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CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA GESTÃO E DA INOVAÇÃO EM SERVIÇOS PÚBLICOS
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INFORMAÇÃO JURÍDICA REFERENCIAL n. 00002/2025/CONJUR-MGI/CGU/AGU

 

NUP: 90849.014079/2024-52

INTERESSADOS: MINISTÉRIO DA GESTÃO E INOVAÇÃO EM SERVIÇOS PÚBLICO

ASSUNTOS: CONCURSO PÚBLICO

 

INFORMAÇÃO JURÍDICA REFERENCIAL (IJR). CONCURSO PÚBLICO NACIONAL UNIFICADO (CPNU). PROCEDIMENTO DE HETEROIDENTIFICAÇÃO. NOVA CONVOCAÇÃO. NULIDADE DO RESULTADO DA BANCA DE HETEROIDENTIFICAÇÃO. MANUTENÇÃO DO CANDIDATO NAS VAGAS RESERVADAS.
 
1 - Esta IJR padroniza a prestação de subsídios para a defesa da União ou de autoridade pública em casos de ações com pedidos de: a) nova convocação para procedimento de heteroidentificação; b) nulidade do resultado da banca de heteroidentificação e manutenção do candidato nas vagas reservadas.
 
2 - Os órgãos de execução da PGU ficam dispensados de encaminhar pedidos de subsídios quando constatarem a identidade entre o processo e esta IJR.
 
3 - A matéria fática ou jurídica não tratada nesta IJR será objeto de solicitação específica que delimite o ponto a ser abordado.
 
4 - Esta IJR terá prazo de validade de dois anos partir de sua aprovação.
 
Processo nº 90849.014079/2024-52

 

I - RELATÓRIO.

 

Trata-se de Informação Jurídica Referencial (IJR) a ser elaborada em razão do alto volume de ações com pedidos de: a) nova convocação para procedimento de heteroidentificação; b) nulidade do resultado da banca de heteroidentificação e manutenção do candidato nas vagas reservadas.

 

Os argumentos normalmente utilizados são: a) o candidato realizou inscrição no Concurso Público Público Unificado nas vagas reservadas de cotas para negros/pardos, conforme a lei e o edital do certame; b) ao longo da vida, alegam que sempre foram considerados como pessoa negra/parda; c) falta de fundamentação para o indeferimento do enquadramento do candidato na condição de negro/pardo, mesmo apresentado devidamente o seu recurso na forma prevista em edital; d) não comparecimento para o procedimento de heteroidentificação, na forma prevista em edital.

 

II - DO CABIMENTO DE IJR

 

A Portaria Normativa CGU/AGU nº. 5, de 31 de março de 2022, instituiu e disciplinou a utilização de IJR:

 

PORTARIA NORMATIVA CGU/AGU nº 05, de 31 de março de 2022
 

Art. 1º Esta Portaria disciplina a utilização de Manifestação Jurídica Referencial (MJR), prevista na Orientação Normativa AGU nº 55, de 2014, e institui e disciplina a Informação Jurídica Referencial (IJR).

(...)

§ 2º São órgãos de execução da Consultoria-Geral da União com competência para emitir IJR: as Consultorias e Assessorias Jurídicas junto aos órgãos da Administração Direta no Distrito Federal.

(...)

Art. 8º Informação Jurídica Referencial é a manifestação jurídica produzida para padronizar a prestação de subsídios para a defesa da União ou de autoridade pública.

§ 1º A IJR objetiva otimizar a tramitação dos pedidos e a prestação de subsídios no âmbito das Consultorias e Assessorias Jurídicas da Administração Direta no Distrito Federal, a partir da fixação de tese jurídica que possa ser utilizada uniformemente pelos órgãos de execução da Procuradoria-Geral da União.

§ 2º É requisito para a elaboração da IJR a efetiva ou potencial existência de pedido de subsídios de matéria idêntica e recorrente, que possa justificadamente impactar na atuação do órgão consultivo ou a celeridade dos serviços administrativos.

 

Trata-se de hipótese em que a Conjur/MGI, órgão competente para a emissão de IJR, elabora uma peça na qual analisa todas as questões jurídicas que envolvam matéria idêntica e recorrente, com vistas a padronizar a prestação de subsídios para a defesa da União ou de autoridade pública. Deste modo, evita-se a desnecessária análise individualizada de processos com idêntica matéria.

 

O alto volume de pedidos de subsídio e a elevada probabilidade de chegada de inúmeros novos pedidos relativos sempre à mesma matéria idêntica e recorrente (nova convocação para heteroidentificação e nulidade do resultado do procedimento de heteroidentificação e reserva de vaga) impactam na atuação desta Conjur/MGI e da área técnica.

 

Em sendo aprovada esta IJR pela autoridade titular desta unidade consultiva, deverá ser observado o art. 12 da PORTARIA NORMATIVA CGU/AGU nº 05, de 31 de março de 2022:

 

Art. 12. A unidade consultiva dará ciência da IJR aos órgãos de execução da Procuradoria-Geral da União, os quais deverão deixar de encaminhar pedidos de subsídios quando constatarem a identidade entre o processo e a IJR.

§ 1º O pedido de subsídios que aborde matéria fática ou jurídica não tratada na IJR será objeto de solicitação específica que delimite o ponto a ser abordado.

§ 2º Caso receba pedido de subsídios em matéria idêntica à que motivou a expedição de IJR, a unidade consultiva poderá devolver a tarefa mediante cota ou despacho, instruída com cópia da IJR e orientações gerais sobre sua utilização.

Considerando se tratar de matéria repetitiva, da qual a unidade de gestão do CPNU já se manifestou inúmeras vezes, desnecessário o encaminhamento de pedido de subsídio de fato à área técnica, ressalvada a necessidade de vir aos autos a Nota Informativa SEI nº 37241/2024/MGI (seq. 6 - NUP: 14022.074180/2024-06).

 

III - INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL

 

Há inúmeros mandados de segurança em que a autoridade coatora não é indicada, o que revela afronta ao disposto no art. 6º da Lei nº 12.016, de 2009, que disciplina o mandado de segurança, e que estabelece expressamente que "a petição inicial (...)  indicará, além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições."

 

Aplicáveis, portanto, os precedentes abaixo nos quais o STJ e o STF determinaram a extinção feito em razão da inépcia da inicial:

 
STJ 
 
MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL CIVIL. ATO DE OUTRO TRIBUNAL. SÚMULA 41/STJ. INCOMPETÊNCIA DO STJ. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO JUDICIAL DA QUAL CABE RECURSO COM EFEITO SUSPENSIVO. DESCABIMENTO. ART. 5º, II, DA LEI 12.016/2009. SÚMULA 267/STF. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO POLO PASSIVO DA AÇÃO. INÉPCIA. FALTA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. ARTS. 10 DA LEI 12.016/2009 E 485, IV, DOCPC/2015. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
(...)
6. Por fim, não consta da petição inicial do mandamus a indicação da autoridade apontada como coatora, restringido-se a impetrante a narrar o objetivo da impetração. Além de manifestamente inepta, por falta de polo passivo, carece de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, devendo a inicial desde logo ser indeferida, com fulcro no art. 10 da Lei 12.016/2009 c/c art. 485, IV, do CPC/2015.
7. Mandado de Segurança extinto, sem resolução do mérito.
(MS n. 23.850/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 13/12/2017, DJe de 20/11/2018.)
 
STF
 
Ementa: Direito administrativo. Agravo regimental em mandado de segurança. Impetração contra decisão de ministro do Supremo Tribunal Federal e contra ato atribuído à câmara de direito privado do tribunal de justiça do estado de são paulo. Inépcia da petição inicial. Decadência da impetração. Incompetência do Supremo Tribunal Federal. Ausência de demonstração de teratologia, ilegalidade ou abuso de poder. Agravo regimental a que se nega provimento.
(...)
3. Há inépcia da petição inicial de mandado de segurança, quando esta não vem acompanhada da documentação necessária ao exame da causa de pedir, nem aponta, com precisão, quais atos teriam sido praticados pela autoridade impetrada ou qual fundamento embasa concretamente o mandado de segurança. Inteligência do art. 6º, da Lei n. 12.016/2009 combinado com art. 319 do Código de Processo Civil.
(...)
(MS 39944 AgR, Relator(a): CRISTIANO ZANIN, Tribunal Pleno, julgado em 06-11-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 13-11-2024  PUBLIC 14-11-2024)

 

Nesse contexto, pede-se a extinção do feito sem resolução do mérito nos termos do art. 10 da Lei nº 12.016, de 2009, c/c art. 485, IV, do CPC.

 

IV - INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA PARA PROCESSAR E JULGAR MANDADO DE SEGURANÇA. EXTINÇÃO DO FEITO

 

Em caso de impetração de mandado de segurança perante os Tribunais de Justiça dos estados e do Distrito Federal e em outros casos de incompetência absoluta para processar e julgar mandado de segurança, deve o processo ser extinto sem resolução do mérito, conforme jurisprudência do STJ:

 
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. SECRETÁRIO DE ESTADO. LEGITIMIDADE. AUSÊNCIA. EMENDA DA INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA JURISDICIONAL. ALTERAÇÃO. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
(...)
3. "A jurisprudência deste STJ compreende não ser possível autorizar a emenda da inicial para correção da autoridade indicada como coatora nas hipóteses em que tal modificação implica em alteração de competência jurisdicional. Isso porque compete originariamente ao Tribunal de Justiça Estadual o julgamento de mandado de segurança contra Secretário de Estado, prerrogativa de foro não extensível ao servidor responsável pelo lançamento tributário" (AgInt no RMS 54.535/RJ, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 26.9.2018).
(...)
(AgInt no REsp n. 2.120.640/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 24/6/2024, DJe de 28/6/2024.)
 
TRIBUTÁRIO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. FORNECIMENTO DE COMBUSTÍVEL DE AVIAÇÃO A REVENDEDOR ATACADISTA/DISTRIBUIDOR. OBRIGATORIEDADE DE RECOLHIMENTO DE ICMS-ST. AUTO DE INFRAÇÃO. ILEGITIMIDADE DO SECRETÁRIO DE ESTADO. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. SOLICITAÇÃO DE EMENDA À PETIÇÃO INICIAL. MODIFICAÇÃO DA COMPETÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
4. A jurisprudência do STJ consolidou-se no sentido de que a oportunidade de emenda à petição inicial de mandado de segurança para correção da autoridade coatora somente pode ser admitida quando o órgão jurisdicional em que a demanda tenha sido proposta for competente para o conhecimento do mandamus, não sendo a hipótese dos autos. Precedentes: AgRg no RMS 46.032/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 6/4/2015; AgRg no RMS 46.748/RJ, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 17/3/2015.5. Mandado de segurança extinto, sem resolução do mérito, por ilegitimidade passiva da autoridade impetrada. Recurso em mandado de segurança prejudicado.(RMS n. 38.129/GO, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 18/5/2017, DJe de 1/8/2017.)

 

Oportuno citar decisão proferida nos autos do MANDADO DE SEGURANÇA Nº 5032699-98.2024.4.04.7200, no qual a 4ª Vara Federal de Florianópolis prolatou sentença extintiva do feito nos seguintes termos (seq. 40 - NUP 00416.048464/2024-09):

 
Logo, considerando que a impetrante se utiliza do Mandado de Segurança para impugnar ato atribuído a Ministra de Estado, situação reiterada na manifestação do evento 12, deverá ajuizar sua pretensão perante o foro competente, que, no caso, é o Superior Tribunal de Justiça, uma vez que este Juízo não possui competência para processamento e julgamento da causa.
A extinção do processo sem resolução de mérito se mostra como única solução possível no presente caso, a teor do art. 16 da Resolução nº 17/2010-TRF4 (e suas alterações), já que se trata de ação ajuizada em meio eletrônico, o que impede a remessa dos autos ao STJ, que não dispõe da tecnologia adequada ao procedimento.
Ante o exposto, declaro a incompetência da Justiça Federal de Primeira Instância para processar e julgar presente processo, declinando a competência ao STJ, a teor do art. 114, VII, da Constituição Federal de 1988, com as alterações introduzidas pela EC nº 45/2004, e JULGO EXTINTO O PROCESSO sem resolução do mérito, na forma do art. 485, IV, do CPC.
​Custas na forma da lei.
Considerando a incompatibilidade dos sistemas eletrônicos entre as esferas judiciais, atribuo ao advogado da parte autora o ônus distribuir a ação no foro competente.
 

Diante disto, pugna-se pela declaração da incompetência absoluta para processar e julgar a presente ação mandamental, com extinção do feito na forma do art. 485, IV, do CPC.​

 

V - FALTA DO INTERESSE PROCESSUAL. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. ​PUBLICAÇÃO DE EDITAL DE NOVA CONVOCAÇÃO PARA HETEROIDENTIFICAÇÃO

 

Ações judiciais recorrentes vêm apresentando pedido de garantia de participação do candidato em nova banca de heteroidentificação, que estava agendada para os dias 11/01/2025 e 12/01/2025.

 

Alegam que não compareceram ao procedimento de heteroidentificação, embora estivessem habilitados para a correção da prova discursiva. 

 

Inicialmente, infere-se a falta de interesse de agir no caso em tela. O Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos publicou novo edital em 23 de dezembro de 2024 para convocação dos candidatos que não realizaram a heteroidentificação prevista no edital do CPNU. Confira-se teor da Nota Informativa SEI nº 49924/2024/MGI (seq. 19 - NUP 90849.013802/2024-86), anexada ao presente processo:

 

Ressaltamos, ainda, que as pessoas que não fizeram a heteroidentificação estão sendo convocadas novamente, por decisão do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos - MGI. A convocação se dá por meio de edital específico, publicado no dia 23 de dezembro e que pode ser consultado em: https://www.in.gov.br/web/dou/-/edital-especifico-n-1-de-convocacao-para-o-procedimento-de-heteroidentificacao-e-decorrente-envio-de-titulos-603598122 .
Em atendimento à convocação, a candidata deverá consultar a área do candidato, a fim de observar as orientações e o agendamento, visto que o não comparecimento à heteroidentificação implica eliminação do concurso, conforme já expusemos.
 

Desta forma, resta satisfeita a pretensão diante da nova convocação para heteroidentificação, impõe-se alegar a perda do objeto da presente Impetração, com a consequente extinção do feito sem resolução de mérito, na forma do art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.

 

VI - DO MÉRITO

 

Os autores das ações são inscritos no Concurso Público Nacional Unificado - CPNU, que não compareceram ao procedimento de heteroidentificação, ou se insurgem contra o resultado do procedimento de heteroidentificação, com base na Lei nº 12.990/2014, cuja aplicação é disciplinada pela Instrução Normativa nº 23, de 25 de julho de 2023, que trata da reserva de vagas para pessoas negras nos concursos públicos, na forma da Lei n° 12.990, de 9 de junho de 2014, e nos editais do CPNU.

 

Com efeito, o procedimento de heteroidentificação visa à garantia do exercício do direito de concorrer às vagas reservadas para pessoas negras/pardas, de modo que a política de inclusão cumpra seu papel de oportunizar acesso aos cargos públicos à população-alvo e atender às diretrizes da administração de promover igualdade de oportunidades, diversidade e representatividade no serviço público.

 

Tal procedimento tem o objetivo exclusivo de evitar fraudes, que certamente comprometeriam sobremaneira a política de inclusão defendida na Lei nº 12.990/2014.

 

De acordo com a Instrução Normativa nº 23, de 25 de julho de 2023, que disciplina a aplicação da reserva de vagas para pessoas negras nos concursos públicos, na forma da Lei n° 12.990, de 9 de junho de 2014, a autodeclaração tem presunção relativa de veracidade, devendo ser confirmada, no transcurso do certame:

 

Art. 5º A autodeclaração da pessoa candidata goza de presunção relativa de veracidade.
§ 1º Sem prejuízo do disposto no caput, a autodeclaração será confirmada mediante procedimento de heteroidentificação.
 

Neste ponto, destaca-se que o procedimento de heteroidentificação foi considerado constitucional pelo C. Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade nº 41/DF - na qual se examinou a constitucionalidade da Lei nº 12.990/2014, que trata da reserva de vagas para negros em concursos públicos – o STF reafirmou a legitimidade da utilização do sistema misto de identificação, consoante se extrai da respectiva ementa:

 
“Ementa: Direito Constitucional. Ação Direta de Constitucionalidade. Reserva de vagas para negros em concursos públicos. Constitucionalidade da Lei n° 12.990/2014. Procedência do pedido.
1. É constitucional a Lei n° 12.990/2014, que reserva a pessoas negras 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal direta e indireta, por três fundamentos.
1.1. Em primeiro lugar, a desequiparação promovida pela política de ação afirmativa em questão está em consonância com o princípio da isonomia. Ela se funda na necessidade de superar o racismo estrutural e institucional ainda existente na sociedade brasileira, e garantir a igualdade material entre os cidadãos, por meio da distribuição mais equitativa de bens sociais e da promoção do reconhecimento da população afrodescendente.
1.2. Em segundo lugar, não há violação aos princípios do concurso público e da eficiência. A reserva de vagas para negros não os isenta da aprovação no concurso público. Como qualquer outro candidato, o beneficiário da política deve alcançar a nota necessária para que seja considerado apto a exercer, de forma adequada e eficiente, o cargo em questão. Além disso, a incorporação do fator “raça” como critério de seleção, ao invés de afetar o princípio da eficiência, contribui para sua realização em maior extensão, criando uma “burocracia representativa”, capaz de garantir que os pontos de vista e interesses de toda a população sejam considerados na tomada de decisões estatais.
1.3. Em terceiro lugar, a medida observa o princípio da proporcionalidade em sua tríplice dimensão. A existência de uma política decotas para o acesso de negros à educação superior não torna a reserva de vagas nos quadros da administração pública desnecessária ou desproporcional em sentido estrito. Isso porque: (i) nem todos os cargos e empregos públicos exigem curso superior; (ii) ainda quando haja essa exigência, os beneficiários da ação afirmativa no serviço público podem não ter sido beneficiários das cotas nas universidades públicas; e (iii) mesmo que o concorrente tenha ingressado em curso de ensino superior por meio de cotas, há outros fatores que impedem os negros de competir em pé de igualdade nos concursos públicos, justificando a política de ação afirmativa instituída pela Lei n° 12.990/2014.
2. Ademais, afim de garantir a efetividade da política em questão, também é constitucional a instituição de mecanismos para evitar fraudes pelos candidatos. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação (e.g., a exigência de autodeclaração presencial perante a comissão do concurso), desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa.
3. Por fim, a administração pública deve atentar para os seguintes parâmetros: (i) os percentuais de reserva de vaga devem valer para todas as fases dos concursos; (ii) a reserva deve ser aplicada em todas as vagas oferecidas no concurso público (não apenas no edital de abertura); (iii) os concursos não podem fracionar as vagas de acordo com a especialização exigida para burlar a política de ação afirmativa, que só se aplica em concursos com mais de duas vagas; e (iv) a ordem classificatória obtida a partir da aplicação dos critérios de alternância e proporcionalidade na nomeação dos candidatos aprovados deve produzir efeitos durante toda a carreira funcional do beneficiário da reserva de vagas.
4. Procedência do pedido, para fins de declarar a integral constitucionalidade da Lei n° 12.990/2014. Tese de julgamento: ‘É constitucional a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública direta e indireta. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa Tribunal Pleno – julgamento em 8/6/2017"(destacou-se)

 

Logo, por ocasião do referido julgamento, o STF declarou não só a constitucionalidade da reserva de vagas aos candidatos negros, mas também declarou legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de verificação dessa condição, como o procedimento de verificação utilizado no processo seletivo em comento. 

 

Esclarece-se que a não confirmação da autodeclaração de pessoa negra pela banca de heteroidentificação não implica a eliminação do certame. Isto porque os candidatos cotistas concorrem, simultaneamente, à reserva de vagas e à ampla concorrência. Por isso, não se pode falar em exclusão do concurso decorrente da heteroidentificação.

 

De acordo com os editais do CPNU:

 

3.4.2.4.1 - Serão consideradas as características fenotípicas do candidato ao tempo de realização do procedimento de heteroidentificação
3.4.4 - O candidato cuja autodeclaração não for confirmada em procedimento de heteroidentificação concorrerá às vagas destinadas à ampla concorrência, desde que possua, em cada fase anterior do certame, nota ou pontuação suficiente para prosseguir nas demais fases

 

É necessário ressaltar que a comissão de heteroidentificação utilizou exclusivamente o critério fenotípico para aferição da condição declarada pela parte Autora, não sendo levado em consideração nenhum outro documento que porventura tenha sido utilizado para confirmar a autodeclaração realizada no momento da inscrição no certame.

 

O Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, analisando questão similar a destes autos, confirmou que a autodeclaração não é suficiente para o enquadramento em cotas raciais e que as características fenotípicas do candidato devem ser avaliadas por uma comissão, nestes termos:

 

"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. UNIÃO. ANALISTA JUDICIÁRIO. TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO. CANDIDATA QUE PARTICIPOU DO CERTAME NA CONDIÇÃO DE NEGRA (PRETA OU PARDA). FENÓTIPO NÃO CONFIRMADO PELA COMISSÃO DE VERIFICAÇÃO. LEGITIMIDADE DO PROCEDIMENTO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. A recorrente participou de concurso público promovido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e disciplinado pelo Edital n. 1/2019. Depois de participar com êxito de todas as fases do processo seletivo, não foi considerada negra (preta ou parda), no momento da avaliação de seu fenótipo, que seguiu as normas do referido edital.
2. O Supremo Tribunal Federal, em julgamento proferido na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 41, reconheceu a constitucionalidade da reserva de vagas a candidatos negros, bem como a legitimidade na utilização de critérios subsidiários de heteroidentificação.
3. Dessa forma, o procedimento adotado pelos organizadores do concurso público do qual a recorrente participou é inteiramente legítimo e está regulado por legislação específica.
4. A substituição da Banca Examinadora pelo Poder Judiciário, salvo a hipótese de flagrante ilegalidade, não deve ser levada a efeito por configurar incursão no mérito do ato administrativo. Ademais, na hipótese em exame, é evidente que a Comissão de Verificação racial concluiu que as características fenotípicas da autora não a habilitam para a vaga no sistema de cotas raciais, ato administrativo motivado e sem sinais de erro material ou de flagrante ilegalidade, de modo que a intervenção judicial representaria indevida ingerência na esfera administrativa.
5. A discordância da apelante está assentada em seu inconformismo com o resultado da avaliação racial, mas isso não significa ilegalidade cometida pela Administração. O fato de um candidato ter sido considerado negro em concursos públicos anteriormente realizados não vincula a Administração às avaliações futuras, não havendo dúvida de que a comissão de heteroidentificação tem plena liberdade de reexaminar e emitir novo parecer conclusivo.
6. O art. 9º, § 2º, da Portaria Normativa n. 4/2018, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, deixa claro que não serão considerados quaisquer registros ou documentos pretéritos eventualmente apresentados, inclusive imagem e certidões referentes a confirmação em procedimentos de heteroidentificação realizados em concursos públicos federais, estaduais, distritais e municipais, devendo ser consideradas, na forma disciplinada pelo § 1º do mesmo artigo, as características fenotípicas do candidato ao tempo da realização do procedimento de heteroidentificação.
7. A recorrente aponta ainda irregularidades na composição da banca examinadora sem, contudo, trazer aos autos nenhuma comprovação da assertiva, deixando de atender à previsão constante do art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil ( CPC), e ao ser instada a especificar as provas que entendesse necessárias nada requereu no particular.
8. Condena-se a apelante ao pagamento de honorários advocatícios recursais, fixados em R$ 400,00 (quatrocentos reais), nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
9. Incide, na hipótese, a ressalva do art. 98, §§ 2º e 3º também do CPC. A autora litigou sob o pálio da justiça gratuita. (TRF-1 - AC: 10435611320194013400, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, Data de Julgamento: 28/03/2022, 6ª Turma, Data de Publicação: PJe 14/07/2022 PAG PJe 14/07/2022 PAG)"
 
 
 
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL. SISTEMA DE COTAS. AUTODECLARAÇÃO DO CANDIDATO. PROCEDIMENTO DE HETEROIDENTIFICAÇÃO. COMISSÃO AVALIADORA. POSSIBILIDADE. NÃO RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO DE PRETO OU PARDO. APELAÇÃO DESPROVIDA. (...)
5. A autodeclaração é fator importante na construção da identidade racial do indivíduo, revelando a forma como este se percebe e se define para a sociedade, mas em si mesma não é suficiente para o enquadramento em cotas raciais, podendo e devendo ser aferida essa condição por uma comissão, representativa do olhar da sociedade para o indivíduo, como sucedeu na espécie e foi expressamente previsto no edital do concurso.
6. Portanto, não há ilegalidade na utilização pela Administração de critérios subsidiários de heteroidentificação, como a instituição de comissão especialmente designada para aferição dos caracteres fenotípicos dos candidatos a cargos públicos, nos termos da Lei n. 12.990/2014, pois esses caracteres, como a cor da pele, formato do nariz e do rosto, textura do cabelo, constituem, de um modo geral, os fatores da discriminação racial, o que se busca superar com a instituição do sistema de cotas raciais no acesso aos cargos públicos, assim como no ensino público.
7. Honorários advocatícios recursais fixados nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
8. Apelação da autora desprovida. (TRF-1 - AC: 10704027420214013400, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, Data de Julgamento: 17/04/2023, 6ª Turma, Data de Publicação: PJe 19/04/2023 PAG PJe 19/04/2023 PAG)."

Tem-se que a Portaria Normativa n. 4/2018 estabelece que não serão considerados “quaisquer registros ou documentos pretéritos eventualmente apresentados, inclusive imagem e certidões referentes a confirmação em procedimentos de heteroidentificação realizados em concursos públicos federais, estaduais, distritais e municipais”.

 

A par dos dispositivos dos editais do CPNU, não se sustentam as afirmações de que o candidato é, "incontestavelmente" pessoa negra, ou de que deverá ser assim reconhecido porque já o fora anteriormente em outros eventos ou concursos.

 

Também se insere neste contexto que a argumentação com base em fotografias de qualquer fase da vida do candidato, ou outros documentos, também não é válida para contestar o parecer da banca.

 

Desta forma, a banca examinadora do CPNU é soberana e isenta e avaliou o fenótipo dos candidatos de forma regular e isonômica, concluindo sobre os que não podem ser considerados pessoa de cor preta e/ou parda, pois os traços fenotípicos por ela apresentados não são característicos de pessoa negra (preta ou pardo).

Destaque-se que, do resultado provisório, os candidatos têm o direito de recurso administrativo, devidamente avaliado e indeferido pela da comissão revisora.

 

A Comissão de Heteroidentificação, seguindo os critérios contidos no Edital e as normas e orientações que regem o tema, analisou os traços fenotípicos do candidato, concluindo que este não deveria ser mantido na listagem dos candidatos negros referente ao cargo postulado

 

As avaliações das comissões, repise-se, tiveram como parâmetro exclusivo características fenotípicas do candidato, exatamente como previsto no edital de abertura do certame.

 

Nesse contexto, não se cogita de eventual ilegalidade dos mecanismos e critérios utilizados no concurso regido pelo Edital, para bem garantir o acesso dos negros aos cargos públicos.

 

Assim, afastado qualquer vício de procedimento, não se vislumbra motivação para a decretação de nulidade do ato que excluiu o candidato das listagens específicas para candidatos negros.

 

Com efeito, as normas de realização do CPNU pautam-se na legislação vigente e o Edital do concurso, devendo ser observadas por todos os envolvidos no certame, não havendo falar em distinções injustificadas.

 

O Edital do concurso, na qualidade de ato administrativo perfeito, válido e eficaz, é dotado dos atributos reconhecidos pela doutrina em Direito Administrativo, como a presunção de legitimidade e veracidade. A doutrina administrativista ensina que "os principais efeitos da presunção de legitimidade e de veracidade são a autoexecutoriedade dos atos administrativos e a inversão do ônus da prova". Sobre a matéria, observa-se o ensinamento de José dos Santos Carvalho Filho:

 

“Os atos administrativos, quando editados, trazem em si a presunção de legitimidade, ou seja, a presunção de que nasceram em conformidade com as devidas normas legais, como bem anota DIEZ. Essa característica não depende de lei expressa, mas deflui da própria natureza do ato administrativo, como ato emanado de agente integrante da estrutura do Estado. Vários são os fundamentos dados a essa característica. O fundamento precípuo, no entanto, reside na circunstância de que se cuida de atos emanados de agentes detentores da parcelo do Poder Público, imbuídos, como é natural, do objetivo de alcançar o interesse público que lhes compete proteger. Desse modo, inconcebível seria admitir que não tivessem a aura de legitimidade, permitindo-se que a todo momento sofressem algum entrave oposto por pessoas de interesses contrários. Por esse motivo é que há de supor que presumivelmente estão em conformidade com a lei. (OMISSIS). Outro efeito é o da inversão do ônus da prova, cabendo a quem alegar não ser o ato legítimo a comprovação da ilegalidade. Enquanto isso não ocorrer, contudo, o ato vai produzindo normalmente os seus efeitos e sendo considerado válido, seja no revestimento formal, seja no seu próprio conteúdo”. (in “Manual de Direito Administrativo”, 28ª Edição, Editora Atlas, São Paulo, 2015, p. 123). (Destaques inovados).

 

A ingerência do Poder Judiciário é de toda excepcional. Confira-se tese no julgamento do Tema nº. 485 de Repercussão Geral do STF. :

 

Recurso extraordinário com repercussão geral. 2. Concurso público. Correção de prova. Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas. Precedentes. 3. Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o previsto no edital do certame. Precedentes. 4. Recurso extraordinário provido.
(RE 632853, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 23-04-2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-125  DIVULG 26-06-2015  PUBLIC 29-06-2015 RTJ VOL-00235-01 PP-00249)

Decisão

O Tribunal, apreciando o tema 485 da repercussão geral, por maioria e nos termos do voto do Relator, conheceu e deu provimento ao recurso extraordinário, vencido o Ministro Marco Aurélio, que não conhecia do recurso e, superada a questão, negava-lhe provimento. O Tribunal fixou a tese de que os critérios adotados por banca examinadora de um concurso não podem ser revistos pelo Poder Judiciário, não havendo o Ministro Marco Aurélio se manifestado no ponto. Ausentes, justificadamente, o Ministro Celso de Mello e o Ministro Roberto Barroso, que representa o Tribunal na "Brazil Conference", na Universidade de Harvard, e na "Brazilian Undergraduate Student Conference", na Universidade de Columbia, Estados Unidos. Falaram, pelo amicus curiae Estado do Rio Grande do Sul, a Dra. Ivete Maria Razerra, OAB/RS 25.058, e, pelo amicus curiae Conselho Federal Da Ordem Dos Advogados Do Brasil - CFOAB, o Dr. Claudio Pereira de Souza Neto, OAB/RJ 96.073. Plenário, 23.04.2015.

Tema

485 - Controle jurisdicional do ato administrativo que avalia questões em concurso público.

Tese

Os critérios adotados por banca examinadora de um concurso não podem ser revistos pelo Poder Judiciário.

 

Verifica-se que o entendimento segue sendo aplicado normalmente no âmbito do STF:

 

EMENTA Agravo regimental em recurso extraordinário. Administrativo. Controle jurisdicional. Ato administrativo. Avaliação de questões de concurso público. Impossibilidade, salvo em hipóteses excepcionais. Precedentes.
1. O Supremo Tribunal Federal, no exame do RE nº 632.853/CE-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, feito paradigma do Tema nº 485 da Repercussão Geral, firmou o entendimento de que não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora de concurso para apreciar os critérios de avaliação e a correção técnica do gabarito oficial.
2. A Corte de Origem determinou a anulação de questão de concurso público com o fundamento de que ela não era inédita.
3. No caso dos autos, a anulação de questão de processo seletivo fora da hipótese excepcional de verificação de compatibilidade entre o conteúdo cobrado e o respectivo edital divergiu da orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal.
4. Agravo regimental provido para se dar provimento ao recurso extraordinário.
(RE 1489359 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 19-11-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 05-12-2024  PUBLIC 06-12-2024)
 
EMENTA: AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DECISÃO AGRAVADA QUE APLICOU AS SÚMULAS 279 E 454 DO STF. INAPLICABILIDADE DESSES ENUNCIADOS AO CASO DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DO TEMA 485, DA REPERCUSSÃO GERAL NA HIPÓTESE. AGRAVO INTERNO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROVIDO.
1. Decisão agravada que negou provimento ao Recurso Extraordinário do ora agravante, aplicando as Súmulas 279 e 454 do STF. Inaplicabilidade desse enunciados ao caso dos autos, uma vez que os fatos estão claramente descritos no voto condutor do acórdão recorrido.
2. O Plenário desta CORTE, no julgamento do RE 632.853-RG (Rel. Min. GILMAR MENDES, Tema 485), fixou tese no sentido de que “não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas”.
3. O Tribunal de origem, contrariando a jurisprudência desta CORTE, entrou no mérito do ato administrativo e efetivamente substituiu a banca examinadora na correção de questões de concurso público, em evidente violação ao princípio da separação dos Poderes.
4. Agravo Interno a que se dá provimento. Recurso Extraordinário do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROVIDO, para restabelecer a sentença.
(RE 1458938 AgR, Relator(a): CRISTIANO ZANIN, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 19-11-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 28-11-2024  PUBLIC 29-11-2024)

 

O STJ observa integralmente o entendimento do STF e possui jurisprudência sedimentada no sentido de que os atos administrativos da comissão examinadora do concurso público só podem ser revistos pelo Judiciário em situações excepcionais, apenas para a garantia de sua legalidade mediante verificação da fidelidade das questões ao edital.

 

No contexto em que a Administração age conforme as disposições postas no edital, como no caso em tela, não resta comprovada qualquer ilegalidade que autorize o Judiciário a se imiscuir no mérito do ato administrativo, sob pena de violação do princípio da Separação dos Poderes (art. 2º c/c art. 60, §4º, inciso III, ambos da CRFB/88). Vejamos o seguinte precedente: 

 

E M E N T A
APELAÇÃO. DIREITO ADMINISTRATIVO. VESTIBULAR. MEDICINA. EDITAL. CANDIDATOS HABILITADOS. CONVOCAÇÃO NA ORDEM CLASSIFICATÓRIA. VINCULAÇÃO AO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO. RECURSO DESPROVIDO. - Observa-se, de início, que o controle judicial se restringe ao exame da legalidade do ato administrativo, sendo vedado adentrar no mérito do referido ato, matéria essa de atribuição exclusiva da autoridade administrativa - Ainda, deve haver a observância do princípio da vinculação ao edital, de forma que tanto o candidato quanto a instituição que promove o processo seletivo devem se sujeitar às regras estabelecidas no instrumento convocatório. Precedentes - No caso dos autos, o edital, ao estabelecer os critérios de avaliação das provas, definiu que a seleção dos candidatos se dará na ordem classificatória, consoante maior número de pontos. Ademais, prevê que os candidatos serão convocados, conforme classificação, até o limite correspondente do número de vagas - A agravante, apesar de devidamente habilitada, não obteve pontuação suficiente para ser convocada para realização de matrícula, nos moldes estabelecidos pelo edital - Recurso desprovido.(TRF-3 - AI: 5003249-09.2024.4.03.0000 SP, Relator: Desembargador Federal RUBENS ALEXANDRE ELIAS CALIXTO, Data de Julgamento: 06/06/2024, 3ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 10/06/2024).

 

A jurisprudência é firme no sentido de que não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo de questões nem os critérios de avaliação. O controle judicial exercido no âmbito de concurso público deve se restringir aos aspectos de legalidade.

 

Por fim, informa-se que o STJ decidiu, em caso similar, em consonância com a Tese 485-STF, que o Poder Judiciário apenas poderá intervir em concursos públicos nos casos de ilegalidade ou inconstitucionalidade, in verbis:

 

"ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. SISTEMA DE COTAS. CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO FENOTÍPICA. LEGALIDADE. NÃO ENQUADRAMENTO DE CANDIDATO NOS REQUISITOS PARA INCLUSÃO NA LISTA DE COTAS RACIAIS. PREVISÃO NO EDITAL. NÃO COMPETE AO PODER JUDICIÁRIO SUBSTITUIR A BANCA EXAMINADORA. PROVIMENTO NEGADO.
1. Cuida-se de mandado de segurança impetrado contra ato atribuído ao Secretário de Administração e ao Secretário da Fazenda Pública, ambos do Estado da Bahia, consistente na exclusão da parte do concurso público para provimento de cargos de Auditor Fiscal / Tecnologia da Informação, regido pelo Edital SAEB/01/2019.
2. O entendimento desta Corte Superior é firme no sentido de que o critério de orientação para a confirmação do direito à concorrência especial há de fundar-se no fenótipo e não meramente no genótipo, na ancestralidade do candidato.
3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é rigorosamente torrencial e uniforme quanto à obrigatoriedade de seguir-se fielmente as disposições do edital como garantia do princípio da igualdade, sem que isso signifique submissão alguma às exigências de ordem meramente positivistas.
4. É firme a jurisprudência desta Corte Superior de que não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade (Aglnt nos EDcl no RMS 53.448/SC, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 6/6/2022, DJe de 10/6/2022; AgInt no RMS n. 49.239/MS, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 20/10/2016, DJe de 10/11/2016).
5. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt nos EDcl no RMS: 69978 BA 2022/0327028-1, Relator: Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, Data de Julgamento: 23/10/2023, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/10/2023)."

 

Desta forma, considerando que não há qualquer indício de erro material ou de ilegalidade no procedimento questionado nos autos a ensejar a intervenção do Poder Judiciário na esfera administrativa, bem como que houve previsão clara e expressa no edital quanto à utilização exclusiva do critério de apuração das características fenotípicas do candidato ao tempo de realização do procedimento de heteroidentificação, pugna-se pela improcedência dos pedidos, pela segurança e validade do processo de seleção que envolve mais de dois milhões de inscritos, vinte e um órgãos aderentes e o provimento de 6.640 vagas e formação de banco de candidatos para atender o interesse público.

 

VII - CONCLUSÃO.

 

Diante do exposto, conclui-se:

 

1 - Esta IJR padroniza a prestação de subsídios para a defesa da União ou de autoridade pública em casos de ações com pedidos de: a) nova convocação para o procedimento de heteroidentificação; b) nulidade do resultado da banca de heteroidentificação e manutenção do candidato nas vagas reservadas a pessoas negras e pardas.
 
2 - Os órgãos de execução da PGU ficam dispensados de encaminhar pedidos de subsídios quando constatarem a identidade entre o processo e esta IJR.
 
3 - A matéria fática ou jurídica não tratada nesta IJR será objeto de solicitação específica que delimite o ponto a ser abordado.
 
4 - Esta IJR terá prazo de validade de dois anos partir de sua aprovação.

 

Solicita-se ao apoio que traga aos autos a Nota Informativa SEI nº 49924/2024/MGI (seq. 19 - NUP 90849.013802/2024-86) e a Nota Informativa SEI nº 50436/2024/MGI (seq. 6 - NUP 90849.014274/2024-82).​

 

Encaminhe-se ao  Departamento de Gestão Administrativa da Consultoria-Geral da União, à Procuradoria-Geral da União e às Procuradorias Regionais da União, com o intuito de dar ciência aos colegas que atuam na matéria.

À consideração superior.

 

Brasília, 31 de janeiro de 2025.

 

 

VANESSA MAIA ROCHA SOARES

Advogada da União

Coordenadora-Geral Jurídica de Assuntos Judiciais Substituta

 

 


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