ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
DEPARTAMENTO DE COORDENAÇÃO E ORIENTAÇÃO DE ÓRGÃOS JURÍDICOS
PARECER n. 00005/2025/DECOR/CGU/AGU
NUP: 67440.003522/2024-31
INTERESSADA: CONSULTORIA JURÍDICA ADJUNTA DO COMANDO DA AERONÁUTICA(COJAER/CGU/AGU)
ASSUNTO: ATUALIDADE DO PARECER N° 003/2017/CNU/CGU/AGU. POSSIBILIDADE DE PREVISÃO DE PRAZO INDETERMINADO DE VIGÊNCIA DO EDITAL DE CREDENCIAMENTO. LEI 14.133/2021. DECRETO N.º 11.878/2024.
EMENTA: QUESTÃO RELEVANTE E TRANSVERSAL. ATUALIDADE DO PARECER N° 003/2017/CNU/CGU/AGU. POSSIBILIDADE DE PREVISÃO DE PRAZO INDETERMINADO DE VIGÊNCIA DO EDITAL DE CREDENCIAMENTO. LEI 14.133/2021. DECRETO N.º 11.878/2024.
I. Elaborado sob a égide da Lei n.º 8.666/2023, o Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU, no que se refere ao objeto dos autos, estabeleceu a compreensão de que "é admissível o estabelecimento de vigência indeterminada ao credenciamento, com inexistência de prazo limite para que os interessados possam comparecer e se credenciar perante a Administração Pública, sem prejuízo de alteração ulterior das regras de credenciamento".
II. A Lei n.º 14.133/2021, ao tratar o credenciamento como um procedimento auxiliar (art. 74), afastou-lhe o regime jurídico de duração dos contratos.
III. A Lei n.º 14.133/2021 e o Decreto n.º 11.878/2024 não trouxeram qualquer referência à limitação do prazo de vigência do credenciamento. A falta da previsão legal sobre o tema, neste caso, pode ser interpretada como um silêncio eloquente, indicando que a vigência do credenciamento pode ser indeterminada, desde que sirva ao interesse público.
IV. A indeterminação da vigência de credenciamento não impedirá alterações do edital. É clausula necessária do edital a que prevê "condições para alteração ou atualização de preços" (art. 7, inc. IX, do Decreto n.º 11.878/2024).
V. Deverá o "edital prever instrumentos de periódica avaliação para que se exija que os credenciados mantenham o cumprimento dos requisitos, inclusive habilitatórios, exigidos no instrumento convocatório", pois a "perda das condições de habilitação do credenciado" revela-se em uma das hipóteses de descredenciamento (art. 23, inc. II, Decreto n.º 11.878/2024).
VI. Permanece atual, nos limites deste opinativo, o entendimento estabelecido pelo Parecer nº 003/2017/CNU/CGU/AGU.
Sra. Coordenadora-Geral,
A Consultoria Jurídica Adjunta do Comando da Aeronáutica(COJAER/CGU/AGU) encaminhou ao DECOR, para ciência e eventuais providências, o PARECER n. 00199/2024/COJAER/CGU/AGU, seq. 2, aprovado pelo DESPACHO n. 00760/2024/COJAER/CGU/AGU, seq. 5, que entendeu, no que interessa nestes autos, pela manutenção da atualidade do entendimento estabelecido pelo Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU no sentido de que há possibilidade de previsão de prazo indeterminado de vigência do edital de credenciamento
Neste mencionado Parecer foi esclarecido que "o argumento central utilizado para defender a possibilidade de vigência por prazo indeterminado dos editais de credenciamento era a ausência de previsão legal de prazo máximo, considerando que a Lei n° 8.666/93 previa o prazo máximo de contratos administrativos, e o credenciamento em si não é um contrato administrativo. A mesma situação se mantém sob a Lei n° 14.133/21 - não há previsão de prazo máximo do credenciamento, e ele permanece não sendo um contrato administrativo, mas um procedimento auxiliar das licitações e das contratações. Logo, entende-se que essa conclusão do Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU se mantém hígida também sob a Lei n° 14.133/21." (grifos do original).
Recebido os autos no Departamento, foi elaborada a NOTA n. 00047/2024/DECOR/CGU/AGU, aprovada pelo DESPACHO n. 00470/2024/GAB/DECOR/CGU/AGU, seq. 19/20, em que, com fulcro na Portaria Normativa CGU n.º 14, de 23 de maio de 2023, se solicitou a complementação da instrução, preliminarmente a análise da admissibilidade do pedido de uniformização, com a coleta da manifestação da CNLCA/CGU/AGU, da PGFN, da PGF para que esclarecessem se já se manifestaram sobre o objeto dos autos, e da CONJUR/MGI, com a recomendação de oitiva de seu órgão técnico, sobre a matéria encaminhada ao DECOR.
Ato contínuo, a Consultoria Jurídica da Secretaria de Comunicação Social da Presidência de República (CONJUR-SECOM-PR), fez acostar a NOTA JURÍDICA n. 00012/2024/GAB-CONJUR-SECOM-PR/CONJUR-SECOM /CGU/AGU, seq. 25, em que elucidou que entende que "o Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU se mantém hígido também sob a Lei n° 14.133/21, conforme bem descreve a conclusão do PARECER n. 00199/2024/COJAER/CGU/AGU (seq. 2)".
Segundo explicou, "o credenciamento consiste na inscrição de todos os fornecedores dos serviços desejados, selecionados de forma direta, que atendam aos critérios e pagamento previamente indicados no edital, em casos onde a contratação, ou seja, o interesse público, seja melhor realizado com a participação de diversos fornecedores e não de apenas um."
E destacou "o processo de credenciamento é marcado pela unilateralidade, pela discricionariedade vinculada e pela precariedade. A unilateralidade se manifesta quando a Administração estabelece de antemão os critérios para a contratação, levando em consideração o objeto a ser contratado. Como ela tem o direito de encerrar a contratação quando o objeto não for mais necessário, evidencia-se a sua precariedade."
Pontuou, então, após a exposição da legislação atual que regulamenta a matéria, que "uma das exigências fundamentais será elaborar e divulgar o edital de "convocação pública", chamando todos os interessados que possam cumprir com os critérios estabelecidos, possibilitando o registro de novos interessados por tempo indeterminado." (grifos do original)
Evidenciou, por fim, que "em outubro de 2023 (info 792), o Superior Tribunal de Justiça - STJ, fixou a seguinte tese "A Administração Pública é obrigada a divulgar, permanentemente, edital de credenciamento em sítio eletrônico somente após a vigência da Nova Lei de Licitações e Contratações Administrativas".
Para concluir que "o Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU se mantém hígido também sob a Lei n° 14.133/21, conforme bem descreve a conclusão do PARECER n. 00199/2024/COJAER/CGU/AGU (seq. 2)"
A PGFN, por sua vez, pelo Parecer SEI nº 2800/2024/MF, seq. 31, informou que "entende que é possível a previsão de prazo indeterminado para os editais de credenciamento, no âmbito da Lei nº 14.133, de 2021, permanecendo válida a conclusão do Parecer nº 003/2017/CNU/CGU/AGU também para a Nova Lei de Licitações - NLL".
Segundo pontuou, "o credenciamento, procedimento auxiliar de contratação pública (art. 78 da Lei nº 14.133, de 2021), é definido no artigo 6º, inciso XLIII, da Nova Lei de Licitações" donde "nada sobre a vigência do credenciamento, se essa é determinada ou indeterminada. Do mesmo modo, verifica-se que o artigo 79 da Lei 14.133, de 2021, que disciplina o instituto do credenciamento, tampouco dispõe sobre sua vigência".
Esclareceu, assim, que "vê-se que a Nova Lei de Licitações - NLL: 1) indicou hipóteses que o credenciamento pode ser utilizado; 2) determinou que os procedimentos de credenciamento serão definidos em regulamento; e 3) fixou quais as regras que devem ser observadas na regulamentação. Assim, a contrario sensu, a NLL não estabeleceu que o regulamento deve observar a regra da vigência determinada ao disciplinar o credenciamento."
E observou que o seu regulamento, o Decreto nº 11.878, de 9 de janeiro de 2024, "não estabeleceu, em seu artigo 7º, a vigência determinada como regra a ser observada pelo edital de credenciamento".
Para assentar que ""as regras gerais do credenciamento na Lei nº 14.133, de 2021", a exemplo do conteúdo do edital de credenciamento disciplinado no artigo 7º, do Decreto nº 11.878, de 2024, não dispõem sobre a vigência determinada, parece que a intenção do legislador, que editou a NLL, e do Chefe do Poder Executivo Federal, que expediu o mencionado Decreto Regulamentador, foi de não estabelecer a obrigatoriedade da vigência determinada nos editais de credenciamento."
Destacando ainda que "a regulamentação determina que o "credenciamento ficará permanentemente aberto durante a vigência do edital" (art. 5º, do Decreto nº 11.878, de 2024). Apesar de a palavra permanente não significar necessariamente o mesmo que indeterminado, esse termo transmite a ideia de algo duradouro, contínuo, o que se aproxima muito mais da expressão "prazo indeterminado" do que a ideia de prazo certo, definido. Ademais, o termo "vigência do edital" não se confunde com algo obrigatoriamente determinado, tanto que no caso das leis, por exemplo, a regra é a vigência indeterminada, permanente até que outra lei a modifique ou revogue, conforme disposto no artigo 2º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro - LINDB (Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942)."
Para refletir no sentido de que "como permanente não significa necessariamente algo indeterminado, mas apenas duradouro, bem como a vigência, embora possa ser indeterminada como é a regra na edição de leis, também pode ser por prazo determinado, como é comum em contratos administrativos (artigo 105 e seguintes da Lei nº 14.133, de 2021), não se pode afirmar que a vigência do edital de credenciamento será obrigatoriamente indeterminada. O regulamento traz a ideia no seu artigo 5º que o credenciamento deve ficar aberto durante a vigência do edital, mas o gestor tem a autonomia, a faculdade de estabelecer uma vigência determinada ou indeterminada para o credenciamento." (grifos do original)
E observar que "em outro ponto, o referido Decreto (art. 19, §1º) estabeleceu que a administração poderá convocar o credenciado "durante todo o prazo de validade do credenciamento (...)", porém não determinou que o prazo de validade do credenciamento tenha que ser certo".
Certificando, ainda, que "o fato do edital de credenciamento poder ter vigência indeterminada, não significa que o contrato terá vigência indeterminada. Em relação a isso, o Decreto é expresso (art. 20) que a vigência dos contratos decorrentes do credenciamento será estabelecida no edital, observado o disposto no art. 105 da Lei nº 14.133, de 2021. Essa última expressão, ao remeter ao artigo que dispõe sobre o prazo de duração determinado dos contratos na NLL, deixou claro que nos contratos decorrentes de credenciamento a vigência é necessariamente determinada." (grifos do original)
Para concluir que "entende que é possível a previsão de prazo indeterminado para os editais de credenciamento, no âmbito da Lei nº 14.133, de 2021, permanecendo válida a conclusão do Parecer nº 003/2017/CNU/CGU/AGU também para a NLL." (grifos do original)
A CNLCA, pelo DESPACHO n. 00024/2024/CNLCA/CGU/AGU, seq. 36, informou que "na 16ª sessão da Câmara Nacional de Licitações e Contratos - CNLCA realizada no dia 30.07.2024, conforme ata juntada no NUP: 00688000717/2019-98 (seq. 371) restou assentado por unanimidade dos membros presentes, de acordo com o registrado na ata mencionada", o entendimento pela "manutenção do entendimento constante do Parecer n° 003/2017/ CNU/CGU/AGU."
Acrescentou ainda que "pela inteligência dos arts. 5º, 8º e 9º, do Decreto nº 11.878, de 9 de janeiro de 2024, que regulamenta o artigo 79 da Lei no 14.133, de 2021, é de fácil percepção que a regra para o credenciamento é a que permite o cadastramento permanente dos interessados em participar do credenciamento. A Lei no último artigo mencionado não tratou especificamente sobre regra de vigência a ser observada no edital de credenciamento forçoso concluir, então, que é do Decreto regulamentador que deve ser extraída a resposta colocada para consulta e nesse caso não foi estabelecido vigência determinada para os editais de credenciamento."
Para esclarecer, então, que "pela leitura do caput do art. 5º do Decreto no 11.878/2024, o qual dispôs expressamente " O credenciamento ficará permanentemente aberto durante a vigência do edital..." c/c parágrafo único do art. 9º quando deixou expressamente consignado que "A administração permitirá o cadastramento permanente de novos interessados, enquanto o edital de chamamento permanecer vigente." forçoso se torna reconhecer que o credenciamento deverá ficar permanentemente aberto durante toda a vigência estipulada no edital, a qual será indicada de acordo com a instrução do processo de credenciamento levando, portanto, à conclusão de que caberá ao gestor de acordo com o que constar da fase de planejamento definir se a vigência deverá ser determinada, nesse caso incluído seu prazo, ou não. Não poderia ser diferente a opção feita pelo Decreto nº 11.878/2024, haja vista que a lógica da Lei nº 14.133/2021 é no sentido de que deve ser levado em consideração para a realização dos processos específicos que a tenham como fundamento o objeto que se deseja contratar resultando, assim, de certa maneira em maior autonomia para o gestor, o que tem íntima relação, dentre tantos outros previstos no art. 5º da Lei nº 14.133/2021, com o princípio da eficiência tendo em vista que há realidades distintas nos órgãos da Administração Pública para as quais deve ser conferida a devida importância."
O MGI, então, através da NOTA JURÍDICA n. 00073/2024/CONJUR-MGI/CGU/AGU, aprovada pelo DESPACHO n. 17663/2024/CONJUR-MGI/CGU/AGU, seq. 47/48, informou que endossa o entendimento assentado pela "Secretaria de Gestão e Inovação (Seges) deste Ministério, que exarou a Nota Técnica SEI nº 30078/2024/MGI" entendendo que "os editais de credenciamento podem ter vigência indeterminada, à luz da Lei nº 14.133, de 2021, e do Decreto nº 11.878, de 2024", nos seguintes termos:
15. Outro importante ponto acerca do procedimento auxiliar de credenciamento refere-se à sua vigência. Ainda que a Lei nº 14.133, de 2021, não traga nenhuma regra acerca da vigência do credenciamento no seu art. 79, o Decreto nº 11.878, de 2024, traz de forma expressa no art. 5º que “o credenciamento ficará permanentemente aberto durante a vigência do edital”. Assim, fica à conveniência e oportunidade do órgão ou entidade, diante das características e especificidades da necessidade que será atendida com esse procedimento auxiliar, estabelecer de forma expressa a vigência daquele edital de credenciamento.
16. Não há óbices que esta vigência seja indeterminada: tanto a Lei nº 14.133, de 2021, como o Decreto nº 11.878, de 2024, não estabeleceram nenhum regramento específico em relação à vigência. Como no Sistema de Registro de Preços (outro procedimento auxiliar) o prazo máximo de vigência é estabelecido expressamente no artigo 84 da Lei e nos artigos 15, IX e 22 do Decreto nº 11.462, de 2023, pode-se concluir que se trata de uma hipótese de silêncio eloquente.
17. Assinala-se, por importante, que a vigência do edital de credenciamento não pode ser confundida com a vigência dos contratos decorrentes do credenciamento, vistos que esses últimos devem seguir o disposto nos arts. 105 a 114 da Lei nº 14.133, de 2021.
18. A única regra a ser observada em relação à vigência dos credenciamentos está posta no art. 6º da Portaria SEGES/MGI nº 1.769, de 25 de abril de 2023, que “dispõe sobre o regime de transição de que trata o art. 191 da Lei º 14.133, de 1º de abril de 2021, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional”, quando determina que “os credenciamentos realizados, nos termos do disposto no caput do art. 25 da Lei nº 8.666, de 1993, deverão ser extintos até 31 de dezembro de 2024”.
[...]
27. Ante o exposto, em resposta à solicitação de subsídios técnicos formulada pela CONJUR/MGI, esta unidade técnica alinha-se ao entendimento de que os editais de credenciamento podem ter vigência indeterminada, à luz da Lei nº 14.133, de 2021, e do Decreto nº 11.878, de 2024.
Até a subscrição deste Opinativo, não havia sido acostada aos autos a manifestação da PGF para esclarecer se já se manifestou sobre o objeto dos autos.
É o que importa relatar. Passa-se à análise.
Conforme sabido, no DECOR a análise é orientada pela Portaria Normativa CGU n.º 14/2023, que estabelece o fluxo das atividades a serem desenvolvidas nos procedimentos de uniformização.[1]
Segundo esta Portaria Normativa, os procedimentos de uniformização no âmbito do DECOR poderão ser decorrente de questão relevante e transversal, independentemente da existência de controvérsia jurídica (art. 2º, inc. II e §1º), como no caso dos autos, que se trata de uniformizar a matéria trazida pela COJAER/CGU/AGU, PARECER n. 00199/2024/COJAER/CGU/AGU, seq. 2, aprovado pelo DESPACHO n. 00760/2024/COJAER/CGU/AGU, seq. 5, sobre a manutenção da atualidade do entendimento estabelecido pelo Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU no sentido de que há possibilidade de previsão de prazo indeterminado de vigência do edital de credenciamento, se conveniente à realização do interesse público.
Registra-se que esta apreciação se dá em tese, com o objetivo de orientar e uniformizar entendimentos jurídicos sobre a situação de direito versada, nos moldes e limites trazidos pelo oficiante.
Portanto, deve-se deixar claro que não se analisa, neste Opinativo, determinado ajuste propriamente dito de onde eventualmente pode ter se originado a demanda, já que transborda a competência deste Departamento - que está delimitada pela Lei Complementar n.º 73/1993 e pelo art. 39 do Decreto nº 11.328/2023.
Na mesma medida, providências administrativas, judiciais, e eventuais (ir)regularidades documentais, que recaiam sobre a celebração de determinado pacto, bem como análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária, e a conveniência e oportunidade da prática do ato, também não integram a apreciação do DECOR.
Neste cenário, verifica-se que se manifestaram nos autos a CONJUR/MGI, a PGFN, a CNLCA/DECOR/CGU a CONJUR-SECOM-PR e a COJAER/CGU/AGU convergindo o entendimento no sentido de que a conclusão do Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU, de que há possibilidade de previsão de prazo indeterminado de vigência do edital de credenciamento, se mantém hígida também sob a regência da Lei n° 14.133/21.
Elaborado sob a égide da Lei n.º 8.666/2023, o Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU (NUP 00671.000641/2014-75, seq. 14), no que se refere ao objeto dos autos, estabeleceu a compreensão de que "é admissível o estabelecimento de vigência indeterminada ao credenciamento, com inexistência de prazo limite para que os interessados possam comparecer e se credenciar perante a Administração Pública, sem prejuízo de alteração ulterior das regras de credenciamento". Veja:
EMENTA:
(...)
II - É admissível o estabelecimento de vigência indeterminada ao credenciamento, com inexistência de prazo limite para que os interessados possam comparecer e se credenciar perante a Administração Pública, sem prejuízo de alteração ulterior das regras de credenciamento.
(...)
2.3.2 Do prazo de vigência do edital
50. A falta de regulamentação do credenciamento, disciplinando suas premissas e seu procedimento, é fonte de inúmeras dúvidas quanto à aplicação de alguns dispositivos da Lei de Licitações nº 8.666/93, a exemplo da possibilidade de prorrogação contratual do seu prazo.
51. Nesse ponto, é fundamental perceber que o credenciamento não detém natureza jurídica de contrato administrativo, motivo pelo qual, a priori, não se submete às prerrogativas e restrições inerentes ao seu regime.
52. Nesta feita, reitere-se, o credenciamento não permite à Administração valer-se de determinadas prerrogativas extraordinárias específicas do contrato administrativo ínsitas ao contrato administrativo. Cite-se, como exemplo, a faculdade admitida ao particular credenciado de pedir unilateralmente seu descredenciamento, o que, no regime do contrato administrativo seria inadmissível, sob pena de sancionamento. Da mesma forma, não pode a Administração obrigar, unilateralmente, o fornecedor a credenciar-se em serviços diferentes daqueles para os quais ele firmou sua adesão, pois não há nesta relação a mesma prerrogativa contratual para tanto.
53. Noutro prumo, o credenciamento não traz consigo as mesmas restrições impostas pelo específico regime jurídico desses específicos contratos firmados pela Administração. Assim, ele não exige a indicação prévia dos recursos orçamentários para a execução durante toda a sua validade, nem se submete às rígidas e ultrapassadas regras de vigência indicadas pelo artigo 57 da Lei nº 8.666/93.
54. Como já dito, esta percepção é fundamental, para que entendam as premissas e conclusões firmadas pela Câmara Nacional de Uniformização.
55. Não se deve confundir o credenciamento, com os contratos ou contratações que serão firmados à partir dele. A natureza jurídica do credenciamento não equivale à do contrato administrativo. Ele mais se aproxima de um procedimento auxiliar, como o registro cadastral ou a pré-qualificação permanente, produzido para justificar ulteriores contratações diretas, por inexigibilidade, tendo em vista que o interesse público não objetiva selecionar um contratado, mas todos os potenciais fornecedores da pretensão contratual.
56. Em um momento inicial, os contratos firmados a partir do credenciamento se sujeitam as regras estabelecidas pela Lei nº 8.666/93. Todavia, o credenciamento em si não se sujeita aos limites estabelecidos no artigo 57 da Lei nº 8.666/93, dado o seu caráter permanentemente aberto, afastando a necessidade de renovação periódica de qualquer tipo de disputa13. Repisamos, o credenciamento é um instrumento que não se confunde com o contrato administrativo que pode ser gerado, entre o fornecedor credenciado e o órgão/ente credenciador.
57. Não se confundindo o credenciamento com a contratação dele decorrente, convém sopesar que esta (a contratação) dar-se-á nos termos estabelecidos pela legislação. Em relação ao Fusex, por exemplo, a contratação é feita pontualmente, para a prestação do serviço solicitado pelo beneficiário. Não há uma prestação de serviço direta e continuamente executado para a Administração, mas a realização de um serviço pontualmente solicitado e consumado, para atendimento do beneficiário solicitante. Nessa hipótese, inclusive, o instrumento contratual será, na maioria das vezes, substituível por outros instrumentos hábeis, como a nota de empenho ou a ordem de serviço, a teor do que prescreve o artigo 62 da Lei nº 8.666/93, conjuntamente com o artigo 60 da Lei nº 8.320/64.
58. Em relação ao credenciamento, convém frisar, a formalização a priori de instrumento contratual pode, inclusive, conflitar com a lógica estabelecida na Lei nº 8.666/93, pois, havendo incerteza sobre a demanda a ser provocada ao fornecedor credenciado, não é possível estabelecer-se, de antemão, quantitativo preciso de execução dos serviços, durante o período de credenciamento. Nesse ponto, a execução dos serviços credenciados assemelha-se à execução que se dá diante de uma Ata de Registro de Preços, cuja contratação decorrente do preço registrado pode prescindir do instrumento contratual, desde que identificadas algumas das hipóteses admitidas pelo artigo 62 da Lei nº 8.666/93.
59. Além disso, sempre será concedida à Administração a faculdade de mudar as regras do credenciamento, inclusive o rol dos serviços, preços e demais termos e condições, o que pode caracterizar-se incompatível como o estrito regime do contrato administrativo. Nesse sentido, se a Administração percebe que, por exemplo, o mercado está praticando preço abaixo do fixado no regulamento do credenciamento, bastará alterá-lo, sem a necessidade de resguardo a eventual equação econômica, pois esta é afeta à relação contratual, e não ao credenciamento. Outrossim, nesse mesmo raciocínio, não é obrigatório credenciar-se ou manter-se credenciado, de forma que, quando o credenciado não concordar com as alterações feitas nas condições para prestação do serviço credenciado, bastará solicitar seu descredenciamento, de acordo com as regras estabelecidas no respectivo instrumento.
60. Também assim, não vale para o credenciamento a limitação de sua vigência, conforme preceitos do artigo 61. da Lei nº 8.666/93, para contratos administrativos. O credenciamento não é contrato administrativo, podendo sim possuir vigência indeterminada. Apenas as contratações (contratos) dele decorrentes submetem-se ao estrito regime do referido dispositivo da Lei Geral de Licitações.
61. Assim, quanto ao prazo de vigência do edital de credenciamento, há respaldo jurídico na proposição de inexistir prazo limite para que interessados possam comparecer perante a administração pública e solicitar o credenciamento. Em conclusão, há respaldo jurídico para que a vigência do edital de credenciamento seja indeterminada. Nada obstante, deve o edital prever instrumentos de periódica avaliação para que se exija que os credenciados mantenham o cumprimento dos requisitos, inclusive habilitatórios, exigidos no instrumento convocatório.
62. Outrossim, é admissível que o edital de credenciamento se submeta a alterações no curso de sua vigência, inclusive nos preços e demais termos e condições dos serviços prestados, que vincularão os credenciados mediante cláusula no edital prevendo que salvo pedido de descredenciamento, a adesão ao mesmo implica no aceite de suas eventuais alterações supervenientes.
__________________________________________
13. NIEBUHR, Joel de Menezes. (op. Cit. p. 197)
(grifo nosso)
Com a superveniência da Lei 14.133/2021, o credenciamento, que passou a ser expressamente tratado como um procedimento auxiliar (art. 78, inc. I) e previsto dentre as hipóteses de inexigibilidade de licitação (art. 74, inc. IV), foi definido como "processo administrativo de chamamento público em que a Administração Pública convoca interessados em prestar serviços ou fornecer bens para que, preenchidos os requisitos necessários, se credenciem no órgão ou na entidade para executar o objeto quando convocados" (art. 6º, XLIII). Veja:
Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
(...)
XLIII - credenciamento: processo administrativo de chamamento público em que a Administração Pública convoca interessados em prestar serviços ou fornecer bens para que, preenchidos os requisitos necessários, se credenciem no órgão ou na entidade para executar o objeto quando convocados;
(...)
Art. 74. É inexigível a licitação quando inviável a competição, em especial nos casos de:
(...)
IV - objetos que devam ou possam ser contratados por meio de credenciamento;
(...)
Art. 78. São procedimentos auxiliares das licitações e das contratações regidas por esta Lei:
I - credenciamento;
As hipóteses de cabimento do credenciamento foram previstas pela Lei que prescreveu que ele poderá ser utilizado nos casos em que (a) for viável e vantajosa para a Administração a realização de contratações simultâneas em condições padronizadas; (b) a seleção do contratado está a cargo do beneficiário direto da prestação e (c) a flutuação constante do valor da prestação e das condições de contratação inviabiliza a seleção de agente por meio de processo de licitação, segundo regulamentado por Decreto. Observe:
Art. 79. O credenciamento poderá ser usado nas seguintes hipóteses de contratação:
I - paralela e não excludente: caso em que é viável e vantajosa para a Administração a realização de contratações simultâneas em condições padronizadas;
II - com seleção a critério de terceiros: caso em que a seleção do contratado está a cargo do beneficiário direto da prestação;
III - em mercados fluidos: caso em que a flutuação constante do valor da prestação e das condições de contratação inviabiliza a seleção de agente por meio de processo de licitação.
Parágrafo único. Os procedimentos de credenciamento serão definidos em regulamento, observadas as seguintes regras:
I - a Administração deverá divulgar e manter à disposição do público, em sítio eletrônico oficial, edital de chamamento de interessados, de modo a permitir o cadastramento permanente de novos interessados;
II - na hipótese do inciso I do caput deste artigo, quando o objeto não permitir a contratação imediata e simultânea de todos os credenciados, deverão ser adotados critérios objetivos de distribuição da demanda;
III - o edital de chamamento de interessados deverá prever as condições padronizadas de contratação e, nas hipóteses dos incisos I e II do caput deste artigo, deverá definir o valor da contratação;
IV - na hipótese do inciso III do caput deste artigo, a Administração deverá registrar as cotações de mercado vigentes no momento da contratação;
V - não será permitido o cometimento a terceiros do objeto contratado sem autorização expressa da Administração;
VI - será admitida a denúncia por qualquer das partes nos prazos fixados no edital.
Estes dispositivos legais foram, então, regulamentados pelo Decreto n.º 11.878, de 9 de janeiro de 2024.[2]
Este Decreto não trouxe qualquer regulamentação para a vigência do edital de credenciamento, ele apenas estabeleceu que "o credenciamento ficará permanentemente aberto durante a vigência do edital" e determinou que "o edital de credenciamento será divulgado e mantido à disposição no Portal Nacional de Contratações Públicas - PNCP, de modo a permitir o cadastramento permanente de novos interessados" (art. 5º, 8º e 9º)
No que se refere ao prazo de vigência dos contratos, o Decreto definiu que estes serão necessariamente determinados ao dispor que "a vigência dos contratos decorrentes do credenciamento será estabelecida no edital, observado o disposto no art. 105 da Lei nº 14.133, de 2021" (art. 20).
Entretanto, a Lei n.º 14.133/2021, ao estabelecer o credenciamento com um procedimento auxiliar à contratação, afastou-lhe o regime jurídico de duração dos contratos (art. 105 da Lei nº 14.133, de 2021).
Veja, então, que a Lei n.º 14.133/2021 e o Decreto n.º 11.878/2024 não trouxeram qualquer referência à limitação do prazo de vigência do credenciamento. A falta da previsão legal sobre o tema, neste caso, pode ser interpretada como um silêncio eloquente, indicando que a vigência do credenciamento pode ser indeterminada, desde que sirva ao interesse público.[3] [4]
No mesmo sentido, recentemente, o Instituto Nacional de Contratações Públicas (INCP) editou o Enunciado n.º 36, que prescreve que "é admissível o credenciamento com prazo de vigência indeterminado, sem prejuízo de ulterior revogação do procedimento, mediante a comprovação da conveniência administrativa".[5]
Assim sendo, tal como estabelecido pelo Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU[6], o edital de credenciamento, celebrado sob a regência da Lei 14.133/21, não se submete a limites temporais pré-estabelecidos pela norma, de modo que permanece atual o entendimento de que a sua vigência poderá ser indeterminada.
Relacionadas a este assunto, o Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU fez duas relevantes ponderações que merecem aqui ser carreadas.
A primeira delas diz respeito ao entendimento de que a indeterminação da vigência de credenciamento não impedirá alterações do edital enquanto vigente. Por isso, o Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU ponderou que, "salvo pedido de descredenciamento, a adesão ao mesmo (edital de credenciamento) implica no aceite de suas eventuais alterações supervenientes".[7]
Sobre a matéria, a legislação atual determina que é clausula necessária do edital a que prevê "condições para alteração ou atualização de preços" (art. 7, inc. IX, do Decreto n.º 11.878/2024).
Desse modo, os credenciados, ao aderirem ao edital, aceitam também eventuais mudanças e atualização de preços que possam ocorrer ao logo do tempo, exceto se houver um pedido de descredenciamento. Isso é importante para garantir que o edital possa se adaptar às necessidades e condições do serviço público.
E a segunda refere-se à a compreensão do Parecer n° 003/2017/CNU/CGU/AGU de que é prudente o "edital prever instrumentos de periódica avaliação para que se exija que os credenciados mantenham o cumprimento dos requisitos, inclusive habilitatórios, exigidos no instrumento convocatório", visando assegurar a qualidade e a conformidade dos serviços prestados, já que a "perda das condições de habilitação do credenciado" revela-se em uma das hipóteses de descredenciamento (art. 23, inc. II, Decreto n.º 11.878/2024,).
Assim sendo, por todo o exposto, conforme entenderam a CONJUR/MGI, a PGFN, CNLCA/DECOR/CGU, a CONJUR-SECOM-PR e a COJAER/CGU/AGU, permanece atual, nos limites deste opinativo, o entendimento estabelecido pelo Parecer nº 003/2017/CNU/CGU/AGU.
À consideração superior.
Brasília, 10 de abril de 2025.
DANIELA C. MOURA GUALBERTO
Advogada da União
DECOR/CGU/AGU
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 67440003522202431 e da chave de acesso c19b7a4a
Notas