ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE POLÍTICAS CULTURAIS

PARECER n. 00230/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.017456/2024-44

INTERESSADOS: GABINETE DA MINISTRA - GM/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

Senhor Coordenador-Geral

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. NOTITIA CRIMINIS.
I -   Notícia de crime encaminhada pela Corregedoria Regional da Polícia Federal em Curitiba/PR, apresentada pelo Instituto Inteligência Para Cidades Inteligentes, requerendo apuração de irregularidades em aplicações de verbas do Ministério da Cultura, no que tange ao projeto "Verão Cultura Paraná" - Pronac 23-3838, cujo proponente é o próprio Instituto Inteligência para Cidades Inteligentes.
II - Processo arquivado na referida Corregedoria Regional de Polícia Federal/Curitiba/PR.
III - Identificação nesta Pasta de situações das quais podem advir danos ao erário, que deverão ser tecnicamente apuradas e instruídas em processo de Prestação de Contas.
IV - Parecer favorável ao prosseguimento do feito com o encaminhamento à Subsecretaria de Gestão de Prestação e Tomada de Contas da Secretaria-Executiva/MinC,​ para avaliação das supostas irregularidades noticiadas.
V - À consideração superior.
 

Trata o presente feito do Ofício nº 2171628/2024 - COR/SR/PF/PR, dirigido à Exma. Sra. Ministra de Estado da Cultura pela Corregedoria Regional da Polícia Federal/Curitiba/PR, com Notitia Criminis apresentada pelo INSTITUTO INTELIGÊNCIA PARA CIDADES INTELIGENTES, contendo requerimento de instauração de Inquérito Policial com objetivo de serem apuradas possíveis irregularidades em aplicações de verbas do Ministério da Cultura, no que tange ao projeto "Verão Cultura Paraná" - Pronac 23-3838, cujo proponente é o próprio Instituto Inteligência para Cidades Inteligentes - CNPJ nº 38.252.820/0001-43, processo SEI nº 01400.018136/2023-21.

Nesta Pasta, o feito foi dirigido à Subsecretaria de Gestão de Prestação e Tomada de Contas da Secretaria-Executiva/MinC, por meio do Ofício nº 3132/2024/GM/MinC, tendo o processo sido enviado a esta Consultoria Jurídica pelo Ofício nº 941/2024/CATE/SGPTC/GSE/GM/MinC,​ oriundo da Coordenação de Atendimento Administrativo/CATE/SGPTC/SE/MINC.

Constam ainda dos autos, além do citado Ofício nº 3132/2024/GM/MinC, os seguintes documentos:

- Despacho 1838813/2024/SGPTC/GSE/GM;

Ofício nº 941/2024/CATE/SGPTC/GSE/GM/MinC;

- Notícia crime - Romano Advogados Associados;

- Consulta Pronac 23.3838 - Verão Cultura Paraná; e

- Ofício nº 122/2024/COREG/GM/MinC.

É a síntese do necessário. Passamos à análise.

Preliminarmente, deve-se ressaltar que o exame desta Consultoria Jurídica dar-se-á nos termos do artigo 11, inciso V, da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se ao âmbito da competência institucional do Órgão Consultivo a apreciação de elementos de ordem técnica, financeira ou orçamentária, bem como avaliação acerca da conveniência e oportunidade da prática de atos administrativos, restringindo-se aos limites jurídicos da consulta suscitada, consoante o Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU n.º 7/2016.

Impõe-se ainda destacar que foge à alçada desta Consultoria Jurídica imiscuir-se na análise técnica realizada pela unidade competente, órgão detentor de expertise para tal exame. Todavia, cabe à esta Consultoria realizar o exame sob o ponto de vista da legalidade do procedimento.

Assim, a presente manifestação apresenta natureza meramente opinativa e, por tal motivo, as orientações estabelecidas não se tornam vinculantes para o gestor público que pode, de forma justificada, adotar orientação contrária ou diversa daquela emanada por esta Consultoria Jurídica.

Feitos esses registros preliminares, passa-se ao enfrentamento do objeto do presente, extraindo-se da notícia de crime recebida que os membros denunciados do Instituto Inteligência para Cidades Inteligentes teriam gerido fraudulentamente a dita "instituição financeira", em valores que chegaram a R$ 297.622,11 (duzentos e noventa e sete mil reais, seiscentos e vinte e dois reais e onze centavos), oriundos de projeto incentivado pela Lei Rouanet.

A título elucidativo, informe-se que o referido Instituto é uma Organização da Sociedade Civil - OSC, constituído em 2020, que atua em municípios de todo o território brasileiro como elo entre sociedade civil organizada e as esferas da gestão pública. 

A Corregedoria Regional de Polícia Federal - COR/SR/PF/PR, nesse sentido, por meio do Parecer nº 2006623/2024, foi desfavorável à instauração de Inquérito Policial, sugerindo o arquivamento do caso, ao entendimento de que o Instituto não se enquadra na definição de instituição financeira, bem como que as alegações dos crimes cometidos pelos gestores do Instituto também não se encaixam na legislação de crimes financeiros, opinando pela inexistência de competência federal ou de justa causa para iniciar qualquer investigação, e encaminhando o feito a este Ministério da Cultura, verbis:

"(...)
O parecer parte do pressuposto de que o Instituto Inteligência para Cidades Inteligentes é equiparado a uma instituição financeira para fins penais, baseando-se no artigo 1º da Lei 7.492/86. No entanto, é crucial ressaltar que a simples captação de recursos públicos não caracteriza o instituto como uma instituição financeira. De acordo com a lei mencionada, uma instituição financeira é definida como uma pessoa jurídica que, entre outras atividades, realiza a captação, intermediação ou aplicação de recursos financeiros de terceiros. O instituto em questão não se enquadra nessa definição, uma vez que não realiza atividades típicas de instituições financeiras, como banco, corretora ou gestora, e não intermediou valores de terceiros. Portanto, as alegações de crimes cometidos pelos gestores do instituto não se enquadram na legislação de crimes financeiros, eliminando assim as acusações de gestão temerária ou fraudulenta. 
Além disso, é importante contrariar a comparação feita no parecer com casos anteriores de fraudes envolvendo a Lei Rouanet. Cada caso deve ser analisado individualmente, levando em consideração suas circunstâncias específicas, e não se pode justificar a conversão do caso em Notícia de Crime com base apenas em casos anteriores. Da mesma forma, a referência ao artigo 41, parágrafo 2º da Lei 8.313/91, que prevê penalidades para o não cumprimento das atividades culturais objeto do incentivo, não parece ser aplicável ao caso em questão. Não há evidências de que as atividades culturais não foram promovidas sem justa causa, portanto, essa acusação também não se sustenta.
(...)
Portanto, não há competência federal nem justa causa para instaurar um procedimento formal. A solução mais adequada seria o arquivamento do caso."
Diante disso, considerando a sugestão da autoridade policial, conforme despacho acima, que sugere o arquivamento, entende este NUCOR/SR/PF/PR pelo envio do caso ao Ministério da Cultura, entidade competente para fiscalização dos recursos oriundos da Lei Rouanet; Ng.

Consoante visto, no contexto da análise acerca da notícia crime, a Corregedoria Regional de Polícia Federal não identificou condições de aparência sobre ações ilícitas e culpáveis penalmente. Registrou, então, a ausência de circunstâncias mínimas de criminalização concreta para a instauração de Inquérito Policial e, em análise ao âmbito legal de criminalização, concluiu que as informações nos autos deveriam ser encaminhadas ao Ministério da Cultura por se referirem à ilícitos quanto à Lei Rouanet.

Verifica-se, assim, que a referida notícia crime pressupôs que o Instituto Inteligência Para Cidades Inteligentes captou recursos públicos através da Lei Rouanet e, por essa razão, foi equivocadamente equiparado à instituição financeira para fins penais, o que levou a Corregedoria Regional da Polícia Federal à resposta de que a simples captação de recursos públicos por intermédio de projetos incentivados não caracteriza o Instituto como instituição financeira.

Nessa esteira, conforme excertos da denúncia formulada, destacam-se com clareza os seguintes itens, no que tange especificamente ao projeto "Verão Cultura Paraná" - Pronac 23-3838:

"(...)
22. O segundo fato relevante e irregular foi promover pagamentos e ressarcimentos indevidos e ilegais dos recursos públicos em benefício próprio e de terceiros e outros em dissonância com os contratos formalizados previamente à execução do projeto.
23. Todos os pagamentos que foram e deveriam ser regularmente realizados, foram precedidos de contratos escritos que devem ser respeitados, assim considerados os que foram firmados com os músicos, artistas, bandas, grupos folclóricos, estudantes, monitores, bolsistas, oficineiros, coordenadores, assistentes, auxiliares, motoristas, prestadores de serviços e locadores de bens e serviços. 
24. O terceiro fato relevante, reprovável e ilegal foi o Jewan Antunes se apoderar dos documentos originais da sede do Instituto e não ter devolvidos até a presente data, agindo com reserva mental, tanto para impedir a correta conferência deles com os serviços prestados e produtos adquiridos, como para prejudicar a instituição na devida prestação de contas, caracterizando sua má-fé e pretensão de favorecimento pessoal.
25. O quarto fato relevante é de que a aprovação do projeto pelo MinC perpassa pela correspondência entre a execução do recurso e o valor de cada previsão orçamentária, ou seja, cada rubrica contábil. A execução dos recursos deve obrigatoriamente atender cada rubrica e, quando parte do orçamento não é executada, deve ficar disponibilizada no processo para poder ser convertido em renda para a União. Este é caso. O orçamento não foi totalmente executado e havia recursos disponíveis, porém, a intervenção do João Triska, do Jewan Antunes e da Arliet Lira (e quiçá de Mari Antunes), além de os valores não corresponderem às rubricas aprovadas, o saldo da conta movimento foi zerado.
26. Pelos lançamentos verificados na conta movimento do projeto (extrato em anexo), são os seguintes os pagamentos e ressarcimentos ilegítimos e que não poderiam ser pagos em razão da inexistência de contrato que os ampare e da apropriação indevida dos documentos comprobatórios pelo Coordenador Geral Jewan Antunes: (...)
27. O valor total da movimentação financeira ilegal dos recursos do projeto foi de R$ 297.622,11 (duzentos e noventa e sete reais, seiscentos e vinte e dois reais e onze centavos)".

De pronto, percebe-se a possibilidade de identificação de situações das quais podem advir danos ao erário, mas que somente serão devidamente apuradas e instruídas se forem avaliadas no bojo de processo de Prestação de Contas, consoante esclarecimentos prestados pela Subsecretaria de Gestão de Prestação e Tomada de Contas da Secretaria-Executiva/MinC, por meio do Ofício nº 941/2024/CATE/SGPTC/GSE/GM/MinC:

"Em atendimento, informa-se que o Pronac 23-3838 encontra-se atualmente com a situação E75 - Iniciado prazo para apresentar prestação de contas, no SALIC, dessa forma, ainda está no período legal para apresentação da Prestação de Contas. Contudo, importante destacar que, assim que findado o prazo legal e a Prestação de Contas for devidamente encaminhada a este Ministério por parte do proponente, os apontamentos elencados no Ofício nº 2171628/2024 - COR/SR/PF/PR (SEI/MinC 1834348) serão levados em consideração pela área técnica responsável".

Consequência disso, a Corregedoria desta Pasta, através do Ofício nº 122/2024/COREG/GM/MinC, apresentou os seguintes esclarecimentos:

"Cumprimentando-o cordialmente, faço referência à notícia de irregularidades financeiras em valor de cerca de R$ 300 mil reais, trazida pelo próprio proponente do projeto Pronac n. 233838, Instituto Inteligência para Cidades Inteligentes, para informar que, neste caso, eventual atuação desta Corregedoria necessariamente deverá aguardar a finalização da análise da prestação de contas por parte dessa Subsecretaria.
(...)
Por fim, informo que esta Corregedoria está à disposição, contudo, reitero que, dada a lógica do procedimento, só irá atuar mediante provocação (visto que a multa pode ser apurada e aplicada por outras unidades ministeriais) e após a finalização da análise da prestação de contas, se vierem a ser reprovadas".

Assim, caso os indícios apontados confirmem as irregularidades noticiadas, o processo deverá ser encaminhado pela própria Subsecretaria de Gestão de Prestação e Tomada de Contas da Secretaria-Executiva/MinC aos órgãos competentes.

Resta, portanto, evidenciada a necessidade de instrumentalizar a apuração dos fatos noticiados, prováveis geradores de danos ao erário, com a eventual recomposição do suposto prejuízo, o que, conforme já deduzido na presente manifestação, poderá ser efetivado a partir da devida análise da Prestação de Contas. 

À luz das razões trazidas acima, esta Coordenação sugere a restituição dos autos ao Gabinete da Sra. Ministra de Estado da Cultura, recomendando a juntada do presente à avaliação da Prestação de Contas do Instituto Inteligência Para Cidades Inteligentes, na Secretaria competente desta Pasta.

À consideração superior

 

Brasília 2 de agosto de 2024

 

 

MARIA IZABEL DE CASTRO GAROTTI

Advogada da União

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400017456202444 e da chave de acesso c1c73178

 




Documento assinado eletronicamente por MARIA IZABEL DE CASTRO GAROTTI, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br), de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 1573858764 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): MARIA IZABEL DE CASTRO GAROTTI, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br). Data e Hora: 02-08-2024 03:25. Número de Série: 65437255745187764576406211080. Emissor: Autoridade Certificadora do SERPRO SSLv1.