ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER Nº00644/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU.
NUP: 10469.003326/94-44.
ÓRGÃO: UNIÃO - SUPERINTENDÊNCIA ESTADUAL DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE - SPU/RN.
ASSUNTOS: CONSULTA E ORIENTAÇÃO DE ATUAÇÃO - OUTROS ASSUNTOS.
EMENTA:DIREITO ADMINISTRATIVO. PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO.TRANSFERÊNCIA DE IMÓVEL POR SENTENÇA DE FORMAL DE PARTILHA. NÃO COMUNICADO A TRANSFERÊNCIA A SPU/RN DENTRO DO PRAZO DETERMINADO NO ART. 132-A DO DECRETO-LEI Nº 9.760/46 INCLUÍDO PELA LEI Nº 13.465/2017. INVIABILIDADE DE APLICAÇÃO DO ARTIGO 132-A DO DECRETO-LEI Nº 9.760/46, INTRODUZIDO PELA LEI Nº 13.465/2017. RESPEITO AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA LEI.
I- RELATÓRIO.
O Superintendente do Patrimônio da União no Estado do Rio Grande do Norte (SPU/RN) , através do Ofício SEI nº 201186/2021-ME, de 03 de agosto de 2021, encaminhou os presentes autos, a esta Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Patrimônio (E-CJU/PATRIMÔNIO), para proceder análise referente ao terreno de marinha com acrescido situado na Avenida Beira Mar Norte, nº1697 S 23-18, Praia de Muriú, Município de Ceará Mirim, Rio grande do Norte, com o RIP:1651000018161, com área total de 567, 98m², transferido de ANTÔNIO EDUARDO FREIRE FILHO (falecido em 15/06/1989) E ONEIDE PACHECO FREIRE,(falecida em 18/02/2006), para MARIA ELIZABETH FREIRE ALVES , por Decisão Judicial de Auto de Partilha, lavrado em 02/03/2009, transitada em julgado Sentença Homologatória em 12/03/2009.
Trata-se de processo administrativo oriundo da Secretaria do Patrimônio da União no Estado do Rio Grande do Norte com a seguinte consulta, vejamos:
"Proceder análise quanto à correta interpretação do art. 132-A, do Decreto-lei 9.760/46, no tocante à cobrança de débitos do antigo ocupante, quando os documentos da transferência são apresentados fora do prazo legal de 60 dias após a lavratura do título aquisitivo, levando-se também em consideração a data da lavratura do título aquisitivo, a data do conhecimento da SPU e a data da publicação da Lei 13.465/2017, que imputou a responsabilidade pelo pagamento ao antigo ocupante até a apresentação dos documentos.O caso concreto apresentado poderá ser utilizado como parâmetro para análise, mas a seguinte situação ocorre de forma contumaz e o eventual parecer da CJU poderá definir um padrão de ação da SPU."
O imóvel foi adquirido por MARIA ELIZABETH FREIRE ALVES, através do Auto de Partilha lavrado em 02/03/2009, pelo Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte e transitado em julgado Sentença Homologatória proferida em 12/03/2009 (SEI 14853734).
Em 25 de março de 2021, 25/03/2021, foi encaminhado solicitação por meio de Requerimento de Transferência do imóvel para o nome da herdeira, Maria Elizabeth Freire Alves, junto a SPU/RN, via mensagem eletrônica E-mail subscrito por, Oswaldo Vilas Boas dos Santos (SEI 14853734).
A Nota Técnica SEI nº 18372/2021-ME, de 20/04/2021, solicitou a remessa dos autos ao DEDES/SPU para que seja emitida opinião acerca do que foi exposto nesta Nota, principalmente confirmando, ou não, a impossibilidade atual de utilizar os ditames do art. 132-A, do Decreto-lei 9760/46 na estrutura funcional do Sistema SIAPA e, verificando a viabilidade jurídica de se adotar a data do conhecimento como o parâmetro para transferência de responsabilidade (SEI 15180479 ).
Através do documento Despacho (SEI 16093262) a Diretora do Departamento de Destinação Patrimonial, Substituta, se manifestou elucidando as dúvidas já nos seguintes termos:
"Trata-se de consulta realizada pela Superintendência de Patrimônio da União no Rio Grande do Norte - SPU/RN, referente à data de conhecimento para cálculo de multa por requerimento de transferência de ocupação fora do prazo legal, apresentada por meio do Despacho SPU-RN 15196562.
A multa por requerimento de transferência de ocupação fora do prazo está prevista na Instrução Normativa nº 1, de 9 de março de 2018, bem como sua fórmula de cálculo, IN esta elaborada pelo Departamento de Receitas Patrimoniais (DEREP).
Por tratar-se de dúvida específica/técnica sobre os fatores a serem considerados no cálculo, sugerimos o encaminhamento àquele Departamento para manifestação e elucidação da dúvida da SPU/RN.
Entende-se que a orientação possa ser respondida à própria SPU/RN, sendo copiada esta Coordenação-Geral de Desenvolvimento de Infraestrutura, para fins de conhecimento e adoção do entendimento como referência em questionamentos futuros".
Tendo sido encaminhado a Coordenação-Geral de Cobrança, foi emitida a Nota Técnica SEI nº 26214/2021/ME, clarificando o questionamento, por tratar-se de dúvida específica técnica, sobre fatores a serem considerados nos cálculos, bem como, testifica a impossibilidade da aplicação do Art.132-A do Decreto-Lei nº 9.760/46, em homenagem ao princípio da irretroatividade da Lei, sendo que o referido artigo foi introduzido através da Lei nº 13.465/2017.
Entretanto em busca de maiores esclarecimentos referente a aplicação do Art.132-A, no caso em comento, a SPU/RN, através do Despacho (SEI 17519007), encaminhou os presentes autos a esta Consultoria jurídica da União.
Os autos do processo administrativo em tela, foram instruídos com os documentos abaixo relacionados: Seq.0: Capa; Seq.1 PDF.1: Anexo Processo Físico capa e fls. de 01 a 31, (SEI 3935974 ); Anexo Processo Físico, fls.32 a 55, (SEI 3936020 ); Termo de Encerramento de Processo Físico DICIP-SPU/RN, (SEI 3936064 ); Despacho, (SEI 10002506); Planta de Locação, Memorial Descritivo, (SEI 10725283 ); Sistema Integrado de Administração Patrimonial - 15/10/2020, (SEI 11180682); Seq.1-PDF2: Despacho, (SEI 11182012); DESPACHO DECISÓRIO Nº 3441/2020/ME, (SEI 11182087); Consulta do CPF, (SEI 11458178) ); Sistema Integrado de Administração Patrimonial- 29/10/202, RIP: 1651 0000181-61, (SEI 11458619) ); OFÍCIO SEI Nº 273737/2020/ME, (SEI 11458647); Despacho, (SEI 11460700); Despacho, (SEI 11857929); Correspondência, (SEI 13499309 ); Correspondência -AR, (SEI (13499309); Despacho, (SEI 13499409); 07/04/2021, Email – Oswaldo Vilas Boas dos Santos – Outlook, Requerimento de Transferência, com anexos , documentos pessoais e atestado de Óbito do Sr. Antônio Eduardo Freire Filho e SRa. Oneide Pacheco Freire, e Sentença Homologatória, (SEI 14853734); Seq.1-PDF3: Continuação da sentença e documentos discais; 16/04/2021SIAPA - Sistema Integrado de Administração Patrimonial - 16/04/2021, (SEI 15102862)); Nota Técnica SEI nº 18372/2021/ME, de 24/04/2021,Transferência de Ocupação (SEI 15180479); Despacho, Transferência de Ocupação, (SEI 15196562); Despacho, (SEI 16093262); Nota Técnica SEI nº 26214/2021/ME, Consulta sobre aplicação retroativa do art. 132- A do Decreto- lei nº 9.760/1946 incluído pela Lei nº 13.465/2017.de 20/07/2021, (SEI 16273469); Despacho, (SEI 17347380); Despacho, (SEI 17519007); Despacho, (SEI 17568847); Despacho, (SEI 17583815); OFÍCIO SEI Nº 201186/2021/ME, de 03 de agosto de 2021, (SEI 17583819).
Diante desses acontecimentos, a SPU/RN encaminha a consulta formulada no bojo do documento (SEI 15180479) que, em síntese, questiona a possibilidade de aplicação do Art. 132-A do Decreto-Lei nº 9.760/46, introduzido pela Lei nº 13.465/2017, ao caso em comento.
É, em síntese, o relatório.
II- FUNDAMENTAÇÃO LEGAL E INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
Preliminarmente,deve-se ressaltar que o presente exame limitar-se-á aos aspectos jurídicos da consulta formulada referente a (aplicabilidade do Art. 132-A do Decreto-Lei nº 9.760/de 1946, introduzido pela Lei nº 13.465/2017), abstendo-se quanto aos aspectos técnicos, administrativos, econômicos, financeiros e aqueles que exijam o exercício da competência e da discricionariedade administrativa a cargo dos órgãos competentes da Superintendência do Patrimônio da União no Estado do Rio Grande do Norte, SPU/RN.
Impende ressaltar, quanto à instrução processual, que compete exclusivamente aos setores administrativos da unidade consulente verificar e atestar o cumprimento e observância aos atos normativos da Superintendência do Patrimônio da União -SPU, integrante da estrutura do Ministério da Economia, a considerar que não cabe a este órgão da Advocacia -Geral da União adentrar em assuntos alheios à sua competência.
Registre-se que a manifestação a seguir exposta, tem por base, exclusivamente, os dados que constam até o momento, nos autos do processo administrativo, em epígrafe. Com fulcro no Art.131, da Constituição Federal de 1988, e do Art.11da Lei Complementar nº 73/de 1993, compete a esta Consultoria se manifestar sob o prisma estritamente jurídico, portanto , não incube adentrar à conveniência e a oportunidade dos atos praticados no âmbito do Órgão, em referência, nem analisar aspectos de natureza eminentemente técnico administrativo.
A transferência des terrenos de marinha são bens públicos que se destinam historicamente à defesa territorial e atualmente à proteção do meio ambiente costeiro, permitindo-se a ocupação por particulares, mediante o pagamento de taxa de ocupação e de laudêmio quando da transferência, em relação eminentemente pública, regida pelas regras do direito administrativo.
Assim sendo, a inscrição de ocupação nada mais é que a tolerância, pela União, da detenção exercida por particular sobre imóvel público dominial. Tendo em vista a situação de fato constituída, a Administração formaliza a inscrição de ocupação, cadastrando o ocupante e a área ocupada, permitindo assim a correta gestão do patrimônio público e a cobrança das receitas patrimoniais devidas pelo particular.
Portanto, a inscrição de ocupação tem natureza meramente declaratória, já que a relação jurídica entre o particular e a Administração é constituída, na verdade, pela situação de fato decorrente da detenção privada do imóvel público. E não se pode esquecer que, nos termos do art. 7º da Lei 9.636/98, a inscrição de ocupação é ato administrativo precário, resolúvel a qualquer tempo, gerando obrigação de pagamento anual da taxa de ocupação.
No caso dos autos, a questão está consubstanciada em aceitar a Sentença Homologatória como transferência da inscrição de ocupação.
A INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 1, DE 9 DE MARÇO DE 2018, disponibiliza orientações que devem ser observadas nos processos de cessão de direitos e de transferência de titularidade de imóveis da União, sob os regimes de aforamento ou de ocupação, e aplica-se à Secretaria do Patrimônio da União e as suas Superintendências. Determinando a forma de procedimento para se processar as transferências de ocupação, no caso en tela , com observação do Art. 8º, inciso II, e Art. 40, §2º com observância do previsto no Capítulo VII da IN SPU nº 1, de 09 de março de 2018.
Quanto a possibilidade de aplicação do Art. 132-A do Decreto-Lei nº 9.760/46,(que dispõe sobre os bens móveis da União e dá outras providências) introduzido pela Lei nº 13.465/2017, in verbis:
"Art. 132-A. Efetuada a transferência do direito de ocupação, o antigo ocupante, exibindo os documentos comprobatórios, deverá comunicar a transferência à Superintendência do Patrimônio da União, no prazo de até sessenta dias, sob pena de permanecer responsável pelos débitos que vierem a incidir sobre o imóvel até a data da comunicação. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)"
Com efeito, sobre a interpretação de aplicabilidade do Art. 132-A do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946, introduzido pela Lei nº 13.465/2017, temos que observar o Princípio da irretroatividade da lei, a regra adotada pelo ordenamento jurídico é de que a norma não poderá retroagir, ou seja, a lei nova não será aplicada às situações constituídas sobre a vigência da lei revogada ou modificada.
É possível afirmar, ainda, que o referido princípio apresenta duplo fundamento, sendo um de ordem constitucional e outro de ordem infraconstitucional. Vejamos:
"O art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal prevê que: “A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.” [5] Já o art. 6º, da LINDB diz o seguinte: “A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitando o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.” [6]."
Isso quer dizer que o direito adquirido não se restringe apenas ao direito que já se incorporou ao patrimônio de seu titular, mais também o exercício de um direito que depende de um termo prefixo ou condição preestabelecida e que seja inalterável, pelo arbítrio de outrem.
Desta forma, denota-se que o órgão assessorado estava ciente da impossibilidade da aplicação do dispositivo legal aqui em comento, vez que o princípio de irretroatividade da lei é albergado pela Constituição Federal Brasileira. Tendo os autos sido enviados somente para manifestação quanto a possibilidade de aplicação do dispositivo legal (Art. 132-A do Decreto-Lei nº 9.760/46, introduzido pela Lei nº 13.465/2017 ), essa apresenta-se pela inaplicabilidade do referido dispositivo legal ao caso em apreciação pelas razões aqui expostas.
III- CONCLUSÃO
Por todo o exposto, considerados tão somente os aspectos jurídicos do feito, abstraídos os aspectos técnicos e o juízo de oportunidade e conveniência, opino, pela inviabilidade jurídica de aplicação do artigo 132-A do Decreto-Lei nº 9.760/46, introduzido pela Lei nº 13.465/2017. Justifico o atraso da manifestação por problemas técnicos.
Propomos a devolução dos autos ao órgão de origem, para que tome conhecimento do posicionamento desta Consultoria Jurídica da União, a cerca do questionamento formulado.
É o parecer.
Boa Vista 26 de agosto de 2021.
GLAIR FLORES DE MENEZES FERNANDES
ADVOGADA DA UNIÃO CJU-RR/CGU/AGU
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 104690033269444 e da chave de acesso 64c4ec95