ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE POLÍTICAS CULTURAIS
PARECER n. 00314/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU
NUP: 01400.016792/2024-70
INTERESSADOS: DIVISÃO DE PROTOCOLO/DIPRO/MINC.
ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS/PAD
Senhora Coordenadora-Geral Substituta
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - PAD.
I - Análise de Pedido de Reconsideração de decisão ministerial que aplicou penalidade de demissão ao Requerente.
II - Prática de infração funcional prevista na Lei nº 8.112/90, conforme processos administrativos nº 01415.000077/2024-56 e nº 01415.000239/2024-56, do Instituto Brasileiro de Museus - IBRAM.
III - Observância dos princípios da ampla defesa e do contraditório.
IV - Parecer desfavorável ao acatamento do Pedido de Reconsideração diante da ausência de argumentos hábeis a confrontar os já debatidos nos autos.
V - À consideração superior.
Retornam os autos a esta Consultoria Jurídica, em razão do Ofício nº 3675/2024/GM/MinC, de 14/08/2024, por meio do qual a Chefia de Gabinete/GM/MinC encaminha o processo administrativo nº 01400.020651/2024-51, que trata do Pedido de Reconsideração apresentado pelo Requerente, em face de Decisão Ministerial publicada em Diário Oficial da União, em 30 de julho de 2024, nos termos da Portaria de Pessoal MinC nº 417 de 29 de julho de 2024, por meio da qual fora aplicada a penalidade disciplinar de demissão ao servidor Thiago Mendes, do cargo efetivo de Assistente Técnico I, do Quadro de Pessoal deste Ministério, com base no inciso IX do art. 117, e no inciso IV do art. 132 da Lei nº 8.112/1990, combinados com o inciso IX do art. 10, da Lei nº 8.429, de 1992.
A título de esclarecimento, cuida-se de Processo Administrativo Disciplinar - PAD instaurado pela Presidência do Instituto Brasileiro de Museus - IBRAM, através da Portaria nº 2695, de 30 de janeiro de 2024, publicada no Boletim Interno (IBRAM) de 30 de janeiro de 2024, em face do referido servidor Thiago Mendes, uma vez que, segundo se extrai dos autos, se valeu das atribuições decorrentes do cargo para inserir informações financeiras no Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos - SIAPE, com vistas a obter benefício pessoal na atribuição irregular a ele próprio de vantagens referentes ao auxílio transporte, em valor acima do correspondente adequado para o trecho de ida e volta ao trabalho, sem fazer jus ao citado benefício em razão de ter aderido ao Programa de Gestão e Desempenho/PGD na modalidade remota integral.
Após os procedimentos legais regulares, no que tange ao Relatório Final, as questões fáticas e jurídicas foram apreciadas à evidência, com avaliação das circunstâncias atenuantes e os antecedentes funcionais do servidor, abrangendo descrição minuciosa dos principais acontecimentos pertinentes ao apuratório disciplinar concluindo em conformidade com as provas dos autos, sendo de se repisar o seguinte enquadramento legal em relação às condutas praticadas: inciso IX do art. 117 e no inciso IV do art. 132 da Lei nº 8112, de 1990, combinado com o inciso IX do art. 10 da Lei nº 8.429, de 1992.
Isso porque, consoante visto, restou configurado o valimento do cargo para lograr proveito próprio, em detrimento da dignidade da função pública, utilizando-se de procedimentos ilegais e sem embasamento administrativo ou jurídico para conceder a si próprio benefício indevido.
Após a publicação oficial, em 30 de julho de 2024, da Decisão Ministerial que aplicou a penalidade de demissão, o Requerente apresentou o citado Pedido de Reconsideração em 13 de agosto de 2024.
É o relatório. Passamos à análise.
Inicialmente, cumpre observar que a análise deste órgão de assessoramento jurídico se insere no âmbito da competência que lhe é atribuída pelos incisos I e V do art. 11 da Lei Complementar 73/93 (Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União), que estabelecem a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados.
Ressalte-se ademais que, nos termos do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da AGU, essa Conjur não deve se manifestar quanto aos aspectos relativos à conveniência e à oportunidade dos atos administrativos (reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente), tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira.
Impende destacar, ainda, que o presente opinativo está pautado nas orientações contidas na Portaria Conjunta n.º 1/2011, emanada da Consultoria Geral da União, da Procuradoria Geral Federal e da Corregedoria Geral da AGU, a qual dispõe sobre os elementos mínimos a serem observados nas manifestações jurídicas proferidas em apoio ao julgamento de procedimentos disciplinares.
In casu, em razão da penalidade de demissão que lhe fora aplicada, insurgiu-se o Requerente com o Pedido de Reconsideração em exame, dirigido à Exma. Sra. Ministra de Estado da Cultura (autoridade que emitiu a decisão final que pretende reformar), aduzindo vasta argumentação em grande parte repetitiva das alegações apresentadas quando da resposta ao Termo de Indiciamento na peça de Defesa Escrita.
A Lei nº 8.112/1990, em seus artigos 104 a 115, previu o chamado "direito de petição", que, como gênero, sintetiza o direito que tem o administrado de se reportar e requerer diretamente à administração (em defesa de seu direito particular, ou de interesse geral), como reflexo das garantias estabelecidas no artigo 5º, XXXIII e XXXIV da CF, verbis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
...
XXXIII — todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
XXXIV — são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: (...)"
O Pedido de Reconsideração, nesse contexto, encontra fundamento legal nas previsões genéricas contidas nos arts. 104, 105, 106 e 108, e específicas nos artigos 174 e 176 da Lei nº 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, bem como na previsão suplementar do art. 56, §1º c/c art. 69 da Lei nº 9.784/1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Nesse sentido, vejamos:
Lei nº 8.112, de 1990:
...
Art. 104. É assegurado ao servidor o direito de requerer aos Poderes Públicos, em defesa de direito ou interesse legítimo.
Art. 105. O requerimento será dirigido à autoridade competente para decidi-lo e encaminhado por intermédio daquela a que estiver imediatamente subordinado o requerente.
Art. 106. Cabe pedido de reconsideração à autoridade que houver expedido o ato ou proferido a primeira decisão, não podendo ser renovado.
(...)
Art. 108. O prazo para interposição de pedido de reconsideração ou de recurso é de 30 (trinta) dias, a contar da publicação ou da ciência, pelo interessado, da decisão recorrida.
(...)
Art. 174. O processo disciplinar poderá ser revisto, a qualquer tempo, a pedido ou de ofício, quando se aduzirem fatos novos ou circunstâncias suscetíveis de justificar a inocência do punido ou a inadequação da penalidade aplicada. Ng.
(...)
Art. 176. A simples alegação de injustiça da penalidade não constitui fundamento para a revisão, que requer elementos novos, ainda não apreciados no processo originário. Ng.
Lei nº 9.784, de 1999:
(...)
Art. 56. Das decisões administrativas cabe recurso, em face de razões de legalidade e de mérito.
§ 1o O recurso será dirigido à autoridade que proferiu a decisão, a qual, se não a reconsiderar no prazo de cinco dias, o encaminhará à autoridade superior.
(...)
Art. 69. Os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei.
É certo, assim, que, embora a Lei nº 8.112/1990 não traga regramento específico sobre "Reconsideração" no capítulo referente ao Processo Administrativo Disciplinar, mas apenas disponha sobre "Revisão" (art. 174), o Pedido de Reconsideração deve ser avaliado, porquanto, além de prestigiar as disposições dos arts. 104 a 108 da citada Lei, o cabimento se dá em nome do contraditório e da ampla defesa.
Além do mais, é de se registrar a tempestividade do Pedido de Reconsideração apresentado em 13 de agosto de 2024, de Decisão Ministerial publicada em 30 de julho de 2024.
Consoante se pode constatar, o Pedido de Reconsideração permite ao Interessado requerer ao julgador a revisão de uma decisão tomada no âmbito de um PAD, quando identifica possíveis erros ou omissões que, no seu entender, podem ser retificados ou invalidados pela própria autoridade que proferiu a decisão. Tal opção, no entanto, deve levar em conta a necessidade de ser apresentado algum fato novo que não tenha sido objeto da decisão impugnada, ou possível divergência quanto à percepção de um fato já apresentado, exigindo-se, de qualquer modo, que haja a apresentação de argumento novo.
Destaque-se, assim, da legislação de regência que na eventual apresentação de recurso hierárquico não haveria a exigência de nova argumentação ou de novos fatos. No entanto, no Pedido de Reconsideração (Revisão) releva-se a importância de serem levantados novo(s) argumento(s) na defesa do servidor, seja para que se possam corrigir eventual omissão feita na defesa pós-indiciamento, ou para combater entendimento(s) apresentado(s) no curso ou no julgamento do PAD.
Nessa linha de análise, no caso concreto, cumpre verificar se houve a pertinência das razões aduzidas no Pedido de Reconsideração para decifrar se a defesa atual contém fundamentos que possam infirmar diretamente a decisão impugnada. No ponto, ainda que tenha havido a reprodução da defesa anterior ou simplesmente a remissão aos argumentos daquela peça, importa confirmar se há razões na reconsideração hábeis a enfrentar suficientemente os fundamentos da Decisão, pois incumbe ao requerente contraditar especificamente todos os fundamentos da decisão que pretende invalidar, demonstrando o desacerto de modo a justificar o processamento do Pedido Revisional, sob pena de ser indeferido.
Da simples leitura das razões aduzidas pelo Requerente, no entanto, verifica-se que não foram arguidos fatos novos ou qualquer outra circunstância suscetível de justificar a inocência do punido ou a inadequação da pena aplicada, que pudessem ensejar a alteração de decisão ministerial in question ou a instauração de processo revisional.
Em linhas gerais, do cotejo entre a Defesa Escrita e o Pedido de Reconsideração verifica-se a ausência de impugnação específica aos fundamentos da decisão que levou à demissão do servidor, considerando a repetição dos argumentos utilizados na defesa escrita, devidamente avaliada no Relatório Final.
Destaca-se do Pedido de Reconsideração, o item II.4 - Direito ao Contraditório e Ampla Defesa - onde há a alegação do requerente de cerceamento de defesa, em razão de não ter sido intimado a se manifestar em relação aos documentos anexados ao processo após seu depoimento, vejamos:
"Ressalta-se, ainda, que durante o processo administrativo, o requerente não teve plena oportunidade de apresentar sua defesa técnica adequada, uma vez que não foi intimado para apresentar defesa em relação aos documentos anexados ao processo após seu depoimento".
Esquadrinhando-se os autos pode-se verificar a improcedência da dita alegação, levando-se em conta não só a manifestação desta Consultoria Jurídica, por meio do Parecer nº 00196/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU, como também a análise efetivada no Parecer 00042/2024/PF/SEDE/PFIBRAM/PGF/AGU, da Procuradoria Federal junto ao Instituto Brasileiro de Museus - IBRAM, que abordou a integridade do procedimento destacando como um dos aspectos mais importantes para o PAD a observância pela Comissão Processante do direito ao contraditório e à ampla defesa, nos seguintes termos:
"Da observância do Contraditório e Ampla Defesa.
Um dos aspectos mais importantes para o processo administrativo disciplinar é a observância pela Comissão Disciplinar designada do direito ao contraditório e a ampla defesa do acusado.
No presente processo, verifica-se que no doc. sei nº 2374921 consta a "Notificação Prévia" do servidor investigado, demonstrando que a Comissão Processante cumpriu os ditames do art. 3º, II, da Lei nº 9.784, de 1999, que determina que o interessado em processo administrativo deve ser cientificado da tramitação do processo em seu desfavor.
Da oitiva de testemunhas.
A Comissão Processante garantiu o direito do servidor de acompanhar a oitiva da testemunha arrolada, por meio de sua advogada constituída nos autos (doc. sei nº 2392127). A Comissão Processante dispensou o depoimento da testemunha impugnada pelo servidor restando garantido o direito do servidor.
Do interrogatório do servidor.
O interrogatório do acusado deve acontecer após a conclusão da oitiva das testemunhas. No caso em tela, temos que o interrogatório se deu depois da oitiva da testemunha arrolada (sei nº 2432045).
Pontua-se que, a testemunha que iria ser ouvida após o interrogatório foi dispensada pela Comissão Processante, não restando prejuízo à defesa.
Permanece, sob este tema, assegurado o exercício ao direito à ampla defesa e ao contraditório.
Da defesa
O exercício do direito da defesa e do contraditório é bastante amplo no Processo Administrativo Disciplinar e aparece em diversos dispositivos legais visando propiciar ao interessado (servidor) o acompanhamento dos autos e garantindo-lhe o contraditório.
Na fase procedimental, o art. 161 da Lei nº 8112, de 1990, estabelece que:
Art.161. Tipificada a infração disciplinar, será formulada a indiciação do servidor, com a especificação dos fatos a ele imputados e das respectivas provas.
§1º O indiciado será citado por mandado expedido pelo presidente da comissão para apresentar defesa escrita, no prazo de 10 (dez) dias, assegurando-se-lhe vista do processo na repartição.
É preciso destacar que a defesa enfrentou, no mérito, todas as acusações realizadas em desfavor do servidor de forma ampla sendo-lhe assegurado a produção de provas ou a impugnação destas. Ng.
Não se caracterizou, portanto, o alegado cerceamento de defesa, diante do fato da inexistência de outros documentos anexados ao processo após o depoimento do Requerente sem que este pudesse acessá-los previamente à apresentação da Defesa Escrita.
Ademais, prosseguindo na linha das argumentações do Requerente, que serão transcritas com vistas à demonstração da ausência de fatos novos ou fundamentos hábeis a infirmar a decisão impugnada, a saber:
4. Direito ao Contraditório e à Ampla Defesa
(...)
Além do mais, correlaciona aos autos do presente PAD que a testemunha Sra. Valéria Cristina de Laia ouvida participou de diversas formas no processo, em outras fases aquém do seu depoimento, como exemplo, na disposição de informações do sistema sobre o servidor. Verifica-se ainda que seria a própria uma das denunciantes do PAD por meio de "denúncia anônima", uma vez que ela encaminhou um e-mail contendo o relatório que serviu de base para a apuração das supostas infrações em análise, na sexta-feira, 5 de janeiro de 2024 às 10;23 para a Sra. Maria Inês de Melo Espíndola Dias, Coordenadora da CGP, às fls. 17 do presente processo, bem como encaminhou documentação contendo informações complementares sobre o servidor no dia 18/01/2024, conforme se extrai das fls. 55/56 do presente processo.
Mesmo sabendo que a Sra. Valéria Cristina de Laia participou efetivamente da instauração do processo administrativo, a Comissão de PAD a intimou a prestar depoimento como testemunha, conforme fls. 74 e 76.
A pessoa que instaurou o processo não só teve um papel ativo na abertura do PAD, como também forneceu informações à Comissão, que serviram como base para as acusações contra o servidor. Diante desse contexto, a defesa questiona a imparcialidade dessa testemunha, uma vez que ela está diretamente envolvida na origem das acusações e, portanto, tem interesse direto no desfecho do processo.
O depoimento da referida testemunha foi colhido no dia 07 de março de 2024, às fls. 149-150. Ocasião em que questionada se teria tido algum tipo de acesso aos autos respondeu que não. Diante às provas citadas acima, observa-se que a testemunha mentiu sobre a sua participação no processo. Ressaltando que ela não só teve acesso aos autos, como fora parte indispensável para a consolidação deste.
De acordo com o artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". Esse princípio implica que o servidor acusado tem o direito de defender amplamente, o que inclui o direito de contestar a imparcialidade das provas e testemunhas apresentadas no processo.
Ao permitir que uma pessoa com interesse direto na instauração do processo atue como testemunha, o direito do servidor à ampla defesa e ao contraditório foi comprometido. A defesa não teve a oportunidade de questionar devidamente a parcialidade dessa testemunha, o que caracteriza cerceamento de defesa.
Embora a Lei nº 8.112/90, em seu artigo 143, trate especificamente da suspeição e impedimento de autoridades e servidores que atuam na condução do processo, o princípio da imparcialidade se também às testemunhas. Ressaltando que as testemunhas que tenham interesse direto no resultado do processo ou que estejam diretamente envolvidas na origem das acusações contra o servidor não podem ser consideradas imparciais.
Sendo assim, a pessoa que instaurou o processo e forneceu as informações iniciais à Comissão Processante deve ser considerada suspeita para atuar como testemunha, uma vez que sua participação ativa no início do processo administrativo indica interesse no resultado da ação disciplinar. Isso compromete a objetividade de seu depoimento e viola o direito do servidor a uma defesa justa e parcial.
(...)
Diante da evidente suspeição da testemunha, a defesa requer a nulidade do processo desde a fase em que essa testemunha foi ouvida. A anulação se justifica pela violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa, pilares essenciais de qualquer processo administrativo disciplinar. Ng.
Observa-se, ainda a inércia dos órgãos em disponibilizar o devido acesso aos processos quando da emissão da decisão pelo Gabinete da Ministra da Cultura, o que prejudicou significativamente a elaboração da presente defesa. Haja vista que a decisão foi republicada em 30 de julho de 2024 e esta patrona que vos subscreve só conseguiu total aos autos no dia 12/08/2024, após diversas tentativas de obtê-lo via e-mail, telefone e até presencialmente, tendo em vista que foi preciso comparecer aos dois órgãos presencialmente para, enfim, conseguir retorno sobre o acesso aos autos de forma parcial no dia 07/08/2024 (seis dias após a publicação da decisão no diário oficial).
O direito à ampla defesa, previsto no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, garante ao acusado o acesso pleno e tempestivo a todas as peças e documentos do processo. Esse acesso é essencial para que a defesa possa ser elaborada de forma completa e eficaz. A negativa ou a demora injustificada no fornecimento dos autos caracteriza cerceamento de defesa conforme reiteradamente reconhecido pela jurisprudência.
(...)"
De fato, para o Requerente, os fatos novos que poderiam ensejar a alteração da decisão impugnada cingiram-se às alegações de que:
a) "durante o processo administrativo, o requerente não teve plena oportunidade de apresentar sua defesa técnica adequada, uma vez que não foi intimado para apresentar defesa em relação aos documentos anexados ao processo após o seu depoimento"; e,
b) "a testemunha Sra. Valéria Cristina de Laia ouvida participou de diversas formas no processo, em outras fases aquém do seu depoimento, como exemplo, na disposição de informações do sistema sobre o servidor, razão pela qual não poderia ser testemunha."
c) "Houve inércia dos órgãos em disponibilizar o devido acesso ao processo quando da emissão da decisão pelo Gabinete da Ministra".
Conforme pode ser observado, nos termos do item "a", infere-se que a Defesa Escrita no curso do PAD foi a última oportunidade do acusado se expressar nos autos, estando alinhada aos pilares fundamentais da ampla defesa e do contraditório. Isso porque, a rigor, até a constituição deste ato formal (defesa escrita), é de lei que a comissão processante assegure ao acusado o conhecimento de tudo o que foi produzido e analisado no processo com vistas à garantia do pleno exercício de sua defesa.
Sob tal aspecto, a entrega da defesa escrita impossibilita a alteração da situação fática e probatória trazida aos autos até então, de modo que a soma de todas as informações carreadas serve como base para o Relatório Final, deixando a possibilidade de nova análise de alegações e de provas posteriormente a este ato para uma instância administrativa superior, com competência reformadora ou revisional.
Vejamos o que preceitua o artigo 165 da Lei no 8.112/90:
Art. 165. Apreciada a defesa, a comissão elaborará relatório minucioso, onde resumirá as peças principais dos autos e mencionará as provas em que se baseou para formar a sua convicção.
§ 1º O relatório será́ sempre conclusivo quanto à inocência ou à responsabilidade do servidor.
§ 2º Reconhecida a responsabilidade do servidor, a comissão indicará o dispositivo legal ou regulamentar transgredido, bem como as circunstâncias agravantes ou atenuantes.
Claro está, portanto, que depois de concluída a defesa e até o julgamento final, tanto o indiciado quanto a comissão não podem mais trazer aos autos novos elementos de comprovação. Havendo a comissão relatado o processo e feito o seu encaminhamento à autoridade julgadora, as provas ou as razões que porventura surgirem não poderão ser integradas aos autos, exceto em grau de recurso após o julgamento final do PAD. Repise-se que o Requerente teve, comprovadamente, acesso integral aos autos até a data da apresentação da defesa escrita.
Não há, portanto, que se falar em ofensa aos princípios da ampla defesa e do contraditório pela ausência de manifestação do Requerente após ser ouvido, ou após a apresentação da defesa escrita, uma vez que, de acordo com a Lei nº 8.112/90, após a apresentação da defesa somente cabe à Comissão Processante a elaboração do Relatório Final, que será enviado para julgamento.
No que tange ao item "b", sobre a Sra. Valéria Cristina de Laia, que no entender do Requerente não poderia ser ouvida como testemunha, esclareça-se que a simples oitiva de um servidor que participou de diversas formas no processo, não implica, por si só, na quebra da imparcialidade. Para que fosse possível reconhecer o impedimento de testemunha em razão de ter participado de outras formas no PAD, demandaria a efetiva comprovação de que o depoimento prestado, na condição de testemunha, estaria carregado de opinião pessoal ou prejulgamento sobre a conduta do servidor punido, o que não restou evidenciado no Pedido de Reconsideração ou, de um modo geral, no curso do PAD.
As Leis nº 8.112/1990 e 9.784/1999 preveem circunstâncias subjetivas ou objetivas de ordem individual (suspeição e impedimento), que podem impedir o exercício das funções por parte de autoridade administrativa no bojo do procedimento disciplinar. Porém, não se coadunam com as razões arguidas no presente Pedido de Reconsideração quanto à testemunha, conforme entende o interessado.
A título elucidativo, a imparcialidade administrativa, como corolário do princípio constitucional da impessoalidade, além de se configurar em garantia do acusado, envolve o interesse do próprio Estado na busca da independência, neutralidade e isenção de tratamento, sem os quais perderia a própria legitimidade. No PAD, todos os que tomam decisões que causam restrições na esfera jurídica de outrem, ou que participem da formação de juízo de valor acerca da existência ou não de ilícito administrativo, devem agir com imparcialidade. Do contrário, devem ser comprovadas as alegações de parcialidade, o que não ocorreu na peça de Reconsideração.
In casu, sustenta o Recorrente a existência de impedimento e suspeição da Sra Valéria Cristina, ao argumento de que ela já teria juízo de valor formado quando da instauração do PAD, porquanto teria denunciado os ilícitos e participado da persecução disciplinar, além de ter prestado depoimento na condição de testemunha no bojo do procedimento contra o Recorrente. Contudo, do exame das provas pré-constituídas acostadas aos autos não se verificam que a Sra. Valéria agiu investida de interesses pessoais. Ao contrário, a Sra. Valéria o fez nos estritos limites das atribuições funcionais previstas no art. 143, da Lei nº 8.112/90, sob pena de não o fazendo incorrer em ilícito administrativo e penal.
Consoante se vê, o Requerente não logrou comprovar por meio de provas acostadas aos autos que o depoimento da Sra. Valéria teria sido carregado de interesse pessoal ou de juízo de valor, aptos a ensejar a quebra da imparcialidade para originar algum impedimento. Isso porque o Recorrente limitou-se a alegar o cerceamento de defesa com base em suposições, que são insuficientes a comprovar a declaração de parcialidade.
No que tange ao item "c", a suposta inércia em disponibilizar o devido acesso aos processos quando da emissão da decisão no Gabinete da Ministra, o que comprometeu a capacidade da patrona subscritora de realizar uma análise detalhada e estratégica dos documentos, é argumento que também não procede, pois o pedido de acesso aos autos fora formulado pelo interessado via e-mail equivocadamente ao IBRAM após a publicação da decisão (30/07/2024), obtendo a primeira resposta oriunda do IBRAM no dia seguinte (31/07/2024), com a informação da necessidade de se dirigir ao Gabinete da Ministra de Estado da Cultura onde se encontrava o processo, sendo que o Requerente não se reportou ao Gabinete da Ministra e se dirigiu novamente ao IBRAM nos dias 1/08, 05/08 e 06/08, quando os autos puderam ser disponibilizados pelo IBRAM.
Considerando, ainda, que não houve prejuízos ao interessado, pois o prazo final de trinta (30) dias para apresentação do recurso se daria em 29/08/2024, o que proporcionaria ao Requerente quase a totalidade do prazo para contraditar a decisão publicada, prazo que sequer foi necessário diante do fato de que o Pedido de Reconsideração foi apresentado em 13/08/2024.
Além do que, deve-se levar em conta que se tratou de pedido formulado após a publicação em Diário Oficial de Decisão Ministerial em Processo regularmente conduzido, tendo todos os requisitos necessários à sua validade, em procedimento escorreito, íntegro, do qual o interessado teve integral conhecimento e exerceu o contraditório e a ampla defesa, se configurando, portanto, em ato jurídico perfeito consumado de acordo com a lei vigente na data de sua realização.
Inocorrente, portanto, a alegada violação à ampla defesa e ao contraditório, uma vez que os aspectos fáticos da controvérsia ficaram demonstrados nos autos por meio de provas documentais. Nesses termos, esta Coordenação opina pelo indeferimento do Pedido de Reconsideração.
CONCLUSÃO
Ante todo o exposto, estando a decisão final amparada nas normas vigentes (Constituição Federal/1988, Lei nº 8.112/90, Lei nº 8.429/1992), publicada em Diário Oficial da União, em 30 de julho de 2024, nos termos da Portaria de Pessoal MinC nº 417 de 29 de julho de 2024, após regular apuração em Processo Administrativo Disciplinar que assegurou o contraditório e a ampla defesa ao Requerente, não há que se falar em atos administrativos ilegais ou nulidade do processo em face de cerceamento de defesa, diante da ausência de amparo legal aos argumentos apresentados no Pedido de Reconsideração.
À consideração superior
Brasília, 23 de setembro de 2024
MARIA IZABEL DE CASTRO GAROTTI
Advogada da União
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400016792202470 e da chave de acesso 4760a0df