ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA


 

PARECER n. 00096/2025/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.005002/2025-10

INTERESSADOS: DIVISÃO DE PROTOCOLO/DIPRO/MINC.

ASSUNTOS: EMENDA PARLAMENTAR. IMPEDIMENTOS TÉCNICOS.

 

 

 

EMENTA: EMENDA PARLAMENTAR. IMPEDIMENTO TÉCNICO. Constituição Federal. Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO/2024 (Lei n. 14.791/2021). Lei Complementar LCP n. 210, de 25 de novembro de 2024. Portaria Conjunta MF/MPO/MGI/SRI-PR nº 1, de 1º de abril de 2024. Consulta sobre a possibilidade de reversão do impedimento técnico e de viabilidade de retorno da proposta para análise e formalização da parceria.  Impossibilidade jurídica de retorno da proposta para análise e formalização da parceria após o encerramento do exercício financeiro de 2024, face ao princípio orçamentário da anualidade. Possibilidade de superação dos impedimentos técnicos detectados em 2024 mediante a apresentação e análise de nova emenda parlamentar referente ao exercício de 2025, com fundamento na legislação vigente neste exercício, seguida de empenho emitido no mesmo exercício financeiro em que a emenda foi apresentada.
 
 
 

Por meio da Nota Técnica nº 2/2025 (SEI 2166155), a Secretaria da Economia Criativa e Fomento Cultural (SEFIC/MINC) faz referência ao Ofício nº 003/2025 (2161657), da "Associação Esportiva e Cultural - CNB", entidade privada beneficiária da emenda parlamentar nº 43460011, referente ao projeto “Festival Cidade do Futuro, no Centro Histórico da cidade de São Paulo – SP”, cadastrado na plataforma Transferegov sob o nº 036005/2024.

 

A entidade alega ter havido precipitação por parte da área técnica deste Ministério, ao decidir pelo impedimento técnico à proposta, e solicita a revisão dessa decisão e a continuidade da análise da documentação, visando a celebração da parceria.

 

A SEFIC, por sua vez, esclarece que a proposta foi recebida pela área de formalização de parcerias apenas em 19/12/2024, e sem os elementos necessários à sua adequada apreciação no tempo disponível até o encerramento do exercício financeiro. Por essa razão, a área técnica responsável emitiu a Diligência nº 50 01/2024 (2067114), em 20/12/2024, solicitando documentos e ajustes essenciais para viabilizar a avaliação técnica da proposta.

 

Considerando os prazos exíguos para execução dos procedimentos necessários à formalização de todas as parcerias propostas, no final do exercício financeiro, foi estabelecido o prazo final de 26/12/2024 para atendimento integral às diligências, e o proponente foi alertado de que a não observância deste prazo resultaria na declaração de impedimento técnico do projeto, dado que não haveria tempo hábil para a análise final e a formalização do Termo de Fomento. 

 

A SEFIC pondera que, em conformidade com a legislação que regula as transferências da União, o processo de formalização de parcerias deve seguir rigorosa avaliação da documentação comprobatória apresentada. A análise técnica inclui a verificação da viabilidade do projeto, sua adequação aos objetivos do programa, a compatibilidade dos custos previstos no plano de trabalho, e a qualificação técnica e capacidade gerencial do proponente.

 

A SEFIC informa, por fim, que realizou reunião presencial com a entidade, a fim de esclarecer os motivos da declaração de impedimento técnico. Na ocasião, a entidade foi informada sobre a impossibilidade de reversão da decisão, bem como sobre a inviabilidade de formalização da proposta apresentada no exercício de 2024, em função do princípio da anualidade e dos critérios e prazos específicos estabelecidos pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e pela Lei Orçamentária Anual (LOA).

 

Em resumo: o não cumprimento tempestivo dos requisitos técnicos necessários à formalização da parceria, que envolve a análise detalhada da proposta, a adequação dos documentos exigidos e a viabilidade da execução do projeto, geraram o impedimento técnico para a formalização do instrumento. Em função desses fatores, houve o cancelamento do empenho, conforme as normas legais aplicáveis (2096059).

 

Face ao exposto, a fim de instruir a resposta à entidade, o órgão consulente solicita a esta Consultoria Jurídica manifestação sobre:

 

a) possibilidade de reversão do impedimento técnico e;

b) viabilidade de retorno da proposta para análise e formalização da parceria após o encerramento do exercício fiscal de 2024.

 

Este é o relato do necessário.

 

 

ANÁLISE JURÍDICA

 

A presente análise se dá com fundamento no art. 131 da Constituição Federal e no art. 11 da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária.

 

A consulta em tela diz respeito a emenda parlamentar recebida por este Ministério, à qual foi atribuído impedimento técnico (e o respectivo empenho foi cancelado), tendo em vista que o proponente não atendeu tempestivamente às diligências apontadas pelo órgão técnico responsável.

 

A entidade beneficiária da emenda, irresignada, solicitou ao Ministério o cancelamento do impedimento técnico e a continuidade da análise da documentação, visando a celebração da parceria.

 

A fim de instruir a resposta à entidade, o órgão consulente solicita a esta Consultoria Jurídica manifestação sobre (i) a possibilidade de reversão do impedimento técnico, e (ii) a viabilidade de retorno da proposta para análise e formalização da parceria após o encerramento do exercício fiscal de 2024.

 

Passando à análise da demanda, observo inicialmente que as emendas parlamentares são alterações ou adições ao projeto de lei orçamentária anual, conforme permite o art. 166 da Constituição Federal.

 

As emendas podem ser de caráter impositivo ou não. As emendas não-impositivas dependem da concordância do Poder Executivo, enquanto as impositivas devem ser acatadas desde que não apresentem impedimentos técnicos e cumpram todos os requisitos constitucionais e legais aplicáveis. É o que estabelecem os §§ 10 e 11 do art. 165 e §§ 13 e 14 do art. 166 da Constituição:

 
Art. 165. (...)
§ 10. A administração tem o dever de executar as programações orçamentárias, adotando os meios e as medidas necessários, com o propósito de garantir a efetiva entrega de bens e serviços à sociedade.   
§ 11. O disposto no § 10 deste artigo, nos termos da lei de diretrizes orçamentárias:      
I - subordina-se ao cumprimento de dispositivos constitucionais e legais que estabeleçam metas fiscais ou limites de despesas e não impede o cancelamento necessário à abertura de créditos adicionais;
II - não se aplica nos casos de impedimentos de ordem técnica devidamente justificados;
III - aplica-se exclusivamente às despesas primárias discricionárias.
 
Art. 166. Os projetos de lei relativos ao plano plurianual, às diretrizes orçamentárias, ao orçamento anual e aos créditos adicionais serão apreciados pelas duas Casas do Congresso Nacional, na forma do regimento comum.
(...)
§ 11. É obrigatória a execução orçamentária e financeira das programações oriundas de emendas individuais, em montante correspondente ao limite a que se refere o § 9º deste artigo, conforme os critérios para a execução equitativa da programação definidos na lei complementar prevista no § 9º do art. 165 desta Constituição, observado o disposto no § 9º-A deste artigo.     
§ 12. A garantia de execução de que trata o § 11 deste artigo aplica-se também às programações incluídas por todas as emendas de iniciativa de bancada de parlamentares de Estado ou do Distrito Federal, no montante de até 1% (um por cento) da receita corrente líquida realizada no exercício anterior.  
§ 13. As programações orçamentárias previstas nos §§ 11 e 12 deste artigo não serão de execução obrigatória nos casos dos impedimentos de ordem técnica.    
§ 14. Para fins de cumprimento do disposto nos §§ 11 e 12 deste artigo, os órgãos de execução deverão observar, nos termos da lei de diretrizes orçamentárias, cronograma para análise e verificação de eventuais impedimentos das programações e demais procedimentos necessários à viabilização da execução dos respectivos montantes.  

 

Portanto, mesmo as emendas parlamentares de natureza obrigatória (ditas emendas impositivas) estão sujeitas ao cumprimento de requisitos legais e constitucionais. Assim, não há que se falar em obrigatoriedade absoluta de emendas parlamentares, já que não há dever de execução de uma emenda quando o Poder Executivo constate a existência de impedimentos técnicos ou jurídicos na proposta recebida do beneficiário.

 

Tal regra reflete-se na Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO/2024 (Lei n. 14.791/2021), aplicável à emenda em questão, nos seguintes dispositivos [1]:

 

Art. 73. A administração pública federal tem o dever de executar as programações orçamentárias, por intermédio dos meios e das medidas necessários, com o propósito de garantir a efetiva entrega de bens e serviços à sociedade.
§ 1º O disposto no caput:
I - subordina-se ao cumprimento de dispositivos constitucionais e legais que estabeleçam metas fiscais ou limites de despesas e não impede o cancelamento necessário à abertura de créditos adicionais;
II - não se aplica às hipóteses de impedimentos de ordem técnica devidamente justificados; e
III - aplica-se exclusivamente às despesas primárias discricionárias, no âmbito dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social.
(...)
Art. 74. Para fins do disposto no inciso II do § 11 do art. 165 e no § 13 do art. 166 da Constituição, entende-se como impedimento de ordem técnica a situação ou o evento de ordem fática ou legal que obste ou suspenda a execução da programação orçamentária.
§ 1º O dever de execução das programações estabelecido no § 10 do art. 165 e no § 11 do art. 166 da Constituição não impõe a execução de despesa na hipótese de impedimento de ordem técnica.
 

A LDO/2024 detalha o conceito de impedimento técnico em seu art. 74, § 2º:

 
(...)
§ 2º São consideradas hipóteses de impedimentos de ordem técnica, sem prejuízo de outras posteriormente identificadas em ato do Poder Executivo federal:
I - a ausência de projeto de engenharia aprovado pelo órgão setorial, ou pela unidade orçamentária, responsável pela programação, nos casos em que for necessário;
II - a ausência de licença ambiental prévia, nos casos em que for necessária;
III - a não comprovação, por parte dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, quando a cargo do empreendimento após a sua conclusão, da capacidade de aportar recursos para sua operação e manutenção;
IV - a não comprovação de que os recursos orçamentários e financeiros sejam suficientes para conclusão do projeto ou de etapa útil, com funcionalidade que permita o imediato usufruto dos benefícios pela sociedade;
V - a incompatibilidade com a política pública aprovada no âmbito do órgão setorial responsável pela programação;
VI - a incompatibilidade do objeto da despesa com os atributos da ação orçamentária e do respectivo subtítulo; e
VII - os impedimentos cujo prazo para superação inviabilize o empenho no exercício financeiro.

 

Observo, ainda, que a Lei Complementar LCP n. 210, de 25 de novembro de 2024, que dispõe sobre a proposição e a execução de emendas, foi aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República após deliberações acordadas entre os três Poderes da República no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF 854.

 

O art. 10 da LCP n. 210/2024 estabelece rol exaustivo de hipóteses que podem ser consideradas pelos órgãos e entidades do Poder Executivo como "impedimentos de ordem técnica" a fim de justificar a não-execução das emendas parlamentares recebidas:

 

Art. 10. São consideradas hipóteses de impedimentos de ordem técnica para execução de emendas parlamentares, exclusivamente:
I - incompatibilidade do objeto da despesa com finalidade ou atributos da ação orçamentária e respectivo subtítulo, bem como dos demais classificadores da despesa;
II - óbices cujo prazo para superação inviabilize o empenho no exercício financeiro ou no prazo previsto na legislação aplicável;
III - ausência de projeto de engenharia aprovado pelo órgão setorial responsável pela programação, nos casos em que for necessário;
IV - ausência de licença ambiental prévia, nos casos em que for necessária;
V - não comprovação, por parte dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios que fiquem a cargo do empreendimento após sua conclusão, da capacidade de aportar recursos para seu custeio, operação e manutenção;
VI - não comprovação da suficiência dos recursos orçamentários e financeiros para conclusão do empreendimento ou de etapa útil com funcionalidade que permita o imediato usufruto dos benefícios pela sociedade;
VII - incompatibilidade com a política pública aprovada no âmbito do órgão setorial responsável pela programação;
VIII - incompatibilidade do objeto proposto com o programa do órgão ou ente executor;
IX - ausência de pertinência temática entre o objeto proposto e a finalidade institucional da entidade beneficiária;
X - não apresentação de proposta ou plano de trabalho ou apresentação fora dos prazos previstos;
XI - não realização de complementação ou de ajustes solicitados em proposta ou plano de trabalho, bem como realização de complementação ou de ajustes fora dos prazos previstos;
XII - desistência da proposta pelo proponente;
XIII - reprovação da proposta ou plano de trabalho;
XIV - insuficiência do valor priorizado para a execução orçamentária da proposta ou plano de trabalho;
XV - não indicação de instituição financeira e da conta específica para recebimento e movimentação de recursos de transferências especiais pelo ente federado beneficiário no sistema Transferegov.br ou em outro que vier a substituí-lo;
XVI - omissão ou erro na indicação de beneficiário pelo autor da emenda impositiva individual ou de bancada estadual;
XVII - inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) não correspondente à do beneficiário;
XVIII - incompatibilidade do beneficiário com o subtítulo da programação orçamentária da emenda;
XIX - inobservância da aplicação mínima obrigatória de 70% (setenta por cento) em despesas de capital nas transferências especiais, por autor;
XX - atendimento do objeto da programação orçamentária com recursos inferiores ao valor da dotação aprovada para o exercício financeiro, observado que o impedimento incidirá sobre os saldos remanescentes;
XXI - impossibilidade de atendimento do objeto da programação orçamentária aprovada, ou de uma etapa útil do projeto, em decorrência de insuficiência de dotação orçamentária disponível;
XXII - não observância da legislação aplicável ou incompatibilidade das despesas com a política pública setorial e com os critérios técnicos que a consubstanciam;
XXIII - incompatibilidade, devidamente justificada, com o disposto no art. 37 da Constituição Federal;
XXIV - alocação de recursos em programação de natureza não discricionária;
XXV - ausência de indicação, pelo autor da emenda, do objeto a ser executado, no caso das transferências especiais;
XXVI - indicação, no caso de transferências especiais, de objeto com valor inferior ao montante mínimo para celebração de convênios e de contrato de repasses previsto no regulamento específico do tema; e
XXVII - outras hipóteses previstas na lei de diretrizes orçamentárias.
§ 1º Caberá à área técnica de cada órgão ou ente executor identificar e formalizar existência de qualquer impedimento de ordem técnica, sob pena de responsabilidade.
§ 2º Formalizada a identificação de impedimento de ordem técnica, caberá ao órgão ou ente executor da emenda analisá-lo e determinar diligências com vistas a assegurar a execução da emenda parlamentar mediante a regularização do impedimento, sempre que possível.
§ 3º Nos casos previstos nos incisos III e IV do caput deste artigo, será realizado o empenho das programações, e a licença ambiental e o projeto de engenharia deverão ser providenciados no prazo para resolução da cláusula suspensiva.

 

Como se vê nos trechos destacados acima, a Constituição Federal, a LDO/2024 e a LCP n. 210/2024 referem-se a um cronograma ou prazo para análise das emendas parlamentares. Esse cronograma e os respectivos prazos de análise são estabelecidos anualmente pelo Poder Executivo por meio de Portaria Conjunta.

 

No caso da emenda em tela, recebida pelo Ministério da Cultura no exercício financeiro de 2024, aplicava-se a Portaria Conjunta MF/MPO/MGI/SRI-PR nº 1, de 1º de abril de 2024, que dispõe sobre "procedimentos e prazos para operacionalizaç ão de emendas individuais, de bancada estadual, de comissão permanente do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e de comissão mista permanente do Congresso Nacional e superação de impedimentos de ordem técnica, em atendimento ao disposto nos arts. 166, §§ 9º a 20, e 166-A da Constituição, nos arts. 71, 73 a 84 da Lei nº 14.791, de 29 de dezembro de 2023 e art. 4º, §§ 7º, 10 e 11 da Lei nº 14.822, de 22 de janeiro 2024, e dá outras providências".

 

A Portaria Conjunta n. 1/2024, portanto, disciplina a análise de emendas parlamentares no âmbito de todo o Poder Executivo Federal, no exercício de 2024 e, consequentemente, orienta a atuação de todos os Ministérios e autarquias contemplados com emendas, estabelecendo prazos e procedimentos a serem seguidos pelos servidores públicos responsáveis e pelos beneficiários das emendas. 

 

O art. 4º da Portaria Conjunta n. 1/2024, em consonância com as normas precedentes,  define as hipóteses de impedimento de ordem técnica nos seguintes termos:

 

Art. 4º São hipóteses de impedimento de ordem técnica, consideradas as dispostas no § 2º do art. 74 da Lei nº 14.791, de 29 de dezembro de 2023, Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2024 - LDO-2024:
I - incompatibilidade do objeto da despesa com finalidade ou atributos da ação orçamentária e respectivo subtítulo, bem como dos demais classificadores da despesa;
II - impedimentos cujo prazo para superação inviabilize o empenho no exercício financeiro ou no prazo previsto na legislação aplicável;
III - ausência de projeto de engenharia aprovado pelo órgão setorial responsável pela programação, nos casos em que for necessário;
IV - ausência de licença ambiental prévia, nos casos em que for necessária;
V - não comprovação, por parte de Estados, Distrito Federal ou Municípios que fiquem a cargo do empreendimento após sua conclusão, da capacidade de aportar recursos para sua operação e manutenção;
VI - não comprovação de que os recursos orçamentários e financeiros são suficientes para conclusão do empreendimento ou de etapa útil com funcionalidade que permita o imediato usufruto dos benefícios pela sociedade;
VII - incompatibilidade com a política pública aprovada no âmbito do órgão setorial responsável pela programação;
VIII - incompatibilidade do objeto proposto com o programa do órgão ou entidade executora;
IX - ausência de pertinência temática entre o objeto proposto e a finalidade institucional da entidade beneficiária;
X - não apresentação de proposta ou plano de trabalho ou apresentação fora dos prazos previstos;
XI - não realização de complementação ou ajustes solicitados em proposta ou plano de trabalho, bem como realização de complementação ou ajustes fora dos prazos previstos;
XII - desistência da proposta pelo proponente;
XIII - reprovação da proposta ou plano de trabalho;
XIV - valor priorizado insuficiente para a execução orçamentária da proposta ou plano de trabalho;
XV - não indicação de instituição financeira para recebimento e movimentação de recursos de transferências especiais pelo ente federado beneficiário na Transferegov.br;
XVI - omissão ou erro na indicação de beneficiário pelo autor da emenda, para RP 6 e RP 7.
XVII - CNPJ não correspondente ao do beneficiário;
XVIII - beneficiário incompatível com o subtítulo (localizador de gasto) da programação orçamentária da emenda;
XIX - inobservância da aplicação mínima obrigatória de setenta por cento em despesas de capital nas transferências especiais, por autor;
XX - não indicação da área da política pública na qual o recurso oriundo de transferências especiais será aplicado;
XXI - atendimento do objeto da programação orçamentária com recursos inferiores ao valor da dotação aprovada para o exercício financeiro, cujo impedimento incidirá sobre os saldos remanescentes;
XXII - impossibilidade de atendimento do objeto da programação orçamentária aprovada, ou de uma etapa útil do projeto, em decorrência de insuficiência de dotação orçamentária disponível;
XXIII - não observância da legislação aplicável ou incompatibilidade das despesas com a política pública setorial e critérios técnicos que a consubstanciam;
XXIV - incompatibilidade, devidamente justificada, com o disposto no art. 37 da Constituição;
XXV - incompatibilidade com diretrizes e critérios técnicos de execução das programações orçamentárias parte do Novo PAC, quando couber;
XXVI - alocação de recursos em programação de natureza não discricionária, na forma do art. 79 da LDO-2024; e
XXVII - outras razões de ordem técnica devidamente justificadas.
§ 1º Não constitui impedimento de ordem técnica a indevida classificação de Modalidade de Aplicação e de Grupo de Natureza de Despesa.
§ 2º Às emendas de que trata esta portaria não se aplicam outros impedimentos de ordem técnica, salvo disposição na LDO e em ato do Ministério do Planejamento e Orçamento.
 

O art. 5º, § 2º, da Portaria Conjunta n. 1/2024 , por sua vez, estabelece que os Órgãos Setoriais do Sistema de Planejamento e Orçamento Federal -  SPOF [2] podem, a seu critério, definir prazos e condições para o seu cumprimento:

 

Art. 5º Os Órgãos Setoriais do SPOF constantes dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social que tenham sido contemplados com emendas, após análise, concluirão pela existência ou não de impedimento de ordem técnica à execução da despesa.
(...)
§ 2º Os Órgãos Setoriais do SPOF poderão, a seu critério, delegar as atribuições de que trata este artigo às suas respectivas Unidades Orçamentárias - UOs, bem como definir prazos e condições para o seu cumprimento.

 

Tal regra, como dito, é coerente com os dispositivos da Constituição Federal, da LDO/2024 e da LCP n. 210/2024 acima destacados (que levam em consideração o prazo necessário à conclusão da análise) e tem por objetivo evitar que os proponentes protelem o atendimento às diligências do Poder Executivo até o último momento, sobrecarregando os órgãos técnicos nos últimos dias do ano, e forçando a aprovação de emendas que não preencham todos os requisitos constitucionais e legais aplicáveis.

 

Com efeito, este Ministério recebe, todos os anos, centenas de emendas parlamentares, e analisar todas elas na última semana do ano simplesmente não é uma opção, face à escassez de servidores e à complexidade da matéria (são muitos os impedimentos técnicos possíveis e toda a legislação específica deve ser observada).

 

Assim, conclui-se que é plenamente justificável, sob o ponto de vista da razoabilidade, e também considerando o disposto na legislação vigente, o estabelecimento de prazo para a análise técnica das emendas recebidas.

 

No caso em tela, há que se considerar que o prazo estabelecido pela SEFIC foi extremamente generoso, já que reservou apenas 3 (três) dias úteis (sendo que um deles com expediente pela metade) para conclusão da análise e todos os procedimentos que se seguem, após cumprimento das diligências pelos proponentes. Ou seja: a proposta foi recebida para análise no dia 19/12/2024, a diligência foi solicitada já no dia 20/12/2024 e a SEFIC estabeleceu o prazo de seis dias corridos para o seu cumprimento, ou seja: até 26/12/2024, sendo que o exercício financeiro encerrou-se no dia 31/12/2024.

 

Uma vez concluída essa breve digressão sobre a questão do prazo para superação dos impedimentos técnicos, passamos ao objeto da consulta propriamente dito.

 

Ressalto desde já que as duas questões apresentadas pela SEFIC estão intrinsecamente ligadas, e aqui já adianto a conclusão deste Parecer: a reversão do impedimento técnico seria inútil, neste momento, tendo em vista a inviabilidade de retorno da proposta para análise e formalização da parceria após o encerramento do exercício fiscal de 2024, face ao princípio da anualidade.

 

Ou seja, ainda que seja possível reverter o impedimento técnico (o que, em tese, é válido para o exercício financeiro de 2025, mas não para o exercício de 2024), essa reversão não tornará possível a formalização da parceria com os recursos de 2024, já que aquele exercício financeiro encontra-se encerrado e todas as notas de empenho nele emitidas e não liquidadas foram canceladas pelo órgão competente.

 

O princípio da anualidade encontra fundamento nos artigos 165, III, e 167, I, da Constituição Federal,​ e no art. 2º da Lei n. 4.320, de 17 de março de 1964, que estatui as normas gerais de Direito Financeiro para a elaboração e controle do orçamento da União, nos seguintes termos:

 
Constituição Federal
 Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:
(...)
III - os orçamentos anuais.
(...)
Art. 167. São vedados:
I - o início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual;
(...)
 
Lei n. 4.320/1964
Art. 2° A Lei do Orçamento conterá a discriminação da receita e despesa de forma a evidenciar a política econômica financeira e o programa de trabalho do Governo, obedecidos os princípios de unidade universalidade e anualidade.
 

O princípio da anualidade, portanto, ​estabelece a vinculação do período de vigência do orçamento público com o exercício financeiro, que coincide com o ano civil, de acordo com o art. 34 da Lei nº 4.320/1964. Esse princípio é um aspecto do mecanismo de "freios e contrapesos" entre os Poderes da República, e, portanto, decorrência do Estado Democrático de Direito, e visa garantir que o Poder Executivo obtenha, anualmente, autorização do Legislativo para arrecadar tributos e aplicar o dinheiro público, promovendo o controle e a transparência da gestão financeira. Nas palavras de Ricardo Lobo Torres [3]:

 

O princípio da anualidade orçamentária indica que o Legislativo deve exercer o controle político sobre o Executivo pela renovação anual da permissão para a cobrança dos tributos e a realização dos gastos, sendo inconcebível a perpetuidade ou a permanência da autorização para a gestão financeira.
Embora se tenha estremado do princípio da anualidade tributária, a anualidade orçamentária ainda é fundamental ao Estado Democrático, consagrada nas mais importantes Constituições, ainda que, às vezes, combinada com a plurianualidade.

 

A respeito do tema, trago à baila o Parecer n. 19/2016/DECOR/CGU/AGU (NUP 01400.007140/2014-72) que, a partir de consulta realizada pelo Ministério da Cultura, consolidou, no âmbito da Advocacia-Geral da União o entendimento segundo o qual não é possível a celebração de convênio em exercício distinto ao do respectivo empenho. Ou seja: para que o empenho possa ser inscrito em restos a pagar, o convênio tem que ser celebrado no mesmo ano da emissão do empenho. Do referido Parecer, vale transcrever o trecho em que se desenvolve a tese a respeito da impossibilidade de celebrar convênio com empenhos de outro exercício:

 

12. Parte-se aqui da conceituação precisa da fase de execução das despesas públicas denominada empenho.
 
13. O art. 58 da Lei n.º 4.320/64 fornece a definição legal de empenho: “O empenho de despesa é o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição”.
 
14. Todavia, a doutrina acertadamente contesta a ideia de que o empenho cria a obrigação de pagamento.
 
15. Regis Fernandes de Oliveira, apoiado nas lições de José Afonso da Silva e de Celso Bastos, desfaz a imprecisão técnica presente no art. 58 da Lei n.º 4.320/64:
 
19.5 Realização da despesa
Consuma-se a despesa em três fases: o empenho, a liquidação e o pagamento.
(...)
O empenho ‘é o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição’ (art. 58 da Lei 4.320/64). Na precisa lição de José Afonso da Silva, ‘consiste na reserva de recursos na dotação inicial ou no saldo existente para garantir a fornecedores, executores de obras ou prestadores de serviços pelo fornecimento de materiais, execução de obras ou prestação de serviços’. Materializa-se pela emissão de um documento que identifica a quem se deve pagar e quanto se paga. Anota Celso Bastos que ‘o empenho não cria a obrigação jurídica de pagar, como acontece em outros sistemas jurídico-financeiros. Ele consiste numa medida destinada a destacar, nos fundos orçamentários destinados à satisfação daquela despesa, a quantia necessária ao resgate do débito’.1
 
16. Kiyoshi Harada também ressalta que o empenho não faz nascer a obrigação para o Estado:
 
A primeira providência para efetuar uma despesa é seu prévio empenho, que significa o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de pagamento pendente de implemento de condição (art. 58). O empenho visa garantir os diferentes credores do Estado, na medida em que representa reserva de recursos na respectiva dotação inicial ou no saldo existente. É importante lembrar que o empenho, por si só, não cria obrigação de pagar, podendo ser cancelado ou anulado unilateralmente. O empenho limita-se a diminuir do determinado item orçamentário a quantia necessária ao pagamento do débito, o que permitirá à unidade orçamentária (agrupamento de serviços com dotações próprias) o acompanhamento constante da execução orçamentária, não só evitando as anulações por falta de verba, como também possibilitando o reforço oportuno de determinada dotação, antes do vencimento da dívida.
 
17. Com efeito, o que cria a obrigação para o Estado é o convênio, não o empenho. O título jurídico responsável pelo nascimento da obrigação de pagar é o convênio.
 
18. O que se diz não é inédito. O Tribunal de Contas da União assim se manifesta há tempos:
 
Acordão n.º 1653/2003 – Plenário
(...)
Parecer da Unidade Técnica
(...)
6. Embora a Lei nº 4.320/64 não estabeleça as exigências que devem anteceder a emissão de uma Nota de Empenho, é notório que tal ato é de praxe, inclusive à luz da doutrina, respaldado em atos formais tais como, contratos, convênios ou ajustes, excepcionando-se as transferências financeiras decorrentes de dispositivos constitucionais ou legais.
7. A referida Lei também não contempla em Restos a Pagar qualquer despesa, senão aquelas legalmente empenhadas no exercício financeiro, entendendo-se, como tal, não a simples ‘confecção’, no Siafi, da Nota de Empenho, mas também - e principalmente - a existência formal de um termo de compromisso que cria obrigação de pagamento para o Estado.
(...)
6. Como mencionado pela unidade técnica, não é a simples emissão do empenho que cria a obrigação de pagamento para o Estado. O compromisso nasce com a formalização do contrato, com a celebração do convênio, com a homologação da licitação ou outro fato que crie a relação obrigacional do Estado com terceiro. A emissão do empenho simplesmente formaliza a existência da obrigação, vinculando o recurso orçamentário ao pagamento de determinada despesa. Ademais, o decreto ressalva as situações em que a obrigação de pagamento para o Estado já tenha sido criada.
(...)
 
19. Só faz sentido falar em credor e devedor da obrigação a partir da celebração do convênio.
 
20. Ainda sobre empenho, vale observar os ensinamentos de Tathiane Piscitelli sobre as três modalidades de empenho (ordinário, global ou por estimativa) e perceber que em todos os casos a dúvida recai sobre o montante do gasto, e não sobre o credor deste:
 
A análise dos artigos 58 e 60 denota a existência de três modalidades de empenho: o empenho ordinário, o empenho global e o empenho por estimativa. Como a denominação sugere, o empenho ordinário é o mais usual e tem lugar sempre que a Administração já tem conhecimento prévio do montante da despesa, que deverá ser paga de uma só vez. Contudo, essa situação nem sempre se faz presente. Pode haver ou casos em que não é possível determinar o valor exato da despesa (como se verifica nos gastos constantes, como os de água, luz etc.), ou situações em que a despesa será paga parceladamente.
Na primeira hipótese, haveria empenho por estimativa, nos termos do disposto no artigo 60, § 2.º, da Lei 4.320/1964 – por ocasião da realização do gasto e fixação do valor, haverá o abatimento da quantia empenhada por estimativa. No segundo caso, teria lugar o empenho global, segundo estabelece o artigo 60, § 3.º: o valor da despesa está determinado, mas será pago de forma parcelada. A despeito disso, o empenho ocorre tendo-se em conta o valor total da despesa. Por fim, deve-se destacar que, em quaisquer dos casos, haverá emissão da nota de empenho respectiva, salvo situações expressamente previstas em lei quanto à dispensa da emissão de tal nota, mas não do empenho em si (artigo 60, § 1.º).3
 
21. Também é válido destacar que a materialização do empenho ocorre com a emissão da nota de empenho. E a Lei n.º 4.320/64 assim dispõe sobre os requisitos essenciais da nota de empenho:
 
“Art. 61. Para cada empenho será extraído um documento denominado ‘nota de empenho’ que indicará o nome do credor, a representação e a importância da despesa bem como a dedução desta do saldo da dotação própria.”
 
22. Ora, mais uma vez, observa-se que o nome do credor deverá ser conhecido nessa fase, e não posteriormente. A liquidação, fase seguinte ao empenho da despesa pública, representa a verificação da correção do empenho realizado. Não se presta a identificar o credor, que já deve estar determinado quando do empenho. Eis as considerações formuladas por Kiyoshi Harada sobre o tema:
 
Materializa-se [o empenho] pela emissão da ‘nota de empenho’, na qual constará o nome do credor, a representação e a importância da despesa, bem como a dedução desta do saldo da dotação própria (art. 61). Atualmente, a maioria das unidades orçamentárias se utiliza dos modernos recursos da informática, que substituem com vantagens, em termos de precisão e velocidade, os empenhos manuais.
A segunda etapa na realização de uma despesa é sua liquidação, que consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito (art. 63). Da mesma forma que o empenho, a liquidação nada cria, limitando-se a tornar líquida e certa a obrigação preexistente.
A terceira etapa é a ordem de pagamento, que outra coisa não é senão o despacho da autoridade competente determinando o pagamento da despesa (art. 64).
Finalmente, temos a etapa do pagamento que, uma vez efetivado em decorrência de regular liquidação da despesa e por ordem da autoridade competente (art. 62), extingue a obrigação de pagar.4
 
23. Neste momento, também é válido transcrever o art. 63 da Lei n.º 4.320/64, que cuida da liquidação da despesa, ou seja, verificação do título pertencente ao credor:
 
Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.
§ 1° Essa verificação tem por fim apurar:
I - a origem e o objeto do que se deve pagar;
II - a importância exata a pagar;
III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.
§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:
I - o contrato, ajuste ou acôrdo respectivo;
II - a nota de empenho;
III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.
 
(...)
 
25. Estabelecida a necessidade de identificação do credor já no momento do empenho, deve-se agora tecer considerações sobre a alegação de que a medida reclamada pelo Ministério da Cultura seria possível em razão da existência do instituto dos restos a pagar.
 
26. Ora, os restos a pagar estão positivados e devem ser vistos como exceção. No entanto, para que haja regular inscrição em restos a pagar, tem de haver obediência aos requisitos legais. E isso não ocorre no presente caso.
 
27. Os restos a pagar estão assim previstos no art. 36 da Lei n.º 4.320/64: “Consideram-se restos a pagar as despesas empenhadas mas não pagas até o dia 31 de dezembro distinguindo-se as processadas das não processadas”.
 
28. Não se desconhece que pode haver convênio formalizado em determinado exercício não pago e que deverá ser liquidado na forma de restos a pagar em exercício posterior. Por exemplo, caso o convênio e o empenho tenham sido regularmente formalizados em determinado exercício, mas o pagamento (última fase da realização da despesa pública) não aconteceu por alguma razão. Essa, sim, é a situação que poderá gerar uma inscrição válida em restos a pagar.
 
29. Mas o que se busca é outra coisa: permitir a inscrição como restos a pagar de despesa relativa a convênio que sequer foi formalizado. E isso não é possível.
 
30. Com efeito, o art. 92, parágrafo único, da Lei n.º 4.320/64 é decisivo para se chegar a tal conclusão:
 
Art. 92. A dívida flutuante compreende:
I - os restos a pagar, excluídos os serviços da dívida;
II - os serviços da dívida a pagar;
III - os depósitos;
IV - os débitos de tesouraria.
Parágrafo único. O registro dos restos a pagar far-se-á por exercício e por credor distinguindo-se as despesas processadas das não processadas.
 
31. O citado preceito é expresso: o registro em restos a pagar é feito por exercício e por credor. Ora, não é qualquer pessoa, qualquer proponente que deve ser indicado como credor. No caso, só faz sentido a inscrição em restos a pagar após a celebração do convênio, eis que a partir desse momento surge o legítimo credor.
 
32. A existência da figura jurídica do credor é indispensável. Só pode haver a inscrição em restos a pagar quando se sabe quem é o credor. Logo, a assinatura prévia do convênio é condição inafastável para a regularidade da inscrição em restos a pagar.
 
33. Se o empenho deve identificar a quem se paga, não pode ocorrer na inexistência de convênio.

 

Apesar de a consulta que originou o Parecer n.º 19/2016/DECOR/CGU/AGU tratar especificamente de convênios, e fundamentar-se na legislação vigente à época, as conclusões do opinativo aplicam-se ao presente caso, já que os princípios de direito orçamentário e financeiro que regem a transferência de recursos a entidades privadas são basicamente os mesmos, e a substância do regramento mencionado não mudou desde então, sendo de aplicação obrigatória ao caso em tela.

 

Em poucas palavras, pode-se concluir, a partir do referido Parecer, que o compromisso de pagamento nasce com a formalização do instrumento, e não com a emissão da nota de empenho.

 

No caso em tela, a nota de empenho foi emitida, mas o instrumento não foi celebrado dentro do exercício financeiro correspondente. 

 

Como visto, o órgão consulente questiona sobre a possibilidade de​ formalização da parceria após o encerramento do exercício fiscal de 2024 (ou seja, no exercício financeiro de 2025). Com base no exposto no Parecer n.º 19/2016/DECOR/CGU/AGU, percebe-se que a resposta a essa pergunta deve ser necessariamente negativa, se o recurso em questão é aquele mencionado na nota de empenho emitida em 2024. Ou seja: não é possível celebrar o instrumento de parceria em 2025 com base em nota de empenho emitida em 2024, face ao princípio da anualidade.

 

Em termos técnicos, o empenho de 2024 não poderia ter sido inscrito em restos a pagar, já que não houve liquidação da despesa durante o exercício financeiro. Isso porque, para inscrever despesas em restos a pagar, é necessário que Administração Pública Federal tenha assumido antes uma obrigação de pagamento. Ou seja, precisa existir um ato prévio, vinculando as partes em direitos e obrigações, que, no caso das parcerias, é a formalização (assinatura) de um instrumento (e não a nota de empenho). 

 

Para ilustrar essas conclusões, trago à baila dois julgados do Tribunal de Contas da União – TCU, mencionados no Parecer n.º 19/2016/DECOR/CGU/AGU, pelos quais a Corte de Contas determina expressamente que devem ser anulados os empenhos cujos compromissos não foram formalizados até 31 de dezembro:

 

DC-0615-47/94-P    Sessão: 05/10/94 Grupo: I Classe: I Relator: Ministro CARLOS ÁTILA ÁLVARES DA SILVA - Consulta – Denúncia 
[DECISÃO]
2. rever o subitem 8.1 da Decisão nº 411/94 - TCU - Plenário, com fundamento no Enunciado nº 145 da Súmula de Jurisprudência do Tribunal, para dar-lhe a seguinte redação:
‘1. conhecer da consulta, com fundamento no art. 1º, inciso XVII e § 2º, da Lei nº 8.443/92 c/c o art. 210, inciso II, § 3º, do Regimento Interno, para responder à ilustre consulente, em tese, que a utilização de créditos orçamentários empenhados no exercício só é válida para convênios assinados e com cronograma de desembolso aprovado que se restrinja ao próprio exercício, podendo, apenas, ser inscrito em Restos a Pagar, o saldo orçamentário não utilizado no exercício por motivo justificável, mas previsto no cronograma, devendo ser anulados os empenhos cujos compromissos não foram formalizados até 31 de dezembro, consoante claramente consignado na Nota STN/CONED/DIRAG nº 209, de 18.05.94 e na forma da legislação vigente.’
(...)
 
AC-2659-48/09-P     Sessão: 11/11/09 Grupo: I Classe: VII     Relator: Ministro RAIMUNDO CARREIRO - Fiscalização – Acompanhamento
Nesse contexto, não havendo a formalização do convênio até o dia 31 de dezembro do exercício financeiro em que as despesas foram empenhadas, o órgão ou entidade pública federal e o ente interessado em conveniar não ultrapassam o campo das intenções, o que não produz qualquer força obrigacional entre ambos.
Assim, com o final do exercício financeiro, sem a celebração do convênio, a despesa é anulada e a importância revertida à dotação orçamentária, nos moldes do art. 38 da Lei nº 4.320/64. Em outras palavras, de acordo com a legislação de regência, os valores referentes ao convênio têm como destinação a Conta Única do Tesouro Nacional, não mais ficando afetos à proposta oferecida - mas não regularmente contratada - no exercício financeiro terminado.
Daí se conclui que, ainda que o ente demandante tenha regularizado sua situação no ano seguinte, não é possível que o órgão ou entidade pública federal celebre o ajuste, dado que, após a mudança de exercício financeiro, os recursos que estavam destinados à execução da proposta oferecida pelo ente já foram - ou deveriam ser, à luz da legislação de regência - revertidos à Conta Única do Tesouro Nacional, não podendo o Poder Judiciário, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos poderes, determinar a criação de dotação específica para tal fim. A propósito, como o convênio é um ajuste que disciplina uma transferência voluntária realizada em razão de interesses recíprocos, deixando de existir interesse dos órgãos ou entidades da Administração Pública Federal, estes não têm a obrigação de celebrar o acordo.
(...)

 

Tendo em vista o caráter impositivo da emenda, vale mencionar, ainda, Acórdão recente do TCU que estabeleceu com nitidez lapidar que, ainda que o recursos seja oriundo de emenda parlamentar, não há respaldo legal para que se proceda à inscrição em restos a pagar de empenho emitido em um determinado exercício sem que tenha sido celebrado o instrumento correspondente no mesmo exercício, sob pena de violação ao princípio constitucional da anualidade orçamentária:

 

 

ACÓRDÃO Nº 1106/2024 – TCU – Plenário
Processo nº TC 024.805/2020-3.
 
50. Do exposto, verifica-se que as despesas primárias discricionárias, incluídas as emendas parlamentares ao orçamento, para que sejam de execução obrigatória, estão condicionadas ao cumprimento de metas fiscais, à superação de impedimentos de ordem técnica e à aderência a princípios que regem a administração pública, dentre eles o da legalidade. Além disso, os estágios de execução da despesa (empenho, liquidação e pagamento), bem como os critérios para inscrição em restos a pagar, devem balizar-se pelas normas de Direito Financeiro, em especial a Lei 4.320/1964 e o Decreto 93.872/1986, conforme detalhado acima.
51. Com efeito, entende-se que a obrigatoriedade de execução das programações orçamentárias (§ 10 do art. 165 da Constituição Federal) deve ser compreendida em conjunto com as demais regras do Direito Financeiro, com destaque para a anualidade orçamentária, postulado também insculpido na Lei Maior.
52. Neste aspecto, não há previsão legal para se proceder ao empenho da despesa em um determinado exercício, sem vinculação a uma obrigação ou credor específico, e, em seguida, inscrever essa dotação em restos a pagar para executá-la no exercício seguinte, ainda que o regime de execução da programação orçamentária seja obrigatório, sob pena de violação ao princípio constitucional da anualidade orçamentária. Nessa mesma esteira, a violação desse princípio tem condão de elevar o montante de despesas inscritas em restos a pagar que, potencialmente, também desobedeçam aos requisitos estabelecidos pelo Decreto 93.872/1986, em especial, o disposto nos arts. 29, 30, § 2º e 35.
(sem destaques no original)

 

 

Portanto, em situações como a que ora se apresenta, cabe ao gestor cancelar a nota de empenho e reverter os recursos à Conta Única do Tesouro Nacional, nos moldes do art. 38 da Lei nº 4.320/64, não sendo possível utilizar os recursos de 2024 para a celebração de instrumento em 2025 .

 

No entanto, nada impede que nova emenda parlamentar seja apresentada no exercício de 2025, e venha a ser analisada pelo Ministério da Cultura, com fundamento na legislação vigente no ano corrente. Nesse caso, se os impedimentos técnicos identificados pela SEFIC em 2024 forem tempestivamente sanados pela entidade beneficiária, atentando-se aos prazos e procedimentos válidos para o corrente exercício financeiro, o instrumento poderá ser celebrado, desde que o empenho correspondente seja emitido no mesmo exercício financeiro em que a emenda foi apresentada.

 

 

CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, e ressalvados os aspectos de conveniência e de oportunidade não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, entende-se que não há possibilidade jurídica de retorno da proposta para análise e formalização da parceria após o encerramento do exercício financeiro de 2024, face ao princípio orçamentário da anualidade. 

 

No entanto, nada impede que nova emenda parlamentar seja apresentada no exercício de 2025, e venha a ser analisada pelo Ministério da Cultura, com fundamento na legislação vigente no ano corrente. Nesse caso, se os impedimentos técnicos identificados em 2024 forem tempestivamente sanados pela entidade beneficiária, atentando-se aos prazos e procedimentos válidos para o corrente exercício financeiro, o instrumento poderá ser celebrado, desde que o empenho correspondente seja emitido no mesmo exercício em que a emenda foi apresentada.

 

Isso posto, submeto o presente Parecer à consideração superior, sugerindo que, após aprovação, os autos sejam encaminhados à Secretaria da Economia Criativa e Fomento Culturalpara as providências cabíveis.

 

 

 

 

DANIELA GUIMARÃES GOULART

Advogada da União

Coordenadora-Geral

 

Notas:

[1] Dispositivos de teor semelhante encontram-se na LDO/2025 (Lei n. 15.080/2024), atualmente vigente.

 

[2] Portaria Conjunta MF/MPO/MGI/SRI-PR nº 1, de 1º de abril de 2024
Art. 2º Para fins desta Portaria, considera-se:
(...)
II - Órgão Setorial do SPOF: unidades de planejamento e orçamento dos Ministérios, da Advocacia-Geral da União, da Vice-Presidência e da Casa Civil da Presidência da República, e demais unidades equiparadas a órgãos setoriais, que tenham sido contempladas com emendas, nos termos da Lei nº 10.180, de 6 de fevereiro de 2001;
 
[3] TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 17a Edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2010. P. 116.
 
 

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