ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
DEPARTAMENTO DE COORDENAÇÃO E ORIENTAÇÃO DE ÓRGÃOS JURÍDICOS


 

DESPACHO n. 00713/2019/DECOR/CGU/AGU

 

NUP: 02001.000803/2013-11

Interessada: Procuradoria-Geral Federal                                          

Assunto: Atualização monetária da compensação ambiental prevista no art. 36 da Lei nº 9.985, de 2000.     

 

 

Exmo. Senhor Consultor-Geral da União,

 

 

Aprovo o Parecer nº 77/2019/Decor-CGU/AGU.

 

Cuida-se de manifestação que se destina a apreciar o índice de correção monetária que incide sobre a compensação ambiental de que trata o art. 36 da Lei nº 9.985, de 2000. Sobre a natureza da atualização monetária, esta Advocacia-Geral da União possui posicionamento vinculante, consubstanciado no Parecer nº GQ-111, lançado nos seguintes termos:  

 

15. A correção monetária é "instrumento pelo qual - através do reajuste de unidades pecuniárias - se mantém o equilíbrio entre a dívida e o valor da prestação destinada à satisfação do credor", na feliz assertiva de Humberto Gomes de Barros, quando, como Procurador-Geral, analisou a questão no âmbito da Administração do Distrito Federal. É a conseqüência da corrosão da moeda, isto é, o "descompasso, ao longo do tempo, entre a expressão nominal e a expressão real do dinheiro, assentando, por tal meio a correspondência verdadeira entre duas nominações numéricas ao longo da dilação temporal" (Celso Antônio Bandeira de Mello, Contrato de Obra Pública com Sociedade de Economia Mista - Atraso no Pagamento de Faturas, in RDP n° 74/ 103-116, p. 114). É adequação do valor material da obrigação ao valor formal. Para Caio Tácito, "a correção monetária não altera a substância econômica; altera apenas a sua expressão nominal, em termos monetários, eliminando a instabilidade no valor real dos pagamentos e mantendo a eqüivalência legítima das obrigações bilaterais, quando não são simultâneas, mas sucessivas ou diferidas no tempo. É, em suma, o antídoto eficaz aos efeitos da inflação sobre as relações jurídicas entre o Estado e os particulares" (Direito Administrativo, São Paulo, Saraiva, 1975, p. 332). A "correção monetária não tem nenhuma semelhança com juros, que são um plus. Ela é a própria indenização primitiva quando retificada", como disse o Ministro Xavier de Albuquerque (RTJ 79/735), ao apartear o Ministro Djaci Falcão, no julgamento da Reclamação n°35-SP, em 04/04/74 (RTJ 79/726). É a atualização do débito, para que seja completa a satisfação do credor. Como disse, também, o Ministro Célio Borja (R.E. n°113.892- SP), "a correção monetária foi instituída para que se mantenha o poder de compra da moeda, tendo em vista sua crescente desvalorização.(...) tem por finalidade a atualização do crédito; não é penalidade por atraso, como são os juros contratados." Ou, ainda, como disse o Ministro Cordeiro Guerra, já em 1975, "a correção monetária não remunera o capital, apenas assegura sua identidade no tempo." (R.E. n°82.419 - SP, D.J. 10/12/75, p. 9.263).
16. Não é, portanto, uma pena e independe de culpa, como já reconheceram o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça. Não é, também, um "plus" a exigir expressa previsão legal, mas simples atualização da dívida, decorrência natural da retenção indevida. Sua incidência objetiva exclusivamente manter o valor da prestação. Não configura nenhum acréscimo e independe, pois, de expressa previsão legal. Como diz Maria da Graça Antunes Varela, a "despesa já foi autorizada por Lei. Não pagar a correção monetária implica pagar menos do que a Lei autorizou. Pagá-la implica gastar exatamente o permitido em Lei. O princípio da legalidade não é, de forma alguma desrespeitado." (Correção monetária de valores quitados com atraso pela Administração Pública,in Revista da Procuradoria Geral do Estado da Bahia, vol. 14, p. 23-28, especificamemte p.25).
17. Em regime inflacionário anormal, o pagamento de débitos vencidos, sem a atualização de seu valor nominal, configura pagamento incompleto, insusceptível de saldar a obrigação. E se o pagamento é incompleto, ganha o devedor por não ter que desembolsar a quantia devida; perde o credor, justamente aquele que, tendo tido seu direito violado, deveria merecer a proteção do Direito. Quem recebe com atraso e sem correção, recebe valores menores do que aqueles a que teria direito. Não recebe a real satisfação do que lhe cabe por direito. "O risco da depreciação monetária, ou seja, da desvalorização do poder aquisitivo da moeda corre por conta do devedor, que tem a disponibilidade do valor até o momento do efetivo pagamento", como diz Arnoldo Wald em artigo intitulado "Aspectos processuais da aplicação da teoria das dívidas de valor". (Revista de Informação Legislativa, nº 69, jan/mar. 1981, p. 229-260, especialmente, p.239).
18. Não constitui, como supôs a PGFN, indenização por danos sofridos. Para fazer jus à indenização, o lesado deve comprovar o prejuízo e a indenização deve ser fixada, tendo em vista diversos fatores. Não é assim no caso de correção monetária, que é devida para que o pagamento seja integral, completo.
19. A correção monetária tem conteúdo essencialmente moral: visa a evitar o enriquecimento ilícito do devedor contra o correspondente empobrecimento do credor, titular do direito de crédito. Não houvesse a correção, o devedor seria tanto mais beneficiado quanto mais tempo demorasse para saldar o débito, para cumprir a obrigação a que estivesse sujeito. E, inversamente, o credor, titular do direito, seria tanto mais prejudicado quanto mais tempo demorasse a ver satisfeito o seu direito. Ganharia o faltoso, perderia o titular do direito. Premiar-se-ia o inadimplente e punir-se-ia, sem qualquer razão plausível, o credor, pois, em época inflacionária, pagamento feito com atraso e sem correção monetária é pagamento a menor, pagamento incompleto. Tal situação repugna a qualquer sistema jurídico e, mais ainda, ao sistema vigente num Estado democrático de direito.

 

Na espécie, a correção monetária dos valores devidos a título de compensação decorrente de empreendimento de significativo impacto ambiental rege-se, precipuamente, pelo preceito do tempus regit actum, consoante razões jurídicas postas no Parecer ora aprovado, e em estrito respeito à preservação da segurança jurídica e da incolumidade dos atos praticados antes da edição da Medida Provisória nº 809, de 2017, assim, em brevíssima síntese, deve ser consolidado o entendimento no sentido de que: 

 

a) incidem os indexadores especifica ou genericamente normatizados para cada período anterior à Medida Provisória nº 809 em relação aos valores fixados precedentemente à sua vigência, a exemplo da Taxa Referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - Selic, que se aplica nas hipóteses submetidas à Instrução Normativa Ibama nº 11, de 2013; e
 
b) aplica-se o art. 14-B da Lei nº 11.516, de 2007 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E), em relação aos valores fixados a partir de sua entrada em vigor, ou seja, a partir da publicação no Diário Oficial da União da Medida Provisória nº 809, de 2017, posteriormente convertida na Lei nº 13.668, de 2018.

 

Caso acolhido, cientifique-se a Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Meio Ambiente, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, a Procuradoria-Geral Federal, a Procuradoria Federal Especializada junto ao Ibama e a Procuradoria Federal Especializada junto ao ICMbio.

 

Brasília, 4 de novembro de 2019.

 

VICTOR XIMENES NOGUEIRA

ADVOGADO DA UNIÃO

DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE COORDENAÇÃO E ORIENTAÇÃO DE ÓRGÃOS JURÍDICOS

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 02001000803201311 e da chave de acesso b5d565b7

 




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