ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CÂMARA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DE ENTENDIMENTOS CONSULTIVOS - CNU
PARECER n. 0003/2017/CNU/CGU/AGU
NUP: 00671.000641/2014-75
INTERESSADOS: DEPARTAMENTO DE COORDENAÇÃO E ORIENTAÇÃO DE ORGÃOS JURÍDICOS E OUTROS
ASSUNTOS: LICITAÇÕES, CONTRATOS E PATRIMÔNIO
EMENTA: ADMINISTRATIVO. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. CREDENCIAMENTO DE ORGANIZAÇÕES CIVIS DE SAÚDE PARA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS COMPLEMENTARES AOS MILITARES E DEPENDENTES. VIGÊNCIA DO EDITAL DE CREDENCIAMENTO: POSSIBILIDADE DE PRAZO INDETERMINADO. NÃO SUJEIÇÃO AOS LIMITES DE PRORROGAÇÃO DO ART. 57, INCISO II, DA LEI 8.666/93. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONTINUIDADE DO CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS DE HABILITAÇÃO EXIGIDOS NO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO. REAJUSTE: POSSIBILIDADE DE NÃO PREVISÃO PELO EDITAL DA APLICAÇÃO AUTOMÁTICA DE ÍNDICE OU ÍNDICE ESPECÍFICO. NÃO OBRIGATORIEDADE DE PESQUISA DE MERCADO PARA ATUALIZAÇÃO DOS PREÇOS.
I - É possível a utilização do credenciamento para a prestação de serviços de assistência-médico-hospitalar aos militares e seus dependentes (Decreto nº 95.512/1986), por inexigibilidade de licitação decorrente da inviabilidade de competição, em razão da ausência de exclusão de interessados.
II - É admissível o estabelecimento de vigência indeterminada ao credenciamento, com inexistência de prazo limite para que os interessados possam comparecer e se credenciar perante a Administração Pública, sem prejuízo de alteração ulterior das regras de credenciamento.
III - vigência das contratações firmadas com o fornecedor credenciado não será fixada, necessariamente, em instrumento contratual de serviços contínuos, com base no inciso II do artigo 57 da Lei nº 8.666/93. Nessa hipótese, as contratações ocorrerão autonomamente a cada demanda pela prestação do serviço, seguindo a regra própria e, quando pertinente, adotando instrumentos aptos à substituição do contrato, conforme admitido pelo artigo 62 da Lei nº 8.666/93.
IV - As peculiaridades do segmento econômico afeto ao objeto do credenciamento tornam desnecessário que o edital imponha a aplicação automática de índice ou índice específico para determinados itens ou serviços, havendo respaldo legal para que o instrumento convocatório preveja atualização anual de preços pela Administração, com isso assegurando-se que os valores praticados no âmbito do credenciamento só se alterem em caso de real necessidade e que os valores continuem efetivamente compatíveis com a realidade do setor.
V - É desnecessária a realização de prévia e formal pesquisa de mercado para atualização anual dos preços, tendo, por outro lado, a Administração o dever de instruir os autos com justificativa da adequação dos preços praticados ou propostos.
1. Versa a presente análise acerca de expediente, encaminhado inicialmente pela Consultoria Jurídica da União no Estado do Acre – CJU/AC ao Departamento de Coordenação e Orientação de Órgãos Jurídicos DECOR, informando a existência de divergência de entendimentos jurídicos entre diversos órgãos de assessoramento jurídico vinculados à Consultoria Geral da União, especificamente no que tange a prorrogação contratual de credenciamentos de Organizações Civis de Saúde junto ao FUSEX e a forma de reajuste desses contratos. Tendo em vista tal divergência, requereu-se manifestação da CGU a fim de pacificar a divergência, na forma do art. 14 do Decreto nº 7.392/2010. (MEMORANDO nº 00004/2014/CGERAL/CJUAC/CGU/AGU).
2. Alguns questionamentos acabam por sintetizar a problemática, nos seguintes termos:
3. Dada a evidente relevância das questões suscitadas e a diversidade de posicionamentos firmados por distintos órgãos de assessoramento jurídico vinculados à Consultoria Geral da União, o Diretor do DECOR entendeu que a matéria deveria ser levada à apreciação e deliberação da Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos desta Consultoria Geral da União, na forma do Ato Regimental AGU n. 1, de 4 de fevereiro de 2016, consoante o Despacho nº 00311/2016/DECOR/CGU/AGU.
4. Posteriormente, houve designação do Advogado da União Dr. Stanley Silva Ribeiro como Relator Ad Hoc, no âmbito da CNU, por meio do Despacho n° 00001/2016/1ª Turma CNU/ CGU/AGU.
5. No Parecer do Relator sustentou-se:
6. A Consultoria-Jurídica da União do Estado de Minas apresentou o primeiro Parecer Revisor, de autoria da Advogada da União Drª Vanessa Canêdo Pinto Boaventura, que apontou divergência apenas em relação à realização de pesquisa de preços quando da prorrogação, entendendo ser necessária a realização de tal cotação para a comprovação da manutenção da vantajosidade, após a aplicação do reajuste.
7. Ato contínuo, foi apresentado um segundo Parecer Revisor, de autoria do Advogado da União Dr. Carlos Freire Longato, no qual foram abordados diversos aspectos, inclusive, sobre a própria natureza jurídica do credenciamento, bem como aspectos atinentes a questões orçamentárias.
8. Após deliberação, em sessão do Plenário da CNU, convencionou-se submeter algumas propostas de orientações preliminares à análise da Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Defesa, das Consultorias Jurídicas Adjuntas junto às Forças Armadas, e das respectivas áreas técnicas.
9. Os Representantes da Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Defesa, da Consultoria Jurídica Adjunta junto ao Exército e do Hospital das Forças Armadas trouxeram contribuições e apontamentos ao exame da Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos, conforme descrito na Ata da 8ª Sessão ordinária da CNU, realizada no dia 15 de fevereiro de 2017. Segue transcrição da síntese de suas contribuições:
“Abrangência do entendimento firmado pela CNU –Exército Brasileiro
Considerando que as divergências/questionamentos que foram formuladospelas Consultorias Jurídicas nos Estados e levados à apreciação da Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos dizem respeito aos processos de credenciamento de organizações civis de saúdequeocorreram no âmbito do Exército,entende-se que oposicionamento/orientação que será firmadopela CNUdeverá ser direcionado somente aoExército,haja vista que a Marinha e a Aeronáutica possuem fundos de saúde que vem funcionando de forma satisfatória, sem divergências de entendimentos e não apresentando problemas de operacionalização;
Utilização de Termo de Adesão(item 4)
Que o ato formal de credenciamento se dê através da assinatura de Termo de Adesão, uma vez que a sugestão da CNU de publicação de Portaria, por ser ato assinado apenas pela autoridade, poderia gerar insegurança jurídica;
Índice a ser aplicado –FIPE-saúde(item 10)
Que o índice a ser utilizado para correção dos valores das tabelas de preços seja o FIPE-saúdeuma vez que este melhor reflete a variação dos preços para osetor de saúde;
Cláusula no Termo de Adesão prevendo a negociação de valores
Que seja elaborada Cláusula no Termo de Adesão que permita a realização de negociação da União com o credenciado para a redução de valores no caso de aquisição de procedimentos/materiaisde forma combinada.”
10. Após o exame e discussão das contribuições apresentadas, o Plenário da CNU deliberou, chegando às seguintes conclusões, também registradas na Ata da 8ª Sessão ordinária da CNU, realizada no dia 15 de fevereiro de 2017.
11. Seguem conclusões registradas pelos membros da Câmara Nacional de Uniformização:
a) quanto à ponderação da Conjur/MD, no sentido de se restringir a orientação proposta pela CNU apenas aos credenciamentos realizados pelo Fusex, decidiu-se pelo não acatamento, vencido o Dr. Victor Ximenes Nogueira;
b) quanto à sugestão de alteração do item 4 das orientações preliminares, de modo a substituir-se a portaria por assinatura de termo de adesão, por unanimidade o Plenário deliberou por acatá-la, concluindo-se, entretanto que:
b1) deve ser preservada a necessidade de publicação de portaria de credenciamento;
b.2) o termo de adesão deve ser previsto como um anexo ao edital de credenciamento, a ser preenchido pelo interessado e por ele entregue juntamente com a carta-proposta, quando do requerimento de credenciamento;
b.3) em caso de atendimento apenas parcial do pedido de credenciamento, o interessado deverá ser convocado para apresentar nova carta-proposta e termo de adesão ajustados aos serviços e itens autorizados para credenciamento, resguardada a possibilidade de apresentar-se em qualquer tempo pedido de credenciamento (carta-proposta e termo de adesão) para os itens inicialmente não atendidos, ou para outros que não tenham sido solicitados, caso o interessado entenda que preenche ou passou a preencher os requisitos para os respectivos requisitos de habilitação;
c) quanto ao prazo de vigência do edital, por unanimidade, deliberou-se haver respaldo jurídico na proposição de inexistir prazo limite para que interessados possam comparecer perante a administração pública e solicitar o credenciamento, concluindo-se por ser indeterminado o prazo do edital, sem prejuízo deste submeter-se a alterações no curso do credenciamento, inclusive no rol dos serviços, preços e demais termos e condições, que vincularão os credenciados mediante cláusula no edital prevendo que, salvo pedido de descredenciamento, a adesão ao mesmo implica no aceite de suas eventuais alterações supervenientes;
d) quanto à natureza continuada ou não dos serviços de assistência médico-hospitalar, e possível aplicação do art. 57, inciso II, da Lei nº 8.666/1993 aos credenciamentos, deliberou-se, por maioria, que há respaldo jurídico para que sua vigência não seja fixada por prazo determinado, desde que o edital preveja que periodicamente os credenciados demonstrem a continuidade do cumprimento dos requisitos de habilitação exigidos no instrumento convocatório, vencido o Dr. Victor Ximenes Nogueira;
e) quanto ao índice de reajuste aplicável, entendeu-se que as peculiaridades do segmento econômico afeto ao objeto torba juridicamente possível que o edital não preveja a aplicação automática de índice ou índice específico para determinados itens ou serviços, concluindo-se por haver respaldo legal a que o instrumento convocatório preveja atualização anual de preços pela Administração, com isso assegurando-se que os valores praticados no âmbito do credenciamento só se alterem em caso de real necessidade, e que os valores continuem efetivamente compatíveis com a realidade do setor;
f) quanto à obrigatoriedade ou não de realização de prévia pesquisa de mercado setorial para atualização anual dos preços, firmou-se o entendimento majoritário de que tal seria desnecessário, facultativo, ou não obrigatório, em qualquer caso incumbindo à Administração o dever de instruir os autos com justificativa da adequação dos preços praticados, vencidos os Drs. Bruno Andrade Costa, Maria Vitória Barros de Silva Saraiva, Arthur Porto Carvalho, Joaquim Modesto Pinto Júnior, e Victor Ximenes Nogueira; e
g) quanto à sugestão apresentada pela Conjur/MD, no sentido de se permitir a realização de negociação da União com o credenciado para redução de valores no caso de aquisição de procedimentos ou materiais de forma combinada, deliberou-se que a matéria não deveria ser tratada no Parecer nem tampouco na Orientação Normativa a ser exarada pela Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos, vencidos os Drs. Arthur Porto Carvalho , Teresa Villac Pinheiro Barki, Luiz Palumbo Neto, André Luís Rodrigues de Souza, Rafael Magalhães Furtado e Victor Ximenes Nogueira.
12. Diante dos entendimentos oriundos dos debates firmados, convencionou-se que este Advogado da União seria o relator do Parecer, consolidando as conclusões apresentadas pelos membros da CNU.
13. É o relatório. Passamos a opinar.
2.1 - Delimitação da problemática e direcionamento da solução jurídica
14. A presente análise busca, em síntese, compreender alguns aspectos complexos e substanciais acerca do instituto do credenciamento, a fim de ofertar soluções jurídicas adequadas a algumas questões procedimentais passíveis de entendimentos diversos, de acordo com as conclusões apresentadas pelos membros da Câmara Nacional de Uniformização-CNU.
15. Importante frisar que os elevados debates realizados no âmbito da CNU já indicaram as conclusões a serem seguidas nesta manifestação, o que torna desnecessário maior aprofundamento sobre esses pontos. Nossa função, aqui, é de materializar neste Parecer essas conclusões, fruto da decisão do Colegiado.
16. Antes de ingressar, propriamente, nas aludidas conclusões, cabe tecer, num primeiro momento, algumas considerações sobre o instituto jurídico investigado, buscando refletir sobre suas particularidades.
2.2 Aspectos Gerais sobre o Credenciamento (Hipótese de Inexigibilidade)
17. A Constituição Federal, notadamente em seu artigo 37, XXI, enunciou o princípio da obrigatoriedade da licitação, sendo sua disciplinadora maior e regrando que: “Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.”
18. Importante frisar que o princípio da obrigatoriedade (de licitar) se manifesta sobre duas perspectivas: a burocrática e a democrática. Pela perspectiva burocrática, o princípio da obrigatoriedade estabelece ao Poder público o compromisso de realizar licitações para contratar obras, serviços, compras e alienações, ressalvadas as hipóteses admitidas pela legislação (contratação direta). Noutro diapasão, pela perspectiva democrática, o princípio da obrigatoriedade impõe que seja protegido o direito dos particulares de, consagrada a isonomia, ter resguardada a possibilidade de participação na seleção necessária ao atendimento daquela pretensão contratual da Administração Pública, de acordo com as condições e exceções previstas pela legislação.
19. Nesse prumo, tomando por base as lições basilares em matéria de licitações, sabe-se que a realização de procedimento licitatório busca prestigiar o princípio da isonomia e, de forma reflexa, elevar os princípios da moralidade administrativa e da impessoalidade, tendo como um de seus objetivos alcançar a proposta mais vantajosa. Seguindo a linha imposta pelo princípio da obrigatoriedade de licitar, notadamente em sua perspectiva burocrática, via de regra, a Administração Pública deverá realizar licitação pública antes da celebração de seus contratos.
20. Contudo, o próprio constituinte admitiu que a obrigatoriedade de licitar comporta ressalvas ou exceções. Uma das situações em que a obrigatoriedade de licitar é afastada, dá-se, justamente, naquelas hipóteses em que a competição se apresenta inviável.
21. No caso da inexigibilidade, em virtude da inviabilidade de competição, não há sentido em se exigir submissão do negócio ao procedimento licitatório se este não é apto (ou é prejudicial) ao atendimento do interesse público (objetivo pretendido com determinada contratação), pois, a finalidade, a razão de ser do formalismo licitatório, é tal atendimento, através de seleção da melhor proposta. Nessa feita, competição inviável, para fins de aplicação da hipótese de inexigibilidade licitatória, não ocorreria apenas nas situações em que é impossível haver disputa, mas também naquelas em que a disputa é inútil ou prejudicial ao atendimento da pretensão contratual, pelo confronto e contradição com aquilo que a justifica (o interesse público).
22. Tem-se que, a inexigibilidade de licitação deriva da inviabilidade de competição, estabelecida no caput do artigo 25 da Lei nº 8.666/1993, o qual prescreve ser “inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: (...)”.
23. Dada a evidente dificuldade de relacionar todas as hipóteses de inviabilidade de competição, a redação dada ao dispositivo restringiu-se a elencar algumas situações meramente exemplificativas daquilo que poderia ser considerado como tal, o que se percebe facilmente pela utilização da expressão em especial, encontrada no final do caput do referido artigo.
24. Os casos típicos de inexigibilidade ocorrem nas hipóteses de existência de um único fornecedor ou prestador de serviço que atende aos requisitos necessários a satisfação do interesse público. Contudo, deve-se destacar que a inviabilidade de competição não compreende um conceito simples, nem corresponde a uma ideia única. Trata-se de um gênero, que congrega em sua estrutura diferentes modalidades, como ausência de pluralidade de alternativas; ausência de mercado concorrencial; impossibilidade de julgamento objetivo e ausência de definição objetiva da prestação1. Em síntese, a inviabilidade de competição é uma consequência, que poderá ser resultado de diferentes causas consistentes nas inúmeras hipóteses de ausência dos pressupostos básicos da licitação2.
25. Tais considerações tornam natural a percepção de que a inexigibilidade compreende situações em que a utilização da regra básica de licitação não é a via mais adequada para alcançar os objetivos perseguidos pela Administração. Impor a realização do procedimento licitatório nos casos de inexigibilidade seria prejudicar a concretização do próprio interesse público.
26. É imperioso destacar que o caput do art. 25 da Lei 8.666/1993 é dotado de função autônoma, de modo que a contratação direta poderá se justificar direta e exclusivamente por meio dele. Não é necessário que a hipótese seja verificada em um dos incisos do mencionado artigo, os quais apresentam, como dito anteriormente, natureza meramente exemplificativa3.
27. Seguindo este raciocínio, embora não esteja explicitamente prevista no corpo do art. 25, uma hipótese de inexigibilidade de licitação, que tem sido amplamente utilizada e reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência, é aquela que consagra a figura do credenciamento. Nesse prumo, Raquel Melo Urbano de Carvalho4 lembra essa hipótese de inexigibilidade, em que a Administração aceita como colaborador todos aqueles que, atendendo as motivadas exigências públicas, manifestem interesse em firmar contrato ou acordo administrativo (“credenciamento”).
28. Assim, quando a possibilidade de contratação for colocada de forma aberta, acessível para todas as pessoas que satisfaçam os requisitos exigidos e nela tenham interesse, não haverá sentido em se fixar qualquer competição. Não há uma seleção, no sentido de disputa, mas um credenciamento. Dá-se uma hipótese de inexigibilidade, pois a falta de necessária submissão à disputa entre os interessados inviabiliza a competitividade. No caso do credenciamento, basta que o interessado atenda as exigências estabelecidas para a ulterior contratação.
29. Conforme bem exarado pelo Parecer nº 07/2013/CPLC/DEPCONSU/PGF/AGU, no credenciamento, a “inviabilidade de competição decorre essencialmente da possibilidade de se contratar todos os que se enquadrarem nos requisitos estabelecidos pela Administração, indistintamente”. Assim, “nos casos em que o credenciamento faz-se possível, não haverá como avaliar se um é melhor ou pior nem mais barato ou mais caro do que outro, porque todos atendem perfeitamente ao interesse da Administração”.
30. No credenciamento inexiste a chamada relação de exclusão, tendo em vista que todos os interessados em contratar com a Administração Pública que demonstrem atender as suas exigências podem ser contratados. Ao reconhecer que o procedimento licitatório só é viável nas situações em que se verifica tal relação de exclusão, isto é, em que a Administração escolhe determinada pessoa ou grupo limitado de pessoas para contratar, chega-se à conclusão de que tal hipótese configura inviabilidade de competição e, por conseguinte, inexigibilidade de licitação pública5. No mesmo sentido, Sidney Bittencourt lembra que não há competição na hipótese em que é fixado o valor que se pretende pagar pelo objeto pretendido e a Administração convoca todos os profissionais de determinado setor, dispondo-se a contratar os que tiverem interesse e satisfaçam os requisitos estabelecidos6.
31. Desde outrora, ao tratar sobre essa hipótese de inviabilidade de competição, Carlos Ari Sundfeld7 teceu lições segundo as quais o princípio da igualdade, tido como a razão de existência da obrigação de licitar, claramente já indicaria as situações que, embora gerem verdadeiros vínculos entre particular e Administração, não dependem, por razões de ordem lógica, de anterior procedimento licitatório, por configurar uma disputa desnecessária ou impossível. Ele ainda acrescenta que, “se a Administração pretende credenciar médicos ou hospitais privados para atendimento à população e se admite credenciar todos os que preencham os requisitos indispensáveis, não há que falar em licitação”. Nesse prumo, o credenciamento pressupõe a inexistência de disputa direta e de relação de exclusão8, dado que todos os interessados que demonstrem aptidão serão aproveitados, de acordo com os critérios definidos no edital de credenciamento.
32. O Próprio Tribunal de Contas da União (TCU) já há muito admitiu em seus julgados a utilização do credenciamento, como manifestação de uma hipótese implícita de inexigibilidade:
6. A questão da inexigibilidade de licitação para realização do “credenciamento” foi objeto de vasta análise no âmbito do Tribunal (TC nº 008.797/93-5). Inicialmente, o procedimento foi sugerido pela Comissão constituída, para oferecer proposta de modificação das normas de assistência médica complementar do Tribunal (OS nº 49/92), e em seguida, analisado pela então Secretaria Jurídica – SEJUR, pelo Chefe do Serviço de Controle de Afastamento e Benefícios Médicos – SCABM e pela Secretaria de Auditoria, que concluíram pela legalidade da contratação de serviços de saúde, com inexigibilidade de processo licitatório, utilizando-se o critério do credenciamento (TCU, Decisão 104/95 – Plenário).
33. Com vistas a prezar os aspectos essenciais do credenciamento, evitando abuso na utilização desse instrumento, é importante atentar para algumas diretrizes. Questionado sobre a legalidade do credenciamento, o Egrégio Tribunal de Contas da União - TCU (Decisão 656/1995) posicionou-se de forma positiva, com espeque no caput do art. 25 da Lei 8.666/93, desde que tal procedimento observe os princípios da Administração Pública e atenda aos seguintes requisitos:
1 - Ampla divulgação, inclusive por meio “de convites a interessados do ramo que gozem de boa reputação profissional”;
2 - fixar os critérios e exigências mínimas para que os interessados possam credenciar-se, de modo que os profissionais, clínicas e laboratórios que vierem a ser credenciados tenham, de fato, condições de prestar um bom atendimento, sem que isso signifique restrição indevida ao credenciamento;
3 - fixar, de forma criteriosa, a tabela de preços que remunerará os diversos itens de serviços médicos e laboratoriais e os critérios de reajustamento, bem assim as condições e prazos para o pagamento dos serviços faturados;
4 - consignar vedação expressa do pagamento de qualquer sobretaxa em relação à tabela adotada, ou do cometimento a terceiros (associação de servidores, p. ex.) da atribuição de proceder ao credenciamento e/ou intermediação do pagamento dos serviços prestados;
5 - estabelecer as hipóteses de descredenciamento, de forma que os credenciados que não estejam cumprindo as regras e condições fixadas para o atendimento, sejam imediatamente excluídos do rol de credenciados;
6 - permitir o credenciamento, a qualquer tempo, de qualquer interessado, pessoa física ou jurídica, que preencha as condições mínimas exigidas;
7 - prever a possibilidade de denúncia do ajuste, a qualquer tempo, pelo credenciado, bastando notificar a Administração, com a antecedência fixada no termo;
8 - possibilitar que os usuários denunciem qualquer irregularidade verificada na prestação dos serviços e/ou no faturamento; e
9 - fixar as regras que devam ser observadas pelos credenciados no atendimento (como p. ex. proibição de que o credenciado exija que o usuário assine fatura ou guia de atendimento em branco). (TCU 656/1995. Processo n.º TC 016.522/95-8. Relator Ministro Homero Santos. DOU 28.12.1995. Página 22.549).
34. Outrossim, o TCU já indicou alguns requisitos que devem ser observados no procedimento de credenciamento9, dentre eles:
a) a contratação de todos os que tiverem interesse e que satisfaçam as condições fixadas pela Administração, não havendo relação de exclusão;
b) a garantia da igualdade de condições entre todos os interessados hábeis a contratar com a Administração, pelo preço por ela definido;
c) a demonstração inequívoca de que as necessidades da Administração somente poderão ser atendidas dessa forma, cabendo a devida observância das exigências do art. 26 da Lei 8.666/93, principalmente no que concerne à justificativa de preços.
35. O Instituto do credenciamento vem sendo utilizado com frequência nas contratações da Administração Pública, destacando-se principalmente no campo das Forças Armadas, na contratação de serviços médicos de caráter complementar.
36. A contratação resultante do credenciamento deverá observar a igualdade de condições de todos os interessados que demonstrarem atendimento às exigências da Administração Pública. Destarte, para que possa realizar o credenciamento, a Administração Pública deverá elaborar um documento que regulamente todos os aspectos que o envolvem, como as atividades a serem desempenhadas pelo credenciado, as condições para o credenciamento, o regime de execução contratual, bem como a contraprestação que se comprometerá a pagar10.
37. Apesar da garantia de igualdade entre os credenciados, isso não significa que todos receberão a mesma remuneração, tendo em vista que uns podem ser mais requisitados do que outros. Na hipótese de serviço médico, admite-se que a escolha seja feita pelo próprio beneficiário interessado, entre os profissionais previamente credenciados. De qualquer forma, deve-se evitar que, a despeito de uma pluralidade de particulares credenciados, possa a escolha do credenciado chamado a atender a demanda administrativa concreta decorrer da vontade do gestor público. Uma vez que não há vencedor, mas uma pluralidade de credenciados aptos ao atendimento da demanda administrativa, necessário resguardar a devida rotatividade, impedindo beneficiamentos a um ou a outro credenciado.
38. Os critérios utilizados para evitar tais beneficiamentos variarão de acordo com as prestações envolvidas. Em relação a alguns serviços, o critério pode ser a escolha do terceiro a ser atendido (como nos serviços médicos); em relação à contratação de companhias aéreas, pode ser a adequação ao atendimento do interesse público na situação concreta (ponderando-se elementos fáticos como: opções de vôo, economicidade e atividade administrativa a ser realizada); em outras situações pode ser o sorteio ou uma ordem de atendimento (como nos casos de serviços advocatícios credenciados ou divulgação de atos administrativos por transmissão radiofônica).
39. Enquanto hipótese de contratação direta, o credenciamento se apresenta como um instrumento fundamental para contratações de determinados serviços, notadamente naqueles em que atende ao interesse público que a prestação das atividades que se pleiteia a contratação se dê de forma múltipla. Nessa linha de raciocínio, mais recentemente, o Tribunal de Contas da União reiterou que o credenciamento é hipótese de inviabilidade de competição não expressamente mencionada no art. 25 da Lei 8.666/93 (cujos incisos são meramente exemplificativos), sendo adotado quando a Administração tem por objetivo dispor da maior rede possível de prestadores de serviços. Segundo o Tribunal, nesta situação, “a inviabilidade de competição não decorre da ausência de possibilidade de competição, mas sim da ausência de interesse da Administração em restringir o número de contratados”11.
40. Percebe-se, então, que o credenciamento pode ser utilizado em várias pretensões contratuais, com certa flexibilidade em sua compleição, notadamente nas prestações de serviço em que, para o atendimento do interesse público, é mais vantajosa a contratação simultânea de vários particulares ao invés da seleção excludente de um ou poucos vencedores de um certame. Esse procedimento deve manter-se aberto, permitindo o credenciamento de interessados aptos à prestação do serviço. Desta percepção, é fundamental perceber que o credenciamento não detém natureza jurídica de contrato administrativo, não se submetendo às prerrogativas e restrições inerentes ao seu regime.
41. Assim, por um lado, o credenciamento, per si, não permite à Administração a utilização de determinadas prerrogativas extraordinárias ínsitas ao contrato administrativo (como a vedação à rescisão unilateral por parte do contratado), por outro, não traz consigo as mesmas restrições impostas pelo específico regime jurídico desses específicos contratos firmados pela Administração (como a obediência hermética às regras de vigência indicadas pelo artigo 57 da lei nº 8.666/93). Esta percepção é fundamental e norteou as conclusões da Câmara Nacional de Uniformização, fundamentando o estabelecimento de premissas que corrigem certo desvirtuamento burocrático gerado na modelagem construída pela doutrina e jurisprudência.
42. Feitas as pertinentes considerações, passaremos a tratar das conclusões consignadas pela Câmara Nacional de Uniformização.
2.3. Dos pontos a serem firmados, sobre o credenciamento
43. Tendo em vista os debates e contribuições trazidas à Câmara Nacional de Uniformização, os membros do colegiado decidiram por firmar pontos de conclusão acerca do tema posto à análise, os quais serão sucintamente explicados nos tópicos a seguir.
2.3.1 Do ato formal de credenciamento
44. Não há em nosso ordenamento a definição de um ato formal específico, como o adequado para iniciar a eficácia do procedimento de contratação direta, por inviabilidade de competição, denominado credenciamento.
45. Seria possível apontar como ato jurídico passível de produção de tais efeitos a publicação de Portaria, no Diário Oficial, contendo a qualificação do credenciado, o termo inicial (correspondente à data da publicação da portaria) e final de vigência do credenciamento além de outros termos e condições do edital.
46. Contudo dado ao caráter permanentemente aberto do credenciamento, bem como ao fato de que ele presume uma concordância do particular com o seu credenciar, o Plenário da Câmara concordou com a ponderação apresentada pelos órgãos jurídicos que compareceram às reuniões do Plenário12, no sentido de que o ato formal de credenciamento se dê através da assinatura de Termo de Adesão (o qual deve estar previsto como um anexo ao edital de credenciamento), uma vez que a simples publicação de Portaria, por ser ato assinado apenas pela autoridade, poderia gerar insegurança jurídica.
47. Contudo, nada obstante a assinatura de termo de adesão, pelo pretenso credenciado, após a aferição, pelo órgão credenciador, de que o credenciado atende todas as exigências estabelecidas para a prestação dos serviços pretendidos, parece mais adequado compreender que o início dos efeitos jurídico do credenciamento ocorre apenas após a publicação da portaria de credenciamento, a qual tem o condão de, periodicamente, dar publicidade a tais relações jurídicas, para fins de transparência e de controle social, reunindo o nome dos diversos pedidos de credenciamentos deferidos em determinado período.
48. Nessa feita, o prestador do serviço só passa a deter a prerrogativa de caracterizar-se como credenciado após a publicação da respectiva Portaria, a qual ocorrerá periodicamente, de acordo com as regras definidas previamente, reproduzindo os pedidos de credenciamento deferidos e os seus respectivos itens a credenciar, de acordo com o edital.
49. Outrossim, em caso de atendimento apenas parcial do pedido de credenciamento, o interessado poderá posteriormente apresentar nova documentação, incluindo-se novo termo de adesão, ajustada aos serviços e itens autorizados para credenciamento, resguardada a possibilidade de apresentar-se posteriormente pedido de credenciamento para os itens inicialmente não atendidos ou para outros que não tenham sido solicitados.
2.3.2 Do prazo de vigência do edital
50. A falta de regulamentação do credenciamento, disciplinando suas premissas e seu procedimento, é fonte de inúmeras dúvidas quanto à aplicação de alguns dispositivos da Lei de Licitações nº 8.666/93, a exemplo da possibilidade de prorrogação contratual do seu prazo.
51. Nesse ponto, é fundamental perceber que o credenciamento não detém natureza jurídica de contrato administrativo, motivo pelo qual, a priori, não se submete às prerrogativas e restrições inerentes ao seu regime.
52. Nesta feita, reitere-se, o credenciamento não permite à Administração valer-se de determinadas prerrogativas extraordinárias específicas do contrato administrativo. ínsitas ao contrato administrativo. Cite-se, como exemplo, a faculdade admitida ao particular credenciado de pedir unilateralmente seu descredenciamento, o que, no regime do contrato administrativo seria inadmissível, sob pena de sancionamento. Da mesma forma, não pode a Administração obrigar, unilateralmente, o fornecedor a credenciar-se em serviços diferentes daqueles para os quais ele firmou sua adesão, pois não há nesta relação a mesma prerrogativa contratual para tanto.
53. Noutro prumo, o credenciamento não traz consigo as mesmas restrições impostas pelo específico regime jurídico desses específicos contratos firmados pela Administração. Assim, ele não exige a indicação prévia dos recursos orçamentários para a execução durante toda a sua validade, nem se submete às rígidas e ultrapassadas regras de vigência indicadas pelo artigo 57 da Lei nº 8.666/93.
54. Como já dito, esta percepção é fundamental, para que entendam as premissas e conclusões firmadas pela Câmara Nacional de Uniformização.
55. Não se deve confundir o credenciamento, com os contratos ou contratações que serão firmados à partir dele. A natureza jurídica do credenciamento não equivale à do contrato administrativo. Ele mais se aproxima de um procedimento auxiliar, como o registro cadastral ou a pré-qualificação permanente, produzido para justificar ulteriores contratações diretas, por inexigibilidade, tendo em vista que o interesse público não objetiva selecionar um contratado, mas todos os potenciais fornecedores da pretensão contratual.
56. Em um momento inicial, os contratos firmados a partir do credenciamento se sujeitam as regras estabelecidas pela Lei nº 8.666/93. Todavia, o credenciamento em si não se sujeita aos limites estabelecidos no artigo 57 da Lei nº 8.666/93, dado o seu caráter permanentemente aberto, afastando a necessidade de renovação periódica de qualquer tipo de disputa13. Repisamos, o credenciamento é um instrumento que não se confunde com o contrato administrativo que pode ser gerado, entre o fornecedor credenciado e o órgão/ente credenciador.
57. Não se confundindo o credenciamento com a contratação dele decorrente, convém sopesar que esta (a contratação) dar-se-á nos termos estabelecidos pela legislação. Em relação ao Fusex, por exemplo, a contratação é feita pontualmente, para a prestação do serviço solicitado pelo beneficiário. Não há uma prestação de serviço direta e continuamente executado para a Administração, mas a realização de um serviço pontualmente solicitado e consumado, para atendimento do beneficiário solicitante. Nessa hipótese, inclusive, o instrumento contratual será, na maioria das vezes, substituível por outros instrumentos hábeis, como a nota de empenho ou a ordem de serviço, a teor do que prescreve o artigo 62 da Lei nº 8.666/93, conjuntamente com o artigo 60 da Lei nº 8.320/64.
58. Em relação ao credenciamento, convém frisar, a formalização a priori de instrumento contratual pode, inclusive, conflitar com a lógica estabelecida na Lei nº 8.666/93, pois, havendo incerteza sobre a demanda a ser provocada ao fornecedor credenciado, não é possível estabelecer-se, de antemão, quantitativo preciso de execução dos serviços, durante o período de credenciamento. Nesse ponto, a execução dos serviços credenciados assemelha-se à execução que se dá diante de uma Ata de Registro de Preços, cuja contratação decorrente do preço registrado pode prescindir do instrumento contratual, desde que identificadas algumas das hipóteses admitidas pelo artigo 62 da Lei nº 8.666/93.
59. Além disso, sempre será concedida à Administração a faculdade de mudar as regras do credenciamento, inclusive o rol dos serviços, preços e demais termos e condições, o que pode caracterizar-se incompatível como o estrito regime do contrato administrativo. Nesse sentido, se a Administração percebe que, por exemplo, o mercado está praticando preço abaixo do fixado no regulamento do credenciamento, bastará alterá-lo, sem a necessidade de resguardo a eventual equação econômica, pois esta é afeta à relação contratual, e não ao credenciamento. Outrossim, nesse mesmo raciocínio, não é obrigatório credenciar-se ou manter-se credenciado, de forma que, quando o credenciado não concordar com as alterações feitas nas condições para prestação do serviço credenciado, bastará solicitar seu descredenciamento, de acordo com as regras estabelecidas no respectivo instrumento.
60. Também assim, não vale para o credenciamento a limitação de sua vigência, conforme preceitos do artigo 61. da Lei nº 8.666/93, para contratos administrativos. O credenciamento não é contrato administrativo, podendo sim possuir vigência indeterminada. Apenas as contratações (contratos) dele decorrentes submetem-se ao estrito regime do referido dispositivo da Lei Geral de Licitações.
61. Assim, quanto ao prazo de vigência do edital de credenciamento, há respaldo jurídico na proposição de inexistir prazo limite para que interessados possam comparecer perante a administração pública e solicitar o credenciamento. Em conclusão, há respaldo jurídico para que a vigência do edital de credenciamento seja indeterminada. Nada obstante, deve o edital prever instrumentos de periódica avaliação para que se exija que os credenciados mantenham o cumprimentos dos requisitos, inclusive habilitatórios, exigidos no instrumento convocatório.
62. Outrossim, é admissível que o edital de credenciamento se submeta a alterações no curso de sua vigência, inclusive nos preços e demais termos e condições dos serviços prestados, que vincularão os credenciados mediante cláusula no edital prevendo que salvo pedido de descredenciamento, a adesão ao mesmo implica no aceite de suas eventuais alterações supervenientes.
2.3.3 Do índice de reajuste aplicável
63. Como é sabido, o reajuste é um instrumento utilizado para a recomposição econômica da álea ordinária, que está relacionada à possível ocorrência de um evento futuro e de natureza econômica desfavorável, contudo previsível ou suportável, por ser inerente ao negócio efetivado. O reajuste deverá ser aplicado nos contratos com prazo de duração igual ou superior a um ano, ocorrendo com periodicidade anual.
64. Não sendo contrato, o edital de credenciamento não se obriga à previsão do reajuste, sendo plenamente possível o estabelecimento de regra diferente, em que os preços inicialmente estipulados sejam devidamente atualizados, com majoração ou redução, de acordo com a realidade econômica vivenciada no respectivo setor.
65. Assim, dadas as peculiaridades inerentes ao segmento econômico afeto ao objeto do credenciamento, é juridicamente possível que o edital não estabeleça a aplicação automática de índice ou índice específico para determinados serviços. O instrumento convocatório poderá apenas prever a possibilidade de atualização anual ou periódica de preços pela Administração, buscando assegurar que tais valores só sejam alterados em caso de real necessidade.
2.3.4 Da natureza continuada ou não dos serviços de assistência médico-hospitalar
66. Os serviços de assistência médico-hospitalar, prestados em razão de edital de credenciamento, não devem ser caracterizados, necessariamente, como serviços contínuos.
67. O extinto MARE (posterior Secretaria de Estado da Administração e do Patrimônio, vinculada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão), em sua IN nº 18, conceituou serviços continuados da seguinte forma:
“São aqueles serviços auxiliares, necessários à Administração para o desempenho de suas atribuições, cuja interrupção possa comprometer a continuidade de suas atividades e cuja contratação deva estender-se por mais de um exercício financeiro”.
68. Este conceito foi reproduzido pelo TCU14, em seu manual de orientações básicas sobre licitações e contratos. Ele induz à compreensão de que a noção de serviços contínuos pode variar de acordo com a necessidade para o desempenho das atribuições do órgão e que apenas deveriam ser entendidos como contínuos os serviços essenciais à atividade administrativa.
69. Nas relações contratuais dos serviços de assistência médico-hospitalar, prestados em razão de edital de credenciamento, não há propriamente a prestação de um serviço contínuo, nos estreitos limites atualmente definidos. Na verdade, as atividades credenciadas não são propriamente necessárias à Administração para o desempenho de suas atribuições, elas são executadas de forma eventual e aleatória, de acordo com a demanda surgida. Demonstra isso, facilmente, o fato de que um fornecedor credenciado pode não ser provocado a prestar o serviço credenciado, pela inexistência de demanda provocada pelo usuário.
70. Nesta feita, parece-nos que, em muitos casos, ao menos, como ocorre nos serviços de assistência médico-hospitalar do Fusex, não haverá a aplicação do inciso II do artigo 57, com limitação da vigência temporal. Cada demanda provocada, em função do credenciamento, representará uma contratação própria, autônoma, a qual será regida pelo caput do artigo 57 e, inclusive, poderá prescindir do instrumento contratual, nas hipóteses admitidas pelo artigo 62 da Lei nº 8.666/93.
71. Assim, justifica-se a conclusão da CNU, no sentido de que há respaldo jurídico para que sua vigência contratual não seja contratualmente fixada por prazo determinado, em instrumento contratual de serviços contínuos, com base no inciso II do artigo 57 da Lei nº 8.666/93. Nesses casos, as contratações ocorrerão autonomamente a cada demanda pela prestação do serviço, adotando instrumentos aptos à substituição do contrato, conforme admitido pelo artigo 62 da Lei nº 8.666/93.
72. Em contraponto, reitera-se a necessária previsão no edital do credenciamento, para aferição periódica da manutenção, pelos credenciados, do cumprimento dos requisitos de habilitação exigidos no instrumento convocatório.
2.3.5 Da obrigatoriedade ou não de realização de prévia pesquisa de mercado
73. O credenciamento poderá ofertar ao interesse público uma série de benefícios que minimizarão a importância do fator preço. Dessa forma, mostra-se razoável que a Administração deixe de buscar o menor preço, apesar de ter que fixar parâmetros de razoabilidade com o mercado.
74. A simples pesquisa de mercado, por não incluir custos inerentes à relação e credenciamento, pode não apontar o adequado valor do mercado para a prestação pretendida. Conforme explica Túlio Bastos, a pesquisa de preços para formação de preços públicos historicamente tem sido um entrave para as contratações públicas, pois, quando devidamente tratado, o tema carrega variáveis importantes como: descrição técnica, região do preços, quantidade a ser comprada, logística de suprimento, forma de pagamento, sazonalidade e oportunidade15.
75. Noutro diapasão, questões administrativas como queda na arrecadação de recursos, crise financeira, necessidade de redução dos gastos na área das atividades credenciadas ou mesmo a ampliação da demanda (que pode gerar maior economia de escala aos fornecedores), entre outros fatores, podem justificar que a redução, aumento ou mesmo alteração dos valores credenciados, sem necessária vinculação a uma pesquisa de preços.
76. Nada obstante, embora a adequação dos preços ou os patamares estabelecidos para sua atualização se dêem à partir de parâmetros específicos, que não a realização de uma formal pesquisa de preços, cabe à Administração o dever inafastável de instruir os autos com justificativa que demonstre a vantagem ou igualdade dos valores atualizados ou mantidos.
77. Diante das razões expostas, chegou-se a uniformização dos seguintes entendimentos:
À consideração do Plenário da Câmara Nacional de Uniformização.
Recife, 11 de abril de 2017.
RONNY CHARLES LOPES DE TORRES
ADVOGADO DA UNIÃO
REFERÊNCIAS
1. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos: Lei 8.666/1993. 16. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. p. 483.
2. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos: Lei 8.666/1993. 16. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. p. 483.
3. JUSTEN FILHO, Marçal. (Op. Cit. p. 486)
4. CARVALHO, Raquel Melo Urbano de. O Sistema de Registro de Preços: um reforço à obrigatoriedade de licitar. In. Direito do Estado: questões atuais. Salvador: JusPodivm, 2009. P. 70.
5. NIEBUHR, Joel de Menezes. Dispensa e Inexigibilidade de Licitação Pública. 4. ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2015. p. 195.
6. BITTENCOURT, Sidney. Contratando sem licitação. São Paulo: Almedina, 2016. P. 315.
7. SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e Contrato Administrativo. São Paulo: Malheiros. 1994, p. 42. apud. NIEBUHR, Joel de Menezes. (Op. Cit. p. 196)
8. Nesse sentido, o TCU firmou o raciocínio de que “a preferência por determinados escritórios de advocacia em detrimento de outros, por meio de critério de pontuação em procedimento de credenciamento, é incompatível com a natureza dessa sistemática, que não possui caráter competitivo” (Comunicação de cautelar ao Plenário, TC-034.565/2011-6, rel. Min. Valmir Campelo, 23.11.2011).
9. TCU. Acórdão 5178/2013-Primeira Câmara, TC 023.697/2011-3, relator Ministro-Substituto Augusto Sherman Cavalcanti, 30.7.2013.)
10. NIEBUHR, Joel de Menezes. (op. Cit. p. 198.)
11. TCU. Acórdão 3567/2014-Plenário.
12. Nesse ponto, destacamos as sugestões apresentadas por representantes da Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Defesa, da Consultoria Jurídica Adjunta junto ao Exército e do Hospital das Forças Armadas.
13. NIEBUHR, Joel de Menezes. (op. Cit. p. 197)
14. BRASIL. Tribunal de Contas da União. Licitações e contratos : orientações básicas. 3.ed. Brasília: TCU, Secretaria de controle Interno, 2010. P. 772.
15. BASTOS, Túlio. Preços para as licitações públicas. In Licitações Públicas. Homenagem ao jurista Jorge Ulysses Jacoby Fernandes. Curitiba: Negócios públicos, 2016. P. 149.
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 00671000641201475 e da chave de acesso 309e9dd2