ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE POLÍTICAS CULTURAIS


 

PARECER n. 00284/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.019943/2024-41

INTERESSADOS: MINISTÉRIO DA CULTURA COORDENAÇÃO-GERAL DE PROMOÇÃO DAS CULTURAS POPULARES CGPCP/DPCP/SCDC/GM/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

Senhora Coordenadora-Geral Substituta

 

EMENTA: CONSULTA ADMINISTRATIVA. 
I - Análise de questionamento técnico apresentado com o propósito de esclarecimentos quanto à possibilidade de incluir o termo "Tradicionais e" no nome da Diretoria de Promoção das Culturas Populares, da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural/SCDC/GM do Ministério da Cultura, por meio de ato normativo inferior a Decreto, ou da alteração de modo informal.
II - Legislação de referência: Decreto nº 11.336, de 1º de janeiro de 2023; Decreto nº 6.040, de 07 de fevereiro de 2007; Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011.
III - Parecer pela inviabilidade da proposta pretendida sem a alteração formal do Decreto nº 11.336, de 2023, que aprova a estrutura regimental deste Ministério, em respeito à hierarquia das normas jurídicas e ao controle da legalidade dos atos administrativos, que decorre do princípio da legalidade.
IV - À consideração superior.​

 

Trata-se de processo administrativo instaurado a partir da Nota Técnica nº 7/2024/CGPCP/DPCP/SCDC/GM/MinC, questionando sobre a possibilidade de inclusão do termo "Tradicionais e" na denominação da Diretoria de Promoção das Culturas Populares, da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura, ou a divulgação oficial da nomenclatura sugerida sem a necessidade de alteração formal do Decreto nº 11.336, de 1º de janeiro de 2023, que aprova a estrutura regimental deste Ministério.​

A justificativa apresentada pela Coordenação-Geral de Promoção das Culturas Populares/SCDC/GM/MinC, informou que:

"(...)
Nesse sentido, temos que as culturas tradicionais, ainda que sejam conceitualmente abrigadas pelas políticas públicas de promoção das culturas populares, apresentam especificidades e complexidades tais que por si só justificam um “olhar” do poder público mais detido sobre tal realidade. O que já se revela na atividade cotidiana da Diretoria de Promoção das Culturas Populares.
"(...)
Assim, tanto do ponto de vista conceitual quanto da prática empreendida pela sociedade civil desde pelo menos os anos 2000 e pactuada junto ao Ministério da Cultura em todas as Conferência Nacionais de Cultura, desde 2005, entendemos fundamental a inclusão do temo “tradicionais” as culturas populares, conforme buscamos contextualizar e justificar acima.
É sabido que a Estrutura Regimental do Ministério da Cultura está definida no Decreto nº 11.336, de 1º de janeiro de 2023, e que a sua alteração, ainda que com a finalidade de apenas incluir o termo “Tradicionais e” no nome da Diretoria de Promoção das Culturas Populares, demandaria a edição de um novo Decreto nesse sentido, esforço institucional tal que eventualmente não estaria ao alcance deste Ministério da Cultura para o momento, o que sugere a possibilidade de se alcançar tal fim por outros meios, desde que igualmente legais. Ng.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, consulta-se a possibilidade de:
a) Inclusão do termo “Tradicionais e” no nome da Diretoria de Promoção das Culturas Populares da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura por meio da edição de ato normativo de natureza inferior (Portaria/Instrução Normativa, etc) ou mesmo por ato ordinatório; e passando a chamar-se Diretoria de Promoção das Culturas Tradicionais e Populares; e
b) Independentemente da resposta à cultura do item “a)”, a divulgação do termo “Tradicionais e” incluído ao nome da Diretoria de Promoção das Culturas Populares nas publicações oficiais do Ministério da Cultura, passando a chamar-se Diretoria de Promoção das Culturas Tradicionais e Populares.

É o breve relatório.

A presente análise se dá com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária, nos termos do Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU nº 7:

"A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento" (Manual de Boas Práticas Consultivas. 4.ed. Brasília: AGU, 2016, página 32).

Impõe-se destacar também que foge à alçada desta Consultoria Jurídica imiscuir-se na análise técnica realizada pela unidade competente, órgão detentor de expertise para tal exame. Todavia, cabe à esta Consultoria realizar o exame sob o ponto de vista da legalidade do procedimento.

Assim, registro que a presente manifestação apresenta natureza meramente opinativa e, por tal motivo, as orientações aqui estabelecidas não se tornam vinculantes para o gestor público, que poderá, sempre de forma justificada, adotar entendimento diverso daquele exarado por este órgão consultivo da AGU.

Consoante visto, trata-se de requerimento de manifestação jurídica sob a ótica de um filtro legal e convencional, acerca da pertinência da inclusão do termo "Tradicionais e" na denominação da Diretoria de Promoção das Culturas Populares, da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural deste Ministério da Cultura, para que possa vigorar com nova nomenclatura - Diretoria de Promoção das Culturas Tradicionais e Populares, a ser divulgada oficialmente, sem a alteração formal do Regimento Interno - Decreto nº 11.336, de 1º de janeiro de 2023.

​Ao que se deflui dos autos, o entendimento registrado pela unidade técnica indica que o uso da expressão "culturas populares" no referido Decreto nº 11.336, de 2023, por si só, não é suficiente às atividades pertinentes à "cultura tradicional", em razão de se tratar de denominação genérica não satisfatória, ou não condizente com a realidade dos fatos, verbis

"(...)
De acordo com o art. 21 do Decreto 11.336/2023, compete à Diretoria de Promoção das Culturas Populares, dentre outras atribuições, “formular, apoiar, monitorar e avaliar os programas, os projetos e as ações de proteção e promoção das culturas populares, de sua produção cultural e dos mestres e mestras que as mantém vivas nos territórios onde são praticadas”.
Ocorre que rotineiramente esta Diretoria de Promoção das Culturas Populares atende demandas de fazedores de cultura originários de comunidades tradicionais, e, portanto, auto identificados como promotores de culturas tradicionais. Fato que serve inclusive como indicador da efetividade da política pública de promoção da cidadania e da diversidade cultural promovida por este Ministério da Cultura.
(...)
Nesse sentido, temos que as culturas tradicionais, ainda que sejam conceitualmente abrigadas pelas políticas públicas de promoção das culturas populares, apresentam especificidades e complexidades tais que por si só justificam um “olhar” do poder público mais detido sobre tal realidade. O que já se revela na atividade cotidiana da Diretoria de Promoção das Culturas Populares. Ng.
(...)".

Convém notar a importância do Regimento Interno de um órgão estatal, que deve expressar com clareza e transparência os deveres e a responsabilidade de cada setor, função ou cargo dentro do órgão, por ser instrumento de informação aos interesses públicos, nos termos da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, Lei de Acesso à Informação - LAI, que regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII, do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal/88.

Nesse sentido, o objetivo desta manifestação é abordar unicamente o cenário jurídico previsto no Regimento Interno deste Ministério (Decreto nº 11.336/2023), no que tange às atividades da citada Diretoria com a denominação atual, em vista de delimitar a necessidade de alteração, no caso de se constatarem falhas ou omissão no texto do retro transcrito artigo 21 que justifique o exame da proposta, levando-se em conta a reconhecida inviabilidade de alteração informal da nomenclatura pretendida.

Contextualizando, vale observar as diferenças básicas nos conceitos ditados pelos profissionais de história quanto à cultura popular, cultura erudita e cultura de massa: O termo culturas populares é claramente distinto de cultura de massa, uma vez que a cultura popular é composta pelas tradições e pelos costumes de uma região ou indivíduos, enquanto que a cultura de massa é produzida pela indústria cultural, com o objetivo, em regra, de gerar lucro para ser consumida em todas as regiões, se possível, do globo terrestre. E, a cultura erudita, ao seu turno, pode ser definida como aquela adquirida por meio de estudos. O termo "culturas populares", portanto, não se confunde com o termo "cultura de massa", e alberga, consoante visto, o termo "cultura tradicional".

A título de ilustração, resumidamente, segundo o Dicionário Iphan de Patrimônio Cultural, cultura tradicional e popular, em regra, se define como um conjunto de criações que emanam de uma comunidade cultural fundadas na tradição, expressadas por um grupo ou por indivíduos e que reconhecidamente respondem às expectativas da comunidade enquanto expressão de sua identidade cultural e social. 

É fato, assim, que a expressão "Culturas Populares", por se configurar em um conjunto de costumes, tradições e manifestações sociais específicas de uma região ou país, engloba à evidência o termo "Cultura Tradicional", abrangendo elementos como a música, dança, festas populares, lendas, contos, artesanato e outros tipos de expressões culturais típicas de um povo ou lugar.

A partir do regramento das atividades da citada Diretoria de Promoção das Culturas Populares instituído pelo Regimento Interno desta Pasta, vê-se as seguintes normas aprovadas no Decreto nº 11.336, de 1º de janeiro de 2023:

Art. 21.  À Diretoria de Promoção das Culturas Populares compete:
I - formular, apoiar, monitorar e avaliar os programas, os projetos e as ações de proteção e promoção das culturas populares, de sua produção cultural e dos mestres e mestras que as mantém vivas nos territórios onde são praticadas
II - implementar a política de reconhecimento de mestres e mestras das culturas populares, de seus saberes e modos de vida;
III - fomentar a articulação de redes colaborativas para integração, intercâmbio e promoção de mestres e mestras das culturas populares;
IV - propor e acompanhar o desenvolvimento e a integração, nas políticas públicas de educação, a valorização e o reconhecimento dos saberes de mestres e mestras das culturas populares; e
V - formular, apoiar, monitorar e avaliar políticas que criem bancos de dados, instituições museológicas ou bibliotecas e instituições similares que registrem os conhecimentos e práticas de mestres e mestras das culturas populares e a sua produção cultural. Ng.

Constata-se que a referência ao termo "culturas populares", bem como aos "mestres e mestras" (povos e comunidades tradicionais), conforme expressos no Regimento Interno desta Pasta, toma como base os critérios subjetivos do reconhecimento e pertencimento de povos e comunidades a culturas diferenciadas, em conjunto com outros critérios objetivos, tais como: a) formas próprias de organização social; e, b) ocupação e utilização tradicional de territórios e recursos naturais como condição para reprodução cultural, social, religiosa, econômica, com conhecimentos, inovações e práticas transmitidas pela tradição, em conformidade com o que se extrai do Decreto Federal nº 6.040/2007, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), na medida em que apresenta as seguintes definições relevantes:

Art. 3° (...):
I - Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição;
II - Territórios Tradicionais: os espaços necessários a reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado, no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, respectivamente, o que dispõem os arts. 231 da Constituição e 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e demais regulamentações; (..)

​Deve-se atentar, assim, para o fato de que os termos Culturas populares e Culturas Tradicionais se apresentam como sinônimos, ou seja, referem-se à cultura popular como um conjunto de costumes, tradições e manifestações sociais específicas de uma região ou país, também chamada de cultura tradicional, que abrange elementos vários tipos de expressões culturais típicas de um povo ou lugar.

Nesse contexto, sob o viés jurídico, extrai-se que a nomenclatura "culturas populares", por abarcar o termo "cultura tradicional", consoante o Regimento Interno deste Ministério, não apresenta óbices legais, ou cria barreiras aos objetivos e às atribuições da Diretoria de Promoção de Culturas Populares que, independentemente de alterar a denominação, pode exercer livremente as atribuições adequadas às referidas "culturas populares e tradicionais", sem restrições legais.

Importa registrar, ainda, ser fundamental a observância ao princípio da legalidade, que regulamenta as relações entre a sociedade e o estado impondo ao administrador público o respeito às leis e às práticas regulares da Administração, sob pena de invalidação de seus atos, o que comprova, no caso, a inviabilidade legal da alteração pretendida informalmente. 

Considerando, portanto, os termos legais vigentes, bem como que os comandos específicos insertos no artigo 21, do Decreto nº 11.336, de 2023, parecem estar conjugados ao conteúdo exposto na referida Nota Técnica 7/2024/CGPCP/DPCP/SCDC/GM/MinC, esta Coordenação opina contrariamente ao questionamento técnico quanto à possibilidade de:

"a) Inclusão do termo “Tradicionais e” no nome da Diretoria de Promoção das Culturas Populares da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura por meio da edição de ato normativo de natureza inferior (Portaria/Instrução Normativa, etc) ou mesmo por ato ordinatório; e passando a chamar-se Diretoria de Promoção das Culturas Tradicionais e Populares".

Entende esta Coordenação, em respeito à hierarquia das normas jurídicas, assim como ao controle dos atos administrativos que decorre do princípio da legalidade, pela impossibilidade da modificação dos termos regimentais via edição de ato normativo de natureza inferior a Decreto, bem como, pela inviabilidade da divulgação de atos oficiais praticados em regime informal com utilização da nomenclatura da Diretoria diferentemente da previsão regimental.

"b) Independentemente da resposta à cultura do item “a)”, a divulgação do termo “Tradicionais e” incluído ao nome da Diretoria de Promoção das Culturas Populares nas publicações oficiais do Ministério da Cultura, passando a chamar-se Diretoria de Promoção das Culturas Tradicionais e Populares". 

 Consoante visto, esta Consultoria não vislumbra a legalidade de tal proposta e recomenda que a divulgação oficial utilize expressamente os termos contidos na previsão regimental, nos termos desta manifestação.

Observe-se, porém, a ressalva de que, havendo a convicção técnica fundamentada no convencimento motivado da necessidade da inclusão no termo "culturas tradicionais" no Regimento Interno desta Pasta para o melhor desempenho das atribuições da Diretoria de Promoção de Culturas Populares, esta Consultoria entende que a unidade técnica deva buscar a alteração formal do Decreto nº 11.336, de 2023, com vistas a adequar a compatibilidade das atividades aos termos regimentais consolidados.

Cabe aos agentes públicos atuarem no sentido de satisfazer aos interesses da coletividade de forma concreta e efetiva. A conveniência e a oportunidade são elementos usados na técnica da discricionariedade para direcionar o mérito de um ato administrativo, desde que respeitados os limites previstos na legislação de regência.

CONCLUSÃO

Ante todo o exposto, entende esta Coordenação pela inviabilidade da alteração e divulgação informais da nomenclatura da Diretoria de Promoção das Culturas Populares/SCDC/GM MinC pela edição de ato normativo inferior a Decreto, em face da hierarquia das normas jurídicas, assim como do controle dos atos administrativos que decorre do princípio da legalidade, repisando que a alteração do Decreto de Regimento Interno do Ministério implica, necessariamente, na edição de novo Decreto a respeito.

Ressalva-se, porém, que, havendo a convicção técnica fundamentada no convencimento motivado da necessidade da inclusão no termo "culturas tradicionais" no Regimento Interno desta Pasta para o melhor desempenho das atribuições da Diretoria de Promoção de Culturas  Populares, esta Consultoria entende que a unidade técnica deva buscar a alteração formal do Decreto nº 11.336, de 2023, com vistas à adequar a compatibilidade das atividades aos termos regimentais consolidados, em nome da conveniência e oportunidade que é afeta aos atos administrativos.

 

À consideração superior

 

Brasília, 01 de setembro de 2024

 

 

 

MARIA IZABEL DE CASTRO GAROTTI

Advogada da União

 


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