ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CÂMARA NACIONAL DE PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS DISCIPLINARES - CNPAD/DECOR/CGU


PARECER n. 00001/2025/CNPAD/CGU/AGU

 

 

NUP: 00688.000720/2019-10.

INTERESSADO: DECOR.

ASSUNTO: Art. 117, inciso X, da Lei nº 8.112/1990.

 

 

ART. 117, INCISO X, DA LEI Nº 8.112/1990 – PARTICIPAÇÃO DE GERÊNCIA OU ADMINISTRAÇÃO DE SOCIEDADE PRIVADA – EXERCÍCIO DO COMÉRCIO – ATUAÇÃO DE FATO E CONDUTA REITERADA – PROPOSTA DE NOVA REDAÇÃO AO ENUNCIADO Nº 11 DO MANUAL DE BOAS PRÁTICAS EM MATÉRIA DISCIPLINAR DA CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO.
I – A caracterização da infração administrativa prevista no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990, inerente a “participar de gerência ou administração de sociedade privada” ou a “exercer o comércio”, por parte do servidor público, pressupõe, em relação à respectiva conduta, (i) o exercício de fato e (ii) a atuação reiterada e habitual.
II – Proposta de nova redação ao Enunciado nº 11 do Manual de Boas Práticas em Matéria Disciplinar da Consultoria-Geral da União.

 

 

Sra. Diretora do DECOR,

 

 

I – RELATÓRIO:

 

01. Trata-se da análise de aspectos jurídicos atinentes à participação de gerência ou à administração de sociedade privada por parte de servidor público federal, além do exercício do comércio, diante do disposto no art. 117, inciso X, da Lei nº 8.112/1990, in verbis:

 

Art. 117.  Ao servidor é proibido:                    (Vide Medida Provisória nº 2.225-45, de 4.9.2001)
[...]
X - participar de gerência ou administração de sociedade privada, personificada ou não personificada, exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário;                      (Redação dada pela Lei nº 11.784, de 2008)
[...] (Destacamos)
 

02. Isso porque, em resposta ao OFÍCIO-CIRCULAR n. 00003/2021/CONSUNIAO/CGU/AGU (Seq. 01 – NUP 00688.001077/2021-58), pelo qual a Câmara Nacional de Procedimentos Administrativos Disciplinares (CNPAD) solicitou, a órgãos consultivos, o encaminhamento de temas controversos, sensíveis e/ou relevantes em regime disciplinar no âmbito da respectiva unidade, a Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Turismo (CONJUR/MTUR), por meio do DESPACHO n. 01447/2021/CONJUR-MTUR/CGU/AGU (Seq. 59 – NUP 00688.001077/2021-58), sugeriu este tema para análise da CNPAD: a “participação de gerência ou administração de sociedade privada por Servidor público, conforme o conceito de ‘administrador de fato ou de direito’ segundo a Administração pública e os tribunais superiores”.

 

03. Ademais, em atenção ao Ofício nº 0034/2021/DECOR/CGU/AGU, pelo qual foi solicitada a sugestão de temas para uniformização de entendimento em matéria disciplinar, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) suscitou, por meio de Despacho situado no Seq. 545 do NUP 00688.000720/2019-10, o seguinte aspecto: o “exercício de gerência: parecer orientativo para definição da necessidade de reiteração de atos e gerência em determinado período de tempo pelo servidor”.

 

04. Dessa forma, por meio deste opinativo, a CNPAD, nos moldes da Portaria CGU nº 3/2019, realiza a análise, diante do art. 117, inciso X, da Lei nº 8.112/1990, tanto (i) da “participação de gerência ou administração de sociedade privada por Servidor público, conforme o conceito de ‘administrador de fato ou de direito’ segundo a Administração pública e os tribunais superiores”, quanto (ii) do “exercício de gerência: parecer orientativo para definição da necessidade de reiteração de atos e gerência em determinado período de tempo pelo servidor”.

 

05. É o relatório. Passa-se a opinar.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO:

 

06. Conforme exposto, este opinativo objetiva analisar dois aspectos jurídicos atinentes à participação de gerência ou à administração de sociedade privada, além do exercício do comércio, por parte de servidor público federal, diante do disposto no art. 117, inciso X, da Lei nº 8.112/1990.

 

07. Vale lembrar que o art. 117, inciso X, da Lei nº 8.112/1990, preconiza que, ao servidor público federal, é vedado “participar de gerência ou administração de sociedade privada, personificada ou não personificada, exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário”.

 

08. Assim, o dispositivo em apreço veda, ao servidor público federal, além de “exercer o comércio”, “participar de gerência ou administração de sociedade privada”, frisando-se que a proibição em tela não se aplica, especialmente, nos casos de:

 

(i) assunção, pelo servidor público, da condição de “acionista, cotista ou comanditário” de sociedade privada, nos termos da parte final do inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990;
 
(ii) participação nos conselhos de administração e fiscal de empresas ou entidades em que a União detenha, direta ou indiretamente, participação no capital social ou em sociedade cooperativa constituída para prestar serviços a seus membros (art. 117, parágrafo único, inciso I, da Lei nº 8.112/1990); 
 
(iii) gozo de licença para o trato de interesses particulares, na forma do art. 91 da Lei nº 8.112/1990, observada a legislação sobre conflito de interesses (em especial, a Lei nº 12.813/2013), conforme art. 117, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 8.112/1990; e
 
(iv) participação no âmbito de fundação e associação (art. 5º, inciso II, da Portaria Normativa MP nº 6, de 15 de junho de 2018), já que não se inserem no termo “sociedades privadas”, contido no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990.

 

09. Dito isso, acerca do primeiro aspecto, inerente à “participação de gerência ou administração de sociedade privada por Servidor público, conforme o conceito de ‘administrador de fato ou de direito’ segundo a Administração pública e os tribunais superiores”, convém salientar que a doutrina ensina que a “caracterização da gerência da empresa privada se configura com o poder de mando do servidor na atividade privada[1]

 

10. Nessa toada, em linhas gerais, o “gerente” da sociedade privada tem a função de gerir os negócios da empresa, bem como que o “administrador” possui amplos poderes de coordenação e mando das atividades societárias.

 

11. Sobre a questão, ao se realizar uma interpretação literal do inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990, vê-se que os termos “participar” e “exercer”, contidos no mencionado dispositivo, denotam uma situação de atuação na prática.

 

12. Tanto é que o art. 3º da Portaria Normativa MP nº 6, de 15 de junho de 2018, preceitua que a caracterização do exercício de gerência ou administração de sociedade privada exige tanto que a sociedade privada esteja em atividade (ainda que irregularmente), quanto que “exista atividade efetiva, direta [...] e com poder de mando do servidor como gerente ou administrador da sociedade privada”, senão vejamos:

 

Art. 3º A caracterização do exercício de gerência ou administração de sociedade privada exige:
I - que a sociedade privada, personificada ou não, esteja em atividade, ainda que irregularmente; e
II- que exista atividade efetiva, direta, habitual e com poder de mando do servidor como gerente ou administrador da sociedade privada.
(Destaque nosso)

 

13. Nessa direção, a atual redação do Enunciado nº 11 do Manual de Boas Práticas em Matéria Disciplinar, da Consultoria-Geral da União, já exige o “exercício de fato” da gerência ou administração de sociedade privada para a configuração da falta disciplinar prevista no art. 117, inciso X, da Lei nº 8.112/1990, assim:

 

Enunciado nº 11: Configura a falta disciplinar prevista no art. 117, inciso X, da Lei nº 8.112/90, o exercício de fato da gerência ou administração pelo servidor público, de sociedade privada personificada ou não personificada, em concomitância com o desempenho de cargo público. (Destacamos)

 

14. Aliás, na fundamentação do supracitado enunciado, externou-se tanto que “a penalidade de demissão, prevista no art. 132, inciso XIII, da Lei nº 8.112/90, somente seja aplicada quando se comprovar, no curso da investigação disciplinar, o exercício de fato da administração da sociedade, não bastando a mera constatação do nome do servidor como sócio gerente ou administrador nos atos constitutivos”, quanto que “evita-se, assim, a aplicação da pena expulsória, dentre outras situações, para aquelas situações em que houve dissolução irregular da sociedade, assim como o fechamento do estabelecimento empresarial ou a extinção do conjunto de bens destinados à exploração da atividade societária, antes do ingresso do servidor público no cargo”.

 

15. No mesmo sentido, sobre o tema, a Controladoria-Geral da União, no âmbito do seu Manual de Processo Disciplinar, consignou o entendimento de que a caracterização da infração disciplinar em questão carece de atuação, na prática, do servidor público como gerente ou administrador de sociedade privada, não bastando a verificação formal do disposto no respectivo contrato social, senão vejamos: 

 

De outro lado, o dispositivo não veda a participação do servidor em contrato de sociedade, à medida em que a proibição se dirige ao agente público que atua na administração ou gerência de sociedade – seja de fato ou de direito.
Assim, figurar como sócio em contrato social não configura, por si só, a infração disciplinar. É preciso verificar se o servidor participa da sociedade como gerente ou administrador. Da mesma forma, o simples fato de o servidor constar do contrato do social como mero sócio cotista, acionista ou comanditário, como consta da parte final do inciso X do art. 117, não afasta por completo a possibilidade do enquadramento, em especial quando há indícios de que o servidor atua na administração ou gerência da sociedade (participação de fato).
É o caso do servidor que, não constando do quadro social, ou constando apenas como sócio, se utiliza de um sócio-gerente ou administrador meramente formal, normalmente seu parente próximo, atuando o servidor de maneira oculta como o verdadeiro gestor da sociedade.
Sem a pretensão de uma conceituação rigorosa, administrador é aquele designado pelo contrato social ou outro ato societário com amplos poderes de coordenação e mando das atividades societárias. Gerente, por sua vez, é o empregado da sociedade contratado para gerir os negócios, comprando insumos, contratando e dispensando mão de obra, assinando contratos etc.
Portanto, não basta que o servidor, na qualidade de sócio ou acionista, participe das reuniões ou assembleias societárias, ou ainda fiscalize as atividades da sociedade, que são poderes intrínsecos à qualidade de participante do contrato de sociedade [...]
Deste modo, ainda que o servidor esteja designado no contrato social como sócio-gerente ou administrador, cumpre comprovar efetivamente os atos de gerência e administração para que o servidor seja responsabilizado. Pois, por diversas vezes, observa-se a manutenção do servidor no contrato social da empresa na qualidade de administrador ou gerente, função esta não exercida pelo agente público efetivamente [...]
Convém ressaltar que a apuração da comissão abrange fatos pretéritos, isto é, o colegiado deve averiguar se o servidor realizou os atos de gerência e administração após sua nomeação ao cargo público, porquanto a infração não alcance momento anterior à posse na função incompatível. (Manual de Processo Disciplinar da Controladoria-Geral da União. Brasília. Maio/2022. Páginas 210/2016). (Grifamos)

 

16. Nesse compasso, o art. 5º da Portaria Normativa MP nº 6, de 15 de junho de 2018 preceitua que não se considera o exercício, por parte do servidor público, de gerência ou administração de sociedade privada, notadamente, "a inscrição do servidor no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ", "a mera indicação de servidor como sócio administrador em contrato social" ou "a constituição de empresa individual de responsabilidade limitada"[2].

 

17. Inclusive, o entendimento no sentido de que a caracterização da infração administrativa contida no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990 pressupõe o exercício de fato, por parte do servidor público, das respectivas condutas, mostra-se alinhada com a interpretação teleológica ou finalística do referido dispositivo.

 

18. Com efeito, a proibição insculpida no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990 visa a, notadamente, tanto resguardar a dedicação do servidor no serviço público, quanto prevenir potenciais conflitos de interesse[3], conforme consignado no Manual de Processo Disciplinar da Controladoria-Geral da União, senão vejamos: 

 

À luz do referido dispositivo, apontam-se dois objetos que são protegidos por esta norma:
a) a dedicação e compromisso do servidor para com o serviço público; e
b) a prevenção de potenciais conflitos de interesse entre os poderes inerentes ao cargo público e o patrimônio particular dos servidores, já que em muitas ocasiões poderá haver influência positiva do Poder Público na atividade empresarial (nomenclatura utilizada para fins didáticos). (Manual de Processo Disciplinar da Controladoria-Geral da União. Brasília. Maio/2022. Página 210). (Destacamos)

 

19. Dessa forma, vê-se que os objetivos inerentes à proibição contida na norma em apreço denotam a necessidade do exercício de fato, pelo servidor público, das condutas preconizadas no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990.

 

20. Nessa direção, em relação ao exercício de fato da respectiva conduta para a caracterização da infração administrativa preconizada no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990, o Superior Tribunal de Justiça entende que:            

 

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ANULAÇÃO EX OFFICIO. POSSIBILIDADE. INOCORRÊNCIA. BIS IN IDEM. PROPORCIONALIDADE. PENALIDADE. DEMISSÃO. CONTRADITÓRIO. AMPLA DEFESA.
[...]
3. Não fere os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade a imposição da pena de demissão aos servidores se, ao final do processo administrativo, resta demonstrada a prática da conduta prevista no art. 117, inciso X, da Lei 8.112/90, qual seja, participar de gerência ou administração de empresa privada [...] ou exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário, nos termos do art. 132 daquele dispositivo legal [...]
(MS nº 7.491/DF. STJ. Relator Ministro Fernando Gonçalves. Julgamento em 18/02/2002). (Destacamos)  

 

21. Portanto, diante (i) dos ensinamentos doutrinários inerentes à questão, (ii) da interpretação literal e teleológica do dispositivo em foco, (iii) do posicionamento que tem sido adotado na Administração Pública Federal em relação à matéria e (iv) do entendimento do STJ acerca do tema, constata-se que a caracterização da infração administrativa prevista no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990 pressupõe, por parte do servidor público, o exercício de fato da respectiva conduta, não bastando a verificação formal do contrato social.

 

22. Avançando, quanto ao segundo aspecto, relativo ao exercício de gerência: parecer orientativo para definição da necessidade de reiteração de atos e gerência em determinado período de tempo pelo servidor, cumpre expor que a infração disciplinar inerente a participar de gerência ou de administração de sociedade privada pressupõe o comportamento ilícito reiterado, e, não, ato isolado, de modo que constitui falta administrativa de caráter habitual

 

23. Nesse ponto, convém destacar que o art. 3º da Portaria Normativa MP nº 6, de 15 de junho de 2018, prevê que a caracterização do exercício de gerência ou administração de sociedade privada exige, entre outras condições, atividade “habitual, desta forma:

 

​Art. 3º A caracterização do exercício de gerência ou administração de sociedade privada exige:
[...]
II- que exista atividade efetiva, direta, habitual e com poder de mando do servidor como gerente ou administrador da sociedade privada.
(Grifo nosso)

 

24. Nesse compasso, a Controladoria-Geral da União, no âmbito do seu Manual de Processo Disciplinar, externou que “um ou poucos atos de gestão não configuram a infração em comento, tendo em vista a interpretação que se extrai da palavra “participar de gerência ou administração de sociedade privada[4].

 

25. Até porque, a proibição em apreço visa, notadamente, a resguardar a dedicação do servidor no serviço público, a qual, em tese, só poderia, no caso, ser ameaçada em caso de realização da conduta vedada de forma reiterada e habitual.

 

26. Nessa linha, o STJ entende que a infração administrativa atinente ao “exercício do comércio”, para fins de contagem do prazo prescricional, constitui falta de cunho “permanente, nos seguintes termos:

 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AGENTE DA POLÍCIA FEDERAL. TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR. ATOS DE COMÉRCIO. INFRAÇÃO DE CUNHO PERMANENTE. TERMO INICIAL. CESSAÇÃO DA PRÁTICA DA INFRAÇÃO. PENA. DEMISSÃO. INOCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO OCORRÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE NO JULGADO. EFEITOS INFRINGENTES. IMPOSSIBILIDADE.
[...]
3. In casu, em que pese o argumento da parte embargante no sentido de que estaria prescrita a pretensão punitiva, uma vez que o prazo prescricional começaria a correr da data em que o fato se torna conhecido, não se pode olvidar do comando inserido no artigo 142, § 1º, da Lei nº 8.112/90, posto que, por se tratar de transgressão permanente, o prazo de prescrição começa a contar do dia em que cessou a permanência, conforme dicção do artigo 391, § 1º, do Decreto 59.310/66.
4. Interrompida a prescrição em 06/07/04 e voltando o prazo prescricional a correr por inteiro, após 140 dias, tem-se que a pretensão punitiva da Administração estaria prescrita em 23/11/09. Dessa forma, não há falar em prescrição porquanto o ato demissional foi levado a efeito dentro desse prazo, ou seja, em 22/09/09.
5. Embargos de declaração rejeitados.
(STJ. EDcl no MS nº 14.672. Relator Ministro Adilson Vieira Macabu - Desembargador convocado do TJ/RJ. Decisão em 27/04/2011. Publicação em 23/05/2011). (Destacamos)

 

27. Assim, vislumbra-se que a configuração da infração inerente a “participar de gerência ou administração de sociedade privadacarece de uma conduta reiterada e habitual por parte do respectivo servidor público federal.

 

28. Logo, tendo em vista (i) o posicionamento que tem sido adotado na Administração Pública Federal em relação à matéria (ii) a finalidade insculpida no dispositivo em foco e (iii) o entendimento do STJ acerca do tema, percebe-se que a caracterização da infração administrativa prevista no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990 carece, por parte do servidor público, o exercício do comportamento ilícito de forma habitual e reiterada.

 

29. Da mesma forma, a Controladoria-Geral da União, por meio do Enunciado nº 9, de 30 de outubro de 2015 (publicado no DOU de 16/11/2015), consignou o seguinte entendimento em relação aos aspectos analisados neste opinativo:  

 

Enunciado CGU nº 9, de 30 de outubro de 2015:
ILÍCITO SÓCIO-GERÊNCIA - ATUAÇÃO FÁTICA E REITERADA.
Para restar configurada a infração disciplinar capitulada no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/90, é preciso que o servidor, necessariamente, tenha atuado de fato e de forma reiterada como gerente ou administrador de sociedade privada. (Destacamos)

 

30. No mais, em relação ao exercício do comércio, vale expor que os “atos de comércio” foram, no âmbito do Código Civil de 2002, absorvidos pela “teoria da empresa”, salientando-se, nessa direção, que o caput do art. 966 do Código Civil preconiza que “considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”, ao passo que o parágrafo único do mencionado dispositivo preceitua que “não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa”.

 

31. Com isso, o inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990, ao proibir que o servidor público federal exerça “atos de comércio”, veda o exercício de “atividade empresarial”, ainda que de forma individual, com a exceção das ressalvas aplicáveis (mencionando-se, em especial, tanto a parte final do inciso X quanto o parágrafo único, ambos do art. 117 da Lei nº 8.112/1990).

 

32. Nesse aspecto, aplica-se, à vedação de “exercer o comércio”, a mesma lógica incidente sobre a proibição de “participar de gerência ou administração de sociedade privada”, de modo que a configuração da infração em tela exige, por parte do servidor público, tanto o exercício de fato da respectiva conduta, não bastando a verificação formal de inscrição no CNPJ ou de registro de empresário individual, quanto o comportamento ilícito habitual e reiterado, e, não, ato isolado.

 

33. Aliás, nesse ponto, entendimento em sentido diverso se mostraria contrário à noção da “teoria da empresa”, consubstanciada no âmbito do caput do art. 966 do Código Civil. 

 

34. Portanto, a caracterização da infração administrativa prevista no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990, inerente a “participar de gerência ou administração de sociedade privada” ou a “exercer o comércio”, pressupõe, por parte do servidor público, tanto o exercício de fato da conduta, não bastando a verificação formal do contrato social, de inscrição no CNPJ ou de registro de empresário individual​, quanto o comportamento reiterado e habitual, e, não, ato isolado.

 

III – CONCLUSÃO:

 

35. Ante o exposto, conclui-se que a caracterização da infração administrativa prevista no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990, inerente a “participar de gerência ou administração de sociedade privada” ou a “exercer o comércio”, por parte do servidor público, pressupõe, em relação à respectiva conduta, (i) o exercício de fato e (ii) a atuação reiterada e habitual.

 

36. Por fim, propõe-se nova redação ao Enunciado nº 11 do Manual de Boas Práticas em Matéria Disciplinar da Consultoria-Geral da União, para assim passar a ficar:

 

ENUNCIADO Nº 11.
A caracterização da infração administrativa prevista no inciso X do art. 117 da Lei nº 8.112/1990, inerente a “participar de gerência ou administração de sociedade privada” ou a “exercer o comércio”, por parte do servidor público, pressupõe, em relação à respectiva conduta, (i) o exercício de fato e (ii) a atuação reiterada e habitual.

 

À consideração superior.

 

 

Brasília, 22 de abril de 2025.

 

 

 

Documento assinado eletronicamente

RENATO DO REGO VALENÇA

Advogado da União

Relator

 

 

De acordo com o Relator:

 

 

 

​ÁGUEDA CRISTINA GALVÃO PAES DE ANDRADE

Procuradora Federal

 

 

 

 

ANA LUIZA DE CARVALHO MONTENEGRO MAGALHÃES

Advogada da União

 

 

 

 

DEBORA VASTI DA SILVA DO BOMFIM DENYS

Procuradora Federal

 

 

 

 

GUILHERME RASO MARQUES

Procurador da Fazenda Nacional

 

 

 

 

​JULIANA SILVA BARROS DE MELO SANT’ANA

Procuradora Federal

 

 

 

 

LEONARDO VIZEU FIGUEIREDO

Procurador Federal

 

 

 

 

LUZIA FONSECA AZEVEDO

Procuradora da Fazenda Nacional

 

 

 

 

RAPHAEL RODRIGUES VALENÇA DE OLIVEIRA

Advogado da União

 

 

 

 

RÔMULO DE CASTRO BARROS

Advogado da União

 

 

 

 

SÉRGIO ANDRADE DE CARVALHO FILHO

Procurador da Fazenda Nacional


[1] MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. Tratado de direito administrativo disciplinar. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2008. P. 524-525.

 

[2] ​Cumpre registrar que o caput do art. 41 da Lei nº 14.195/2021 previu que "as empresas individuais de responsabilidade limitada existentes na data da entrada em vigor desta Lei serão transformadas em sociedades limitadas unipessoais independentemente de qualquer alteração em seu ato constitutivo". 

 

[3] Nesse aspecto, cumpre destacar a Lei nº 12.813/2013, que dispõe sobre o conflito de interesses no exercício de cargo ou emprego do Poder Executivo federal.

 

[4] Manual de Processo Disciplinar da Controladoria-Geral da União. Brasília. Maio/2022.


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