ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE POLÍTICAS CULTURAIS

 

 

PARECER nº 39/2025/CONJUR-MINC/CGU/AGU

PROCESSO nº 01400.000357/2025-12

INTERESSADA: Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural

ASSUNTO: Pronac. Incentivos fiscais. Lei de Diretrizes Orçamentárias.

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E FINANCEIRO.
I - Programa Nacional de Apoio à Cultura - Pronac. Regras de execução de projetos no mecanismo de incentivos fiscais da Lei Rouanet.
II - É vedada a realização de despesas em projetos culturais financiados com recursos de incentivo fiscal da Lei nº 8.313/1991 em favor de empregados e servidores públicos da ativa de qualquer esfera da federação, não se restringindo a agentes públicos federais.
III -  Inteligência do art. 37, inciso II, da Instrução Normativa MinC nº 23/2025, combinado com o art. 18 da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 (Lei nº 15.080/2024), bem como legislações anteriores.
IV - Vedação que não alcança diretamente pessoas jurídicas em cujo quadro societário figurem servidores públicos de qualquer esfera de governo, a menos que se trate de sociedade unipessoal.

 

 

Sra. Consultora Jurídica,

 

Os autos em epígrafe tratam de consulta formulada pela Diretoria de Fomento Indireto da Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural no bojo da Nota Técnica nº 1/2025 (SEI/MinC 2086491), que se reporta a solicitação apresentada por proponente de projeto cultural do Pronac no sistema Salic, referente ao projeto Pronac 234452, intitulado Plano Anual OSPA.

O questionamento diz respeito especificamente à dúvida do proponente quanto à possibilidade de pagamentos, em projetos incentivados do Pronac, a servidores públicos estaduais e municipais, bem como a empresa que tenha servidor estadual ou municipal em seu quadro societário.

Segundo sustentado pelo proponente em sua solicitação, o art. 22, II, da Instrução Normativa nº 11/2024/MinC (atual art. 37, II, da Instrução Normativa nº 23/2025/MinC), apenas alcançaria servidores da administração pública federal, tendo em vista tratar-se de regulamento da lei federal de incentivo à cultura; a Lei Rouanet (Lei nº 8.313/1991).

É o relatório. Passo à análise.

Conforme bem apontado pela Diretoria de Fomento Indireto na Nota Técnica nº 1/2025, a vedação à realização de despesas em benefício de agente público ou agente político, integrante de quadro de pessoal de órgão ou entidade pública da administração direta ou indireta abrange as três esferas administrativas.

Tal vedação não se encontra prevista apenas no regulamento do mecanismo de incentivos fiscais do Pronac (atual art. 37, II, da Instrução Normativa nº 23/2025/MinC), mas deriva das Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que há anos, ao tratar da execução dos orçamentos da União, têm reiteradamente apontado a restrição à destinação de recursos para pagamento, a qualquer título, a agente público da ativa por serviços prestados, sem fazer distinção entre agentes públicos federais e de outras esferas da federação. Atualmente, tal vedação está expressa no art. 18, inciso VII, da Lei nº 15.080/2024 - LDO de 2025.

Este entendimento encontra-se já consolidado por esta Consultoria Jurídica em diversos pareceres que se debruçaram sobre o tema.

No Parecer nº 483/2012/Conjur-MinC/CGU/AGU (Processo 01400.014983/2012-63), firmou-se o entendimento de que o pagamento a agente público da ativa por serviços prestados encontra-se vedado para serviços prestados a qualquer título e à conta de quaisquer fontes de recursos, independente de tratar-se de contraprestação contratual ou repasse a título de fomento. Com este entendimento, apenas estariam liberados pagamentos que não se caracterizem como remuneração por serviços, o que resultou na conclusão de que seria possível a realização de despesas com aquisição de bens, como  a exploração econômica pelo autor que seja servidor público sobre suas obras, visto que em tais caso não há propriamente a prestação de um serviço à administração, mas a remuneração indireta do autor a partir da venda da obra acabada.

No Parecer nº 76/2016/Conjur-MinC/CGU/AGU (Processo 01400.029657/2015-01), com respaldo na LDO-2016, apontou-se ainda que a vedação da LDO era mais abrangente do que a própria vedação da Instrução Normativa então em vigor, de modo a abranger não apenas serviços técnicos e de consultoria, mas também serviços artísticos. Com base em tal entendimento, as vedações nas instruções normativas seguintes passaram a refletir esta abrangência da LDO. No despacho de aprovação do referido parecer, restou também consignado que, para que um serviço técnico especializado pudesse ser admitido entre as exceções da LDO, seria necessário o enquadramento preciso nas hipóteses previstas no § 1º do artigo que traz a vedação (atualmente, apenas as exceções previstas no inciso IV do § 1º do art. 18 da Lei nº 15.080/2024).

No Parecer nº 636/2016/Conjur-MinC/CGU/AGU (Processo 01400.209774/2016-20) firmou-se o entendimento de que servidores com direito constitucional à acumulação de cargos de professor com outras funções não estão necessariamente protegidos pelas exceções da LDO que admitem pagamento excepcional de agentes públicos por serviços prestados fora de sua investidura e exercício em cargo ou função pública, devendo haver previsão em legislação específica para que tal exceção se aplique.

Recentemente, na Nota nº 249/2024/Conjur-MinC/CGU/AGU (Processo 72031.015099/2022-10), estes entendimentos foram reiterados no sentido de reforçar que a vedação do art. 22, II, da Instrução Normativa nº 11/2024/MinC (atual art. 37, II, da IN nº 23/2025/MinC) não atinge apenas servidores em potencial conflito de interesses envolvido no recebimento de vantagens em razão do cargo, mas qualquer servidor ativo da administração pública, tendo como pressuposto que os recursos de renúncia fiscal são considerados recursos públicos para os fins do art. 18, inciso VII, da Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Neste sentido, ainda que o mecanismo de incentivo a projetos culturais da Lei Rouanet não se execute por meio de gasto direto da administração em contraprestação por serviços prestados, a sua caracterização como fomento cultural e execução por meio de gasto tributário na forma de renúncia fiscal o sujeita à regra orçamentária do art. 18 da LDO em vigor. Afinal, a renúncia fiscal, pelos investimentos e benefícios que representam, é considerada uma fonte indireta de recursos públicos e integra a Lei Orçamentária Anual da União, razão pela qual está condicionada pela Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Portanto, seja pela vedação atualmente estabelecida no art. 37, II, da Instrução Normativa MinC nº 23/2025, seja pela incidência direta do art. 18, VII, da Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei nº 15.080/2024), nenhum agente público da ativa pode receber recursos públicos federais a título de pagamento por serviços prestados diversos da remuneração do cargo ou cargos em que está investido. Tal vedação é qualificada pelo tipo de relação exterior ao vínculo estatutário ou empregatício ativo, não fazendo diferença entre servidores públicos de quaisquer esferas da federação, de modo que apenas se podem ressalvar as exceções expressamente previstas na própria LDO (art. 18, § 1º, inciso VI) ou em leis específicas, conforme estabelecido no próprio texto do art. 37, II, da Instrução Normativa nº 23/2025.

Por fim, com relação ao questionamento do proponente relacionado à possibilidade de pagamentos a empresa na qual servidor estadual ou municipal figure como sócio-cotista, trata-se de situação não alcançada pela vedação do art. 18, inciso VII, da LDO-2025, visto que a empresa, em regra, possui personalidade jurídica diversa da de seus sócios, salvo nas hipóteses de sociedades unipessoais, como os microempreendedores individuais, em que há confusão entre a pessoa física e a pessoa jurídica.

Assim, nas hipóteses de empresas em cujo quadro societário figure servidor público, aplica-se exclusivamente a vedação do inciso XI do art. 18 da LDO-2025, que veda aos órgãos e entidades da administração realizar pagamentos a empresas em cujo quadro societário figure servidor ou empregado vinculado ao órgão ou entidade demandante. Tal vedação não alcança diretamente empresas prestadoras de serviços em projetos culturais financiados com recursos de incentivo fiscal, visto que em tais casos a contratante é a proponente do projeto, e não a administração pública, que não tem ingerência ou controle imediato sobre tais contratações.

Para regular tais relações entre proponente e pessoas jurídicas prestadoras de serviço, aplicam-se apenas as vedações do art. 37 da Instrução Normativa nº 23/2025/MinC, entre outras regras relacionadas ao princípio da não-concentração, especialmente aquelas dos arts. 25 a 35 da referida norma. E, com relação às restrições impostas aos próprios proponentes, vale citar ainda o art. 36, incisos II e III, da instrução normativa, que estabelece impedimentos a proponentes que sejam ou apresentem entre seus dirigentes agentes políticos em geral ou servidores públicos do Ministério da Cultura ou suas entidades vinculadas, e respectivos cônjuges. Portanto, sem restrições para servidores estaduais ou municipais, desde que não se remunerem diretamente no projeto.

Diante de todo o exposto, em atendimento à consulta formulada na Nota Técnica nº 1/2025, conclui-se que a vedação do art. 22, II, da Instrução Normativa nº 11/2024/MinC (atual art. 37, II, da IN nº 23/2025/MinC), estende-se a servidores e empregados de órgãos e entidades da administração pública de qualquer esfera governamental, não por interpretação extensiva do art. 21, II, da mesma instrução normativa (atual art. 36, II, da IN nº 23/2025), mas por derivação do art. 18, inciso VII, da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025, bem como suas edições anteriores. Todavia, tal vedação não impede a contratação e o pagamento, via projeto cultural incentivado, de empresas não unipessoais nas quais servidores públicos (de qualquer esfera da federação) figurem como sócios, visto que em tal situação o servidor não se remunera diretamente pelo serviço prestado por sua empresa.

 

À consideração superior.

 

Brasília, 18 de fevereiro de 2025.

 

 

(assinado eletronicamente)

OSIRIS VARGAS PELLANDA

Advogado da União

Coordenador-Geral Jurídico de Políticas Culturais

 


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