ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE POLÍTICAS CULTURAIS

 

PARECER n. 00201/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.015276/2024-28

INTERESSADOS: COORDENAÇÃO DE ASSUNTOS PARLAMENTARES - CAP/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

EMENTA: Indicação nº 47, de 2024, de autoria da Senadora Eliziane Gama. Registro da música gospel como patrimônio imaterial do Brasil. Análise jurídica.

 

 

1. O Despacho nº 1838819/2024/CAP/ASPAR/MinC encaminhou os autos a esse Consultivo, para análise acerca da Indicação nº 47, de 2024, de autoria da Senadora Eliziane Gama, que sugeriu ao Poder Executivo a apresentação de proposta ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN para instaurar o processo de registro da música gospel como bem cultural de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro.[1]

 

2. Os autos foram instruídos com os seguintes documentos: (a) a Indicação nº 47, de 2024 (1797227); (b) a manifestação do IPHAN (1833039); e (c) o Despacho nº 1838819/2024/CAP/ASPAR/MinC.

 

3. É o relatório. Passo à análise.

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

4. O art. 131 da CF/88 dispõe sobre a Advocacia-Geral da União - AGU, responsável pelas atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo. E o art. 11, incisos I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 (Lei Orgânica da AGU), estabeleceu a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade dos atos a serem por ela praticados.[2]

 

5. Destaco, desde já, que este controle interno pelas Consultorias Jurídicas não deve se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos (reservados à esfera discricionária do administrador público), tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, nos termos do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da AGU[3].

 

6. Elaboradas essas considerações preliminares, passa-se à análise da Indicação nº 47, de 2024, de autoria da Senadora Eliziane Gama, que sugeriu ao Poder Executivo a apresentação de proposta ao IPHAN para instaurar o processo de registro da música gospel como bem cultural de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro.

 

 7. O fundamento para a Indicação ora analisada segue abaixo:

A música gospel tem raízes profundas na história e na cultura do Brasil, transcendendo as barreiras religiosas para se estabelecer como um elemento importante da nossa diversidade cultural.
A música gospel chegou ao Brasil juntamente com as primeiras missões evangélicas, adaptando-se e integrando-se à nossa rica pluralidade cultural. Desde então, tem desempenhado um papel significativo na formação da identidade cultural de diversas comunidades, servindo como veículo para a expressão da fé, a esperança e a resiliência diante dos desafios da vida.
O gênero abrange uma ampla variedade de estilos musicais, desde hinos tradicionais aos mais contemporâneos, incluindo influências do samba,  forró, hip hop e música brasileira, entre outros. Essa diversidade reflete a capacidade da música gospel de se reiventar e dialogar com diferentes públicos e gerações, mantendo-se relevante e vibrante no cenário musical brasileiro.
Assim, consideramos que declarar a música gospel como patrimônio cultural brasileiro implica a adoção de medidas para sua proteção, salvaguarda e promoção. Isso inclui o apoio à pesquisa, documentação, transmissão de conhecimento e a realização de eventos que visem à valorização e difusão desse gênero musical.

 

8. Nos termos do inciso II do art. 1º do Decreto nº 3.351, de 2000, o registro de bens culturais imateriais que constituem o patrimônio cultural brasileiro compete ao IPHAN.

 

9. Desta forma, os autos foram enviados ao IPHAN, que manifestou-se no seguinte sentido:

O IPHAN, como instituição federal de preservação do patrimônio cultural brasileiro, é responsável pela execução da Política de Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial e atua no marco dos Decretos supracitados. Através do seu Departamento de Patrimônio Imaterial vem trabalhando de forma contínua há mais de quinze anos para reconhecer, apoiar e fortalecer os bens e práticas culturais de natureza imaterial representativos da memória, história e identidade dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira. E faz isso através dos instrumentos e procedimentos previstos na Política, como o Registro, que reconhece bens culturais através do título de Patrimônio Cultura do Brasil (Decreto 3.551/2000 – Art.5º).
Assim, para que possamos instaurar um processo de Registro é necessário que se atenda os critérios estabelecidos pelo Decreto nº. 3.551, de 4 de agosto de 2000, e a Resolução nº. 001, de 3 de agosto de 2006, que regulamenta o decreto (ambos em anexo).
Todas as exigências para a instauração do processo se encontram nos artigos 2º a 4º desta Resolução. Como é possível depreender da legislação competente, para uma proposta de Registro ser avaliada é preciso que contenha diversos documentos e informações básicas.
De acordo com o Artigo 4º da Resolução nº 001, de 03 de agosto de 2006, para requerer a instauração do processo administrativo de Registro é necessário que o requerimento seja apresentado em documento original, datado e assinado, endereçado ao presidente do Iphan e acompanhado das seguintes informações e documentos: identificação do proponente (nome, endereço, telefone, e-mail etc.); justificativa do pedido; denominação e descrição sumária do bem proposto para Registro, com indicação da participação e/ou atuação dos grupos sociais envolvidos, de onde ocorre ou se situa, do período e da forma em que ocorre; informações históricas básicas sobre o bem; documentação mínima disponível, adequada à natureza do bem, tais como fotografias, desenhos, vídeos, gravações sonoras ou filme; referências documentais e bibliográficas disponíveis; e declaração formal de representante de comunidade produtora do bem ou de seus membros, expressando o interesse e anuência com a instauração do processo de Registro.
Além disso, de acordo com o artigo 2º do Decreto nº 3551, de 04 de agosto de 2000, apenas são partes legítimas para solicitar Registro: o Ministro de Estado da Cultura; instituições vinculadas ao Ministério da Cultura; Secretarias de Estado, de Município e do Distrito Federal; sociedades ou associações civis.
Após a apresentação da solicitação de Registro de um bem cultural imaterial, o pedido passará pelas etapas de análise preliminar, e independentemente da origem da solicitação, a proposta pende de anuências para seguir os trâmites, conforme procedimento estabelecido na Resolução n° 001/2006.
 

10. Assim, no que tange à Indicação ora analisada, a manifestação técnica proferida pelo IPHAN foi no sentido de que: (a) para que o IPHAN possa instaurar um processo de registro, é necessário que sejam atendidos os critérios estabelecidos pelo Decreto nº. 3.551, de 4 de agosto de 2000, e a Resolução nº 001, de 3 de agosto de 2006, que o regulamenta; (b) o requerimento de registro deve ser apresentado em documento original, datado, assinado e acompanhado das informações contidas no art. 4º da Resolução nº 001, de 03 de agosto de 2006; e (c) são partes legítimas para solicitar o registro: a Ministra de Estado da Cultura, instituições vinculadas ao Ministério da Cultura, Secretarias de Estado, de Município ou do Distrito Federal, ou sociedades ou associações civis.

 

11. A fundamentação técnica apresentada pelo IPHAN encontra respaldo jurídico nos arts. 216, p. 1º da CF/88, c/c o art. 1º e 3º do Decreto nº 3.351, de 2000:

Constituição Federal
Art. 216, p. 1º: O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.
Decreto nº 3.351, de 2000:
Art. 1o  Fica instituído o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro.
Art. 2o  São partes legítimas para provocar a instauração do processo de registro:
I - o Ministro de Estado da Cultura;
II -  instituições vinculadas ao Ministério da Cultura;
III - Secretarias de Estado, de Município e do Distrito Federal;
IV - sociedades ou associações civis.
Art. 3o  As propostas para registro, acompanhadas de sua documentação técnica, serão dirigidas ao Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, que as submeterá ao Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural.

 

12. A Indicação encontra-se prevista no art. 113, inciso I, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, nos seguintes termos:

Art. 113. Indicação é a proposição através da qual o deputado:
I - sugere a outro Poder a adoção de providência, a realização de ato administrativo ou de gestão, ou o envio de projeto sobre a matéria de sua iniciativa exclusiva; (grifamos)
 

13. Assim sendo, e tendo-se em vista a fundamentação técnica e jurídica acima apresentada, entendo que, para o momento, a Indicação nº 47 de 2024, foi cumprida. Isso porque, ao enviar os autos ao IPHAN, que proferiu a manifestação acima citada, o MinC adotou as providências cabíveis, tendo sido elaborados os atos administrativos necessários à elucidação das razões pelas quais, no caso, não foi possível avançar-se no processo de registro, conforme requerido pela Senadora Eliziane Gama.

 

III. CONCLUSÃO

 

14. Diante do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade, alheios ao crivo dessa Consultoria Jurídica, manifesto-me no sentido de que a Indicação nº 47, de 2024, foi devidamente cumprida pelo MinC, podendo ser respondida, nos termos da fundamentação técnica e jurídica apresentada neste Parecer.

 

15. É o Parecer.

 

Brasília, 10 de julho de 2024.

 

                     

LARISSA FERNANDES NOGUEIRA DA GAMA

ADVOGADA DA UNIÃO

Coordenadora-Geral de Políticas Públicas Substituta

 


[1] Nos termos da Convenção para a salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial (UNESCO, 2003), entende-se por “patrimônio cultural imaterial” as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas - junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados - que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural. Este patrimônio cultural imaterial, que se transmite de geração em geração, é constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade e contribuindo assim para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana.

[2] Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:

I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;

(...)

V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;

 

[3] A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400015276202428 e da chave de acesso 9b3432d4

 




Documento assinado eletronicamente por LARISSA FERNANDES NOGUEIRA DA GAMA, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br), de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 1555848237 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): LARISSA FERNANDES NOGUEIRA DA GAMA, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br). Data e Hora: 10-07-2024 20:30. Número de Série: 65437255745187764576406211080. Emissor: Autoridade Certificadora do SERPRO SSLv1.