ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE POLÍTICAS CULTURAIS

 

 

PARECER nº 220/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

PROCESSO nº 01400.004633/2024-22

INTERESSADA: Secretaria-Executiva

ASSUNTO: Patrimônio da União. Cessão de uso de imóvel.

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PATRIMÔNIO DA UNIÃO.
I - Patrimônio imobiliário da União. Cessão de imóvel a título não oneroso.
II - A cessão de imóvel a entidade sem fins lucrativos, a título gratuito ou sob condições especiais, somente é autorizada a entidades de caráter educacional, cultural, ou de assistência social ou à saúde, para destinação a tais finalidades. Inteligência do art. 18 da Lei nº 9.636/1998 e respectivos regulamentos.
III - Parecer favorável, condicionado a manifestação técnica quanto ao caráter cultural das atividades previstas no plano de uso do imóvel.

 

 

Sra. Consultora Jurídica,

 

Trata-se de consulta dirigida ao Secretário-Executivo do Ministério da Cultura pela Superintendência de Patrimônio da União em São Paulo por meio do Ofício nº 23717/2024/MGI (doc. SEI/MinC 1641067; SEI/MGI 40382863). No documento, solicita-se a este ministério a emissão de parecer quanto à possibilidade de cessão de uso gratuito de imóvel da União situado na Rua coronel Xavier Toledo, 210, ap. 112 (11º andar), na cidade de São Paulo, cadastrado sob o RIP 7107.01070.500-9.

A cessão seria destinada à Associação Instituto DiverCidades para a "instalação da Sede Administrativa do Instituto e para a implementação de projetos na área cultural conforme projeto" (SEI/MGI 35198684; SEI/MinC 1641068). Conforme informado no projeto, a área do imóvel é de 145,64 m2. Ademais, a instituição é cadastrada como Ponto de Cultura no Programa Cultura Viva do Ministério da Cultura, o que implica reconhecimento de sua natureza cultural e a habilita a acessar recursos da Política Nacional de Cultura viva (Lei nº 13.018/2014)

A solicitação de uso do imóvel foi formulada pela própria entidade à Secretaria do Patrimônio da União (SPU), a qual, segundo o ofício citado, para ser atendida, depende de manifestação favorável do Ministério da Cultura, na forma do art. 18 da Lei nº 9.636/1998 e do art. 2º, § 3º, da Portaria nº 144/2001/SPU, conforme recomendação da Consultoria-Geral da União exarada no Parecer nº 975/2023/NUCJUR-SUM/E-CJU/PATRIMONIO/CGU/AGU, da Consultoria Jurídica da União Especializada de Patrimônio (SEI/MinC 1641069; Sapiens/AGU 1346515941).

Encaminhada a consulta à Secretaria-Executiva, esta direcionou a consulta à Subsecretaria de Espaços e Equipamentos Culturais (SEEC), que se deu por incompetente para analisar a questão, visto não se tratar propriamente de matéria relacionada a infraestrutura cultural, recomendando o encaminhamento à Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural (SCDC), por se tratar do reconhecimento de pertinência das atividades prestadas por entidade qualificada como Ponto de Cultura.

Por meio do Parecer Técnico nº 1/2024/CGPCV/DPNCV/SCDC/MinC, a SCDC informou não haver óbices técnicos para a cessão de uso gratuita de imóvel da União à requerente, dentro do escopo de de análise da secretaria, adstrita a suas competências, no que tange ao atendimento dos objetivos e diretrizes da Política Nacional de Cultura Viva. Porém, recomendou a oitava do IPHAN, por se tratar de cessão de patrimônio da União, bem como manifestação desta Consultoria Jurídica, para opinar quanto aos aspectos legais envolvidos.

É o relatório. Passo à análise.

Preliminarmente, é relevante considerar que a Portaria nº 144/2001/SPU, da Secretaria de Patrimônio da União, encontra-se já revogada pela Instrução Normativa nº 87/2020/SGPU/ME[1]. Todavia, para o que importa ao caso em exame, tal instrução normativa reproduz disposições no mesmo sentido da norma revogada.

​Com relação à necessidade de licitação para este tipo de cessão de imóvel, verifica-se que o inciso I do caput do art. 18 da Lei nº 9.636/1998, combinado com seus §§ 1º e 5º, conduzem ao entendimento de que a licitação é dispensada quando a cessão destina-se a associações sem fins lucrativos.  

Dando maior concretude às disposições legais, o art. 10, inciso III, da Instrução Normativa nº 87/2020/SGPU/ME estabelece que, seja a título gratuito ou em condições especiais, somente é possível a cessão de uso de imóveis da União a entidades privadas sem fins lucrativos quando o ato destinar-se às seguintes finalidades:

a) implantação de ensino gratuito destinado à comunidade local;
b) implantação de centro de ensino especial ou de atividade de atendimento a excepcionais;
c) implantação de atividade cultural;
d) implantação de atividade de assistência social gratuita destinada ao atendimento de carentes e idosos; e
e) implantação de centro de saúde ou hospitais, desde que contemplando o atendimento seja público e gratuito, e que o proponente integre a rede do Sistema Único de Saúde - SUS ou serviço de atendimento à saúde que lhe suceda. [grifamos]

Além destas finalidades, o mesmo inciso III ainda estabelece que a cessão somente é autorizada a "entidades sem fins lucrativos de caráter educacional, cultural ou de assistência social". Ou seja, além da destinação qualificada, é também necessária a qualificação da entidade cessionária de acordo com a natureza de sua atuação.

Conforme se depreende dos atos constitutivos (art. 2º do Estatuto Social) da entidade pleiteante juntados aos autos (doc. SEI/MinC 1641071), trata-se efetivamente entidade de caráter cultural, visto que voltada para o desenvolvimento de "ações para a defesa (...) da qualidade de vida e dos direitos básicos das pessoas ditas como minorias (...) e de pessoas que vivem em condições de vulnerabilidade social, por intermédio dos mais diversos meios e atividades sociais como serviços, programas, projetos e benefícios (...), promoção da educação formal e não formal, da cultura, dos direitos humanos, do fomento à produção e apreciação artística, (...), do lazer, do entretenimento, (...), do acesso à informação, entre outros" (grifamos).

Ademais, trata-se de entidade já qualificada como Ponto de Cultura pelo próprio Ministério da Cultura, em relação à qual a SCDC registra, no Parecer Técnico nº 1/2024/CGPCV/DPNCV/SCDC/MinC (SEI/MinC 1820960), a realização de diversas atividades culturais comunitárias em territórios de periferia da cidade de São Paulo, onde pleiteia o uso do imóvel.

Com relação à destinação cultural a ser dada ao imóvel, o Ofício nº 23717/2024/MGI (doc. SEI/MinC 1641067; SEI/MGI 40382863) e o projeto a ele anexado (SEI/MinC 1641068) mencionam que a cessão será destinada à  "sede administrativa do Instituto Diversidades, podendo ser utilizado também por outras organizações parceiras para atividades comuns", devendo o espaço ser também utilizado "para formações para o público alvo do Instituto e, também, para eventos para captação de recursos". Entre os objetivos específicos do projeto estão: (i) a criação do espaço administrativo para o instituto; (ii) o atendimento a mulheres periféricas e seus filhos; (iii) a criação de um espaço de "coworking" para empreendedores com negócios digitais; (iv) oficinas e treinamentos para o público-alvo; e (v) realizar eventos de captação de recursos.

Portanto, ainda que a utilização primordial seja com finalidade administrativa, é possível que o espaço venha a ser utilizado para implantação de atividades culturais, embora tal destinação não esteja diretamente planejada no projeto da entidade requerente.

Diante do exposto, do ponto de vista estritamente jurídico, e considerando que o requisito principal relativo ao caráter cultural e sem fins lucrativos da associação requerente está devidamente atendido, não vislumbramos óbices à aprovação, pelo Ministério da Cultura, da cessão de uso do referido imóvel próprio da Secretaria de Patrimônio da União, desde que haja manifestação técnica deste ministério que expressamente reconheça como cultural, e não meramente administrativa, a destinação a ser dada pela entidade cessionária.

Alternativamente, caso não haja manifestação conclusiva quanto à finalidade cultural do projeto de uso apresentado, poderão os autos ser encaminhados ao Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, para eventual enquadramento da cessão no art. 10, III, "d", da Instrução Normativa nº 87/2020/SGPU/ME.

Por fim, no que se refere especificamente à sugestão de oitiva do IPHAN, entendo-a desnecessária para o caso em exame, tendo em vista não se tratar propriamente de imóvel integrante do patrimônio cultural brasileiro, mas apenas imóvel próprio da União, sujeito às regras gerais de administração patrimonial. Assim, prevalece o disposto no § 3º do art. 10 da Instrução Normativa nº 87/2020/SGPU/ME, segundo o qual as proposições de que trata a alínea "c" do inciso III (implantação de atividade cultural) deverão contar com prévia aprovação do órgão federal de gestão da cultura (Ministério da Cultura).

 

À consideração superior.

 

Brasília, 19 de julho de 2024.

 

OSIRIS VARGAS PELLANDA

Advogado da União

Coordenador-Geral Jurídico de Políticas Culturais

 

 


Processo eletrônico disponível em https://supersapiens.agu.gov.br por meio do Número Único de Protocolo (NUP) 01400004633202422 e da chave de acesso cb934189

Notas

  1. ^ Disponível no DOU em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/instrucao-normativa-n-87-de-1-de-setembro-de-2020-284713592



Documento assinado eletronicamente por OSIRIS VARGAS PELLANDA, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br), de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 1565079974 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): OSIRIS VARGAS PELLANDA, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br). Data e Hora: 19-07-2024 23:50. Número de Série: 65437255745187764576406211080. Emissor: Autoridade Certificadora do SERPRO SSLv1.