ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE
PARECER n. 00364/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU
NUP: 01400.025622/2024-86
INTERESSADOS: DIRETORIA DE PROMOÇÃO DAS CULTURAS POPULARES - DPCP/MINC
ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS
EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MINUTA DE PORTARIA MINISTERIAL. PROGRAMA BRASIL JUNINO.
I - Minuta de portaria ministerial. Instituição do Programa BRASIL JUNINO.
II - Implementação de ações com o objetivo de incentivar o fomento às festas juninas tradicionais e populares nos municípios, estados e Distrito Federal, por meio de recursos orçamentários, emendas parlamentares, leis de incentivo e ações coordenadas entre os governos federal, estaduais e municipais.
III - Competência da Ministra da Cultura para instituição do Programa por meio de portaria.
IV - Parecer favorável ao texto apresentado, com recomendações.
1. DO RELATÓRIO
Vêm os autos à Consultoria Jurídica para fins de análise e parecer acerca de minuta de portaria ministerial destinada a instituir o Programa Brasil Junino, com vistas a incentivar o fomento às festas juninas tradicionais e populares nos municípios, estados e Distrito Federal.
A proposta consiste na criação de programa com o objetivo de incentivar celebrações juninas em todo país, estimular o turismo, a economia da cultura e comercio local por meio das festas juninas, difundindo e valorizando-as como patrimônio cultural do Brasil.
A minuta encontra-se juntada aos autos no documento SEI 1949484 e vem acompanhada da Nota Técnica 16/2024 (SEI 1949407), que apresenta as seguintes justificativas para o ato:
[...]
2.20. As festas juninas trazem ainda dois outros elementos importantes, que justificam a elaboração de politica pública de cultura. O primeiro é que ao longo da história constitui-se em espaços de lazer, tanto em territórios rurais quanto em urbanos. O antropólogo José Guilherme Magnani (1984) em seu estudo pioneiro sobre cultura popular e lazer na cidade irá indicar que as festas populares serão também formas de lazer e sociabilidades das classes trabalhadoras no contexto urbano.
2.21. O segundo elemento é que as festas juninas geram emprego e renda, além de movimentarem a economia nacional. Em estimativa do Ministério do Turismo, em 2022, as festas juninas gerou mais de R$ 3,4 bilhões em retorno financeiro:
Somente no estado da Bahia, por exemplo, são esperados mais de R$ 1,3 bilhões injetados na economia. Em Caruaru (PE) e Campina Grande (PB) algumas das festas mais tradicionais do país, a estimativa é de R$ 300 milhões e R$ 400 milhões, respectivamente. Outra cidade pernambucana que está movimentando milhões é Petrolina. A expectativa é de R$ 273 milhões sejam injetados no município. Além disso, devem ser criados 10 mil empregos diretos e indiretos. Em Parintins (AM), a tradicional festa dos bois Garantido e Caprichoso espera circular R$ 100 milhões na economia local. E em São Paulo, são esperados R$ 641 milhões e a geração de 15.950 empregos.
2.22. Não somente as manifestações artísticas e as expressões culturais fortalecem a economia da cultura, mas também coletivos e redes produtivas de moda e vestuários, assessórios, alimentos, artesanato, literatura e cordel, entre outros.
2.23. Em dados do Ministério do Turismo, em 2023, apontam que as festividades dos santos Antônio, João e Pedro devem mobilizar mais de 26,2 milhões de pessoas e arrecadar cerca de R$ 6 bilhões pelo país.
2.24. Assim, as chamadas festas juninas que nos últimos anos perduram até o final de julho, em todo território nacional, com diversas expressões e estilos locais e territoriais, conforme destacamos acima valorizam as dimensões simbólica, sociocultural, política e econômica das culturas tradicionais e populares do Brasil.
É o breve relatório. Passo à análise.
2. DA ANÁLISE JURÍDICA
O art. 131 da Constituição Federal dispõe sobre a Advocacia-Geral da União - AGU, responsável pelas atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo. E os incisos I e V do art. 11 da Lei Complementar n.º 73, de 1993 (Lei Orgânica da AGU), estabelecem a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados.
Destaco que, nos termos do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da AGU, essa Conjur não deve se manifestar quanto aos aspectos relativos à conveniência e à oportunidade dos atos administrativos (reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente), tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira.
3. DOS REQUISITOS DO ATO ADMINISTRATIVO
De início, verificam-se presentes os elementos/requisitos do ato administrativo, que se encontram especificados no art. 2º da Lei nº 4.717, de 1965, que regula a Lei Popular. In verbis:
Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de:
a) incompetência;
b) vício de forma;
c) ilegalidade do objeto;
d) inexistência dos motivos;
e) desvio de finalidade.
Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas:
a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou;
b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato;
c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo;
d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido;
e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.
Assim, são elementos do ato administrativo a competência, forma, objeto, motivo e finalidade, sobre os quais passa-se a dispor.
Da competência
Conforme prevê a transcrita letra "a", do parágrafo único do artigo 2º da Lei nº 4.717,de 1965, a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou. Dessa forma, o sujeito que pratica o ato é competente para tal quando a lei lhe atribui sua prática.
Com relação à competência, a Ministra da Cultura é autoridade competente para o ato, a teor do disposto no art. 21 da Lei nº 14.600, de 2023, e no art. 1º do Decreto nº11.336, de 2023.
Do objeto
A ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo. O objeto é o efeito jurídico que se pretende como ato, seja ele o nascimento, a transformação ou a extinção de um determinado direito.
Esse elemento do ato deve ser lícito, praticado conforme a lei; possível, no que diz respeito à praticidade do comando do ato na esfera fática e do Direito; certo, no que se refere à identificação dos destinatários, efeitos, tempo e lugar; e moral.
No caso concreto, a portaria sob análise tem como objeto específico a criação do Programa Brasil Junino, que consiste na implementação das seguintes estratégias:
I – Realizar um levantamento das festas juninas mais tradicionais e representativas em cada região do país, identificando as necessidades de investimento e apoio;
II – Buscar cooperação federativa para publicar calendário nacional de festas juninas tradicionais e populares (Calendário Brasil Junino);
III – Oferecer formação para gestores públicos de cultura, agentes culturais e comunidades locais sobre a organização e gestão de festas juninas, o impacto social, educativo e econômico, incluindo aspectos de segurança, infraestrutura e sustentabilidade;
IV – Valorizar políticas de incentivo fiscal por meio da Lei nº 8.313, de 23 de dezembro de 1991 (Lei Rouanet) e outras leis municipais e estaduais para empresas que apoiarem as festas juninas tradicionais e populares, estimulando o patrocínio e a parceria entre o setor privado e as iniciativas culturais.
V – Estabelecer uma linha de atuação para assistência, apoio técnico e financeiro para os municípios interessados em fortalecer suas festas juninas tradicionais e populares, com orientações sobre programação cultural, estruturação de espaços e divulgação do turismo cultural.
VI – Realizar estudos, pesquisas e avaliações periódicas do impacto do Programa Brasil Junino, monitorando os resultados alcançados e promovendo ajustes necessários para sua eficácia e sustentabilidade.
Nota-se que não há quaisquer ilegalidades no objeto pretendido pelo ato em análise.
Da Forma
A forma, como elemento do ato administrativo, diz respeito ao meio de exteriorização do ato, verbal, escrito, via decreto, portaria, resolução, etc. A obediência à forma do ato e do procedimento constitui garantia jurídica para o administrado e para a própria Administração, possibilitando, inclusive, o controle do ato administrativo.
Segundo o Manual de Redação da Presidência da República, a portaria é o instrumento pelo qual Ministros ou outras autoridades expedem instruções sobre a organização e o funcionamento de serviço, sobre questões de pessoal e outros atos de sua competência.
Observa-se, assim, a adequação da forma de portaria para o ato normativo, já que será assinado pela mais alta autoridade do Ministério da Cultura, visando a tratar de matéria de sua competência.
Do motivo
O motivo se traduz nos pressupostos de fato e de direito que fundamentam o ato administrativo, sendo que os fatos são as situações, circunstâncias, acontecimentos que levaram à prática do ato; ao passo que o direito consiste na norma em que o ato se baseia e que guarda correspondência com o fato.
Cuida-se de princípio que norteia a administração pública, constante do art. 2º, caput, e parágrafo único, inciso VII, da Lei nº 9.784, de 1999, onde se lê:
Art. 2 o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
(...)
VII - indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;
In casu, verifica-se que a Nota Técnica 16/2024 (SEI 1949407) suficientemente motiva fática e juridicamente as razões pelas quais é necessária a publicação da portaria em exame.
Da finalidade
A finalidade se traduz naquilo que se pretende alcançar, é o resultado da prática do ato, correspondendo à consecução do interesse público, razão pela qual se diz que os atos administrativos possuem finalidade pública. O desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.
Destarte, o desvio de finalidade, ou desvio de poder, se caracteriza quando o ato não é praticado visando ao interesse público, ou objetivando finalidade diversa daquela prevista na lei.
Nos termos da Nota Técnica, a finalidade do ato que institui o Programa Brasil Junino se encontra relacionada com "reconhecer, valorizar, fortalecer e preservar essas importantes manifestações culturais tradicionais e populares, promovendo o turismo cultural e de base comunitária, a economia da cultura em todas as regiões e territórios do Brasil".
Observa-se, portanto, a finalidade pública da portaria.
4. DA ANÁLISE DA MINUTA DA PORTARIA
O referido Programa foi analisado na Nota Técnica 16/2024 (SEI 1949407) e seus aspectos serão a seguir abordados.
Quanto à contextualização e análise, a Nota Técnica abordou aspectos históricos e culturais acerca da importância de tais celebrações:
2.9. As festas juninas que ocorrem em todas as regiões do Brasil, com suas particularidades locais e regionais. As quadrilhas juninas no Nordeste, o batizado do Boi no Maranhão, a Festa de Parintins no Amazonas, as Festas no Vale do Paraíba em São Paulo e as danças de fita no Rio Grande do Sul são apenas alguns exemplos de festividades que acontecem no mês de junho.
2.10. Em todas elas serão indissociáveis, a música, a dança, o canto, a moda e vestuário e a alimentação tradicional. Esses elementos unem as festas juninas, mesmo que em determinado local teremos o vanerão e em outro o forró.
2.11. A Festa Junina como manifestação tradicional e popular no traz as identidades culturais que nos caracterizam como povo brasileiro.
Além desse aspecto, foi também abordado o impacto econômico trazido por tais manifestações culturais:
2.20. As festas juninas trazem ainda dois outros elementos importantes, que justificam a elaboração de politica pública de cultura. O primeiro é que ao longo da história constitui-se em espaços de lazer, tanto em territórios rurais quanto em urbanos. O antropólogo José Guilherme Magnani (1984) em seu estudo pioneiro sobre cultura popular e lazer na cidade irá indicar que as festas populares serão também formas de lazer e sociabilidades das classes trabalhadoras no contexto urbano.
2.21. O segundo elemento é que as festas junians geram emprego e renda, além de movimentarem a econômia nacional. Em estimativa do Ministério do Turismo, em 2022, as festas juninas gerou mais de R$ 3,4 bilhões em retorno financeiro: Somente no estado da Bahia, por exemplo, são esperados mais de R$ 1,3 bilhões injetados na economia. Em Caruaru (PE) e Campina Grande (PB) algumas das festas mais tradicionais do país, a estimativa é de R$ 300 milhões e R$ 400 milhões, respectivamente. Outra cidade pernambucana que está movimentando milhões é Petrolina. A expectativa é de R$ 273milhões sejam injetados no município. Além disso, devem ser criados10 mil empregos diretos e indiretos. Em Parintins (AM), a tradicional festa dos bois Garantido e Caprichoso espera circular R$ 100 milhões na economia local. E em São Paulo, são esperados R$ 641 milhões e a geração de 15.950 empregos.
2.22. Não somente as manifestações artísticas e as expressões culturais fortalecem a economia da cultura, mas também coletivos e redes produtivas de moda e vestuários, assessórios, alimentos, artesanato, literatura e cordel, entre outros.
2.23. Em dados do Ministério do Turismo, em 2023, apontam que as festividades dos santos Antônio, João e Pedro devem mobilizar mais de 26,2 milhões de pessoas e arrecadar cerca de R$ 6 bilhões pelo país.
Passemos à análise da minuta.
O art. 1º da minuta da portaria institui o Programa Brasil Junino, com o objetivo de incentivar o fomento às festas juninas tradicionais e populares calendarizadas nos municípios, estados e Distrito Federal.
Embora o ato mencione os demais entes federativos, é importante ressaltar que não há qualquer tipo de obrigação sendo imposta aos municípios, estados e Distrito Federal, tendo em vista que a portaria é um instrumento " (...) pelo qual Ministros ou outras autoridades expedem instruções sobre a organização e o funcionamento de serviço, sobre questões de pessoal e outros atos de sua competência" (Manual de Redação da Presidência da República)[1], vinculando apenas o Ministério da Cultura.
O caput do art. 2º, em continuidade ao art. 1°, reforça que o Programa irá reconhecer, valorizar, fortalecer e preservar as manifestações juninas, com promoção do turismo cultural e de base comunitária e a economia da cultura. Sem óbices jurídicos.
Apenas faço a seguinte observação: considerando que foi incluída a promoção do turismo cultural como um dos objetivos do Programa e que a pauta está prevista em outros artigos da minuta, sugiro que haja a reflexão da área técnica acerca da pertinência de incluir o Ministério do Turismo como autor e tornar a portaria interministerial.
O parágrafo único explica que o Programa será executado por meio de ações formadoras e de pesquisa, apoio técnico e recursos orçamentários.
Considerando que, nos termos do art. 6°, do Decreto n° 12.002/24, os primeiros dispositivos do texto do ato normativo devem indicar o seu objeto e o seu âmbito de aplicação, sugiro que o disposto no parágrafo único seja transferido para o final do ato normativo, antes do art. 9°, o que corresponderia a "Disposições Finais", caso o texto fosse dividido em capítulos. Ademais, sugiro a seguinte redação, com inclusão da expressão "sem prejuízo de outras hipóteses" para demonstrar que se trata de rol exemplificativo:
Art. xxx A execução do Programa Brasil Junino se dará, sem prejuízo de outros hipóteses, por meio de ações formadoras e de pesquisa, apoio técnico e recursos orçamentários, formalizados em instrumentos jurídicos específicos.
O Art. 3º estabelece os princípios do Programa, o artigo 4º os objetivos específicos da política pública e o artigo 5º dispõe sobre as estratégias de implementação, tratando essencialmente de questões de caráter técnico/político, não se vislumbrando qualquer impedimento jurídico no texto proposto.
A definição do método adequado para efetivação da política pública é matéria de caráter técnico de competência do gestor público. Cumpre alertar, porém, que decisão deve estar devidamente justificada nos autos administrativos com a apresentação dos fundamentos para as escolhas do gestor e a demonstração de que atendem ao interesse público.
A fim de dar clareza, precisão e ordem lógica aos dispositivos, consoante exigido pelo art. 11, do Decreto n° 12.002/24, sugiro apenas a avaliação quanto à possibilidade de alterar/complementar algumas expressões, por exemplo:
Art. 3º São princípios do Programa Brasil Junino:
(...)
III – promover a inclusão e ampliar a participação ativa de comunidades tradicionais, coletivos, grupos culturais, artistas, educadores e demais atores envolvidos na promoção e na vivência nos processos de idealização e desenvolvimento das festas juninas;
(...)
VI – promover nas festas juninas a diversidade das tradições culturais e populares, a sua sustentabilidade, incentivando o respeito ao meio ambiente, a valorização da produção local e o estímulo à economia da cultura nas comunidades;
Art. 4°...................................................................................
(...)
III – estimular o turismo cultural e de base comunitária, a economia da cultura e o comércio local, a partir do calendário de festas juninas tradicionais e populares, gerando formação, emprego e renda;
(...)
V – apoiar os estados, Distrito Federal e municípios na organização e na realização das festas juninas tradicionais e populares, por meio de repasses de recursos federais, via emendas parlamentares, leis de incentivo e parcerias com a sociedade civil e outros apoios locais.
Art. 5°....................................................................................
IV – valorizar políticas de incentivo fiscal, como as da Lei nº 8.313, de 23 de dezembro de 1991 (Lei Rouanet), e de outras leis municipais e estaduais, para estimular empresas a apoiarem festas juninas tradicionais e populares, por meio de patrocínio e de parceria entre o setor privado e as iniciativas culturais.
Ainda, em observância ao art. 11, do Decreto n° 12.002/24, que estabelece que as disposições normativas devem ser redigidas com clareza, precisão e ordem lógica, apresento sugestões que podem auxiliar no aprimoramento do texto da minuta, as quais não precisam ser acatadas pela área técnica, caso entendam que não fazem sentido na situação em tela.
No Art. 3°, V (fomentar, valorizar, reconhecer a educação patrimonial e cultural sobre as festas juninas, promovendo a sensibilização da população e do patrimônio cultural material e imaterial do Brasil), sugiro avaliar o trecho final proposto, uma vez que, além da sensibilização da população, o texto dá a entender que o patrimônio cultural material ou imaterial do Brasil também deve ser sensibilizado, o que deixa, salvo melhor juízo, a redação truncada.
Ainda, sugiro avaliar se os incisos VII e VIII, ambos do art. 3°, não se adequariam melhor ao artigo que trata das estratégias de implementação ao invés de serem incluídos como princípios.
Da mesma forma, no art. 6°, sugiro analisar o texto do inciso VI (realizar estudos, pesquisas e avaliações periódicas do impacto do Programa Brasil Junino, monitorando os resultados alcançados e promovendo ajustes necessários para sua eficácia e sustentabilidade), para que se esclareça a qual impacto do Programa a minuta está se referindo (financeiro, visibilidade, etc) e sugiro incluir a complementação no texto do inciso.
O artigo 7º da minuta estabelece como competência da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural a coordenação da execução do Programa, a definição de critérios, o estabelecimento de diretrizes, a elaboração de editais e outros instrumentos congêneres.
Considerando, como visto, que a competência para instituir o Programa é da Ministra de Estado da Cultura e que a Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural (SCDC) integra a pasta, não vislumbro óbices à delegação de competência à SCDC das atribuições previstas no art. 7° da minuta.
Quanto ao inciso II, do art. 7°, sugiro especificar quais critérios de equidade seriam esses ou deixar o dispositivo mais preciso.
Em seu artigo 8º, a Portaria dispõe acerca da participação de outros órgãos e entidades da administração pública federal, que se dará por duas vias: integração de ações de formação, mobilização, produção, circulação e comunicação à agenda do Programa Brasil Junino; e articulação do Programa Brasil Junino junto aos entes federados do Sistema Nacional de Cultura no Programa Brasil Junino, visando ampliar e qualificar a comunicação e a mobilização social sobre políticas, programas e ações afins.
Ocorre que, não ficou nítido se a expressão "...mediante intersecções em" diz respeito às atuações previstas em cada inciso separadamente ou entre eles, devendo, portanto, ser escolhida a conjunção "e" ou "ou". Assim, sugiro confirmar a ideia inicial pensada pela Secretaria e elaborar o texto de forma mais precisa, a exemplo da sugestão abaixo, caso o propósito seja unir os dois formatos de participação e que eles sejam meramente exemplificativos:
Art. 8º A participação de outros órgãos e entidades da administração pública federal no Programa Brasil Junino poderá se dar, sem prejuízo de outros formatos, mediante:
I - integração de ações de formação, mobilização, produção, circulação e comunicação à agenda do Programa Brasil Junino; e,
II - articulação do Programa Brasil Junino junto aos entes federados do Sistema Nacional de Cultura no Programa Brasil Junino, visando ampliar e qualificar a comunicação e a mobilização social sobre políticas, programas e ações afins.
Quanto ao art. 9°, está-se prevendo que os recursos para implementação das ações do Programa Brasil Junino serão advindos da Lei Orçamentária, do Fundo Nacional da Cultura, de parcerias agregadas ao Programa, emendas parlamentares, leis de incentivo e ações coordenadas entre os governos federal, estaduais, do DF e municipais, ou de outras eventuais fontes de recursos.
Acerca das informações orçamentário-financeiras, dispõe o Decreto n° 12.002/24, no seu art. 58, que trata do parecer de mérito:
Art. 58. O parecer de mérito conterá:
(...)
V - a informação orçamentário-financeira, nos termos do disposto nos § 1º e § 2º;
(...)
§ 1º A informação orçamentário-financeira de que trata o inciso V do caput explicitará se a proposta cria, expande ou aperfeiçoa ação governamental que acarrete aumento de despesas ou implique redução ou renúncia de receitas.
§ 2º Se a proposta criar, expandir ou aperfeiçoar ação governamental que acarrete aumento de despesas ou implique redução ou renúncia de receitas, o parecer de mérito demonstrará o atendimento ao disposto na legislação fiscal, em especial, o atendimento ou a não aplicação do disposto:
I - nos art. 167 e art. 169 da Constituição;
II - no art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
III - na Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000;
IV - na lei de diretrizes orçamentárias; e
V - na lei orçamentária anual.
Portanto, verifico que a Nota Técnica nº 16/2024 não traz as informações, nos termos dos §§1° e 2°, do art. 58, do Decreto, motivo pelo qual recomendo que tais especificações sejam complementadas na referida nota.
Insta salientar que, a Nota Técnica 16/2024 (SEI 1949407) também não analisou se a proposta acarretará aumento de despesa. Neste sentido, a Lei de Responsabilidade Fiscal, no seu art. 16, determina que a criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:
I - estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;
II - declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.
§ 1º Para os fins desta Lei Complementar, considera-se:
I - adequada com a lei orçamentária anual, a despesa objeto de dotação específica e suficiente, ou que esteja abrangida por crédito genérico, de forma que somadas todas as despesas da mesma espécie, realizadas e a realizar, previstas no programa de trabalho, não sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o exercício;
II - compatível com o plano plurianual e a lei de diretrizes orçamentárias, a despesa que se conforme com as diretrizes, objetivos, prioridades e metas previstos nesses instrumentos e não infrinja qualquer de suas disposições.§ 2º A estimativa de que trata o inciso I do caput será acompanhada das premissas e metodologia de cálculo utilizadas.
Ainda, recomendo que o órgão técnico avalie a necessidade de produção da Análise do Impacto Regulatório ou dispensa desta, nos termos do art. 4º c/c art. 2º, inciso II, do referido Decreto no 10.411/2020. Caso a AIR seja dispensada, é necessária a avaliação de resultado regulatório, no prazo máximo de 3 anos, conforme art. 12 do Decreto no 10.411/2020.
O artigo 10º dispõe sobre a entrada em vigor da Portaria na data da publicação, não havendo óbice neste sentido.
5. DA OBSERVÂNCIA AO DECRETO N.º 12.002, DE 2024
Quanto aos aspectos estritamente formais contidos na minuta, insta ponderar que a eles se aplicam o Decreto n. 12.002/2024, que estabelece normas para elaboração, redação, alteração, revisão e consolidação de atos normativos.
A este respeito, destaco que a numeração da presente Portaria deve ser estabelecida em continuidade à série anteriormente iniciada, tendo em vista o disposto no Decreto n. 12.002/2024, no art. 22.
No que diz respeito à epígrafe, determina o art. 4°, §1° e art. 12, XXVI , ambos do Decreto n°12.002/2024:
Art. 4o O ato normativo será estruturado em três partes básicas:
(...)
§ 1o A epígrafe dos atos normativos será constituída pelos seguintes elementos, nesta ordem:
I - título designativo da espécie normativa;
(...)
III - numeração sequencial; e
IV - data de assinatura.
Art. 12. O texto da proposta de ato normativo observará as seguintes regras:
(...)
XXVI - a epígrafe, formada pelo título designativo da espécie normativa e pela data de assinatura,
é grafada em letras maiúsculas, sem negrito, de forma centralizada;
(...) grifos
Logo, sugiro que a epígrafe contida no documento em análise siga tais requisitos, a exemplo de:
PORTARIA MINC N° XX, DE XX DE XXX DE 2024.
Sobre o preâmbulo, o art. 4°, I, 'c', do Decreto n° 12.002/24, exige como requisitos: 1. a autoria; 2. o fundamento de validade, nas medidas provisórias, nos decretos e nos atos normativos inferiores a decreto; e 3. a ordem de execução, nos decretos e nos atos normativos inferiores a decreto.
Sugiro incluir o fundamento de validade da Lei n° 14.600, de 19 de junho de 2023, a qual estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios, além do Decreto n° 11.336/23, por possuir hierarquia superior em relação a este. Ademais, há necessidade de alterar a remissão ao art. 87, pois deve se adequar ao disposto no art. 11, II, 'l', 5, do Decreto n. 12.002/2024: grafar as remissões aos dispositivos de outros artigos da seguinte forma: “art. 1º, caput, inciso I, alínea ‘a’, sugerindo-se a seguinte redação:
A MINISTRA DE ESTADO DA CULTURA, no uso da atribuição prevista no art. 87, parágrafo único, inciso II, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 21, da Lei n° 14.600, de 19 de junho de 2023, e no art. 25, do Decreto n° 11.336, de 1° de janeiro de 2023, resolve:
Quanto aos arts. 3°, 4° e 5°, sugiro a adequação aos art. 12, inciso X, e 11, inciso II, 'g' os quais dispõem:
Art. 12. O texto da proposta de ato normativo observará as seguintes regras:
(...)
X - o texto do inciso inicia-se com letra minúscula, exceto quando se tratar de nome próprio, e termina com:
a) ponto e vírgula;
b) dois-pontos, quando se desdobrar em alíneas; ou
c) ponto, caso seja o último;
(...)
Art. 11. As disposições normativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem lógica, e observarão o seguinte:
(...)
II - para obtenção da precisão:
(...)
g) usar no penúltimo inciso, alínea, item ou subitem:
1. a conjunção “e”, se a sequência de dispositivos for cumulativa ou enumerativa; ou
2. a conjunção “ou”, se a sequência de dispositivos for alternativa;
(grifos)
Ou seja, o texto deve se iniciar com letra minúscula e o penúltimo inciso deve usar a conjunção "e" ou "ou" a depender do caso.
Quanto aos artigos 7º e 8º sugiro a retirada do hífen do caput. Além disso, nos artigos 8º e 9º o ponto utilizado após a numeração deve ser suprimido para atender o padrão do art. 12 inciso I, do Decreto n° 12.002/24.
No que tange aos artigos 3º, 4º, 5º e 7º recomendo que sejam alterados os travessões dos incisos para hífens, eis que o 12 inciso IX, do Decreto n° 12.002/24, dispõe que:
Art. 12. O texto da proposta de ato normativo observará as seguintes regras:
(...)
IX - os incisos são indicados por algarismos romanos seguidos de hífen, separado do algarismo e do texto por um espaço em branco"
Ademais, os artigos devem ser renumerados, uma vez que foi suprimido o artigo 6º.
Quanto a correções de ordem gramatical e de escrita, faço as seguintes sugestões:
Art. 1º Fica instituído o Programa Brasil Junino com o objetivo de incentivar o fomento às festas juninas tradicionais e populares calendarizadas nos municípios, estados e Distrito Federal.
Art. 2º O Programa Brasil Junino irá reconhecer, valorizar, fortalecer e preservar essas importantes manifestações culturais tradicionais e populares, promovendo o turismo cultural e de base comunitária e a economia da cultura, em todas as regiões e territórios do Brasil.
Art. 3°..........................................................................................
I – reconhecer e valorizar a diversidade cultural, as expressões, as celebrações e as manifestações juninas em todo o território nacional, respeitando as particularidades regionais e locais das festas juninas;
II – garantir a preservação, a promoção e a valorização das tradições juninas, incluindo elementos como danças, músicas, literatura e poesias, cultura alimentar, vestimentas e rituais, que compõem a riqueza dessas tradições;
(...)
IV – incentivar a criatividade e a inovação nas celebrações juninas, valorizando a renovação das práticas e a adaptação das tradições às realidades contemporâneas, sem perder de vista a essência cultural;
(...)
IX – fomentar a interseccionalidade entre cultura e os marcadores sociais da diferença, para inclusão e promoção da equidade de raça, gênero, sexualidade, acessibilidade, geracional, entre outros.
Art. 4°........................................................................................
IV – incentivar e movimentar a criação de grupos, coletivos e redes produtivas de vestuários, acessórios, alimentos, artesanato, literatura e cordel, manifestações artísticas easexpressões culturais existentes em todas as regiões brasileiras;
Art. 5°.........................................................................................
III – oferecer formação para gestores públicos de cultura, agentes culturais e comunidades locais sobre a organização e a gestão de festas juninas e os impactos social, educativo e econômico, incluindo aspectos de segurança, infraestrutura e sustentabilidade;
Art. 7º - Compete à Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura, no âmbito do Programa Brasil Junino:
(...)
III – estabelecer as diretrizes e orientações para a articulação do Programa Brasil Junino às demais políticas do Ministério da Cultura e dos entes públicos;
(...)
V – integrar o Programa às políticas nacionais de cultura do Ministério da Cultura e às de responsabilidade de suas entidades vinculadas - Sistema MinC.
Acerca do art. 9°, recomendo a retirada da expressão "e/ou", a qual é vedada, nos termos do art. 11, §4°, do Decreto n° 12.002/24, devendo ser escolhida a conjunção "e" ou "ou", a depender de qual se adequa mais ao caso.
No que diz respeito à exigência de parecer de mérito, conforme determinação do Art. 56, II, do Decreto no 12.002/24, verifica-se a presença da Nota Técnica 16/2024 (SEI 1949407), suprindo essa determinação, embora com outra nomeclatura.
Em relação a isso, ressalta-se a necessidade de que sejam cumpridos os requisitos previstos no art. 58, do Decreto n° 12.002/24.
No que tange especificamente à data de entrada em vigor, o artigo 10º previu que o Decreto entrará em vigor na data da publicação, não se aplicando o art. 17 do Decreto n. 12.002/2024.
6. CONCLUSÃO
Diante do exposto, e sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, opina-se pela inexistência de óbices jurídico-formais na minuta de Instrução Normativa em análise, estando o ato em tela apto a ser assinado pela Ministra de Estado da Cultura, desde que observado o disposto no presente Parecer, principalmente os parágrafos 32,34, 37, 39, 40, 41, 44, 46, 49, 50, 51, 56, 58, 59, 61, 62, 63, 64, 65.
Destaca-se que, conforme Enunciado nº 05, do Manual de Boas Práticas Consultivas da AGU, “ao órgão Consultivo que em caso concreto haja exteriorizado juízo conclusivo de aprovação de minuta de edital ou contrato e tenha sugerido as alterações necessárias, não incumbe pronunciamento subsequente de verificação do cumprimento das recomendações consignadas”. Assim, não é necessário o retorno dos autos a esta Consultoria, salvo se subsistir dúvida de cunho jurídico.
Isto posto, submeto o presente Parecer à consideração superior, sugerindo que os autos sejam encaminhados à Secretaria da Cidadania e Diversidade Cultural, para as providências cabíveis.
À consideração superior.
Brasília, 31 de outubro de 2024.
FERNANDA DE OLIVEIRA SILVA
Estagiária de Pós-Graduação
LORENA DE FÁTIMA SOUSA ARAÚJO NARCIZO
Procuradora da Fazenda Nacional
Consultora Jurídica junto ao Ministério da Cultura
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400025622202486 e da chave de acesso 67596484
Notas