ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO


 

PARECER n. 00599/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 10154.144548/2021-01

INTERESSADOS: SUPERINTENDÊNCIA DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM MINAS GERAIS – SPU-MG/ME

ASSUNTOS: CESSÃO DE USO GRATUITA. CASA HUNTER. PESSOA JURÍDICA PRIVADA SEM FINS LUCRATIVOS. DISPENSA DE LICITAÇÃO

 

EMENTA:
I – Direito Administrativo. Patrimônio imobiliário da União.
II – Cessão de uso gratuita por dispensa de licitação. CASA HUNTER. Pessoa jurídica privada sem fins lucrativos. Construção de centro de auxílio médico ao paciente portador de doença rara em situação de vulnerabilidade, qualificação dos profissionais de saúde e desenvolvimento de pesquisas.
III – Fundamentação legal da dispensa de licitação inadequada. Observância dos termos do PARECER n. 00918/2017/ACS/CGJPU/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP: 04926.001744/2011-21) aprovado pelo DESPACHO DE APROVAÇÃO n. 01873/2017/CONJUR-MP/CGU/AGU.
IV – Legislação: art. 18, inciso I, da Lei nº 9.636/1998, art. 2º, inciso III, e seu §3º, da Portaria SPU nº 144/2001, inciso I, do § 2º, do art. 17 da Lei nº 8.666/93 e art. 18, inciso II e seu §1º, da Lei nº 9.636/1998 c/c art. 7º, Decreto-Lei nº 271/1967.
V – Devolução ao órgão consulente para ciência e providências que se fizerem necessárias.

 

 

RELATÓRIO

 

Em cumprimento ao disposto no art. 131 da CRFB/88, no art. 11 da Lei Complementar nº 73/1993, no art. 8º-F da Lei nº 9.028/1995, no art. 19 do Ato Regimental AGU nº 05/2007 e no art. 1º da Portaria AGU nº 14/2020, conforme a delegação de competência atribuída pela Portaria Conjunta CGU/PGFN nº 99/2020, a SUPERINTENDÊNCIA DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM MINAS GERAIS – SPU-MG/ME encaminha a esta e-CJU/Patrimônio, via SAPIENS, cópia digitalizada e link de acesso ao processo SEI de referência, que trata da análise da minuta do termo de contrato de cessão de uso gratuita a ser celebrado, por dispensa de licitação, com a CASA HUNTER – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS PORTADORES DA DOENÇA DE HUNTER E OUTRAS DOENÇAS RARAS, CNPJ nº 20.103.570/0001-14, pessoa jurídica privada sem fins lucrativos, para a construção de centro de auxílio médico ao paciente portador de doença rara em situação de vulnerabilidade, qualificação dos profissionais de saúde e desenvolvimento de pesquisas.

 

Encontram-se nos autos os seguintes documentos:

https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=1280917&infra_hash=24b08ad75be834fbfe11b2e7ff538fbf

Processo distribuído em 25/07/2021.

 

É o relatório.

 

Inicialmente, cumpre observar que as páginas do processo físico foram digitalizadas e carregadas no Sistema SEI pelo órgão consulente.

 

Registre-se, por oportuno, que a análise, por ora alinhavada, está adstrita à documentação constante nos arquivos digitalizados no NUP e está condicionada à efetiva fidedignidade do conteúdo das cópias juntadas com os respectivos originais, sob pena de ser desconsiderada.

 

DA FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER JURÍDICO

 

A presente manifestação jurídica tem o escopo de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem praticados ou já efetivados. Ela envolve, também, o exame prévio dos textos de editais, de minutas de contratos e de seus anexos, quando for o caso.

 

A função da Consultoria Jurídica da União é apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.

 

Importante salientar, que o exame dos autos processuais se restringe aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica. Em relação a estes, parte-se da premissa de que a autoridade competente se municiou dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.

 

Nesse sentido vale lembrar que o Enunciado n° 07, do Manual de Boas Práticas Consultivas da CGU/AGU recomenda que “o Órgão Consultivo não deve emitir manifestações conclusivas sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, sem prejuízo da possibilidade de emitir opinião ou fazer recomendações sobre tais questões, apontando tratar-se de juízo discricionário, se aplicável. Ademais, caso adentre em questão jurídica que possa ter reflexo significativo em aspecto técnico deve apontar e esclarecer qual a situação jurídica existente que autoriza sua manifestação naquele ponto”.

 

De fato, presume-se que os estudos técnicos contidos no presente processo, inclusive quanto ao detalhamento de seu objeto, suas características e requisitos, tenham sido regularmente determinadas pelo setor competente do órgão, com base em parâmetros técnicos objetivos, para a melhor consecução do interesse público.

 

Além disso, vale esclarecer que, em regra, não é atribuição do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Cabe-lhes, isto sim, observar se os seus atos estão dentro do seu espectro de competências.  Assim sendo, o ideal, para a melhor e completa instrução processual, é que sejam juntadas ou citadas as publicações dos atos de nomeação ou designação da autoridade e demais agentes administrativos bem como os atos normativos que estabelecem as respectivas competências, com o fim de que, em caso de futura auditoria, possa ser facilmente comprovado que quem praticou determinado ato tinha competência para tanto. Todavia, a ausência de tais documentos, por si, não representa, a priori, óbice ao desenvolvimento do processo.

 

Por fim, com relação à atuação desta Consultoria Jurídica, é importante informar que, embora as observações e recomendações expostas não possuam caráter vinculativo, constituem importante instrumento em prol da segurança da autoridade assessorada, a quem incumbe, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações, ressaltando-se, todavia, que o seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva da Administração.

 

DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL

 

A CASA HUNTER – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS PORTADORES DA DOENÇA DE HUNTER E OUTRAS DOENÇAS RARAS, CNPJ nº 20.103.570/0001-14, pessoa jurídica privada sem fins lucrativos (17199970), solicita, no presente processo, a cessão de uso gratuita do imóvel denominado “Antiga Fazenda da Cachoeira Grande”, município de Pedro Leopoldo/MG, com área de 49.137,75m², parte de uma área maior de 38,72 hectares, que adquiriu por meio de desapropriação, conforme matrícula nº 28.219, Livro n° 2, no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Pedro Leopoldo.

 

A Nota Técnica SEI nº 32853/2021/ME (17203994) apresenta o seguinte sumário executivo:

 

1. Cuidam os autos da cessão gratuita para a Casa Hunter de um imóvel de 49.138,45m², parte de uma área maior de 38,27 hectares, situado no município de Pedro Leopoldo/MG, em local denominado "Antiga Fazenda Cachoeira Grande", matriculado sob o n° 28.219, Livro 02 do Cartório de Registro de Imóveis de Pedro Leopoldo.
 
ANÁLISE
 
2. Em junho/2021, a instituição sem fins lucrativos denominada "Casa Hunter" solicitou à União, via SISREI, área no município de Pedro Leopoldo/MG para abrigar sua unidade chamada "Casa dos Raros", destinada ao atendimento gratuito de pacientes com doenças raras.
 
3. O imóvel, anteriormente destinado para a Polícia Militar de Minas Gerais, foi retomado pela SPU/MG, tendo em vista o descumprimento do encargo contratual.
 
4. O Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras (Portaria nº 199, 30/01/2014), estabelecendo diretrizes para oferecer diagnóstico e tratamento (medicamentos ou fórmulas metabólicas nutricionais, quando indicado) aos indivíduos afetados por doenças raras através do Sistema Único de Saúde - SUS, sendo este o principal objetivo do interessado na utilização do imóvel da União.
 
5. Entre as áreas de atuação da Casa Hunter citam-se não somente a prestação de auxílio médico direto ao paciente em situação de vulnerabilidade, mas também a qualificação dos profissionais de saúde e desenvolvimento de pesquisas.
 
6. O Art. 18 da Lei 9636 respalda a destinação do patrimônio por meio de cessão de uso gratuito, a saber:
 
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
 
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde;    
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional.    
 
7. O estatuto da Casa Hunter (17199970) determina a natureza da instituição, sendo ela sem fins lucrativos na área de saúde e assistência social, além de notório interesse público.
 
8. Acostaram-se aos autos as certidões negativas trabalhista, de FGTS e de dívida ativa da União.
 
9. Tendo em vista o importante investimento necessário para a concretização do projeto, que será o encargo contratual, esta Superintendência do Patrimônio da União entende que a cessão gratuita é oportuna e conveniente, propondo-se a validade de 30 anos diante da necessária previsibilidade dos investimentos. Propõe-se que conste em contrato o prazo de até 18 meses a partir da assinatura do contrato para início das obras, com a conclusão em até 36 meses.
 
CONCLUSÃO
 
10. Entende-se que a cessão gratuita do imóvel, desocupado há várias décadas, encontra amparo legal, além de ser conveniente e oportuna.
 
11. A cessão deverá ser concluída até 31/12/2021, tendo em vista o ano eleitoral vindouro que, a princípio, impediria a assinatura do contrato em 2022.
 
RECOMENDAÇÃO
 
12. Recomenda-se o envio dos autos para avaliação para fins de cessão de uso gratuito. Salienta-se a existência de avaliação RVR 997/2018 (3209340) que poderá auxiliar na determinação do valor do patrimônio. Em seguida, encaminhe-se o processo para apreciação do Comitê Estadual de Destinação, conforme previsto na Portaria 83/2019, sucedido por preparação de minutas contratuais e envio para a CJU/MG.
 

Cumpre-se registrar, preliminarmente, que a Portaria SGPU nº 22.950, de 29 de outubro de 2020, publicada no DOU de 4 de novembro de 2020, revogou a Instrução Normativa nº 87, de 1º de setembro de 2020, restaurando a vigência da ON-SPU-GEAPN nº 002/2001, da Portaria SPU nº 144/2001, de 9 de julho de 2001, da Portaria SPU nº 404, de 28 de dezembro de 2012 e da Portaria SPU nº 11.190, de 1º de novembro de 2018.

 

A cessão de uso gratuita pretendida tem sua previsão legal, no art. 18, inciso I, da Lei nº 9.636/1998 e no art. 2º, inciso III, e seu §3º, da Portaria SPU nº 144/2001, abaixo transcritos (grifos nossos):

 

Lei nº 9.636/1998
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
 
Portaria SPU nº 144/2001
Art. 2º As cessões de uso gratuito ou em condições especiais de imóveis da União deverão observar as seguintes destinações:
[...]
III - a entidades sem fins lucrativos, de caráter educacional, cultural ou de assistência social, para os seguintes fins:
a) implantação de ensino gratuito destinado à comunidade local;
b) implantação de centro de ensino especial ou de atividade de atendimento a excepcionais;
c) implantação de atividade cultural;
d) implantação de atividade de assistência social gratuita destinada ao atendimento de carentes e idosos; e
e) implantação de centro de saúde ou hospitais, desde que contemplado o atendimento preponderantemente a carentes e que o proponente integre a rede do Sistema Único de Saúde - SUS ou serviço de atendimento à saúde que lhe suceda;
[...]
§ 3º As proposições de que tratam as alíneas "a" e "b", "c", "d" e "e" do inciso III deverão contar com prévia manifestação favorável dos Ministérios da Educação, da Cultura, da Previdência e Assistência Social e das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, respectivamente.
 

A cessão tem por finalidade a construção de um centro de auxílio médico ao paciente portador de doença rara em situação de vulnerabilidade, a qualificação dos profissionais de saúde e o desenvolvimento de pesquisas. Assim, verifica-se que a cessão não se destina a empreendimento de fins lucrativos, porém deverá ser certificado nos autos o cumprimento dos requisitos contidos no inciso III do art. 2º da Portaria MPOG nº 144/ 2001, o que deverá ser providenciado pela autoridade competente.

 

Na minuta do termo de dispensa de licitação (17441041) consta como fundamento o inciso I, do § 2º, do art. 17 da Lei nº 8.666/93. Ocorre que esse fundamento não é o adequado, pois essa fundamentação permite a dispensa para “outro órgão ou entidade da Administração Pública”, o que não ocorre no caso concreto, pois a CASA HUNTER é uma associação constituída como pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos:

 

Art. 17. [...]
 
§ 2o A Administração também poderá conceder título de propriedade ou de direito real de uso de imóveis, dispensada licitação, quando o uso destinar-se: (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005)
 
I - a outro órgão ou entidade da Administração Pública, qualquer que seja a localização do imóvel; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

 

A questão que surge é verificar a possibilidade de se afastar o certame para cessão de uso às pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos.

 

A resposta à pertinente questão trazida pelo órgão consulente encontra fundamento, principalmente, no entendimento teórico das modalidades de contratação direta.

 

A regra de conduta direcionada à Administração Pública para a aquisição de bens e serviços é a utilização do processo licitatório, conforme expresso no art. 37, inciso XXI, da Constituição de 1988, cujo objetivo maior é a busca pela proposta mais vantajosa, e que apenas em ocasiões excepcionais nas quais a lei exonera o Administrador desse dever, conferindo-lhe a possibilidade de realizar uma contratação direta, é admitida a contratação sem que se leve a termo o processo licitatório. A relação de situações de licença de licitação é taxativa (exaustiva), ou seja, todas as hipóteses devem constam expressamente na Lei.

 

A doutrina tradicional estabelece distinções entre licitação dispensada, dispensável e inexigível, seguindo em termos gerais os critérios que são utilizados pela Lei nº 8.666/93. Entretanto, alerte-se que nem sempre será possível diferenciar os termos licitação “dispensada” e “dispensável” como se fossem conceitos referentes a situações de natureza distintas, sendo admissível seu uso como sinônimos por diversas ocasiões.

 

A chamada “licitação dispensada” se aplica basicamente às hipóteses de alienação de bens pertencentes à Administração e está sempre condicionada à existência de interesse público. Como já se afirmou, as situações a que se refere estão disciplinadas exclusivamente no art. 17 da Lei nº 8.666/93.

 

A “licitação dispensável” verifica-se em situações em que, embora teoricamente seja viável a competição entre particulares, o procedimento licitatório afigura-se inconveniente ao interesse público. Isso ocorre porque, em determinados casos, surgem circunstâncias especiais, previstas em lei, que facultam a não realização da licitação pela administrador, que em princípio era imprescindível. Dentre as hipóteses previstas no art. 24 da Lei nº 8.666/93 pode-se citar como exemplo a dispensa em razão do baixo valor.

 

A realização de contratação direta, em se tratando de licitação dispensável, está relacionada a um juízo de discricionariedade do gestor, que, diante de uma situação concreta, em cotejo com uma hipótese legalmente autorizada, caracterizada por uma excepcionalidade, pode concluir pelo afastamento da licitação como solução para melhor atendimento ao interesse público. Hely Lopes Meirelles (Licitação e Contrato Administrativo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 113) ensina que “licitação dispensável é aquela que a Administração pode deixar de realizar, se assim lhe convier

 

A “licitação inexigível”, segundo o art. 25 da Lei nº 8.666/93, ocorrerá sempre que houver inviabilidade de competição. Entretanto, o conceito de viabilidade da competição não é simplisticamente reconduzível à mera existência de uma pluralidade de sujeitos em condições de executar uma certa atividade. Existem inúmeras situações em que a competição é inviável não obstante existirem inúmeros particulares habilitados a executar a atividade objeto da contratação. Isso se passa inclusive nos casos em que realizar a licitação acarretaria solução objetivamente incompatível com o interesse público. Nesse caso, o referido artigo apresenta rol exemplificativo.

 

Visto isso, ressalta-se que o afastamento de certame licitatório para pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos foi controversa no âmbito da Consultoria-Geral da União/AGU, tendo sido uniformizada pelo PARECER n. 00918/2017/ACS/CGJPU/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP: 04926.001744/2011-21) aprovado pelo DESPACHO DE APROVAÇÃO n. 01873/2017/CONJUR-MP/CGU/AGU, da Consultora Jurídica Adjunta, nos seguintes termos:

 

EMENTA:
I - Autos encaminhados pela Secretaria do Patrimônio da União para análise da juridicidade da proposta de cessão de uso gratuita de imóvel da União para o Centro de Africanidade e Resistência de culto Afro Brasileiro Ilê de Keto Axé Alafindé – CENARAB, para o desenvolvimento do Projeto "Resgatando a tradição e a cultura Afro-Brasileira, formação para as Comunidades Tradicionais de Belo Horizonte e Região", sem prévio chamamento público.
II - Possibilidade de destinação de imóvel da União para associação sem fins lucrativos por meio de cessão de uso, seja para as associações que desenvolvam atividades elencadas no art. 18, inciso I, ou para as demais entidades, com fulcro no art. 18, inciso II, desde que se trate de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional.
III - Não inserção da situação versada nos autos em nenhuma das hipóteses de dispensa previstas pelo art.18 da Lei nº 9.636/98, nem tampouco nas causas de dispensa elencadas pela Lei nº 8.666/93. O art. 18, §1º, da Lei 9.636/98 só se aplica às cessões sob regime de concessão de direito real de uso, e não às cessões de uso, como é o caso. PARECER Nº 1670-5.4.1/2012/MAA/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP 04991.001579/2006-67).
IV - Possibilidade de instrução do processo como cessão sob a modalidade de concessão de direito real de uso e celebração do contrato de CDRU com dispensa de licitação, com fulcro no art. 18, §1º, da Lei 9.636/98. Considerações sobre o repasse de parcelas da área para atividades lucrativas. Art. 18, §5º, da Lei nº 9.636/98. Sugestão.
V - Pela devolução dos autos para a Secretaria do Patrimônio da União.
 
[...]
11. Como se extrai do dispositivo normativo transcrito acima, os imóveis da União poderão ser cedidos para entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde (inciso I), bem como para pessoas jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional (inciso II).
 
12. Assim, em princípio, não se vislumbra obstáculo jurídico para que seja realizada uma cessão de uso de imóvel da União para associação sem fins lucrativos, seja para as que desempenham atividades elencadas especificamente pelo art. 18, inciso I,ou para as demais entidades, com fulcro no art. 18, inciso II, obviamente desde que se trate de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional.
 
13. Importante registrar, contudo, que embora o art. 18, §5º, Lei nº 9.636/98, somente exija de forma expressa o procedimento licitatório quando a cessão for onerosa, o dever da Administração de licitar (ou realizar chamamento, conforme entendimento dado no PARECER Nº 1670-5.4.1/2012/MAA/CONJUR-MP/CGU/AGU, citado pela SPU) também se impõe nas hipóteses de cessão gratuita. Afinal, por meio desta, a União outorga ao particular o uso exclusivo de imóvel público, devendo ser observados os princípios constitucionais da impessoalidade e da isonomia.
 
14. Assim, a destinação dos imóveis de propriedade da União deve ser precedida de prévio procedimento impessoal de escolha, salvo se o caso se inserir em uma das dispensas elencadas pelo art. 18 da Lei nº 9.636/98, ou, ainda, pela própria Lei nº 8.666/93.
 
15. No caso em questão é possível constatar facilmente que não se trata de programa de provisão habitacional nem de regularização fundiária de interesse social (parágrafo 6º), muito menos de hipótese que possa ser inserida no parágrafo 7º ou no parágrafo 8º, situações em que o art. 18 dispensou a realização de prévio procedimento licitatório. Aponta-se, ainda, que a situação versada nos autos, à primeira vista, também não se insere em nenhuma das dispensas de licitação previstas na Lei nº 8.666/93.
 
16. Sendo assim, caso o órgão insista na destinação do bem mediante cessão de uso, deverá atestar expressamente os motivos pelos quais não se aventou a realização de prévio procedimento licitatório (ou do chamamento), informando, ainda, se a proposta contida nos autos se enquadra em alguma hipótese de dispensa ou inexigibilidade de licitação.
 
17. Por outro lado, como à primeira vista a interessada tem identidade jurídica de “associação”, impende destacar que em tese a destinação direta da área em tela poderia se dar por meio de concessão de direito real de uso, com fulcro no art. 18, inciso II e parágrafo 1º, da Lei nº 9.636/98, c/c art. 7º, Decreto-Lei n. 271/1967.
[...]
 
18. Isso porque a escolha por essa modalidade encontra permissivo expresso na legislação patrimonial para fins de dispensa de licitação, na hipótese de utilização do bem para a implementação de projeto como o tratado nestes autos que, em tese, se enquadra em “outras modalidades de interesse social”, conforme redação constante da parte final do art. 7º, caput, DL nº 271/1967. Não bastasse, essa modalidade permite ao cessionário maior segurança jurídica quanto aos direitos que titulariza sobre o bem, já que estarão presentes as prerrogativas inerentes a um direito real. Todavia, há de se alertar que, em se tratando de direito dessa natureza, a outorga da CDRU pressupõe a regularidade cartorial do imóvel, que deve estar registrado em nome da União.
 
19. Dessa forma, esta Consultoria Jurídica entende que a destinação de imóvel de propriedade da União por meio do instituto da cessão de uso para a realização de projetos semelhantes aos desenvolvidos pela interessada deve ser necessariamente precedida de procedimento licitatório (ou chamamento) nos termos da legislação vigente, conforme já apontado pela própria Secretariado Patrimônio da União. Vislumbra-se, entretanto, a possibilidade, em tese, de destinação da área em tela por meio de concessão de direito real de uso, com fulcro no art. 18, inciso II e parágrafo 1º, da Lei nº 9.636/98, c/c art. 7º, Decreto-Lei n. 271/1967, uma vez preenchidos os requisitos legais e observadas as considerações feitas neste opinativo. (grifos nossos)

 

Conforme o excerto do parecer da CONJUR-MP acima reproduzido, verifica-se que a utilização do instituto da "cessão de uso gratuita" do imóvel de propriedade da União a CASA HUNTER, por dispensa de licitação, pela forma proposta, configura-se inadequada, não havendo previsibilidade legal para afastar o certame por dispensa de licitação. Poderá, no entanto, nos limites do juízo de conveniência e oportunidade da autoridade assessorada, ser a destinação formalizada por meio de Concessão de Direito Real de Uso, com fulcro no art. 18, inciso II e seu §1º, da Lei nº 9.636/1998 c/c art. 7º, Decreto-Lei nº 271/1967, uma vez preenchidos os requisitos e procedimentos da legislação de patrimônio específica e o que dispõe a Lei n° 8.666/1993.

 

Assim, opina-se pelo reconhecimento da inviabilidade jurídica quanto a formalização da cessão de uso gratuita na forma do fundamento legal contido na minuta do termo de dispensa de licitação (17441041), podendo, porém, nos termos do entendimento firmado no PARECER n. 00918/2017/ACS/CGJPU/CONJUR-MP/CGU/AGU, nos limites do juízo de conveniência e oportunidade exclusivo da autoridade assessorada, formalizar a destinação do imóvel por meio de Concessão de Direito Real de Uso, com fundamento no art. 18, inciso II e seu §1º, da Lei nº 9.636/1998 c/c art. 7º, Decreto-Lei nº 271/1967, uma vez preenchidos os requisitos e procedimentos da legislação de patrimônio específica e o que dispõe a Lei n° 8.666/1993.

 

DISPOSIÇÕES FINAIS

 

As normas citadas encontram-se, na sua maior parte, com o recurso de hiperlink disponível, para acesso imediato pela internet.

 

Ressalta-se que não compete à e-CJU avaliar questões de ordem fática, técnica ou de cálculo, responsabilizando-se os signatários dos documentos juntadas pelo teor de suas informações perante aos Órgãos de controle, especialmente no que diz respeito às justificativas para o afastamento do certame, inteligência da Boa Prática Consultiva BPC/CGU/AGU nº 7.

 

Cumpre realçar que, caso o Administrador discorde das orientações emanadas neste pronunciamento, deverá carrear aos autos todas as justificativas que entender necessárias para embasar o ajuste pretendido e dar prosseguimento, sob sua exclusiva responsabilidade perante eventuais questionamentos dos Órgãos de Controle. Nesse caso, não haverá a necessidade de retorno do feito a esta Consultoria Jurídica da União, consoante o inciso VII do art. 50 da Lei nº 9.784/1999.

 

Alerta-se, por fim, quanto ao teor da Boa Prática Consultiva BPC/CGU/AGU nº 5 (sem grifos no original):

 

Ao Órgão Consultivo que em caso concreto haja exteriorizado juízo conclusivo de aprovação de minuta de edital ou contrato e tenha sugerido as alterações necessárias, não incumbe pronunciamento subsequente de verificação do cumprimento das recomendações consignadas.
 

CONCLUSÃO

 

Pelo exposto, solicita-se ao Protocolo que devolva ao órgão consulente para ciência dos termos do presente parecer, especialmente do item 30, e demais providências que entender cabíveis.

 

É o parecer, de caráter opinativo, que prescinde de aprovação por força do art. 21 da Portaria E-CJU/Patrimônio/CGU/AGU n° 1/2020 – Regimento Interno da e-CJU/Patrimônio, publicada no Suplemento B do BSE nº 30, de 30 de julho de 2020.

 

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2021.

 

(assinado eletronicamente)

RICARDO COUTINHO DE ALCÂNTARA COSTA

ADVOGADO DA UNIÃO

SIAPE 1332674 - OAB-RJ 110.264

 

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154144548202101 e da chave de acesso 7dc99686

 




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