ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
PARECER nº 405/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU
PROCESSO nº 01400.027776/2024-11
INTERESSADA: Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural
ASSUNTO: Termo de compromisso de incentivo.
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. FOMENTO À CULTURA. FOMENTO INDIRETO. I - Minuta de Termo de Compromisso de Incentivo. II - Inteligência do art. 24 da Instrução Normativa MinC nº 11/2024. Natureza de acordo de adesão com amparo no art. 48 do Decreto nº 11.453/2023 e no art. 184 da Lei nº 14.133/2021. III - Parecer favorável, com recomendações.
Sra. Consultora Jurídica,
Por meio da Nota Técnica nº 15/2024 (SEI nº 1994030), o Secretário de Economia Criativa e Fomento Cultural (SEFIC) solicita análise e manifestação sobre minuta de termo de compromisso de incentivo a ser celebrado entre o Ministério da Cultura e a Shell Brasil Petróleo Ltda, na condição de empresa patrocinadora de projetos culturais.
A parceria tem por objeto "a realização de edital de patrocínio cultural para atender às regiões brasileiras NORTE, NORDESTE e CENTRO-OESTE, com investimento total de R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais), que deverão ser aportados pela EMPRESA PATROCINADORA diretamente aos projetos, caso atendam os critérios estabelecidos nos termos do edital, com a finalidade de promover ações culturais em territórios que apresentam vulnerabilidades sociais, utilizando o mecanismo Incentivo a Projetos Culturais previsto na Lei n.º 8.313/1991 (Lei Rouanet), de acordo com o art. 48 do Decreto nº 11.453/2023 e os arts. 24, 25 e 26 da Instrução Normativa MinC nº 11/2024".
Para o que interessa à presente análise, constam dos autos: a minuta de "Termo de Compromisso de Incentivo" (Sei nº 1993981) e a referida Nota Técnica nº 15/2024 (SEI nº 1994030), da Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural, que fornece a fundamentação técnica e a motivação do ato.
É o relatório. Passo à análise.
A presente manifestação se dá com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73/1993 e nos termos do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União.
O instrumento em exame respalda-se no art. 48, caput e § 1º, do Decreto nº 11.453/2023. Referido decreto estabeleceu um novo marco para a gestão dos mecanismos federais de financiamento à cultura, e uma de suas inovações diz respeito à possibilidade de que o Ministério da Cultura selecione, mediante chamamento público, ações culturais a serem financiadas pelo mecanismo de Incentivo Fiscal, conforme dispõe o citado art. 48, mencionado na Nota Técnica nº 15/2024. Conforme estabelecido no § 1º do referido artigo, a empresa patrocinadora interessada em aderir a chamamento público promovido pelo Ministério da Cultura informará, previamente, o volume de recursos que pretende investir e a sua área de interesse, observados o montante e a distribuição dos recursos estabelecidos pelo Ministério da Cultura.
Para o cumprimento do art. 48 do Decreto nº 11.453/2023, a Instrução Normativa MinC nº 11/2024 prevê em seu art. 24, que o Ministério da Cultura estabelecerá linhas específicas de recursos de incentivo fiscal para seleção de projetos culturais com base nos recortes de ações afirmativas estabelecidos no art. 50 do decreto. Para assegurar a disponibilidade de tais recursos incentivados, o § 2º do art. 24 da IN dispõe que o MinC poderá realizar a busca ativa de possíveis empresas incentivadoras, com as quais firmará Termo de Compromisso de Incentivo.
Segundo o art. 50 do Decreto nº 11.453/2023, as ações afirmativas executadas neste mecanismo devem estimular a ampliação de investimento nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, em projetos de impacto social relevante, conforme ato da Ministra de Estado da Cultura. No caso em tela, conforme os critérios e procedimentos dos arts. 24, 25 e 26 da IN MinC nº 11/2024.
A Nota Técnica nº 15/2024 (SEI nº 1994030) informa que a SEFIC iniciou tratativas com a empresa Shell Brasil Petróleo Ltda, que demonstrou interesse em atuar de forma articulada com o MinC para promover ações culturais em territórios que apresentam vulnerabilidades sociais, utilizando o mecanismo do Incentivo a Projetos Culturais. A partir de tais entendimentos, entendeu a SEFIC ser viável e oportuno o lançamento desta linha de recursos incentivados para contemplar projetos culturais nas regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste, resultando na proposta do Termo de Compromisso de Incentivo ora em exame, com o objetivo de permitir a realização de investimentos nessas regiões pela empresa patrocinadora parícipe no instrumento, após a realização da seleção de projetos pelo MinC.
O instrumento instrumento terá como partes, de um lado, a União, representada pelo Ministério da Cultura e, de outro, a empresa Shell Brasil Petróleo Ltda, na condição de compromissária patrocinadora.
Observa-se que o instrumento pretendido não prevê a transferência de recursos entre as partes, o que afasta a aplicação da Portaria Interministerial n° 424/2016, que dispõe sobre instrumentos de repasse celebrados por órgãos e entidades da administração pública para a execução de programas, projetos e atividades de interesse recíproco. Com relação ao Decreto nº 11.531/2023, verifica-se que, além de não se aplicar o regime jurídico de instrumentos de repasse, também não se aplica ao presente caso o regime jurídico de parcerias sem transferências previsto nos arts. 24 e 25 do decreto, visto que a celebração de acordos de cooperação técnica e de acordos de adesão só é admitida entre órgãos e entidades da administração pública, ou com serviços sociais autônomos ou consórcios públicos.
O instrumento em exame, portanto, deriva diretamente do art. 48, § 1º, do Decreto nº 11.453/2023, e tem natureza estrita de acordo de adesão a chamamento público instituído pelo Ministério da Cultura, com o respaldo do art. 184 da Lei nº 14.133/2021, que, na ausência de norma específica, autoriza o Poder Executivo a regulamentar instrumentos congêneres de contratos e convênios, desde que não contrariem a referida lei nem impeçam sua aplicação subsidiária onde cabível.
Nesse sentido, aplica-se ao caso em tela, no que for compatível, o disposto no art. 92 da Lei nº 14.133, de 2021, que estabelece as cláusulas necessárias aos instrumentos celebrados pela administração, descartando-se desde já, por incompatíveis, os requisitos relativos a transferência de recursos financeiros, já que o instrumento em exame não é oneroso. Isto posto, verifica-se que a minuta apresentada atende aos referidos requisitos, assim elencados no referido artigo:
Art. 92. (...)
I - o objeto e seus elementos característicos;
(...)
III - a legislação aplicável à execução do contrato, inclusive quanto aos casos omissos;
(...)
XIV - os direitos e as responsabilidades das partes, as penalidades cabíveis e os valores das multas e suas bases de cálculo;
(...)
XIX - os casos de extinção.
§ 1º Os contratos celebrados pela Administração Pública com pessoas físicas ou jurídicas, inclusive as domiciliadas no exterior, deverão conter cláusula que declare competente o foro da sede da Administração para dirimir qualquer questão contratual (...).
(...)
Passando à análise do conteúdo das cláusulas da minuta (SEI/MinC nº 1993981), observo a necessidade de renumerar o inciso III da cláusula terceira (sobre responsabilidades conjuntas das partes), erroneamente grafado como inciso II. Além disso, é necessário que as alíneas "a", "b" e "c" desse inciso III sejam transpostas para o inciso I da cláusula, uma vez que consistem em atribuições exclusivas do Ministério da Cultura, não compartilháveis com o partícipe privado. Em se tratando de instrumento com natureza de acordo de adesão a chamamento público, amparado no art. 48 do Decreto nº 11.453/2023, a definição das regras do edital consiste em formulação de ação pública vinculada a política pública ministerial.
Portanto, compete exclusivamente ao Ministério da Cultura a definição dos critérios de participação, de segmentação, de regionalização e de descentralização de recursos que serão estabelecido no edital para aporte nos projetos, tendo em vista tratar-se de sua competência exclusiva o desenho da política afirmativa que se utilizará do mecanismo de incentivos fiscais. Certamente, o ministério pode ouvir a empresa patrocinadora a fim de viabilizar o melhor desenho institucional ao instrumento, e eventuais verificações de adequação dos contemplados às regras de compliance da empresa patrocinadora estão ao alcance da parte privada do acordo, visto que o patrocínio será realizado com recursos incentivados provenientes da empresa. No entanto, estas verificações não interferem na governança pública do ministério sobre a política pública, devendo ser feita a posteriori, quando da seleção dos projetos, podendo resultar em desclassificação de propostas ou projetos.
Na cláusula quinta, verifica-se a necessidade de supressão da alínea "b" e ajuste na redação da alínea "a" da subcláusula quinta, tendo em vista que não haverá hipótese alguma de sublicenciamento de direitos de uso de marca da empresa patrocinadora a terceiros. Recomenda-se a seguinte redação, unificada ao texto do caput da subcláusula:
Subcláusula quinta. Sujeito aos termos deste Termo de Compromisso, a EMPRESA PATROCINADORA concede ao Ministério da Cultura, durante o prazo de vigência deste instrumento, uma licença não exclusiva, intransferível, isenta de royalties e revogável para reproduzir, usar, exibir e aplicar as Marcas da EMPRESA PATROCINADORA, sendo vedado ao Ministério da Cultura sublicenciar os direitos referidos nesta subcláusula.
Ainda no que tange ao uso e marcas da empresa patrocinadora, verifica-se que o texto da subcláusula sexta encontra-se em contradição com a própria subcláusula quinta, pois veda por completo a possibilidade de qualquer uso, inclusive para o fins do termo de compromisso. Para corrigir este equívoco, recomenda-se a seguinte redação:
Subcláusula sexta. O Ministério da Cultura não deve usar as Marcas da EMPRESA PATROCINADORA (ou quaisquer Direitos de Propriedade Intelectual relacionados a elas) para quaisquer fins diversos dos previstos nesta cláusula e nas subcláusulas primeira e segunda. Eventuais usos não previstos neste Termo de Compromisso, em qualquer meio ou forma, estão sujeitos ao consentimento prévio por escrito da EMPRESA PATROCINADORA, a critério exclusivo e absoluto da EMPRESA PATROCINADORA, desde que em conformidade com as Diretrizes de Marca e Marketing da EMPRESA PATROCINADORA.
Com a redação sugerida para a subcláusula sexta, perde o sentido a subcláusula sétima, que deverá ser suprimida do instrumento.
Ainda na cláusula quinta, no que tange à subcláusula oitava, é necessário esclarecer o que significa a sigla SBI e, se for o caso, suprimir esta referência do texto, já que o ajuste é celebrado com a empresa patrocinadora, e não com outras empresas do grupo econômico. O mesmo se aplica à subcláusula nona, já que não é possível prever quaisquer repasses da administração à empresa ou a terceiros com base no termo de compromisso em exame.
A subcláusula décima sétima da cláusula quinta deve ser suprimida, visto que não cabe ao Ministério da Cultura, com base simplesmente no presente termo de compromisso, assumir obrigações de promover ou proteger a marca da empresa parceira além do estritos usos destinados às finalidades da parceria e condições nela estabelecidas.
Ainda na cláusula quinta, tendo em vista que a subcláusula quinta não permitirá o sublicenciamento das marcas da empresa patrocinadora pelo Ministério da Cultura, deve ser suprimida a subcláusula vigésima primeira.
Na subcláusula segunda da cláusula nona (sobre recisão), recomenda-se acrescentar a seguinte locução ao final do parágrafo: "observadas ainda as eventuais sanções aplicáveis pelo Ministério da Cultura a proponentes e patrocinadores, conjunta ou isoladamente, conforme suas responsabilidades, nos termos da Instrução Normativa MinC nº 11/2024".
Na cláusula décima, observo que a publicação em diário oficial pode ser substituída pela divulgação do instrumento no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), no prazo de 10 dias úteis a partir de sua assinatura, conforme disposto no art. 94, inciso II, da Lei 14.133/2021. A falta desta publicidade pode acarretar nulidade da parceria.
Na cláusula décima segunda, deve ser suprimida a expressão "por analogia".
Na cláusula décima terceira, deve ser suprimida a subcláusula quinta, sem prejuízo de sua validade em relação a quaisquer atos ou fatos que ocorram durante a vigência do instrumento, ainda que seus efeitos ultrapassem tal vigência.
Quanto à competência da autoridade signatária por parte deste Ministério, nota-se que foi adequadamente indicada na minuta, observado o disposto no art. 5º da Portaria MinC nº 18/2023, que atribui ao titular da SEFIC a competência para celebração de instrumentos congêneres de contratos e parcerias no âmbito de sua unidade administrativa. Não é necessária, contudo, a transcrição no preâmbulo do instrumento de dados pessoais relativos aos números de documentos pessoais (RG e CPF) das pessoas físicas representante de ambos o partícipes, sendo suficiente a indicação dos dados correspondentes das respectivas pessoas jurídicas. Tal recomendação se dá para adequação às exigências da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais - LGPD - em atendimento às orientações do Parecer nº 4/2022/CNMLC/CGU/AGU[1], da Câmara Nacional de Modelos de Licitação e Contratos Administrativos da Advocacia-Geral da União, complementado pelo Parecer nº 1/2024/CNCIC/CGU/AGU[2], da Câmara Nacional de Convênios e Instrumentos Congêneres.
Diante do exposto, ressalvados os aspectos técnicos e de conveniência e oportunidade na efetivação do ajuste, não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, cumpre opinar pela possibilidade de prosseguimento dos trâmites, observadas as recomendações contidas nos §§ 14 a 26 do presente parecer.
À consideração superior, com recomendação de retorno dos autos à Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural, para as providências cabíveis.
Brasília, 12 de novembro de 2024.
OSIRIS VARGAS PELLANDA Advogado da União Coordenador-Geral Jurídico de Políticas Culturais |
FERNANDA DE OLIVEIRA SILVA Estagiária de Pós-Graduação
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Chave de acesso ao Processo: de108b85 - https://supersapiens.agu.gov.br
Notas