ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE


 

DESPACHO DE APROVAÇÃO n. 00265/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 72031.004958/2021-56

INTERESSADOS: MINISTÉRIO DA CULTURA GABINETE DA MINISTRA GM/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

De acordo com o Parecer nº 394/2024/CONJUR-MinC/CGU/AGU, aprovado pelo DESPACHO nº 1281/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU, complementado com as considerações que seguem.

 

Nos termos do art. 25 da Lei n.º 12.846, de 2014 (Lei Anticorrpção), prescrevem em 5 (cinco) anos as infrações nela previstas, contados da data da ciência da infração ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.

 

Quanto à autoridade cuja ciência dos fatos é aptar para deflagrar a contagem do prazo prescricional supramencionado, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro e Thiago Marrara (na obra Lei Anticorrupção Comentada), "não é imprescindível que a autoridade a conhecer em primeiro momento da infração seja a competente para instauração do procedimento. Deve, porém, ter mínimos poderes decisórios ou, ao menos, atribuições legais para encaminhar ao conhecimento da autoridade competente os fatos, para que esta possa fazer a apreciação adequada e decidir pela instauração de processo administrativo."

 

Igualemente sobre o tema, reproduzo o que consta no Manual de PAR da Controladoria-Geral da União (CGU), disponível em https://repositorio.cgu.gov.br/handle/1/68182:

 

(...) Como havíamos adiantado no tópico anterior, perceba que a Lei 12.846/2013 distingue dois inícios diferentes para esse prazo de 5 anos: se a infração for instantânea, o prazo se iniciará somente quando houver ciência dessa infração. Mas se a infração for permanente ou continuada, o prazo se iniciará somente quando essa infração se encerrar.
Mas esse artigo traz um problema: ele diz apenas “ciência da infração”, mas não define quem deve tomar ciência da infração. Ou seja, ele não definiu completamente os termos do prazo prescricional. Problema semelhante existe na prescrição da Lei nº 8.112/1990 (estatuto dos servidores federais), pois ela também determina que a prescrição se inicia de quando o fato “tornou-se conhecido” – mas sem especificar por quem o fato deve se tornar conhecido para que o prazo se inicie.
Existe amplo debate doutrinário sobre quem é o sujeito que deve tomar ciência da infração e ainda não existe uma posição unânime, ou mesmo razoavelmente pacífica, sobre o tema. Portanto, recomendamos, por cautela, que se utilize o critério de que qualquer agente público que tome ciência institucional de infração da Lei nº 12.846/2013 provoca o início do respectivo prazo prescricional. O fundamento desta posição está em que, apesar das diversas e complexas divisões internas da Administração pública, ela se apresenta como uma só para o cidadão, pois a Administração nada mais é do que a corporificação do Estado. Portanto, entendemos que, se um agente da Administração pública toma ciência de uma infração, ainda que ele não tenha competência para apurá-la, a informação da infração já chegou a um agente estatal e, portanto, já chegou ao Estado. Se o agente em questão não tiver competência para apuração, incumbe-lhe, por dever funcional, encaminhar para a autoridade competente. (grifamos)

 

Mais especificamente relacionado ao caso dos autos, registra-se que a Nota Técnica nº 1595/2019/CGUNE/CRG, aprovada pelo Corregedor-Geral da União, em 30 de agosto de 2019, e citada no Ementário de Notas Técnicas: Uniformização de entendimentos da Corregedoria-Geral da União, 1ª ed, 2024, consignou o seguinte entendimento:

 

4.1 Portanto, diante de todo o exposto, pode-se concluir que a fluência do prazo prescricional para apuração de irregularidades envolvendo agentes públicos e entes privados de órgãos e entidades da Administração Pública federal, as quais foram reveladas através de Operação Policial com participação de auditores ou conhecimento prévio de autoridade da Controladoria-Geral da União, deve ser contada:
(i) a partir da ciência da autoridade designada pelo normativo do órgão ou entidade federal como a competente para proceder à apuração, quando ela ficar a cargo do órgão ou entidade em que esses fatos ocorreram, conforme entendimento exposto pela COAC e transcrito no item 3.3;
(ii) no caso de exercício de competência correcional concorrente pela Controladoria-Geral da União, a partir da ciência da irregularidade pela autoridade competente - o Corregedor-Geral da União, a quem compete o exercício da competência delegada pelo Ministro para apuração de irregularidades envolvendo agentes públicos e entes privados no âmbito da Administração Pública federal; nesse sentido, a ciência dos fatos pelo Superintendente Regional da CGU não tem o condão de iniciar o prazo prescricional, já que atualmente tal autoridade não detém qualquer parcela do exercício de competência correcional; caso os fatos apurados envolvam servidores da Controladoria, deve-se observar a competência estabelecida na Portaria nº.1.286, de 10 de abril de 2019, a qual fixa a competência para instauração e julgamento de sindicâncias e processos administrativos disciplinares no âmbito da Controladoria-Geral da União;
(iii) excepcionalmente, quando houver motivo relevante para avocação temporária da competência atribuída ao Corregedor, a ciência do Ministro de Estado da CGU deflagrará o início do prazo prescricional para apuração dos fatos;
(iv) e, por fim, nas hipóteses de deflagração sigilosa da Operação Especial, o prazo somente começará a correr a partir da ciência dos fatos pela autoridade competente a partir da autorização de acesso franqueada pelo Poder Judiciário ou pela publicização dos fatos para o público em geral, conforme alertado pela COAC e transcrito no item 3.4.

 

Assim, dos entendimentos acima esposados, verifica-se as seguintes possilidades fixação do dies a quo do prazo prescricional:

 

a) a partir do conhecimento dos fatos por agente público que detenha mínimos poderes decisórios ou, ao menos, atribuições legais para encaminhar ao conhecimento da autoridade competente os fatos para que esta possa fazer a apreciação adequada e decidir pela instauração de processo administrativo;
 
b) a partir da ciência por qualquer agente público que tome ciência institucional de infração da Lei nº 12.846/2013;
 
c) nos casos de operações policiais, a partir da ciência da autoridade designada pelo normativo do órgão ou entidade federal como a competente para proceder à apuração, quando ela ficar a cargo do órgão ou entidade em que esses fatos ocorreram.

 

Partindo para o caso concreto, cumpre destacar que restou concluído no Relatório nº 6/2024/COREG/GM/MinC (SEI 1613622) no que toca à prescrição punitiva neste PAR:

 

A Defesa junta alguns trechos de outros PARs, julgados pela CGU, alega que o prazo prescricional deve ser contado a partir do "envio da prestação de contas" - essa Comissão diverge desse entendimento por uma razão óbvia, vejamos. No momento em que a proponente entrega a prestação de contas, a Administração ainda não aferiu sua conduta, qual seja, se está ou não de acordo com o objeto contratado no PRONAC, ademais, o processo de prestação de contas pode ter idas e vindas, inclusive com a chance de se impugnar a primeira decisão por meio de recurso administrativo. Desse modo, a relação jurídica só se conclui após a última decisão da Administração, está sim, capaz de indicar se houve ou não regularidade formal e material do projeto cultural. Afasta-se, desse modo, a tese defensiva, por definir um momento processual estranho à finalização do processo de prestação de contas junto à Administração. Assim, o prazo a ser utilizado, que garante a segurança jurídica para os administrados só pode ser a partir do ato decisório final, da Administração, sobre o projeto.
Seguindo o raciocínio acima, ao tratar do prazo prescricional previsto pela LAC (art. 25, da Lei nº 12.846/13), a Defesa retorna à tese que o prazo prescricional teria início no ato da prestação de contas pela proponente o que aconteceu em 1º de junho de 2016, o que como demonstrado no parágrafo anterior, não se sustenta. Afirmar que os fatos são conhecidos pela Administração desde 28 de junho de 2016, ou seja, com a deflagração da Operação Policial, também não se coaduna com a realidade, assim como a inabilitação, esses atos são atos preparatórios, cautelares, que não indicam mas apenas sugerem uma irregularidade, que por sua vez está em apuração. Para estabelecimento da data da ciência, a defesa se utiliza do Painel de Correição e Dados, da CGU.  O fato, é que a ciência da infração é diverso da data em que efetivamente cessou a infração continuada, observando as duas hipóteses previstas no art. 25, caput, da LAC.
Ainda em relação à data de ciência dos fatos, alega o defendente que o Ministério da Cultura, no âmbito do PRONAC 137643, o Parecer de Avaliação Técnica n. 11/2014, conclui que a execução teria sido irregular e recomendou o envio dos autos aos órgãos de controle para aferição de suposto enriquecimento ilícito. Conforme a própria defesa reconhece, não há nesse momento o reconhecimento individualizado das condutas de cada proponente ou patrocinador, pois conforme a evolução das investigações isso foi feito de forma gradual, sendo na seara administrativa, conforme já informado, a data do julgamento final da prestação de contas da proponente. Entende-se que até essa data poderiam ter sido afastada as irregularidades, ou seja, até lá não haveria a justa causa para proposição do presente processo. 
Quanto aos marcos iniciais levantados pela defesa, em relação à prescrição prevista na LAC, temos a observar: Inabilitação Cautelar dos dois PRONACs, aqui tratados, não teriam o condão para dar justa causa ao procedimento acusatório na esfera administrativa. Quando da inabilitação cautelar o que se tem são meros indícios de condutas contrárias ao direito, para evitar sua continuidade as empresas que faziam parte do Grupo Belline Cultural tiveram seus projetos suspensos por meio da inabilitação cautelar, foi na esteira desses atos que se pode ao fim das investigações levadas à cabo pela Polícia Federal, detectar o modus operandi das empresas desse grupo junto às patrocinadoras. A deflagração das Operações da Polícia Federal (primeira e segunda fase) tiveram como objetivo levantar a partir das evidências, provas necessárias para a propositura das ações acusatórias. Estamos, ainda, aqui na fase de inquéritos. Ocorre, que essa Comissão, conforme explicitado no termo de indiciamento, contou como prazo inicial o indeferimento da última prestação de contas, uma vez que trata os crimes da Operação Boca Livre, como crimes continuados. 
No quesito "Capitulação Genérica da Conduta", essa Comissão entende razão parcial devendo ser afastado o inciso II do art. 5º, uma vez que não se enquadra na conduta da empresa. 
(...)
Não reconhecer a ocorrência da prescrição, mantendo como data inicial para contagem do prazo a decisão em Recurso Administrativo, que não aprova as contas, ocorrida em 23/10/2017.
 

Inicialmente, entende-se ser necessário para a início da contagem do prazo prescricional haver indícios concretos da prática de uma conduta ilícita (materialidade), não merecendo trânsito a tese defensiva no sentido de que o Parecer de Avaliação Técnica n. 11/2014, a decisão de Inabilitação Cautelar dos PRONACs ou a deflagração da Operação Policial seriam marcos temporais aptos a dar início do referido prazo.

 

Isto porque tratam-se de meros atos atos preparatórios, cautelares, que não indicam, mas apenas sugerem uma irregularidade, que, por sua vez, está em apuração e, até decisão final, pode ser completamente afastada.

 

Além disso, admite-se, por  consubstanciarem entendimentos mais razoáveis, a tese de que a notícia da irregularidade - uma vez adequadaente identificada e com materialidade reconhecida - precisa chegar a alguma autoridade com o mínimo de competência para levar a notícia às instâncias apuradoras. No caso destes autos, a autoridade precisaria ter o mínimo de competência para levar notícia à Corregedoria do Ministério da Cultura, o que claramente não é o caso do agente público signatário do Parecer de Avaliação Técnica n. 11/2014.

 

A guisa de exemplo, se a notícia de fato relativo a uma fraude a licitação chegar, por exemplo, ao setor de arquitetura do Ministério, o arquiteto que leu a história não pode ser considerado como responsável por apurá-la, principalmente se há evidente dificuldade dele perceber que ali existiu um fato ilícito. Por isso que cada caso é um caso e como regra geral, prestações de contas que concluem (ou não) por um fato ilícito não podem ser termo a quo de prazo prescricional.

 

De outro modo, se uma auditoria é feita e aponta possível ocorrência de ilícitos, não basta essa auditoria ser assinada, ela tem que chegar às mãos do órgão que deve apurar o fato ilícito e chegar às mãos de algum servidor com o mínimo de discernimento para perceber que aquilo merece apuração. Ou seja, não basta a auditoria, não basta o envio, tem que chegar às mãos de alguma autoridade com responsabilidade sobre o encaminhamento para apuração.

 

De outro lado, igualmente não merece trânsito parte do entendimento exarado no PARECER n. 00394/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU no sentido de que

 

Nesse norte, no que tange às questões relativas à prescrição, ressalte-se que o presente Processo Administrativo de Responsabilização (PAR) foi objeto de Notas Técnicas da Controladoria-Geral da União - CGU (Nota técnica nº 668/2020/COREP-ACESSO RESTRITO/COREP/CRG e Nota Técnica nº 2590/2020/COREP - ACESSO RESTRITO/COREP/CRG), das quais se originou a recomendação para a instauração do presente PAR com dados objetivos quanto aos pontos questionados nos autos.
Consoante se extrai da Nota Técnica nº 668/2020/COREP-ACESSO RESTRITO/COREP/CRG, o processo fora autuado a partir de notícia datada de 13/12/2018, constando da referida Nota Técnica as seguintes informações:
​(...)
repara-se indene de dúvidas que a ciência dos fatos pela autoridade competente para instaurar o devido Processo Administrativo de Responsabilização se deu a partir da notícia datada de 13/12/2018. Vê-se ainda que a reprovação da Prestação de Contas do Pronac em tela restou fundamentada na Lei nº 8.313/1991, porém, o indiciamento nos autos não tratou de ilícitos previstos na referida Lei Rouanet, mas, sim de ilícitos previstos na Lei Anticorrupção. Nesse contexto, diante do afastamento das regras sobre a prescrição na legislação específica (Lei nº 8.313/1991), deve ser utilizada a Lei nº 9.873/1999 que regula justamente o exercício da ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, ou a própria Lei Anticorrupção.  

 

Outrossim, na linha da denúncia recebida pela MM. Juíza, adotando-se a ocorrência de infração administrativa continuada – quando a empresa infratora, guiada pela mesma unidade de propósito, mediante pluralidade de condutas, realizar uma série de atos lesivos à administração, atos da mesma espécie, guardando entre si um elo de continuidade –, pode-se apontar que a cessação dos atos lesivos ocorreu em 01/06/2016.

 

Destaca-se que o fato ensejador do indiciamento é o abaixo reproduzido (registrado no RELATÓRIO FINAL - PAR (SEI 1613622), a saber:

 

Na contramão dos objetivos fixados nos referidos projetos culturais as pessoas jurídicas contrataram um show de comemoração de 50 anos da CIPATEX, aproveitando a festa da cidade. Deste modo, conforme a documentação apreendida em busca e apreensão foi possível constatar, a partir do "CONTRATO DE PARCERIA" tendo como parceiras a empresa CIPATEX SINTÉTICO VINÍLICOS LTDA e a PREFEITURA MUNICIPAL DE CERQUILHO, o referido contrato teria validade nas festividades de 65 anos do Município que coincidia com o aniversário de 50 anos da empresa CIPATEX.

 

Esta irregularidade foi identificada e entendida como ocorrida, de forma definitiva no âmbito administrativo, por ocasião do indeferimento do recurso administrativo pela Ministra de Estado da Cultura, apresentado em face da reprovação da prestação de contas, cuja nota técnica que deu subsídio trouxe as seguintes informações (Nota Técnica nº 269/2016 — COFPC/CGAAV/DIC/SEFIC-MinCAs), vide:

 

 

 

 

 

Deste modo, salvo melhor juízo, inegável que, no momento processual em que houve reprovação das contas em ato realizado pela Ministra de Estado, já havia ciência dos fatos ilíticos ensejadores de PAR pela Administração (descritos na nota técnica subsidiadora do ato), em caráter dotado de materialidade e definitividade suficientes para início da contagem de prazo prescricional, sendo inadequada a adoção de data posterior, a despeito da capitulação legal utilizada para enquadrar a infração administrativa no momento da reprovação definitiva das contas.

 

Encaminhem-se à Corregedoria.

 

Brasília, 25 de novembro de 2024.

 

 

KIZZY COLLARES ANTUNES

Advogada da União

CONSULTORA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA

 

 


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