ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE POLÍTICAS CULTURAIS

PARECER n. 00226/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.024360/2023-51

INTERESSADOS: GABINETE DA MINISTRA - GM/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

 

Senhor Coordenador-Geral

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO.
PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - PAD. 
I - Prática de infração funcional prevista na Lei nº 8.112/90, configurada no descumprimento do dever de tratar pessoas com urbanidade, com a inobservância de conduta compatível com a moralidade administrativa.
II - Investigação Preliminar Sumária (IPS) efetivada no processo administrativo nº 01400.011928/2023-74.
III - Observância dos princípios da ampla defesa e do contraditório.
IV - Relatório Final com conclusão e recomendações da Comissão Processante Disciplinar levando em conta as provas documentais e os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
V - Parecer favorável ao prosseguimento do feito nos termos do Relatório Final.

 

Cuida-se de Processo Administrativo Disciplinar/PAD instaurado pela Corregedoria do Ministério da Cultura, através da Portaria COREG/GM nº 07, de 24 de novembro de 2023, publicada no Boletim de Gestão de Pessoas (BGP) de 24 de novembro de 2023, em face de servidor deste Ministério Wallace Ribeiro Magalhães, CPF nº 007709241-40, Agente Administrativo, matrícula SIAPE 1812063, com vistas à apuração das responsabilidades administrativas descritas em Investigação Preliminar Sumária/IPS, Processo Administrativo nº 01400.011928/2023-74.

Verifica-se que a referida IPS foi iniciada por denúncia anônima de conduta ilícita, em 13 de julho de 2023, inicialmente enquadrada no inciso V do artigo 132, na Lei 8112/90, definida naqueles autos como 'incontinência pública e conduta escandalosa, na repartição', e tipificada no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal) - art. 215-A, descrita como “Importunação sexual”, Incluída pela Lei nº 13.718, de 2018, em desfavor do servidor Wallace Ribeiro Magalhães.

O fato anonimamente denunciado, com posterior confirmação dos episódios descritos e conhecimento do denunciante, reportou-se a incidentes de importunação sexual iniciados em 4 de julho de 2023, apontando o responsável Wallace Ribeiro Magalhães pela prática de constrangimento caracterizada pelo ato de encostar o órgão genital no braço da denunciante, toque classificado por indesejado, criando ambiente de trabalho desagradável.

Compulsando-se os autos, extrai-se o juízo de admissibilidade por meio da Nota Técnica nº 11/2023/COREG/GM/MinC, formatada na Investigação Preliminar Sumária (IPS) que recomendou a instauração de PAD, em vista das seguintes conclusões:

"(...)
Pelas  constatações e esclarecimentos consignados no presente relatório;
Considerando a razoabilidade, a legalidade e o subprincípio da proibição da proteção deficiente, faceta do princípio da proporcionalidade,  em face do direito fundamental à dignidade/liberdade sexual;
Levando-se em conta a vedação à atuação administrativa ou à autorização legislativa que atenue a sanção administrativa de demissão em casos de assédio sexual, por flagrante ausência de proteção estatal à dignidade sexual como direito fundamental e patente inconstitucionalidade, na medida em que violaria o princípio da proibição da proteção deficiente, faceta da proporcionalidade, tornando o ato eivado de ilegalidade.
Considerando especialmente o que estabelece a jurisprudência do  Supremo Tribuna Federal (STF), segundo a qual, "nos crimes contra a dignidade sexual a palavra da vítima, em harmonia com os demais elementos de certeza dos autos(provas), reveste-se de valor probante e autoriza a conclusão quanto à autoria e às circunstâncias do crime, e que em se tratando de crimes contra a liberdade sexual, "a palavra da ofendida ganha especial relevo", e "aliada a prova admitida em direito, ilide e fulmina o argumento da negativa de autoria;"
Recomenda-se a instauração de Processo Administrativo Disciplinar(PAD) em desfavor do servidor Wallace Ribeiro Magalhães, pela suposta prática da conduta ilícita denominada assédio sexual tendo como suposta vítima a Sra Maria Alice Diniz Ferreira".

De igual modo, deflui-se da Nota Técnica nº 12/2023/COREG/GM/MinC, o seguinte posicionamento quanto ao Juízo de Admissibilidade:

"...
Cumpre destacar que dos fatos relatados na denúncia e que exigem apuração, apenas a conduta descrita como “assédio sexual” será objeto do presente juízo de admissibilidade, quanto aos demais atos, relatados também pela suposta vítima, serão aqui apenas mencionados, mas a análise, na profundidade e extensão necessárias, será realizada em IPS própria já em curso nesta Corregedoria em outro processo de nº 01400.011284/2023-14, que apura suposta “conduta desidiosa” também em desfavor do servidor ora investigado.
...
No Parecer n. 00001/2023/PG-ASSEDIO/SUBCONSU/PGF/AGU, itens 44 e 45, ao avaliara gravidade da conduta, considerando o enquadramento legal no regime jurídico disciplinar, destacando ensinamentos do Manual de Processo Administrativo Disciplinar da CGU, a AGU considera que “os atos de cunho sexual que visem ao favorecimento pessoal do servidor, cometidos no exercício do cargo, emprego ou função pública, ou praticados em decorrência dele, nos termos do artigo 148 da Lei n. 8.112, de 1990, embora violem inúmeros deveres do estatuto jurídico, tais como os deveres de lealdade, de observância às normas legais e regulamentares e de urbanidade, afrontam principalmente a dignidade do múnus público, do decoro, da probidade e da moralidade pública, amoldando-se diretamente ao previsto no artigo 116, inciso IX, artigo 117, inciso IX, c/c artigo 132, inciso V, XIII e artigo 137, todos da Lei n. 8.112, de 1990. Eis os textos legais:
(...)
Assim, uma vez tenha a autoridade julgadora chegado à conclusão de que a conduta do servidor se amolda ao disposto no artigo 132 da lei n. 8.112, de 1990, e artigo 5º, inciso I, parágrafo único, inciso I, da Lei n. 8.027, de 1990, não há espaço para discricionariedade na fixação da pena, que deverá ser aquela descrita na disposição legal, ou seja, demissão.
...
Recomenda-se a instauração de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) em desfavor do servidor Wallace Ribeiro Magalhães, pela suposta prática da conduta ilícita denominada assédio sexual tendo como suposta vítima a Sra Maria Alice Diniz Ferreira".

Da argumentação contida na referida Defesa Escrita apresentada no Processo Administrativo Disciplinar, foram destacados os seguintes pontos: a) Da urbanidade; e, b) Do suposto impacto psicológico, nos termos a seguir:

A. Da urbanidade
(...)
Citou-se como argumento “o relato do senhor Wallace Ribeiro Magalhães (SEI n. 1792396 - início com a minuto de vídeo e destaque a partir dos 2min. e 10s)”. Ora, o relato é de um episódio em que o Sr. Wallace foi vítima de tratamento desprovido de urbanidade, quando foi insultado pela Sra. Maria Alice.
Não houve maiores repercussões desse ocorrido, o que é visto com estranheza é a inversão dos acontecimentos.
É imperioso salientar que, nos depoimentos das Sras. Responsáveis pela empresa da qual Alice era colaboradora, foi citado que episódios de destempero por parte da Sra. Maria Alice eram comuns, tendo a mesma brigado com um garçom e feito gestos obscenos aos colegas da copa, o que torna obscura a possibilidade de que haja relação de causa e efeito entre seu destempero e quaisquer acontecimentos que envolvam o Sr. Wallace.
Destaca-se, ainda, que foram trazidas ao processo várias testemunhas que confirmaram o tratamento cortês do servidor para com todos, indo de encontro ao que foi imputado.
B. Do Suposto impacto psicológico 
(...)
Esta defesa acredita que, para que se avalie a existência de algum dano psicológico, a intensidade deste dano (considerado significativo), e especialmente a causa deste eventual dano, seria necessária uma avaliação técnica, feita por psicólogo habilitado para tanto, sendo qualquer outro meio insuficiente para que se chegue a alguma conclusão e considerado como meio de prova, mesmo que para fins de punição administrativa. A existência destas características seria inviável, a esta altura, mesmo por alguém especializado, considerado o lapso temporal de 1 ano. 
É mister lembrar que, em seu depoimento, em resposta à Sra. Lilian Janine De Barros Beckmann, a Sra. Maria Alice afirma não ter necessitado ou procurado algum tipo de apoio psicológico. Por seu turno, o Sr Wallace sim, necessitou de ajuda psicológica para lidar com todos os pormenores deste processo, e seus danos mentais estão comprovados por profissional especializado.  

Nesse contexto, o Relatório Final da CPAD avaliou minuciosamente as alegações da Defesa, sendo de se destacar a seguinte conclusão:

"(...)
Por todo o exposto, a CPAD entende que a defesa escrita do servidor indiciado não teve o efeito de afastar o enquadramento dado pela Comissão, nem a observação de que a Comissão considerou a conduta grave, dentro do enquadramento dado.
Como citado anteriormente, a Comissão Processante entende que apesar do enquadramento da conduta ter sido no descumprimento do dever de tratar com urbanidade as pessoas (art. 116, inciso XI da Lei n. 8.112/1990), o que, normalmente, justificaria a penalidade de advertência, entendemos que a penalidade devida é a de suspensão, nos termos do art. 129 da Lei n. 8.112/1990, confira-se:
(...)
Demonstrada a possibilidade legal de se aplicar a penalidade de suspensão, passa-se a demonstrar o raciocínio da Comissão para sugerir o período de suspensão recomendado:
13.1. Observando o art. 128 da Lei n. 8.112, vê-se que devem ser levados em conta os seguintes fatores: natureza + gravidade + danos para o serviço público + circunstâncias agravantes e atenuantes + antecedentes funcionais;
13.2. Decidimos escalonar o prazo de suspensão que é de no máximo 90 dias em função dos 5 fatores do art. 128; ou seja, dividimos 90 por 5 e chegamos a períodos de até 18 dias para cada fator;
13.3. Avaliando a "natureza" da infração, o que se refere à subjetividade da conduta, ou seja, à avaliação sobre a vontade/culpa do servidor no cometimento do ato, a CPAD não vê outra opção que não seja atribuir 18 dias em função disso, visto que concluímos que a conduta foi proposital;
13.4. Avaliando agora a "gravidade", a CPAD entende que devem ser acrescidos 6 dias, visto que o enquadramento da conduta foi "descumprimento do dever de tratar com urbanidade as pessoas" (art. 116, inciso XI da Lei nº 8.112/1990). Relembra-se que o descumprimento de dever funcional é, para a Lei n. 8.112/1990, uma infração considerada mais branda, tanto que a penalidade inicial prevista é a advertência;
13.5. Avaliando os "danos para o serviço público", a CPAD não vê outra opção que não seja não acrescentar nenhum dia em função desse fator; 
13.6. Avaliando as "circunstâncias agravantes e atenuantes", temos como agravantes: (i) a dinâmica do ocorrido, posto que revela que a atitude do servidor em relação à Sra. Maria Alice Diniz Ferreira não teve nenhuma motivação que de alguma forma a justificasse (+9 dias porque consideramos esse fator especialmente reprovável); (ii) a relação amistosa que o servidor tinha com a Sra. Maria Alice Diniz Ferreira antes do ocorrido, o que mostra, a nosso ver, um especial desprezo à relação cordial prévia (+6 dias, porque consideramos o fator bastante reprovável); como atenuantes: (i) as testemunhas trazidas aos autos, as quais foram unânimes em afirmar que o servidor mantinha uma atitude geral respeitosa com as pessoas (-4 dias, porque consideramos que isso é o mínimo esperado de um servidor público); e (ii) tratou-se de conduta isolada (-4 dias porque consideramos também que isso é o mínimo esperado de um servidor público); assim sendo, a CPAD, ponderando as circunstâncias, entende pelo acréscimo de 7 dias em função das circunstâncias agravantes e atenuantes; e
13.7. Olhando agora para os "antecedentes funcionais", a CPAD não vê opção que não seja não acrescentar nenhum dia em função desse fator;
13.8. Concluímos então, pela recomendação de suspensão do servidor Wallace Ribeiro Magalhães pelo prazo de 31 dias. Ng.
(...)".

Encerrados os trabalhos, os autos foram enviados à autoridade julgadora e, em seguida, por meio do Ofício nº 3304/2024/GM/MinC (1851142), a esta Consultoria Jurídica com vistas à avaliação e manifestação jurídica.

É a síntese do necessário. Passamos à análise.

Preliminarmente, deve-se ressaltar que o exame desta Consultoria Jurídica dar-se-á nos termos do artigo 11, inciso V, da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se ao âmbito da competência institucional do Órgão Consultivo a apreciação de elementos de ordem técnica, financeira ou orçamentária, bem como avaliação acerca da conveniência e oportunidade da prática de atos administrativos, restringindo-se aos limites jurídicos da consulta suscitada, consoante o Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU n.º 7/2016.

Impõe-se ainda destacar que foge à alçada desta Consultoria Jurídica imiscuir-se na análise técnica realizada pela unidade competente, órgão detentor de expertise para tal exame. Todavia, cabe à esta Consultoria realizar o exame sob o ponto de vista da legalidade do procedimento.

Assim, a presente manifestação apresenta natureza meramente opinativa e, por tal motivo, as orientações estabelecidas não se tornam vinculantes para o gestor público que pode, de forma justificada, adotar orientação contrária ou diversa daquela emanada por esta Consultoria Jurídica.

Do preenchimento dos pressupostos formais

O procedimento administrativo se encontra hígido, escorreito, íntegro e sem falhas processuais que possam comprometer o seu desiderato. Isso porque, no aspecto formal, inexistem vícios que possam ensejar a nulidade do feito, o qual foi conduzido em observância a todas as formalidades impostas pela legislação de regência.

A instauração do PAD ocorreu através da publicação da portaria baixada pela autoridade competente, que designou os integrantes e indicou, dentre eles, o presidente da Comissão Processante (art. 151, I, c/c art. 149, Lei nº 8.112/90).

Verifica-se, assim, que o presente Processo Administrativo Disciplinar foi devidamente instaurado pela Portaria COREG/MINC nº 7, de 24 de novembro de 2023, da lavra do Corregedor/MinC, publicada no Boletim de Gestão de Pessoas - BGP de 24 de novembro de 2023, tendo o ato designado os servidores responsáveis pela apuração.

Posteriormente, foram publicadas outras portarias nos autos, as quais, em síntese, garantiram a adequada condução dos trabalhos apuratórios.

No caso concreto, a Portaria de Instauração do presente PAD não fez descrição objetiva do ilícito administrativo que especificamente buscavam apurar dentre as irregularidades constatadas no Processo nº 01400.011928/2023-74. No entanto, após a instrução do Processo Administrativo Disciplinar houve, no Indiciamento do acusado, o detalhamento preciso dos ilícitos a ele atribuídos consoante apurados no mencionado processo administrativo de investigação, possibilitando integralmente a apresentação da defesa.

Logo, o processamento do PAD observou a jurisprudência dos Tribunais Pátrios, segundo a qual apenas quando do indiciamento do servidor, posteriormente à fase instrutória do processo administrativo disciplinar, deve haver a descrição detalhada dos fatos a serem apurados. Isso porque o Processo Administrativo Disciplinar ancora-se no informalismo moderado em oposição ao absolutismo das formas, pois, para a maioria das irregularidades, é preciso que a defesa do servidor demonstre o efetivo prejuízo ao provar as alegações de defesa.

É de se registrar, no caso, a sequência dos procedimentos legais pertinentes que caracterizaram o atendimento ao contraditório e à ampla defesa: I) Notificação Prévia do servidor desde a Investigação Preliminar Sumária (1589005); II) Defesa prévia do Notificado (1614240); III - Termo de Indiciamento no Processo Administrativo Disciplinar - PAD (1823057); e IV) Peça de Defesa apresentada no PAD (1830431).

Deve-se destacar, portanto, que não houve nos autos qualquer nulidade por contrariedade aos princípios que regem a Administração Pública, notadamente aos princípios do contraditório e da ampla defesa, uma vez que as formalidades legais atinentes à produção de provas e à apresentação de defesa escrita do acusado foram devidamente observadas.

Em suma, pelo confronto das provas trazidas aos autos, não se constatam a inobservância dos aspectos relacionados à regularidade formal do processo disciplinar, que atendeu aos ditames legais.

Da plausibilidade das conclusões da Comissão Processante

Consoante visto, a temática sub lúmen versa sobre análise de infração administrativa de conduta que, nos termos analisados, foi de encontro às premissas básicas que regem o ambiente de trabalho, capitulada pela Comissão Processante como o descumprimento do dever de tratar com urbanidade às pessoas, nos termos do inciso XI do art. 116, da Lei nº 8.112/1990, definido no próprio estatuto de regência dos servidores públicos civis da União:

Art. Art. 116.  São deveres do servidor:
(...)
XI - tratar com urbanidade as pessoas;

Houve esclarecimentos pela Comissão Processante no sentido de que, com base nos elementos probatórios colhidos durante a instrução processual e observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, optou por aplicar a penalidade de suspensão, embora o enquadramento da conduta tenha sido em artigo que pudesse justificar a penalidade de advertência.

De acordo com a Lei nº 8.112/1990, são os seguintes critérios para a aplicação das penalidades nos termos previstos nos artigos 128, 129 e 130:

"Art. 128.  Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais.
Parágrafo único.  O ato de imposição da penalidade mencionará sempre o fundamento legal e a causa da sanção disciplinar.     
Art. 129.  A advertência será aplicada por escrito, nos casos de violação de proibição constante do art. 117, incisos I a VIII e XIX, e de inobservância de dever funcional previsto em lei, regulamentação ou norma interna, que não justifique imposição de penalidade mais grave.  
Art. 130.  A suspensão será aplicada em caso de reincidência das faltas punidas com advertência e de violação das demais proibições que não tipifiquem infração sujeita a penalidade de demissão, não podendo exceder de 90 (noventa) dias.
(...)".

Conforme visto, o caput do art. 128 deixou claro que na aplicação das penalidades são consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem ao serviço público, bem como as circunstâncias agravantes ou atenuantes, e ainda os antecedentes funcionais. Ocorre, porém, que, em que pese tenham sido estabelecidos tais critérios a serem avaliados na aplicação das penalidades de advertência e suspensão, não foi especificado o método necessário ao discernimento dos referidos critérios (natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem ao serviço público, bem como as circunstâncias agravantes ou atenuantes, e ainda os antecedentes funcionais), o que poderia ter ensejado dúvidas na aplicação adequada da pena.

No entanto, no que tange ao art. 129, verifica-se o enunciado de que a penalidade de advertência será aplicada por escrito nos casos de violação das proibições descritas nos incisos I a VIII e XIX, assim como nos casos de inobservância do dever funcional previsto em lei, regulamentação ou norma interna que não justifique a aplicação de penalidade mais grave.

Quanto ao caput do art. 130, a previsão é de que a suspensão será aplicada em caso de reincidência das faltas punidas com advertência, bem como de violação das demais proibições que não tipificarem infração sujeita a penalidade de demissão.

Firme nessas premissas, a Comissão Processante entendeu que, embora o enquadramento da conduta tenha se dado em razão do descumprimento do dever de tratar com urbanidade as pessoas, o que justificaria a penalidade de advertência, optou por aplicar a penalidade de suspensão, nos termos do citado art. 129 da Lei nº 8.112/1990.

Nesse ponto, registre-se a importância da avaliação da penalidade aplicável ao caso, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, por ser indispensável levar em conta os efeitos concretos da sanção, já que, à evidência, a advertência é a penalidade mais branda e a suspensão pode ocasionar, inclusive, efeitos pecuniários ao servidor de cargo efetivo.

Nessa perspectiva, para elucidar o assunto é imperioso recorrer aos esclarecimentos do Manual de Processo Administrativo Disciplinar da Corregedoria-Geral da União - CGU, Edição de setembro/2019, de onde se extrai que:

a) infrações leves: aquelas que afrontam os deveres funcionais descritos no art. 116 da Lei nº 8.112/90 ou configuram as proibições descritas no art. 117, incisos I a VIII e XIX, do diploma legal, às quais são aplicáveis as penalidades de advertência ou de suspensão;
b) infrações médias: por exceção, são aquelas puníveis exclusivamente com suspensão, quais sejam, as que se encontram elencadas no art. 117, incisos XVII e XVIII da Lei nº 8.112/90, as que configurem casos de reincidência das faltas punidas com advertência, os casos de cometimento de nova infração disciplinar sujeita à advertência por servidor com registro de penalidade não cancelado, vide caput do art. 131 da referida lei, a hipótese de recusa de submissão à inspeção médica, conforme dispõe o §1o do artigo 130 do Estatuto Funcional, bem como as condutas previstas pelo art. 32 da Lei nº 12.527/2011.

Deveras, importa ainda extrair do referido Manual que a suspensão deve ser aplicada nas seguintes situações:

a) nos casos de violação das proibições constantes do art. 117, incisos I a VIII e XIX da Lei nº 8112/90, e de inobservância de dever funcional previsto em lei, regulamentação ou normas internas que justifiquem penalidade mais grave; Ng.

b) violação das obrigações do art. 117, XVII e XVIII, da Lei nº 8.112/90;

c) reincidência das faltas punidas com advertência, de acordo com o caput do artigo 130 da Lei nº 8.112/90; 

d) cometimento de uma nova infração disciplinar sujeita à advertência por agente público que tenha registro de penalidade em seu assentamento funcional não cancelado em razão do decurso de 3 (três) anos, no caso de advertência, ou de 5 (cinco) anos, no caso de suspensão, vide caput do artigo 130 c/c o caput do art. 131 da Lei nº 8.112/90;

e) no caso de recusa de submissão à inspeção médica determinada pela autoridade competente, conforme dispõe o §1º do artigo 130, da Lei nº 8.112/90; e

f) ocorrência das condutas elencadas pelo art. 32 da Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação), segundo o disposto pelo inciso II do §1º do art. 32 daquele diploma legal.

Nessa esteira, a Comissão Disciplinar, ao avaliar a conduta e a penalidade adequadas ao caso, ponderou o grau de cada elemento da situação concreta, uma vez que, ainda que se tenham constatado (num primeiro momento) que a punição resultante da análise seria a de advertência, foi verificada a inobservância de dever funcional previsto em lei e normas internas que justificou a penalidade majorada para suspensão. 

Para efeito de corroboração ao Relatório Final, embora não se trate de argumento imprescindível, mas detentor de força jurídica, esta Coordenação colaciona também à circunstância dos autos a violação pelo servidor do inciso IX, do retrocitado art. 116, da Lei nº 8.112/90, (IX - manter conduta compatível com a moralidade administrativa), notoriamente vinculado às regras de 'relacionamentos interpessoais' no ambiente de trabalho, o que ratifica a fundamentação para a majoração da pena.

Outro dado importante extraído das ponderações da Comissão Processante que não se pode olvidar, é o fato da análise detalhada no Relatório Final quanto à Defesa apresentada, no sentido de que esta não logrou ilidir a acusação formal realizada no Termo de Indiciamento, restando expressa a ilegalidade da conduta registrada. Ao pormenorizar atenuantes e agravantes na dosimetria da aplicação da penalidade, a Comissão tracejou a decisão final de maneira fundamentada.  

No que atine, assim, ao exame do Relatório Final, em conjunto com os demais documentos constantes dos autos, constata-se que a Comissão processante atendeu às determinações da legislação de regência, pelo que esta Coordenação opina pelo regular prosseguimento do feito.

Nunca é demais repisar que o Direito Sancionador deve ser pautado em dois princípios, o princípio da razoabilidade, que assevera que os atos realizados por administradores públicos devem pautar-se pela razão, pela lógica, pela plausibilidade das justificativas, e, ainda, o princípio da proporcionalidade que recomenda, dentre as diversas condutas a tomar, que o administrador escolha a melhor para o caso, de modo proporcional ao interesse público que ele pretende alcançar.

Eis os fundamentos que servem de base às conclusões externadas nesta manifestação jurídica, consentâneos com a ordem constitucional brasileira e o direito administrativo contemporâneo.

CONCLUSÃO

Constatado, portanto, no âmbito dos procedimentos administrativos efetivados nos autos que culminaram na aplicação da pena de suspensão, que foi assegurado ao acusado o devido processo legal com a observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, esta Coordenação se manifesta favoravelmente aos termos do Relatório Final, com o regular prosseguimento do feito.

De todo o exposto, em sede de apoio a julgamento, considerando a regularidade formal do procedimento e a plausibilidade das conclusões da Comissão, recomendo que seja acatada a penalidade de suspensão, aplicada com base nos termos da Lei nº 8.112/90, conforme expresso no Relatório Final.

Repise-se que a presente manifestação apresenta natureza meramente opinativa e, por tal motivo, as orientações estabelecidas não se tornam vinculantes para o gestor público que pode, de forma justificada, adotar orientação contrária ou diversa daquela emanada por esta Consultoria Jurídica.

 

À consideração superior

 

Brasília 12 de julho de 2024

 

MARIA IZABEL DE CASTRO GAROTTI

Advogada da União

 

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