ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA
PARECER n. 00210/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU
NUP: 01400.004931/2024-12
INTERESSADOS: COORDENAÇÃO GERAL DE ESCRITÓRIOS ESTADUAIS CGEE/ MINC
ASSUNTOS: VEDAÇÕES ELEITORAIS. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO.
EMENTA:
I. Direito Eleitoral. Consulta.
II. Interesse de agentes públicos em participar do pleito eleitoral. Prazos de desincompatibilização.
III. Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990. Jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral.
RELATÓRIO
Por intermédio do Ofício nº 1084/2024/SCC/GM/MinC (SEI nº 1836508), a Chefe de Gabinete Substituta da Ministra de Estado encaminha os autos a esta Consultoria Jurídica solicitando avaliação no que tange aos questionamentos dispostos no Ofício nº 346/2024/CGEE/DAG/SCC/GM/MinC (SEI nº 1644956), com o intuito de complementar as análises realizadas pela Assessoria Especial de Controle Interno (SEI nº 1668959) e pela Coordenação-Geral de Gestão de Pessoas do Ministério da Cultura (SEI nº 1684446).
Em resumo, a consulta versa sobre orientações quanto ao afastamento de servidores interessados em candidatarem-se a prefeitos ou vereadores, para disputarem as eleições municipais, em 2024. Foram efetuadas as seguintes indagações:
1.1. Qual o último dia que o coordenador de Escritório Estadual deste Ministério da Cultura, ocupante de cargo em comissão em nível de coordenação (CCE ou FCE 101.10), tem para solicitar a sua desincompatibilização?
1.2. Para os coordenadores que são servidores públicos com vínculo estatutário em outro Órgão, mas que ocupa o cargo em comissão no Ministério da Cultura, deverá requerer sua desincompatibilização junto ao Ministério da Cultura e ao seu órgão de origem também?
1.3. Quais os procedimentos necessários para realizar a desincompatibilização de servidores de outros órgãos públicos ocupantes de cargo comissionado?
1.4. Caso um coordenador tenha realizado a desincompatibilização e não tenha sido eleito, ele poderá retornar ao cargo comissionado ocupado?
Os autos foram recebidos nesta Consultoria Jurídica na data de 11 de julho de 2024.
É o relatório.
ANÁLISE JURÍDICA
Observo que a presente consulta diz respeito à desincompatibilização eleitoral de "coordenadores de Escritórios Estaduais deste Ministério da Cultura, ocupantes de Cargo em Comissão e lotados nos respectivos estados", ocupantes de cargo em comissão em nível de coordenação (CCE ou FCE 101.10), conforme especificado pelo Ofício nº 346/2024/CGEE/DAG/SCC/GM/MinC.
Desincompatibilização eleitoral é a ação pela qual ocupantes de cargos no serviço público se afastam do posto, emprego ou função na administração pública direta ou indireta para poder se candidatar a um cargo eletivo. Para isso, o pré-candidato deverá observar, caso a caso, os prazos constantes da Lei de Inelegibilidade (Lei Complementar 64/90) e da jurisprudência eleitoral.
A regra busca impedir que o servidor, no uso do cargo, função ou emprego público, utilize a administração pública em benefício próprio. O princípio da desincompatibilização pretende evitar, dessa forma, que haja abuso de poder econômico ou político nas eleições por meio do uso da estrutura e recursos aos quais o servidor tem acesso.
Em geral, a norma vale para servidores públicos efetivos ou comissionados, dirigentes ou representantes de autarquias, fundações, empresas, cooperativas, instituições de ensino que recebam verbas públicas; e dirigentes ou representantes de órgãos de classe como sindicatos, conselhos de classe.
Sem essa desvinculação da função pública, o candidato torna-se “incompatível” para disputar as eleições. A incompatibilidade é uma das causas de inelegibilidade prevista em lei e impede o indivíduo de concorrer a um cargo eletivo enquanto estiver ocupando determinado cargo. Por isso, a desincompatibilização é um dos requisitos necessários para o registro de candidatura de quem deseja disputar um cargo eletivo nas eleições.
O prazo para desincompatibilização de servidores efetivos ou comissionados pode variar de acordo com o cargo eletivo disputado e o cargo ocupado pelo concorrente.
Assim dispõe a Lei Complementar n. 64/90:
Art. 1º São inelegíveis:
(...)
II - para Presidente e Vice-Presidente da República:
a) até 6 (seis) meses depois de afastados definitivamente de seus cargos e funções:
(...)
16. os Secretários-Gerais, os Secretários-Executivos, os Secretários Nacionais, os Secretários Federais dos Ministérios e as pessoas que ocupem cargos equivalentes;
(...)
l) os que, servidores públicos, estatutários ou não, dos órgãos ou entidades da Administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e dos Territórios, inclusive das fundações mantidas pelo Poder Público, não se afastarem até 3 (três) meses anteriores ao pleito, garantido o direito à percepção dos seus vencimentos integrais;
III - para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal;
a) os inelegíveis para os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República especificados na alínea a do inciso II deste artigo e, no tocante às demais alíneas, quando se tratar de repartição pública, associação ou empresas que operem no território do Estado ou do Distrito Federal, observados os mesmos prazos;
(...)
IV - para Prefeito e Vice-Prefeito:
a) no que lhes for aplicável, por identidade de situações, os inelegíveis para os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, observado o prazo de 4 (quatro) meses para a desincompatibilização;
(...)
V - para o Senado Federal:
a) os inelegíveis para os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República especificados na alínea a do inciso II deste artigo e, no tocante às demais alíneas, quando se tratar de repartição pública, associação ou empresa que opere no território do Estado, observados os mesmos prazos;
(...)
VII - para a Câmara Municipal:
a) no que lhes for aplicável, por identidade de situações, os inelegíveis para o Senado Federal e para a Câmara dos Deputados, observado o prazo de 6 (seis) meses para a desincompatibilização;
b) em cada Município, os inelegíveis para os cargos de Prefeito e Vice-Prefeito, observado o prazo de 6 (seis) meses para a desincompatibilização.
A fim de facilitar a aplicação da Lei Complementar n. 64/1990, o Tribunal Superior Eleitoral disponibiliza sítio eletrônico específico que consolida a legislação e jurisprudência, informando de maneira clara e direta os prazos específicos de desincompatibilização: https://www.tse.jus.br/servicos-eleitorais/desincompatibilizacao/desincompatibilizacao .
Em relação aos servidores públicos ocupantes de cargos em comissão (o que é o caso da consulta em tela), o TSE informa que é de 3 (três) meses o prazo de desincompatibilização, tanto para os cargos de prefeito/vice-prefeito, quanto para o cargo de vereador:
Nesse sentido, o AgR-REspe nº 9053, de 21/03/2017 (anexo) resume a compreensão do TSE sobre a matéria nos seguintes termos:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. REGISTRO DE CANDIDATURA. ART. 1, II, L, DA LC 64/90. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. DIRETOR DO DEPARTAMENTO RODOVIÁRIO DO MUNICÍPIO. TRÊS MESES ANTERIORES AO PLEITO. DESPROVIMENTO.
(...)
No decisum monocrático, manteve-se deferido o registro de candidatura de Valdir Aparecido de Souza para a vereança de lbaiti/PR em 2016, pois o cargo por ele ocupado - Diretor de Departamento Rodoviário do Município de lbaiti/PR - impõe desincompatibilização nos três meses anteriores às eleições, consoante previsto no art. l, II, l, da LC 64/90
No presente agravo, a coligação alega que a desincompatibilização deveria ocorrer no lapso temporal de seis meses.
Porém, esta Corte entende que o prazo de licenciamento para servidor público será sempre nos três meses anteriores às eleições, conforme regra do art. 1, II, l, da LC 64/90, independentemente de se tratar de pleito majoritário ou proporcional, das esferas federal, estadual ou municipal e abarca tanto servidor efetivo quanto o comissionado.
(...)
Nesse mesmo sentido:
CONSULTA DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. SERVIDORES PÚBLICOS. 3 MESES ANTES DO PLEITO. ART. 1°, II, L, DA LEI COMPLEMENTAR 64/90 REGRA GERAL APLICABILIDADE AOS OCUPANTES DE CARGO EM COMISSÃO. HIPÓTESES DE INELEGIBILIDADE. RESERVA DE LEI. SERVIDOR COM ATRIBUIÇÃO DE ORDENAMENTO DE DESPESAS. AUSÊNCIA DE PREVISÃO ESPECÍFICA. INCIDÊNCIA DA REGRA GERAL: ATÉ 3 MESES ANTES DAS ELEIÇÕES PARA SE AFASTAR DAS FUNÇÕES. CARGO. PREFEITO. VICE-PREFEITO.
1. A desincompatibilização dos servidores públicos no prazo previsto na legislação eleitoral, em geral, é de 3 meses antes da data do pleito, consoante a norma descrita no art. 1, II, 1, da Lei de Inelegibilidades (direcionada às hipóteses de disputa pelos cargos de Presidente da República e Vice-Presidente da República), a qual é estendida aos casos de competição pelos cargos do Poder Executivo Municipal, ex vi do art. 1, IV, a, desse diploma normativo.
2. O regramento atinente à desincompatibilização aplicável aos servidores públicos abarca tanto os ocupantes de cargo efetivo quanto os comissionados, consoante jurisprudência sedimentada nesta Corte. Precedentes: AgR-RO n° 92054/SP, Rei. Min. Gilmar Mendes, PSESS de 30.10.2014; AgR-RO n° 100018/SP, Rei. Mm. João Otávio de Noronha, PSESS de 2.10.2014 e Cta 993/DF, Rei. Mm. Fernando Neves da Silva, DJ de 16.3.2004. [ ... ] (CTA 45.971/DF, Rei. Min. Luiz Fux, DJE de 19.5.2016)
Tal entendimento restou consignado ainda na Súmula nº 54 do Tribunal Superior Eleitoral:
A desincompatibilização de servidor público que possui cargo em comissão é de três meses antes do pleito e pressupõe a exoneração do cargo comissionado, e não apenas seu afastamento de fato.
Em relação ao procedimento de desincompatibilização de cargo ou função comissionada, há, como visto acima, o entendimento do Tribunal Eleitoral de que deve haver o pedido de exoneração, não bastando o mero afastamento das funções:
“[...] Eleições 2004 [...] Desincompatibilização. Servidor público. Cargo em comissão. [...] A desincompatibilização de servidor público, efetivo ou comissionado, pressupõe a exoneração. Não basta o abandono ou o afastamento do serviço”. NE : Candidato que comunica o afastamento da função de radialista para concorrer ao cargo de vereador. “Em rigor, o servidor público deve esperar, no exercício do cargo, sua exoneração. No caso, o servidor limitou-se a comunicar à Administração seu propósito de não mais trabalhar. Isso traduz abandono de cargo, ato ilícito que não produz desincompatibilização.”
(Ac. de 15.9.2004 no REspe nº 22733, rel. Min. Humberto Gomes de Barros; no mesmo sentido o Ac. de 19.10.2004 no AgRgREspe nº 24285, rel. Min. Caputo Bastos.)
“Consulta. Candidatura. Prefeito. Servidor. Cargo em comissão. Afastamento definitivo. Exoneração. Prazo. 1. O servidor público ocupante de cargo em comissão deverá exonerar-se no prazo de três meses anteriores às eleições para se candidatar ao cargo de prefeito.”
(Res. nº 21641 na Cta nº 993, de 26.2.2004, rel. Min. Fernando Neves.)
Como destacado pela Coordenação-Geral de Pessoas no Ofício nº 396/2024/CQVLD/COGEP/GSE/GM/MinC (SEI nº 1684446), a desincompatibilização é um ato voluntário, praticado por um(a) pré-candidato(a) com o intuito de se afastar, de forma temporária ou definitiva, de cargo ou função que ocupa, a fim de evitar conflitos de interesse durante o processo eleitoral.
Uma vez que o servidor tenha pedido exoneração de um cargo ou função comissionada, que é de livre nomeação e exoneração, não há qualquer direito subjetivo a retornar automaticamente ao mesmo cargo em comissão, encerrado o pleito eleitoral. Embora tal conclusão decorra, como mencionado, da própria natureza do cargo ou função comissionada, o Tribunal Superior Eleitoral deixa claro que:
"A desincompatibilização pode ser definitiva ou temporária. De forma geral, ocupantes de cargos eletivos (com mandato) têm que se afastar definitivamente, bem como os que têm vínculo precário (cargo que permite demissão a qualquer momento), os nomeados e os comissionados em geral. Isso é feito por meio de renúncia e, caso o candidato não seja eleito, não pode retornar ao cargo".
Disponível em: https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2021/Junho/desincompatibilizacao-eleitoral-saiba-quem-deve-fazer-e-conheca-os-prazos
Nesse cenário, diante do indagado a esta Consultoria Jurídica, verifica-se que não há acréscimos a serem feitos em relação à manifestação da Assessoria Especial de Controle Interno (SEI nº 1668959) e da Coordenação-Geral de Gestão de Pessoas do Ministério da Cultura (SEI nº 1684446).
CONCLUSÃO
Diante do exposto, ressalvados os aspectos técnicos de conveniência e de oportunidade não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, entende a CONJUR:
a) Qual o último dia que o coordenador de Escritório Estadual deste Ministério da Cultura, ocupante de cargo em comissão em nível de coordenação (CCE ou FCE 101.10), tem para solicitar a sua desincompatibilização?
A desincompatibilização deve ser solicitada no prazo máximo de 3 (três) meses antes do pleito eleitoral.
b) Para os coordenadores que são servidores públicos com vínculo estatutário em outro Órgão, mas que ocupa o cargo em comissão no Ministério da Cultura, deverá requerer sua desincompatibilização junto ao Ministério da Cultura e ao seu órgão de origem também?
Sim, deve pedir exoneração do cargo em comissão e se desincompatibilizar/ licenciar onde é servidor público efetivo.
c) Quais os procedimentos necessários para realizar a desincompatibilização de servidores de outros órgãos públicos ocupantes de cargo comissionado?
Como mencionado acima, deve proceder com os procedimentos de exoneração do cargo em comissão e de desincompatibilização e licença onde é servidor público efetivo.
d) Caso um coordenador tenha realizado a desincompatibilização e não tenha sido eleito, ele poderá retornar ao cargo comissionado ocupado?
Não há direito subjetivo em permanecer ou retornar para um cargo ou função comissionada que, por sua natureza, é de livre nomeação e exoneração.
Das respostas acima, pode-se concluir, portanto, que não há acréscimos a serem feitos em relação à manifestação da Assessoria Especial de Controle Interno (SEI nº 1668959) e da Coordenação-Geral de Gestão de Pessoas do Ministério da Cultura (SEI nº 1684446).
Isso posto, submeto o presente processo à consideração superior, sugerindo que, após aprovação, os autos sejam encaminhados à Chefe de Gabinete da Ministra de Estado, para as providências cabíveis.
Brasília, 29 de julho de 2024.
(assinatura eletrônica)
GUSTAVO ALMEIDA DIAS
Advogado da União
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400004931202412 e da chave de acesso a6f16003