ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE POLÍTICAS CULTURAIS
PARECER n. 00383/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU
NUP: 01400.023108/2024-14
INTERESSADOS: DIVISÃO DE PROTOCOLO/DIPRO/MINC.
ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS
Senhora Coordenadora-Geral Substituta
EMENTA: Direito Administrativo Sancionador. Processo Administrativo Disciplinar (PAD). Servidores Públicos pertencentes ao Quadro de Pessoal do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN.
I - Abandono de Cargo comprovado nos elementos conceituais - "animus abandonandi"- materialidade das faltas. Infração permanente.
II - Análise da legalidade do procedimento.
III - Rito Sumário. Processo Regular. Compulsoriedade de aplicação da penalidade prevista no art. 132, inciso II, c/c art. 138, ambos da Lei n.º 8.112/90.
IV - Parecer pelo prosseguimento do feito.
V - À consideração superior.
Trata-se de Processo Administrativo Disciplinar (PAD), instaurado em face dos Servidores Ariadne Marques Mendonça, matrícula nº 1543152, ocupante do cargo de Técnico I, Classe "B", Padrão V, lotada na Divisão Técnica, da Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN no Estado de Santa Catarina; e Mário Alves do Rosário Pires, matrícula nº 1540685, ocupante do cargo de Técnico I, Classe "B", Padrão VI, lotado na Divisão Técnica, da Superintendência do IPHAN no Estado de Santa Catarina, deflagrado em razão dos fatos descritos no processo administrativo nº 01510.000835/2018-18, Ofício Nº 1179/2023/IPHAN-SC-IPHAN inserto no anexo (IPHAN/SEI nº 5159241), diante do que restou estabelecida, por meio do DESPACHO Nº 100/2023 CORREGEDORIA/GAB PRESI/PRESI, a realização do juízo de admissibilidade.
Os fatos narrados dizem respeito à apuração das implicações disciplinares decorrentes da prática de abandono de cargo desde setembro de 2018, 30 dias após o fim do gozo de licença para tratar de assuntos particulares (LIP), concedida por um ano, através das Portarias nº 324, de 15 de agosto de 2017 e nº 325, de 15 de agosto de 2017, publicadas no BAE n. 1.284 em 18 de agosto de 2017 e retificadas em 08 de setembro de 2017, publicadas no BAE/IPHAN nº 1.289, tendo o prazo da licença se encerrado em 18/08/2018.
As negociações junto à Administração quanto à prorrogação da licença dos servidores não obtiveram êxito. A Decisão da Corregedora do IPHAN, datada de 13 de dezembro de 2023, nos referidos autos do processo nº 01510.000835/2018-18 (SEI 5159241), considerou que após decorridos mais de cinco anos do final da licença houve indícios nos autos de que os servidores foram trabalhar em outro país:
"(...)
No caso hora avaliado há indicativos de que dos servidores Mário Alves do Rosário Pires e Ariadne Marques Mendonça não retornaram ao exercício de suas atividades após o fim da licença para tratar de assuntos particulares, a qual findou em agosto de 2018. Apesar de ter havido inicial debate sobre a possibilidade ou não de prorrogação, fato é que desde o fim da licença já se passaram mais de 5 anos. Ou seja, desde a data da concessão da licença, já decorreu o prazo máximo de 6 anos previsto para a licença para tratar de interesses particulares, fixado no art. 12, § 3º da Instrução Normativa SGP/SEDGG/ME nº 34, de 24 de março de 2021 que regulamenta a matéria: (...).
Desta feita, vislumbra-se justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar para averiguação da possível conduta faltosa. Assim, DETERMINO A INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DIISCIPLINAR, sob o rito sumário, nos moldes do art. 11, II do Anexo I do Decreto 11.178/2022, do art. 32, II da Portaria nº Iphan nº 141, de 12 de dezembro de 2023 c/c o art. 133 da Lei 8.112/90 para a apuração da situação posta nos autos".
Nesses termos, foi determinada a abertura de PAD, sob o rito sumário, por meio da PORTARIA COREG/GAB PRESI/IPHAN Nº 9, de 20 de MARÇO de 2024 (IPHAN/SEI nº 5160486).
Os Termos de Indiciamento dos servidores foram realizados em 3 de abril de 2024 (processo IPHAN nº 01450.001969/2024-48), documentos que abarcaram os fatos que lhes foram atribuídos pelo colegiado processante, dispositivos legais infringidos e as respectivas provas. A irregularidade consignada pela CPAD foi de "Abandono de cargo público, na forma tipificada pelo art. 138 da Lei nº 8.112/1990, materializado pela ausência intencional ao serviço por mais de trinta dias consecutivos", consoante visto, capitulada no art. 138 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990.
Diante da ausência do endereço dos indiciados, foram citados por e-mail para apresentação da defesa final no prazo de dez dias, com a disponibilização da íntegra do processo respectivamente nos e-mails: ariadnemm@gmail.com; e marioarpires@gmail.com. Foram, assim, obtidas as seguintes informações: "A entrega para estes destinatários ou grupos foi concluída, mas os servidores de destino não enviaram uma notificação de entrega".
Quanto às citações, constou ainda dos autos que, em decorrência da ausência de resposta, solicitaram apoio à Corregedoria do IPHAN, que logrou êxito em realizar os contatos através do telefone institucional por meio de aplicativo de mensagens, ocasião na qual foram remetidos os respectivos documentos e acusado o recebimento por parte dos servidores (SEI/IPHAN nºs 5306437, 5347772, 5351747, 5351748, 5534113).
No entanto, diante da ausência da apresentação de defesa, o colegiado declarou a revelia dos indiciados e solicitou a designação de defensor dativo, nos termos do art. 164, § 1º, da Lei nº 8.112/1990, havendo, assim, a publicação da Portaria COREG/GAB PRESI/IPHAN nº 19, de 29 de maio de 2024, que designou o servidor Leon de Oliveira Madeira, Analista de Planejamento e Administração, matrícula SIAPE 3126888, como defensor dativo no Processo Administrativo Disciplinar nº 01450.007822/2023- 81. O referido servidor apresentou a defesa administrativa dos indiciados Mário Alves do Rosário Pires e Ariadne Marques Mendonça, da qual se destacaram os seguintes pontos:
Preliminarmente, cumpre ressaltar que foi concedida licença para tratar de assuntos particulares a ambos os servidores, conforme Portarias Iphan nº 324 e 325, de 15 de agosto de 2017, para o período de três anos. Entretanto, tais portarias foram retificadas por meio de Termo de Retificação, em que se pede que seja dada ciência aos servidores.
Não foi identificada a formalização da ciência dos servidores quando da retificação inicial do período de licença para tratar de assuntos particulares aos servidores. Ressalta-se que tal ausência pode ter impossibilitado a manifestação inicial de prorrogação da referida licença, conforme manifestado pelo próprio servidor Mário A. R. Pires, por meio de correspondência datada de 13 de setembro de 2018, constante nos autos.
Registra-se ainda que, conforme amplamente demonstrado no processo administrativo em apreço, o servidor Mário A. R. Pires demonstrou, inequivocadamente, seu interesse em regularizar a sua situação funcional, inferindo-se, dessa forma, seu desejo em prorrogar a referida licença. Vejamos sua manifestação:
(...)
Ora, nitidamente, toda a problemática em tela concentra-se na falta de conhecimento dos servidores de que o prazo para sua licença foi retificado e reduzido de três anos para somente um ano, diferentemente do que fora pleiteado inicialmente, bem como incialmente publicado pela Administração Pública.
Frise-se: não há evidenciação no processo administrativo do conhecimento de tal redução/retificação por parte dos servidores, apesar de asseverada sua necessidade no próprio Termo de Retificação (grifo meu)
(...)
Logo, a afirmação apresentada pela autoridade máxima da unidade de lotação dos servidores em apreço foi equivocada e pode tê-los induzido a acreditar que “não precisam fazer mais nada” e que “a exoneração seria feita de forma automática”. Diante da afirmação apresentada pela Superintendência, qual seria a lógica de apresentar pedido de prorrogação da licença em apreço, se a "exoneração seria feita de forma automática", quando não "não precisavam fazer mais nada"? Saliento, portanto, a possibilidade de prejudicialidade do exercício da ampla defesa e do contraditório no caso em apreço, por meio de uma possível indução ao erro, diante dos argumentos supramencionados.
Saliento ainda que, conforme disposto no inciso II, do art. 140, da norma supramencionada, após avaliação do pedido de defesa, resta à autoridade julgadora a avaliação sobre a intencionalidade da ausência ao serviço superior ao período de trinta dias. Ora, conforme argumentos apresentados, em que pese a citação dos servidores e a ausência de manifestação tempestiva, resta evidente que a ausência de retorno ao serviço público não foi intencional, dado o desconhecimento do período de licença inferior ao inicialmente concedido, bem como a possível redução do exercício do contraditório e ampla defesa dos servidores.
(...)
Solicito que seja dado conhecimento aos servidores, formalmente, de que o procedimento de demissão em cargo público em tais casos não é um procedimento automático, conforme foram informados no início de todo o processo, e que há a possibilidade e consideração do seu exercício de ampla defesa e contraditório. Solicita-se abrir novo período de apresentação de defesa administrativa dos servidores, com a possibilidade de retorno ao cargo público efetivo, ou a prorrogação ou solicitação de nova licença para tratar de interesses particulares, dado o interesse inicialmente manifestado de regularização (e prorrogação) da licença".
Ao final dos trabalhos, a Comissão Processante elaborou Relatório Final (IPHAN/SEI nº 5494201), sugerindo a aplicação da penalidade de demissão, nos seguintes termos:
(...) de acordo com os ditames do art. 132, II, da Lei nº 8.112, de 1990, esta Comissão sugere a RESPONSABILIZAÇÃO e consequente aplicação da penalidade de DEMISSÃO em face dos servidores ARIADNE MARQUES DE MENDONÇA e MÁRIO ALVES DO ROSÁRIO PIRES.
Os autos foram, então, encaminhados à autoridade instauradora do PAD, Corregedoria do IPHAN, que elaborou a NOTA TÉCNICA nº 3/2024/CORREGEDORIA/GAB PRESI/PRESI (SEI/IPHAN nº 5531790). Referida Nota foi aprovada pelo DESPACHO Nº 137/2024 CORREGEDORIA/GAB PRESI/PRESI (SEI/IPHAN nº 5535989), de onde se destacam:
"Nesse sentido, verifica-se que os esforços envidados pela defesa se referem à tentativa de demonstrar a ausência da intencionalidade. Contudo, o que se depreende dos autos é que houve comprovação do animus abandonandi, pois, não obstante tenha ocorrido discussão junto à Administração acerca da prorrogação da licença, a qual, cumpre reforçar, é discricionária e pode ser interrompida a qualquer tempo, denotando o dever do servidor de acompanhar a situação, o que Mário Pires informou na cadeia de e-mails com o Iphan foi, em realidade, o interesse em regularizar sua situação funcional, visto que não seria possível seu retorno antes do prazo de três anos, o qual efetivamente não ocorreu. No caso da servidora Ariadne, por sua vez, não constam nos autos quaisquer indicativos de comunicação junto ao Iphan ou retorno às atividades, diante do que não se pode concluir que, pelo mero fato de ter requerido licença em vez de ter apresentado pedido de exoneração, restaria caracterizada a ausência de intenção de abandonar o cargo. Também verifica-se, pelos números de telefone através dos quais foi possível estabelecer contato, que eles possivelmente não se encontram no Brasil. Ademais, mesmo após manifestarem ciência sobre a citação no presente processo, nenhum dos servidores fez menção a interesse em retornar às atividades, elementos que corroboram com a tese de que há intencionalidade".
Nesse cenário, em atendimento ao teor do art. 27, inciso III, c/c o art. 29, inciso V, do Regimento Interno do IPHAN, o processo foi encaminhado à PF/IPHAN para emissão de manifestação jurídica sobre o relatório final produzido pela Comissão Processante, o que originou o PARECER Nº 00598/2024/PFIPHAN/PGF/AGU, com a seguinte conclusão:
"A título de conclusão, manifesta-se pela regularidade do processo disciplinar sumário, estando ele apto a ser encaminhado para julgamento da autoridade competente (Ministra da Cultura).
Além disso, recomendo à administração verificar a existência de prejuízo ao erário em razão da conduta da indiciada. Em caso positivo, devem ser adotados os procedimentos para recolhimento de recursos aos cofres da União.
Outrossim, a demissão aplicada aos servidores indiciados no presente PAD - caracteriza-se como demissão comum decorrente da prática de irregularidade prevista no artigo 132, II, da Lei nº 8.112, de 1990, não ensejando, aqui esboçar manifestação quanto ao efeito mencionado nos itens 33 a 35 da Manifestação Técnica nº 3/2024, inclusive por não ter sido objeto da indiciação, tampouco do relatório final encaminhado a esta procuradoria para a análise pleiteada.
(...)".
Dessa forma, vieram os autos encaminhados à esta Consultoria Jurídica, por meio do Ofício nº 4243/2024/GM/MinC, para análise e manifestação.
É o relatório. Passo a opinar.
Inicialmente, cumpre observar que a análise deste órgão de assessoramento jurídico se insere no âmbito da competência que lhe é atribuída pelo art. 11 da Lei Complementar 73/93, que institui a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União.
Impende ainda destacar os termos do art. 131 da Constituição Federal, e do art. 10 da Lei n.º 10.480, de 02 de julho de 2002, bem como da Portaria Conjunta nº 1, de 1º de março de 2016, da Consultoria-Geral da União, Procurador-Geral Federal e Corregedoria-Geral da Advocacia da União, que dispõe sobre os elementos mínimos a serem observados na fundamentação das manifestações dos órgãos consultivos da Advocacia-Geral da União, em atividade de apoio a julgamento de procedimentos disciplinares, seguindo as premissas abaixo delineadas:
1. a observância do contraditório e da ampla defesa;
2. a regularidade formal do procedimento, com verificação da adequação dos atos processuais ao ordenamento jurídico vigente, em especial:
3. se o termo de indiciamento contém a especificação dos fatos imputados ao servidor e as respectivas provas;
4. se, no relatório final, foram apreciadas as questões fáticas e jurídicas, relacionadas ao objeto da apuração, suscitadas na defesa;
5. se ocorreu algum vício e, em caso afirmativo, se houve prejuízo à defesa;
6. se houve nulidade total ou parcial indicando, em caso afirmativo, os seus efeitos e as providências a serem adotadas pela Administração;
7. a adequada condução do procedimento e a suficiência das diligências, com vistas à completa elucidação dos fatos;
8. a plausibilidade das conclusões da Comissão quanto à:
. conformidade com as provas em que se baseou para formar a sua convicção;
. adequação do enquadramento legal da conduta;
. adequação da penalidade proposta;
. inocência ou responsabilidade do servidor.
DO PREENCHIMENTO DOS ASPECTOS FORMAIS
O procedimento administrativo se encontra hígido, escorreito, incólume e sem falhas processuais que possam comprometer o seu desiderato.
Isso porque no aspecto formal, inexistem vícios que possam ensejar a nulidade do feito, o qual foi conduzido observando-se todas as formalidades impostas pela legislação de regência.
A instauração do PAD de rito sumário ocorre com a publicação do ato que constituir a Comissão, a ser composta por dois servidores estáveis, e deve indicar a autoria e a materialidade da transgressão objeto da apuração.
Assim preveem os arts. 133 e 140 da Lei 8.112/90:
Art. 133. Detectada a qualquer tempo a acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas, a autoridade a que se refere o art. 143 notificará o servidor, por intermédio de sua chefia imediata, para apresentar opção no prazo improrrogável de dez dias, contados da data da ciência e, na hipótese de omissão, adotará procedimento sumário para a sua apuração e regularização imediata, cujo processo administrativo disciplinar se desenvolverá nas seguintes fases:
I - instauração, com a publicação do ato que constituir a comissão, a ser composta por dois servidores estáveis, e simultaneamente indicar a autoria e a materialidade da transgressão objeto da apuração;
II - instrução sumária, que compreende indiciação, defesa e relatório;
III - julgamento.
§ 1º A indicação da autoria de que trata o inciso I dar-se-á pelo nome e matrícula do servidor, e a materialidade pela descrição dos cargos, empregos ou funções públicas em situação de acumulação ilegal, dos órgãos ou entidades de vinculação, das datas de ingresso, do horário de trabalho e do correspondente regime jurídico.
§ 2º A comissão lavrará, até três dias após a publicação do ato que a constituiu, termo de indiciação em que serão transcritas as informações de que trata o parágrafo anterior, bem como promoverá a citação pessoal do servidor indiciado, ou por intermédio de sua chefia imediata, para, no prazo de cinco dias, apresentar defesa escrita, assegurando-se-lhe vista do processo na repartição, observado o disposto nos arts. 163 e 164.
§ 3º Apresentada a defesa, a comissão elaborará relatório conclusivo quanto à inocência ou à responsabilidade do servidor, em que resumirá as peças principais dos autos, opinará sobre a licitude da acumulação em exame, indicará o respectivo dispositivo legal e remeterá o processo à autoridade instauradora, para julgamento. § 4º No prazo de cinco dias, contados do recebimento do processo, a autoridade julgadora proferirá a sua decisão, aplicando-se, quando for o caso, o disposto no § 3º do art. 167. [...] § 7º O prazo para a conclusão do processo administrativo disciplinar submetido ao rito sumário não excederá trinta dias, contados da data de publicação do ato que constituir a comissão, admitida a sua prorrogação por até quinze dias, quando as circunstâncias o exigirem. § 8º O procedimento sumário rege-se pelas disposições deste artigo, observando-se, no que lhe for aplicável, subsidiariamente, as disposições dos Títulos IV e V desta Lei".
"Art. 140. Na apuração de abandono de cargo ou inassiduidade habitual, também será adotado o procedimento sumário a que se refere o art. 133, observando-se especialmente que:
I - a indicação da materialidade dar-se-á:
a) na hipótese de abandono de cargo, pela indicação precisa do período de ausência intencional do servidor ao serviço superior a trinta dias;
b) no caso de inassiduidade habitual, pela indicação dos dias de falta ao serviço sem causa justificada, por período igual ou superior a sessenta dias interpoladamente, durante o período de doze meses;
II - após a apresentação da defesa a comissão elaborará relatório conclusivo quanto à inocência ou à responsabilidade do servidor, em que resumirá as peças principais dos autos, indicará o respectivo dispositivo legal, opinará, na hipótese de abandono de cargo, sobre a intencionalidade da ausência ao serviço superior a trinta dias e remeterá o processo à autoridade instauradora para julgamento."
Nesses termos, o processo administrativo de rito sumário, adotado no caso concreto, constituiu-se como procedimento aplicável nas apurações de acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas e, nos termos do retrocitado art. 140, da Lei nº 8.112, de 1990, de abandono de cargo.
No que tange ao rito, o PAD sumário possui como fases: a instauração, com a publicação do ato que constituição da comissão; a instrução sumária, que compreende indiciação, defesa e relatório; e o julgamento. Todas as etapas processuais foram adequadamente cumpridas, não havendo, portanto, óbices legais quanto ao desenvolvimento do processo.
Conforme observado no Parecer nº 00598/2024/PFIPHAN/PGF/AGU, foram atendidos regularmente os princípios da ampla defesa e do contraditório, com os acusados regularmente notificados da instauração do processo administrativo disciplinar. Na ocasião, os servidores foram informados sobre o direito à ampla defesa e ao contraditório, no que se incluíam as produções de provas e contraprovas. Os autos foram disponibilizados aos acusados, via e-mail (Ariadne Marques Mendonça - 5236446 e 5236455 e Mário Alves do Rosário Pires - 5236470, 5236473).
Houve a citação dos acusados, através de e-mail, com prazo marcado de 10 (dez) dias para a apresentação da defesa, (SEI 5306437, 5347772, 5351747, 5534113, 5351748, 5351747 e 5351748) além de contatos verbais através de telefones institucionais.
Decorrido o prazo para apresentação das defesas pelos acusados, sem manifestação, a Comissão Processante, em 16/05/2024, deliberou por declarar a revelia, nos termos da Ata Deliberativa (IPHAN/SEI nº 5353977). Houve lavratura do Termo de Revelia e comunicação à autoridade instauradora para as providências quanto à indicação de defensor dativo.
Nos termos da PORTARIA COREG/GAB PRESI/IPHAN Nº 18, DE 24 DE MAIO DE 2024, publicada em 24/04/2024 (SEI 5380083), foi designado Leon de Oliveira Madeira, Analista I, 3126888, para atuar como Defensor Dativo no Processo Administrativo Disciplinar em apreço, sendo o referido defensor dativo comunicado da designação e concedido o prazo de 10 (dez) dias para a apresentação da defesa dos acusados.
Apresentada a defesa, adveio o Relatório Final com a devida análise dos documentos, dos fatos e dos elementos da defesa dos servidores, concluindo pela responsabilização dos acusados e pela aplicação da penalidade de demissão, haja vista ausência superior a trinta dias consecutivos, contados do encerramento da licença para tratar de assuntos particulares, pelo prazo de um ano.
A autoridade instauradora do PAD, Corregedoria do IPHAN, elaborou a NOTA TÉCNICA nº 3/2024/CORREGEDORIA/GAB PRESI/PRESI, ratificando os termos apresentados pela Comissão Processante no Relatório Final.
DA PLAUSIBILIDADE DAS CONCLUSÕES DA COMISSÃO - MÉRITO DO PROCESSO
Quanto ao mérito, não vislumbramos razões hábeis à discordância das conclusões da Comissão de PAD.
No Processo Administrativo IPHAN nº 01450.007822/2024-48, observa-se a documentação comprobatória sobre as faltas injustificadas ao trabalho dos acusados a partir do dia 19 de agosto de 2018 até 18 de setembro de 2018, cujas faltas seguiram-se por mais de cinco anos até a instauração do Processo Administrativo Disciplinar.
Resulta, assim, das provas dos autos que os servidores acusados estiveram ausentes do trabalho, por mais de trinta dias consecutivos, sem justificativa por amparo legal. Assim, restou evidente que os servidores, considerando-se apenas o espaço temporal de faltas, cometeram abandono de cargo. Conquanto o quesito temporal esteja devidamente comprovado, a lei, para caracterização absoluta do abandono de cargo, exige a constatação de intencionalidade.
Parece claro nos autos que as provas produzidas não deixam dúvidas acerca da existência de faltas injustificadas por parte dos servidores, principalmente, a demonstração de que se encontravam trabalhando noutro país. Resta, no entanto, avaliar se o processo obteve sucesso na comprovação dos quesitos legais que tornariam as faltas injustificadas passíveis de aplicação de penalidade administrativa.
O art. 138, da Lei n. 8.112, de 1990, define os casos em que se dará a configuração do abandono de cargo:
"Art. 138. Configura abandono de cargo a ausência intencional do servidor ao serviço por mais de trinta dias consecutivos". Ng.
Conforme o Parecer nº 00598/2024/PFIPHAN/PGF/AGU, a intencionalidade do abandono de cargo é, nos termos de enunciado publicado pela Corregedoria Geral da União, relativamente presumida pela Administração a partir da trigésima primeira falta injustificada consecutiva: Enunciado nº 22: As ausências injustificadas por mais de trinta dias consecutivos geram presunção relativa da intenção de abandonar o cargo (DOU de 28/02/2018, Seção 1, página 81).
Nesse sentido, segundo assentado pelos nossos tribunais, delineou-se como parâmetro para a configuração da infração disciplinar de abandono de cargo público a necessidade da concorrência de dois requisitos: um elemento objetivo, caracterizado pela ausência do serviço por mais de 30 (trinta) dias consecutivos por parte do servidor; e um elemento subjetivo, expresso pelo ânimo do servidor em abandonar seu cargo.
Desse modo, para que as ausências do servidor possam ser enquadradas como abandono de cargo há necessidade de ser demonstrado, pela Administração, que houve a intenção de abandonar o cargo.
A expressão normativa desses elementos encontra-se, como visto, no art. 138, da Lei nº 8.112/1990, que, ao conceituar a infração de abandono de cargo, estabelece que "(...) configura abandono de cargo a ausência intencional do servidor ao serviço por mais de trinta dias consecutivos", bem como no art. 140, inciso I, alínea a, que determina que "I - a indicação da materialidade dar-se-á: a) na hipótese de abandono de cargo, pela indicação precisa do período de ausência intencional do servidor ao serviço superior a trinta dias".
O sistema judicial brasileiro admite a presunção relativa – juris tantum. Na presunção relativa, há a inversão do ônus da prova, de maneira a caber ao acusado a apresentação de documentos que comprovem sua inocência. Em outras palavras, a presunção relativa é desfeita por prova em contrário, ou seja, por contraprovas apresentadas. Os acusados, como interessados no reconhecimento das respectivas não intencionalidade de abandono de cargo, teriam, no caso em tela, o ônus de provar o fato contrário ao presumido, isto é, a não intencionalidade de proceder ao abandono dos cargos perante o serviço público a que estavam vinculados.
Consoante visto, a ausência dos Acusados contava com mais de cinco anos na data da instauração do PAD. Considere-se que as tratativas acerca de eventual prorrogação não prosperaram, tanto que não veio aos autos o documento pertinente a esse respeito.
Na hipótese, embora a defesa apresentada pelo Defensor Dativo tenha evidenciado no processo administrativo a ausência de conhecimento dos servidores da redução/retificação do prazo de 3 (três) anos de Licença, para 1 (um) ano, apesar de asseverada sua necessidade no próprio Termo de Retificação, os acusados não apresentaram defesa nos autos e não retornaram ao trabalho por cinco anos, até a instauração do presente PAD, o que comprovou a intencionalidade do abandono de cargo dos servidores. Verifica-se, portanto, a não contestação das provas institucionais, inclusive quanto à informação de que os servidores residiam fora do Brasil.
Não restaram dúvidas quanto à configuração do Animus Abandonandi dos Acusados, elemento subjetivo do ilícito administrativo de abandono de cargo, em relação ao qual é de se destacar que, ao demonstrarem desapego à atividade pública, os servidores corroboraram para a configuração do animus abandonandi. Nesse sentido, o Manual de Processo Administrativo Disciplinar da Controladoria-Geral da União (CGU, ed. Jan.2022, pág. 225) orienta a respeito de sua presunção relativa (juris tantum):
"(...) PRESUNÇÃO RELATIVA DE ANIMUS ABANDONANDI.
As ausências injustificadas por mais de trinta dias consecutivos geram presunção relativa da intenção de abandonar o cargo. Enunciado nº 22, publicado no DOU de 28 de fevereiro de 2018, seção 1, p. 81.
No voto que fundamentou o enunciado aprovado, consta menção a ensinamento de José Armando da Costa, segundo o qual o que caracteriza o abandono de cargo é a ausência do funcionário ao serviço de sua repartição por mais de trinta dias consecutivos, sem que haja circunstâncias insuperáveis e legítimas que elidam a liberdade do agente na implementação da ação faltosa. Nessas circunstâncias, ainda que o servidor não haja alimentado a vontade direta de abandonar o cargo (dolo direto), ainda assim terá perpetrado essa transgressão disciplinar (dolo eventual). Referidas “circunstâncias insuperáveis” seriam aquelas que impedem o comparecimento ao local de trabalho e que se fundam em razões que independem da vontade do servidor acusado. (...)". NG.
Desse modo, ficou aferida a regularidade do procedimento e a suficiência das diligências implementadas. Cumpre, então, a este órgão jurídico opinar pela plausibilidade das conclusões da Comissão quanto à conformidade das provas coletadas para consubstancializar decisões relativas à adequação do enquadramento legal da conduta e da penalidade proposta.
No que tange à adequação do enquadramento legal e à sanção aplicável, a Lei nº 8.112, de 1990 aponta as penalidades disciplinares possíveis de aplicação a servidores públicos:
Art. 127. São penalidades disciplinares:
I - advertência;
II - suspensão;
III - demissão;
IV - cassação de aposentadoria ou disponibilidade;
V - destituição de cargo em comissão;
VI - destituição de função comissionada.
O mesmo regramento esclarece os casos em que cada um dos tipos penalidades deve ser aplicado. Especificamente em relação à demissão, a Lei n. 8.112, de 1990 aponta:
Art. 132. A demissão será aplicada nos seguintes casos:
I - crime contra a administração pública;
II - abandono de cargo;
III - inassiduidade habitual;
IV - improbidade administrativa;
V - incontinência pública e conduta escandalosa, na repartição;
VI - insubordinação grave em serviço;
VII - ofensa física, em serviço, a servidor ou a particular, salvo em legítima defesa própria ou de outrem;
VIII - aplicação irregular de dinheiros públicos;
IX - revelação de segredo do qual se apropriou em razão do cargo;
X - lesão aos cofres públicos e dilapidação do patrimônio nacional;
XI - corrupção;
XII - acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas;
XIII - transgressão dos incisos IX a XVI do art. 117.
Restou comprovado nos autos por documentação institucional que os servidores, após usufruírem da licença concedida pelo prazo de um ano, não retornaram às atividades laborais no IPHAN. Nesse sentido, constata-se que a Comissão procedeu ao adequado enquadramento da conduta, sugerindo a aplicação da sanção de demissão cabível ao caso.
É cediço que o mero abandono fático do cargo pelo servidor público não é suficiente para a configuração da infração disciplinar em comento, sendo necessário que a intenção de abandonar o cargo esteja comprovada. No entanto, é do servidor o ônus de comprovar que a sua ausência se deu em razão de motivo justificável - motivo de força maior ou mesmo para evitar o sacrifício da perda de um direito ou bem jurídico de índole maior.
Nesse ponto, é necessário ressaltar que o elemento subjetivo exigido para fins de caracterização da "intencionalidade" abarca tanto o dolo direto, consistente na vontade livre e determinada de abandonar o cargo público, como também o dolo eventual, materializado na assunção do risco pelo agente público de incorrer na conduta de abandono de cargo mediante a sua ausência injustificada do serviço público.
Imperioso, assim, recordar que a aplicação da demissão aos casos previstos no art. 132, da Lei nº 8.112, de 1990 é obrigatória, não sendo possível aplicar pena mais branda, nos termos do que determinam os pareceres da Advocacia Geral da União GQ 177 e GQ 193, aprovados pelo Presidente da República e, portanto, vinculantes para toda a Administração Pública Federal, nos termos do art. 40 da Lei Complementar n.º 73/1993. In verbis:
Parecer AGU nº GQ – 177, vinculante Ementa: Verificadas a autoria e a infração disciplinar a que a lei comina penalidade de demissão, falece competência à autoridade instauradora do processo para emitir julgamento e atenuar a penalidade, sob pena de nulidade de tal ato [...]. 10. [...] Apurada a falta a que a Lei nº 8.112, arts.132 e 134, cominam a aplicação da pena de demissão ou de cassação de aposentadoria ou disponibilidade, esta medida se impõe sem qualquer margem de discricionariedade de que possa valer se a autoridade administrativa [...] para omitir-se na apenação.
Parecer AGU nº GQ – 183, vinculante Ementa: É compulsória a aplicação da penalidade expulsiva, se caracterizada infração disciplinar antevista no art.132 da Lei nº 8.112/90, de 1990. [...] 7. Apurada a falta a que a Lei nº 8.112, de1990, arts. 129, 130, 132, 134 e 135, comina a aplicação de penalidade, esta medida passa a constituir dever indeclinável, em decorrência do caráter de norma imperativa de que se reveste messes dispositivos. Impõe-se a apenação sem qualquer margem de discricionariedade de que possa valer-se a autoridade administrativa para omitir-se nesse mister. [...] 8. Esse poder é obrigatoriamente desempenhado pela autoridade julgadora do processo disciplinar
[...].
O STF e o STJ possuem julgados em sentido convergente ao indicado nos pareceres vinculantes da AGU, quanto à impossibilidade de aplicação do princípio da proporcionalidade para as hipóteses em que a lei prevê a aplicação da pena de demissão: STF, MS 26.023; STJ, MS 15.690, 15.951, 15.437, 15.517, 15.175, 13.169, 12.689,10.987, 16.567, 10.420, 9.116 e8.361, RMS 32.573, 20.537, 33.281 e 30.455.
Vale, ainda, destacar que o STJ, com fundamento em sua jurisprudência reiterada, firmou a seguinte tese:
A administração pública, quando se depara com situação em que a conduta do investigado se amolda às hipóteses de demissão ou de cassação de aposentadoria, não dispõe de discricionariedade para aplicar pena menos gravosa por se tratar de ato vinculado.
Com fulcro no disposto acima, constata-se que a Comissão além de providenciar o correto enquadramento da conduta, zelou por indicar à autoridade julgadora a única decisão permitida por lei ao caso, qual seja a aplicação da penalidade de demissão.
Ratifica-se, ainda, a recomendação à administração, constante do Parecer nº 00598/2024/PFIPHAN/PGF/AGU, no sentido de verificar a existência de prejuízo ao erário em razão da conduta dos acusados. Em caso positivo, devem ser adotados os procedimentos para recolhimento dos recursos aos cofres públicos, sendo que os valores deverão ser atualizados e consolidados para a finalidade de reposição ao erário. A aplicação da penalidade disciplinar não elimina o dever de reparar o dano causado ao erário, em razão da independência das instâncias de responsabilidade do servidor, prevista no art. 125, da Lei n. 8.112/1990.
Em linha de arremate, considerando que, do Relatório Final da Comissão, não restaram evidenciados indícios de potencial prejuízo à regularidade do serviço público que possam vir a caracterizar o crime de abandono de função previsto no art. 323 do Código Penal, não é recomendável a comunicação do fato ao Ministério Público a que se refere o art. 154 e 171 do Estatuto Funcional. Sobre esse ponto, transcrevo entendimento da Controladoria- Geral da União:
15.6. Abandono de cargo
(...) Destarte, nos casos de possível abandono de cargo, uma vez instaurado o processo disciplinar de rito sumário (art. 140) e, ao final do apuratório restarem evidenciados indícios de potencial prejuízo à regularidade do serviço público que possam vir a caracterizar o crime de abandono de função previsto no art. 323 do Código Penal, a providência recomendada é a comunicação do fato com o envio de cópia dos autos com os elementos probatórios colhidos ao Ministério Público, em cumprimento aos art. 154 e 171 do Estatuto Funcional. Art. 154. Os autos da sindicância integrarão o processo disciplinar, como peça informativa da instrução. Parágrafo único. Na hipótese de o relatório da sindicância concluir que a infração está capitulada como ilícito penal, a autoridade competente encaminhará cópia dos autos ao Ministério Público, independentemente da imediata instauração do processo disciplinar.
(MANUAL DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR, 2022 p. 331).
DO EXAME DA PRESCRIÇÃO
Conforme visto, cumpre corroborar o posicionamento do Parecer nº 00598/2024/PFIPHAN/PGF/AGU, quanto à prescrição no processo administrativo disciplinar que, como regra, é regida pelo art. 142 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de1990, a saber:
Art. 142. A ação disciplinar prescreverá:
I – em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;
II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;
III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.
§ 1° O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido.
§ 2° Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crime.
§ 3° A abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente.
§ 4° Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia em que cessar a interrupção.
O termo inicial do prazo prescricional é a data da ciência da irregularidade pela autoridade competente para a abertura do procedimento administrativo, nos termos do que dispõe o art. 142, §2º, da Lei 8.112/1990, o qual é interrompido pela abertura de sindicância ou instauração de processo administrativa disciplinar. Sindicâncias meramente investigativas e outros procedimentos prévios não são capazes de interromper o andamento do prazo de prescrição.
Sobre o tema destaca-se o Parecer nº GQ-55, vinculante para a Administração, interpretado mais recentemente pela Nota DECOR/CGU/AGU nº 208/2009, acatada pelo Despacho-CGU/AGU nº 14/2009 do Consultor Geral da União, e aprovado por Despacho do Advogado-Geral da União; STJ MS nº 14.446-DF (2009/0121575-7), Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 13/12/2010; MS nº 11.974-DF (2006/0133789-1), Relatora Ministra Laurita Vaz, 07/05/2007.
A interrupção do prazo prescricional, indicada no art. 142, §3º, da Lei 8.112, de 1990, retorna o referido prazo à estaca zero e ao mesmo tempo o congela. O reinício do curso da prescrição ocorre não da forma prevista no art. 142, §4º, da Lei 8.112, de 1990 mas - por força de consolidação jurisprudencial dos Tribunais Superiores - após decorridos 140 (cento e quarenta) dias da instauração do processo administrativo disciplinar, ou 80 (oitenta) dias após a instauração de sindicância punitiva, ou 50 dias para o rito sumário (Súmula STJ 635 e Enunciado CGU n.º 01, DOU de 05/05/2011, Seção 01, p. 22).
Registre-se, ainda, o entendimento da Corregedoria-Geral da União sobre peculiaridades quanto ao início da contagem do prazo prescricional quando de investigação de conduta "Abandono de cargo". Em suma, é defendido que a conduta "abandono de cargo" possui natureza jurídica de infração de caráter permanente, a exemplo dos ilícitos criminais, razão pela qual o termo inicial do prazo prescricional só se dará a partir do dia em que cessar a permanência.
O prazo prescricional no abandono de cargo possui algumas peculiaridades. Em primeiro lugar, é oportuno ressaltar que, de acordo com o Parecer Vinculante nº GMF-6, o prazo para a Administração punir o servidor por abandono de cargo começa a contar da data de retorno ao serviço, e não após 30 dias de ausência injustificada. Isso porque a infração de abandono de cargo prevista no inciso II do art. 132 do Estatuto é considerada de caráter permanente, tendo como termo inicial do prazo da prescrição direta – ocorrida antes da instauração do processo administrativo disciplinar – o dia em que cessar a permanência do ilícito. Vejamos abaixo:
Parecer GMF-6, Vinculante EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. MATÉRIA DISCIPLINAR. ANALOGIA COM O DIREITO PENAL. ABANDONO DE CARGO. NATUREZA PERMANENTE. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. CESSAÇÃO DA PERMANÊNCIA.
I - As condutas que são objeto de persecução na esfera administrativa poderão, ante a omissão legislativa administrativa, por analogia e conforme avaliação do caso concreto, obedecer aos mesmos critérios do direito criminal, inclusive quanto a natureza jurídica das infrações e suas implicações quanto à contagem do prazo prescricional.
II - A vontade do agente incide diretamente não apenas para a configuração do abandono de cargo, mas também para a situação de permanência que produz efeitos jurídicos, restando caracterizada, portanto, a prorrogação de sua base consumativa.
III - A infração funcional de abandono de cargo possui caráter permanente e o prazo prescricional apenas se inicia a partir da cessação da permanência.
IV - Deve-se ter a superação (overruling) das razões de decidir (ratio decidendi) sufragadas nos Pareceres GQ - 206, GQ - 207, GQ - 211 e GQ - 214, com eficácia prospectiva, com base nas recentes decisões judiciais do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria, na dou- trina e na legislação ordinária estadual. (MANUAL DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR, 2022 p. 329)
No caso dos autos, os servidores acusados não retornaram ao trabalho decorridos mais de cinco anos a contar do término da licença para tratar de assuntos particulares, circunstância que, conforme entendimento acima destacado, redundaria na afirmação de inexistência de prescrição.
E, independentemente do referido entendimento, examinando a instrução à luz das regras gerais de prescrição expendidas neste Parecer, os fatos apurados no processo chegaram ao conhecimento da autoridade instauradora em 09/11/2023. Veja-se que a Corregedoria do IPHAN instaurou o procedimento disciplinar, sob rito sumário - Processo Administrativo Disciplinar - para apuração de possível abandono de cargo por parte dos Servidores Ariadne Marques Mendonça e Mário Alves do Rosário Pires, nos termos da PORTARIA COREG/GAB PRESI/IPHAN Nº 9, de 20 de MARÇO de 2024 (SEI 516-486), publicada em 22/03/2024, data considerada como marco interruptivo do prazo prescricional.
Início da contagem prescricional (agente público): 09/11/2023; Data prescrição advertência (180 dias): 07/05/2024; Data prescrição suspensão (2 anos): 09/11/2025; Data prescrição penalidades expulsivas (5 anos): 09/11/2028.
No caso, portanto, não há que se falar em prescrição da pretensão punitiva da administração, porquanto não se passaram mais de 05 anos entre a data da ciência da irregularidade pela autoridade competente para a abertura deste processo disciplinar (09/11/2023) e a data da instauração do processo disciplinar (22/03/2024), tampouco se passaram 05 anos e 50 dias a partir da instauração deste PAD.
DA COMPETÊNCIA
No que se refere ao processo administrativo disciplinar com a aplicação da penalidade de demissão, a competência é especificada na própria Lei nº 8.112/1990, in verbis:
Art. 141. As penalidades disciplinares serão aplicadas:
I - pelo Presidente da República, pelos Presidentes das Casas do Poder Legislativo e dos Tribunais Federais e pelo Procurador-Geral da República, quando se tratar de demissão e cassação de aposentadoria ou disponibilidade de servidor vinculado ao respectivo Poder, órgão, ou entidade;
II - pelas autoridades administrativas de hierarquia imediatamente inferior àquelas mencionadas no inciso anterior quando se tratar de suspensão superior a 30 (trinta) dias;
III - pelo chefe da repartição e outras autoridades na forma dos respectivos regimentos ou regulamentos, nos casos de advertência ou de suspensão de até 30 (trinta) dias;
IV - pela autoridade que houver feito a nomeação, quando se tratar de destituição de cargo em comissão.
Assim, o Presidente da República é a autoridade competente para aplicar a pena de demissão.
Ocorre, no entanto, que o Presidente da República delegou a competência do art. 141, inciso I, através do Decreto nº 11.123, de 7 de julho de 2022 aos Ministros de Estado, conforme verifica-se abaixo:
Art. 2º Ressalvadas as hipóteses previstas no art. 4º, fica delegada a competência aos Ministros de Estado e ao Presidente do Banco Central do Brasil para:
I - o julgamento de processos administrativos disciplinares e a aplicação de penalidades, nas hipóteses de:
a) demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade de servidores; e
b) destituição ou conversão de exoneração em destituição de ocupante de Cargo Comissionado Executivo - CCE-15 ou CCE-16 ou equivalente ou de cargo ou função de Chefe de Assessoria Parlamentar; e
II - a reintegração de ex-servidores em cumprimento de decisão judicial ou administrativa. Parágrafo único. O Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República exercerá a competência de que trata o caput para os órgãos diretamente subordinados ao Presidente da República cujos titulares não sejam Ministros de Estado.
Dessa forma, não tendo havido delegação de competência no âmbito do Ministério da Cultura, nos termos do art. 3º do Decreto, caberá à Sra. Ministra de Estado da Cultura o julgamento e a aplicação da penalidade, conforme acima destacado.
CONCLUSÃO
Ante todo o exposto, em sede de apoio a julgamento, e considerando a regularidade formal do procedimento, bem como diante da plausibilidade das conclusões da Comissão, opinamos que seja aplicada a penalidade disciplinar de demissão aos servidores acusados, conforme decisão registrada pela Comissão Processante.
Dessa forma, esta Coordenação se manifesta pela regularidade do processo disciplinar sumário, estando ele apto a ser encaminhado para julgamento da autoridade competente, a Exma. Sra. Ministra da Cultura.
Além disso, deve ser reforçada a recomendação à administração para examinar a existência de prejuízo ao erário em razão das condutas dos acusados. Em caso positivo, devem ser adotados os procedimentos para recolhimento de recursos aos cofres da União.
Por fim, ressalto que a análise do mérito técnico-administrativo recai sempre sobre a Administração, em seu juízo de oportunidade e conveniência, ficando eventual matéria técnica fora do âmbito de análise de legalidade desta Consultoria Jurídica, resultando daí que o contido no presente Parecer possui conteúdo meramente opinativo, à luz dos princípios da legalidade e moralidade, que orientam a ação administrativa.
À consideração superior.
Brasília 31 de outubro de 2024
MARIA IZABEL DE CASTRO GAROTTI
Advogada da União
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