ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00650/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 21181.000164/2010-14
INTERESSADOS: MG/MPOG/SPU/SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO
ASSUNTOS: Consulta. Residência Obrigatória de Servidor Público. Desocupação do imóvel.
EMENTA: Direito Administrativo. Patrimônio da União. Consulta. Termo de Entrega para Residência Obrigatória de Servidor Público. Licença para Trato de Interesse Particular. Descumprimento. Utilização Irregular de Imóvel da União. Rescisão de Pleno Direito. Reversão do Bem à administração da União. Lei Nº 9.636/98. Decreto-lei Nº 9.760/46. Recomendações Devidas.
I - Os imóveis de natureza residencial só poderão ser alugados por servidores públicos sem prévia licitação, quando houver interesse público. Em caso de residência voluntária ou por outros interessados, imprescindível é a prévia concorrência pública, por força dos dispositivos expressos do Decreto-Lei n. 9.760/46 e da Constituição Federal.
A Superintendência do Patrimônio da União em Minas Gerais encaminha os autos a esta Consultoria Jurídica da União para que emita parecer jurídico sobre a avaliação da possibilidade legal de continuidade da ocupação do Próprio Nacional 22, situado no município de Pedro Leopoldo/MG, jurisdicionado ao Laboratório Nacional Agropecuário - LANAGRO/MG, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e ocupado pelo servidor Ricardo Aurélio Pinto Nascimento, em licença para trato de interesse particular.
Segundo Despacho constante no SEI nº 17734833:
(...)
- O servidor Ricardo Nascimento tem portaria de obrigatoriedade assinada pelo então Ministro da Agricultura, quando desempenhava a função de coordenador do Lanagro. Ocorre que, com a perda de sua condição de coordenador, não subsiste a razão que justificaria a ocupação do imóvel, quais sejam, a necessidade de vigilância ou assistência constante, conforme Art 80 do segundo o Decreto-Lei 9760.
- Salvo melhor juízo, abrir-se-iam outras hipóteses para ocupação do patrimônio, como aquelas previstas no Art. 86 do mesmo Decreto-Lei, ou seja, ocupação no interesse do serviço ou a qualquer interessado.
- Tendo em vista o pedido de afastamento sem remuneração formalizado pelo servidor (email 14341805) a partir de 01/02/2021, infere-se que ele não desempenha qualquer atribuição funcional que viesse a justificar a ocupação do PN em razão de interesse do serviço. Restaria apenas a possibilidade de locar o imóvel a qualquer interessado, o que demandaria licitação.
- Recomenda-se o envio dos autos para a CJU/MG para orientação quanto à existência de alguma possibilidade legal de não cancelamento da entrega do imóvel ao Ministério da Agricultura e consequente desocupação imediata do bem, tendo em vista que o servidor está em licença não remunerada".
Consta nos autos:
"a presença do Coordenador deste Laboratório se faz de extrema importância em dias e horários extraordinários. É importante ressalvar que, a qualidade de todo este sistema laboratorial - e de suas unidades externas pertencentes - bem como, o gerenciamento de suas parcerias e convênios, demandam tempo e muita dedicação no ambiente de trabalho. Viabilizar e otimizar o tempo significa investimento e rendimento para o interesse público federal".
É o que importa relatar, para o desiderato da questão.
II - DA FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER JURÍDICO
A presente manifestação jurídica tem o escopo de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem praticados.
Nossa função é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências, para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.
Importante salientar, que o exame dos autos processuais se restringe aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica e administrativa. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade competente se municiou dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos, inclusive oriundos de determinações internas em vigor, de caráter normativo, atinentes a aspectos procedimentais. Sobrevindo, eventualmente, dúvidas associadas a questões jurídicas relacionadas a esses aspectos, deve o órgão assessorado consultar a CJU/AGU a respeito do cumprimento de tais atos normativos.
Impõe-se lembrar que, consoante o Enunciado n° 07, do Manual de Boas Práticas Consultivas da CGU/AGU, “o Órgão Consultivo não deve emitir manifestações conclusivas sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade”. De fato, presume-se que as especificações técnicas contidas no presente processo, inclusive quanto ao detalhamento do objeto da contratação, suas características, requisitos e avaliação do preço estimado, tenham sido regularmente determinadas pelo setor competente do órgão, com base em parâmetros técnicos objetivos, para a melhor consecução do interesse público.
De outro lado, cabe esclarecer que, em geral, não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes observar se os seus atos estão dentro do seu espectro de competências. Assim sendo, o ideal, para a melhor e completa instrução processual, é que sejam juntadas ou citadas as publicações dos atos de nomeação ou designação da autoridade e demais agentes administrativos, bem como, os Atos Normativos que estabelecem as respectivas competências, com o fim de que, em caso de futura auditoria, possa ser facilmente comprovado que quem praticou determinado ato tinha competência para tanto. Todavia, a ausência de tais documentos, por si, não representa, a nosso ver, óbice ao prosseguimento do feito.
Finalmente, é nosso dever salientar que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada a quem incumbe, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações. Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva da Administração.
III - FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
3.1. IMÓVEL RESIDENCIAL FUNCIONAL E IMÓVEL PARA RESIDÊNCIA OBRIGATÓRIA DE SERVIDOR DA UNIÃO — DIFERENCIAÇÃO E REQUISITOS
Primeiramente, importante é trazer a diferenciação entre institutos utilizados para permitir o uso de imóveis da União a servidores públicos (em sentido amplo): a) imóvel residencial funcional e b) imóvel para Residência Obrigatória de Servidor da União.
O denominado imóvel residencial funcional está previsto nas seguintes normas:
Ainda sobre o assunto, temos a ON – GEAPN – 006, de 24 de dezembro de 2002, da Secretaria do Patrimônio da União, que tem como objetivo orientar sobre os procedimentos sistemáticos envolvendo a administração dos imóveis residenciais funcionais de propriedade da União.
A Lei nº 8.025, de 12 de abril de 1990 e o Decreto-lei nº 1.390, de 29 de janeiro de 1975, este último por ter status de lei, são aplicados a todos os órgãos e entidades públicos federais, inclusive dos Poderes Judiciário e Legislativo, além do Ministério Público Federal e Tribunal de Contas da União. Em contrapartida, os Decretos de nº 980, de 11 de novembro 1993 e nº 99.266, de 28 de maio de 1990, são aplicáveis obrigatoriamente apenas ao Poder Executivo Federal.
Assim, pela leitura e interpretação das normas e orientação normativa acima, pode-se chegar a conclusão no sentido de que a previsão de "imóvel residencial funcional" somente é aplicável a propriedades da União situadas no Distrito Federal. Isto é, não pode (ou não deve) existir imóveis residenciais funcionais fora do Distrito Federal, ressalvando-se as situações porventura existentes antes da edição das referidas normas ou aquelas previstas em legislação específica.
Os dispositivos das normas supracitadas, abaixo transcritos, corroboram o que afirmamos:
Lei nº 8.025, de 12 de abril de 1990
Art . 5º A Caixa Econômica Federal procederá, perante os órgãos administrativos do Distrito Federal, nos Cartórios de Registro de Imóveis, à regularização dos títulos dominiais dos imóveis alienados.
Art. 6º Ao legítimo ocupante de imóvel funcional dar-se-á conhecimento do preço de mercado do respectivo imóvel, calculado na forma do art. 2º, inciso I, previamente à publicação do edital de concorrência pública, podendo adquiri-lo por esse valor, caso se manifeste no prazo de 30 dias, mediante notificação, e desde que preencha os seguintes requisitos:
I - ser titular de regular termo de ocupação;
II - estar quite com as obrigações relativas à ocupação;
III - ser titular de cargo efetivo ou emprego permanente, lotado em órgão ou entidade da Administração Pública Federal ou do Distrito Federal.
Art. 7º A venda dos imóveis funcionais somente será efetuada para os atuais ocupantes não proprietários de outro imóvel residencial no Distrito Federal.
Art. 11. É facultado à Ordem dos Advogados do Brasil - Seção do Distrito Federal, designar um representante que integrará a comissão de licitação a ser instituída para executar a licitação prevista nesta lei.
Art. 14. A ocupação dos imóveis residenciais não destinados à alienação, no que não contrarie esta lei, permanece regida pelas disposições do Decreto-Lei nº 1.390, de 29 de janeiro de 1975.
Decreto-lei nº 1.390, de 29 de janeiro de 1975.
Art. 1º O Fundo Rotativo Habitacional de Brasília (FRHB), instituído com base no § 5º, do artigo 65, da Lei nº 4.380, de 21 de agosto de 1964, poderá ter como participantes os órgãos ou entidades da Administração Federal, Direta ou Indireta, bem como as fundações sob supervisão ministerial.
Art. 7º Os órgãos ou entidades da Administração Federal e as fundações referidos no art. 1º, mesmo que não participem do FRHB, ficam obrigados a submeter à apreciação de um órgão único, designado pelo Poder Executivo, os critérios e valores que estabelecerem para fins de alienação ou ocupação de imóveis, tendo em vista:
I - quanto à alienação - possibilitar a fixação, no Distrito Federal, dos funcionários ou empregados necessários, sem permitir qualquer forma de especulação imobiliária;
II - quanto a ocupação - assegurar moradia aos funcionários ou empregados designados para prestar serviço no Distrito Federal, considerando sua representação funcional.
Decreto nº 980, de 11 de novembro 1993
Art. 1° Este decreto regula a cessão de uso dos imóveis residenciais de propriedade da União, situados no Distrito Federal, a ser promovida mediante permissão em caráter precário e por prazo indeterminado.
(...)
Art. 2° O Poder Executivo administrará os imóveis residenciais de propriedade da União, situados no Distrito Federal, exceto os declarados indispensáveis, pelos Poderes Legislativo e Judiciário, pelo Tribunal de Contas da União e pelo Ministério Público da União, aos serviços que desenvolvem, dentre as unidades funcionais já ocupadas por seus membros e servidores.
Art. 3ºRessalvado o disposto no art. 4ºe no art. 5º, incisos VI, VII e VIII, os imóveis residenciais à disposição do Poder Executivo, situados no Distrito Federal, serão administrados pela Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.(Redação dada pelo Decreto nº 4.528, de 18.12.2002)
(...)
Art. 5° São reservados, para atendimento das necessidades do Poder Executivo, os imóveis residenciais:
(...)
III - ocupados por servidores no exercício de cargo em comissão ou função de confiança, que, em 15 de março de 1990, não eram titulares de cargo efetivo ou emprego permanente, lotados em órgão ou entidade da Administração Pública Federal ou do Distrito Federal;
(...)
Art. 6ºA reserva administrada pela Secretaria do Patrimônio da União poderá ser distribuída entre os órgãos interessados, inclusive de outros Poderes, a critério do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, levando-se em conta o número de imóveis disponíveis. (Redação dada pelo Decreto nº 4.528, de 18.12.2002)
§ 1ºConsideram-se imóveis disponíveis, para os fins deste artigo, todas as unidades residenciais passíveis de permissão de uso, excluídos aqueles considerados inservíveis ao serviço público pela Secretaria do Patrimônio da União, vagos ou não, que poderão ser alienados, na forma da Lei nº9.636, de 15 de maio de 1998. (Redação dada pelo Decreto nº 4.528, de 18.12.2002)
§ 2ºTão logo extintas as permissões, deverão os órgãos proceder à devolução dos respectivos imóveis à Secretaria do Patrimônio da União. (Redação dada pelo Decreto nº 4.528, de 18.12.2002)
Art. 9° É vedada a cessão de uso de imóveis residenciais a servidor quando este, seu cônjuge, companheiro ou companheira amparados por lei:
I - for proprietário, promitente comprador, cessionário ou promitente cessionário de imóvel residencial em Brasília, incluída a hipótese de lote edificado sem averbação de construção, exceto no caso do inciso I do art. 5°; (Redação dada pelo Decreto nº 1.803, de 6.2.1996)
Art. 16. Cessa de pleno direito a permissão de uso de imóvel residencial, quando o seu ocupante:
(...)
IV - for movimentado ou transferido para outra Unidade da Federação;
(...)
VII - tornar-se proprietário, promitente comprador, cessionário ou promitente cessionário de imóvel residencial no Distrito Federal, como também seu cônjuge, companheira ou companheiro amparados por lei;
(...)
§ 1ºO permissionário que for nomeado para outro cargo em comissão em órgão da Administração Federal direta, com exercício no Distrito Federal, desde que não ocupante de imóveis relacionados nos incisos VI, VII e VIII do art. 5º, poderá conservar a permissão, uma vez atendidos os requisitos estabelecidos nos arts. 7ºe 8º. (Redação dada pelo Decreto nº 4.528, de 18.12.2002)
(...)
Decreto nº 99.266, de 28 de maio de 1990
Art.1º Os imóveis residenciais de propriedade da União, situados no Distrito Federal, inclusive os vinculados ou incorporados ao Fundo Rotativo Habitacional de Brasília - FRHB, tem autorizada sua venda, no estado em que se encontram, na forma prevista neste decreto e sob a supervisão da Secretaria de Administração Federal do Ministério do Trabalho e da Administração. (Redação dada pelo Decreto nº 647, 1992)
Art. 5° Ao legítimo ocupante do imóvel residencial funcional, que estiver quite com as obrigações relativas à ocupação, é assegurado o direito de preferência à sua compra, nos termos do art. 6° da Lei n° 8.025, de 1990, observado o disposto neste decreto.
§ 1° Consideram-se legítimos ocupantes aqueles que, em 15 de março de 1990, mesmo que no transcurso de prazo de desocupação, atendiam às exigências legais para a ocupação e, cumulativamente:
a) eram titulares de regular termo de ocupação;
b) eram titulares de cargo efetivo ou emprego permanente, lotado em órgão ou entidade da Administração Pública Federal ou do Distrito Federal.
Art. 8° Na celebração do contrato de compra e venda, o adquirente fará a comprovação de não ser proprietário de outro imóvel residencial no Distrito Federal.
Art. 34. E vedada a aquisição, construção ou locação de imóvel residencial no Distrito Federal, por órgão da Administração Pública Federal, para ocupação por seus servidores, bem como a renovação dos contratos de locação em vigor.
Parágrafo único. A vedação constante deste artigo não se aplica aos Ministérios Militares e Estado-Maior das Forças Armadas. (Redação dada pelo Decreto nº 647, 1992)
Art. 39. Os órgãos competentes dos Poderes Legislativo e Judiciário, do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público da União poderão regular, em ato próprio, a constituição da reserva, a distribuição e o uso dos imóveis residenciais funcionais que permanecerão por eles administrados.
Já a ON – GEAPN – 006, de 24 de dezembro de 2002, da Secretaria do Patrimônio da União, ao conceituar imóvel funcional, dispõe:
Imóvel residencial de propriedade da União, situado no Distrito Federal, passível de permissão de uso a servidores federais
Vale ressaltar que, salvo melhor juízo, o art. 6º do Decreto nº 980, de 11 de novembro 1993, o qual permite à SPU, a critério do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (hoje Ministério da Economia), e considerando-se o número de imóveis disponíveis, distribuir a reserva de imóveis administrada por aquela Secretaria a órgãos, inclusive de outros Poderes, interessados em sua utilização como imóvel residencial funcional, refere-se a propriedades localizadas no Distrito Federal, conforme explicita o art. 1º do referido decreto, in verbis:
Art. 1° Este decreto regula a cessão de uso dos imóveis residenciais de propriedade da União, situados no Distrito Federal, a ser promovida mediante permissão em caráter precário e por prazo indeterminado.
Atualmente, a outorga de permissões de uso de imóveis funcionais é regulada pelo Decreto 980/93, cujos arts. 2º e 3º dispõem:
Art. 2° O Poder Executivo administrará os imóveis residenciais de propriedade da União, situados no Distrito Federal, exceto os declarados indispensáveis, pelos Poderes Legislativo e Judiciário, pelo Tribunal de Contas da União e pelo Ministério Público da União, aos serviços que desenvolvem, dentre as unidades funcionais já ocupadas por seus membros e servidores.
Art. 3ºRessalvado o disposto no art. 4ºe no art. 5º, incisos VI, VII e VIII, os imóveis residenciais à disposição do Poder Executivo, situados no Distrito Federal, serão administrados pela Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.(Redação dada pelo Decreto nº 4.528, de 18.12.2002)
De acordo com o art. 2º, cabe ao Poder Executivo administrar os imóveis funcionais de propriedade da União, excetuados aqueles considerados indispensáveis pelos Poderes Legislativo e judiciário, pelo Tribunal de Contas da União - TCU e pelo Ministério Público da União - MPU. No que tange aos imóveis administrados pelo Poder Executivo, o art.3º do decreto atribui sua gestão à SPU, ressalvado o disposto nos arts. 4º e 5º, VI, VII e VIII, que tratam dos imóveis das entidades da Administração Pública Federal indireta e daqueles destinados às Forças Armadas, ao Ministério da Defesa, à Presidência da República e ao Ministério das Relações Exteriores.
Conclui-se, portanto, que somente compete à SPU a administração dos imóveis funcionais de propriedade da União destinados ao uso do Poder Executivo, ressalvados aqueles administrados pelas Forças Armadas, pelo Ministério da Defesa, pela Presidência da República e pelo Ministério das Relações Exteriores. Nessa última hipótese, caberá a tais órgãos a gestão dos imóveis funcionais a eles destinados, o que inclui a própria outorga da permissão de uso.
Por outro lado, temos o instituto da Residência Obrigatória de Servidor da União, tratado no Decreto-lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, que dispõe sobre os bens imóveis da União e dá outras providências, instrumento esse objeto dos presentes autos, conforme já demonstrado acima. Vejamos os principais dispositivos que tratam sobre o tema:
Art. 76. São considerados como utilizados em serviço público os imóveis ocupados:
I – por serviço federal;
II – por servidor da União, como residência em caráter obrigatório.
Art. 77. A administração dos próprios nacionais aplicados em serviço público compete às repartições que os tenham a seu cargo, enquanto durar a aplicação. Cessada esta, passarão êses imóveis, independentemente do ato especial, à administração do S.P.U.
Art. 79. A entrega de imóvel para uso da Administração Pública Federal direta compete privativamente à Secretaria do Patrimônio da União - SPU. (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
§ 2º O chefe de repartição, estabelecimento ou serviço federal que tenha a seu cargo próprio nacional, não poderá permitir, sob pena de responsabilidade, sua invasão, cessão, locação ou utilização em fim diferente do que lhe tenha sido prescrito.
§ 4o Não subsistindo o interesse do órgão da administração pública federal direta na utilização de imóvel da União entregue para uso no serviço público, deverá ser formalizada a devolução mediante termo acompanhado de laudo de vistoria, recebido pela gerência regional da Secretaria do Patrimônio da União, no qual deverá ser informada a data da devolução. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
SEÇÃO III
DA RESIDÊNCIA OBRIGATÓRIA DE SERVIDOR DA UNIÃO
Art. 80. A residência de servidor da União em próprio nacional ou em outro imóvel utilizado em serviço publico federal, somente será considerada obrigatória quando fôr indispensável, por necessidade de vigilância ou assistência constante.
Art. 81. O ocupante, em caráter obrigatório, de próprio nacional ou de outro imóvel utilizado em serviço público federal, fica sujeito ao pagamento da taxa de 3% (três por cento) ao ano sôbre o valor atualizado, do imóvel ou da parte nêle ocupada, sem exceder a 20% (vinte por cento) do seu vencimento o salário.
(...)
§ 2º A taxa de que trata o presente artigo será arrecadada mediante desconto mensal em fôlha de pagamento.
§ 3º É isento do pagamento da taxa o servidor da União que ocupar:
I – construção improvisada, junto à obra em que esteja trabalhando;
II – próprio nacional ou prédio utilizado por serviço público federal, em missão de caráter transitório, de guarda, plantão, proteção ou assistência; ou
III – Alojamentos militares ou instalações semelhantes.
Art. 82. A obrigatoriedade da residência será determinada expressamente por ato do Ministro de Estado, sob a jurisdição de cujo Ministério se encontrar o imóvel, ouvido previamente o S.P.U. (Redação dada pela Lei nº nº 225, de 1948)
Art. 84. Baixado o ato a que se refere o art. 82 se o caso fôr de residência em próprio nacional, o Ministério o remeterá, por cópia, ao S.P.U. (Redação dada pela Lei nº nº 225, de 1948)
Parágrafo único. A repartição federal que dispuser de imóvel que deva ser ocupado nas condições previstas no § 3º do art. 81 dêste Decreto-lei, comunica-lo-á ao S. P. U., justificando-o.
Art. 85. A repartição federal que tenha sob sua jurisdição imóvel utilizado como residência obrigatória de servidor da União deverá:
I – entregá-lo ou recebê-lo do respectivo ocupante, mediante têrmo de que constarão as condições prescritas pelo S. P. U.;
II – remeter cópia do têrmo ao S. P. U.;
III – comunicar à repartição pagadora competente a importância do desconto que deva ser feito em fôlha de pagamento, para o fim previsto no § 2º do artigo 81, remetendo ao S. P. U. cópia dêsse expediente;
IV – comunicar ao S. P. U. qualquer alteração havida no desconto a que se refere o item anterior, esclarecendo devidamente o motivo que a determinou; e
V – comunicar imediatamente ao S.P.U. qualquer infração das disposições dêste Decreto-lei, bem como a cessação da obrigatoriedade de residência, não podendo utilizar o imóvel em nenhum outro fim sem autorização do mesmo Serviço.
Quanto ao assunto, o Ministério do Planejamento editou a Orientação Normativa GEAP/SPU/MP nº 003, de 24.01.2001, caracterizando a residência obrigatória como: “pela natureza ou peculiaridade do trabalho quando for indispensável, por necessidade de vigilância ou assistência constante, a residência de servidor público em imóvel de domínio da União” (grifos nosso).
Portanto, são requisitos para que a residência do servidor tenha caráter obrigatório:
a. Quando for indispensável por necessidade de vigilância ou assistência constante;
b. Ato do Ministro de Estado sob a jurisdição de cujo Ministério se encontrar o imóvel, determinando a obrigatoriedade da residência;
c. Nexo de causalidade com o serviço público e que a natureza e peculiaridade do trabalho tornem a residência indispensável.
Por fim, tendo por fundamento a Nota nº 122/2013/CEP/CONJUR-MJ/AGU, de lavra do Dr. Wagner Akitomi Une, da Consultoria do Ministério da Justiça, também é requisito para caracterizar a residência obrigatória, a relação (nexo causal) com o serviço público.
Segunda a referida manifestação, “não parece ser acidental a qualificação da “residência obrigatória” como espécie de “imóvel utilizado em serviço público”. Isto é, conforme o art. 64, DL 9.760, os bens imóveis da União não utilizados em serviço público poderão ser alugados, aforados ou cedidos. Contudo, o art. 76 deixa claro que são considerados como utilizados em serviço público os imóveis ocupados por servidor da União, como residência em caráter obrigatório.
Isto quer dizer que, com muita propriedade, que há outro requisito, qual seja; a necessidade de existir uma relação entre a residência a ser ocupada e a sua utilização em serviço público.
E isto seria até obvio ao pensarmos que um imóvel da União caracterizado como de serviço público deva ser ocupado por servidor público apenas se houver um nexo com o serviço público, ou melhor, com o interesse público, sob pena de estarmos legitimando uma situação que venha a atender apenas aos interesses particulares.
E mais. A necessidade da existência de alguma relação com o serviço público é defendida no Voto do Juiz Relator, na Apelação Cível nº 50087, TRF 2ª Região, que assim consigna:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DESPESAS COM MORADIA. RESSARCIMENTO. RESIDÊNCIA OBRIGATÓRIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. REGIME JURÍDICO HÍBRIDO. INVIABILIDADE.
I – Caso em que procurador autárquico do DNER alega ter direito subjetivo a residir em Próprio Nacional, ou, ao menos, ter suas despesas com moradia custeadas pela autarquia, com base no Regimento Interno da entidade.
II – Fala-se em residência obrigatória quando, pela natureza ou peculiaridade do trabalho, for indispensável, por necessidade de vigilância ou assistência constante, que o servidor público resida em imóvel de domínio da União (vide Orientação Normativa GEAPN 003 de 2001).
III – O servidor público não pode se beneficiar de um regime jurídico híbrido, formado a partir dos aspectos mais vantajosos do Regimento Interno do DNER e da Lei nº 8.112/90.
IV – A Lei nº 8.112/90, no art. 53, prevê uma ajuda de custo para compensar as despesas de instalação do servidor que, no interesse do serviço, passar a ter exercício em nova sede, com mudança de domicílio em caráter permanente. Nesse sentido, o ressarcimento de despesas com moradia seria inacumulável com a indenização que é paga aos servidores públicos federais por ocasião da transferência.
V – Recurso conhecido e improvido.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
O art 122 do Regimento Interno do DNER, invocado pelo apelante, vigia com a seguinte redação:
Art. 122. O DNER poderá, no interesse do serviço, fixar residência obrigatória para qualquer dos seus servidores, a qual se dará em imóvel próprio da Autarquia, ou por ela arrendado, obedecidas as disposições do Decreto-lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946.
Sustenta o apelante que, tendo sido transferido por necessidade de serviço, possui direito subjetivo a residir em Próprio Nacional, ou, ao menos, ter suas despesas com moradia custeadas pela autarquia. Não lhe assiste razão, todavia, pois sua situação não se enquadra na hipótese de “residência obrigatória” a que alude o dispositivo.
Fala-se em residência obrigatória quando, pela natureza ou peculiaridade do trabalho, for indispensável, por necessidade de vigilância ou assistência constante, que o servidor público resida em imóvel de domínio da União (vide Orientação Normativa GEAPN 003 de 2001). Não é o caso, contudo, pois o exercício das atribuições do cargo de procurador autárquico não exige que o ocupante resida em um imóvel específico.
(TRF2, AC 50087, Quinta Turma, Des. Federal Mauro Luis Rocha Lopes, DJU 18.06.2008)
Portanto, é imprescindível que o imóvel esteja em utilização no serviço público, para que continue a ser usado como residência de servidor. Se o servidor encontra-se em licença de suas atividades públicas, para trato de interesse particular, é obvio que não pode utilizar o imóvel sob tal fundamento, devendo a SPU consulente, acaso não encontre, a seu juízo de oportunidade e conveniência, outra destinação no interesse público, promover a aplicação do art. 64, qual seja, “os bens imóveis da União não utilizados em serviço público poderão, qualquer que seja a sua natureza, ser alugados, aforados ou cedidos.”
Especificamente quanto ao uso de imóvel através de aluguel, temos, no mesmo Decreto-Lei 9.760:
Art. 86. Os próprios nacionais não aplicados, total ou parcialmente, nos fins previstos no art. 76 deste Decreto-lei, poderão, a juízo do S.P.U., ser alugados:
I – para residência de autoridades federais ou de outros servidores da União, no interesse do serviço:
II – para residência de servidor da União, em caráter voluntário;
III – a quaisquer interessados.
[...]
SEÇÃO III
DA RESIDÊNCIA VOLUNTÁRIA DE SERVIDOR DA UNIÃO
Art. 94. Os próprios nacionais não aplicados nos fins previstos no artigo 76 ou no item I do art. 86 deste Decreto-lei, e que se prestem para moradia, poderão ser alugados para residência de servidor da União.
§ 1º A locação se fará, pelo aluguel que for fixado e mediante concorrência, que versará sobre as qualidades preferenciais dos candidatos, relativas ao número de dependentes, remuneração e tempo de serviço público.
§ 2º As qualidades preferenciais serão apuradas conforme tabela organizada pelo S. P. U. e aprovada pelo Diretor Geral da Fazenda Nacional, tendo em vista o amparo dos mais necessitados.
SEÇÃO IV
DA LOCAÇÃO A QUAISQUER INTERESSADOS
Art. 95. Os imóveis da União não aplicados em serviço público e que não forem utilizados nos fins previstos nos itens I e II do art. 86, poderão ser alugados a quaisquer interessados.
Parágrafo único. A locação se fará, em concorrência pública e pelo maior preço oferecido, na base mínima do valor locativo fixado". (grifos nosso)
Diante dos dispositivos supra, verifica-se que os imóveis de natureza residencial só poderão ser alugados por servidores públicos sem prévia licitação, quando houver interesse público. Em caso de residência voluntária ou por outros interessados, imprescindível se torna a concorrência pública. Veja-se que referida Lei, ainda que anterior à atual Constituição Federal, traz exigência expressa para observância de tal procedimento. E se assim não fosse, deveria somente ter seus dispositivos recepcionados à luz da Carta Magna ou mediante o uso de aplicação do princípio da interpretação conforme.
Nesse prumo, não parece cabível o uso de imóvel residencial da União por servidor público afastado de suas funções em virtude de licença para trato de interesse particular, ainda mais quando a justificativa e fundamento para a publicação da Portaria de Obrigatoriedade de residência estão assim consignados:
"a presença do Coordenador deste Laboratório se faz de extrema importância em dias e horários extraordinários. É importante ressalvar que, a qualidade de todo este sistema laboratorial - e de suas unidades externas pertencentes - bem como, o gerenciamento de suas parcerias e convênios, demandam tempo e muita dedicação no ambiente de trabalho. Viabilizar e otimizar o tempo significa investimento e rendimento para o interesse público federal".
Assim, tendo o Decreto-lei nº 9.760/46 que dispõe sobre os bens imóveis da União, disposto como atribuição da SPU a participação em todo o referido procedimento (art. 74), lembrando-lhe que deve estar atento ao previsto no § 4º do art. 79 do, o qual determina:
§ 4o Não subsistindo o interesse do órgão da administração pública federal direta na utilização de imóvel da União entregue para uso no serviço público, deverá ser formalizada a devolução mediante termo acompanhado de laudo de vistoria, recebido pela gerência regional da Secretaria do Patrimônio da União, no qual deverá ser informada a data da devolução. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
Pois bem, não se encontrando mais o servidor a serviço do MAPA, impõe-se trazer em destaque as seguintes transcrições do Termo de Entrega do Imóvel que ele subscreveu (sei n. 5955710 fls. 40/41):
CLÁUSULA QUARTA - considerar-se-á rescindida a presente Entrega, independentemente de ato especial, retornando o imóvel ao OUTORGANTE, hipótese em que deverá ser revertido à administração da SPU, sem qualquer direito do OUTORGADO à indenização, inclusive por benfeitorias, nos seguintes casos: a) se extinto o objetivo que motivou a entrega; b) se o imóvel objeto da entrega, na sua totalidade ou em parte, vier a ser cedido, transferido ou sublocado a terceiros, sem a prévia e indispensável autorização escrita do OUTORGANTE e da GRPU, ou se ao imóvel for dada utilização diversa da destinada; c) se ocorrer inadimplemento de cláusula deste termo; d) se o OUTORGADO renunciar à entrega, deixar de exercer as suas atividades ou se aposentar
Note-se que a cláusula resolutiva, tal como concebida nas disposições acima, é assim prevista no Código Civil:
Art. 474. A cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação judicial.
Desta feita, resta evidente que a atual utilização do imóvel por parte do servidor tornou-se ilegal, devendo a SPU/MG considerar a avença rescindida de pleno direito. Isso porque, o descumprimento da finalidade proposta da ocupação [parágrafo primeiro e segundo da cláusula quarta] acarreta a rescisão automática do pactuado e independentemente de ato especial, retornando os bens à posse da União, sem direito a qualquer indenização, inclusive por benfeitorias realizadas.
Outrossim, deverá a SPU/MG notificar o servidor público para no prazo aventado desocupar o imóvel, sob pena de incidir na multa prevista no parágrafo único, do artigo 10, da Lei 9.636/98, transcrito na íntegra abaixo:
Art. 10. Constatada a existência de posses ou ocupações em desacordo com o disposto nesta Lei, a União deverá imitir-se sumariamente na posse do imóvel, cancelando-se as inscrições eventualmente realizadas.
Parágrafo único. Até a efetiva desocupação, será devida à União indenização pela posse ou ocupação ilícita, correspondente a 10% (dez por cento) do valor atualizado do domínio pleno do terreno, por ano ou fração de ano em que a União tenha ficado privada da posse ou ocupação do imóvel, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.
Frise-se que Administração deve adotar conduta diligente e rápida para a resolução da questão ora em destaque, considerando o lapso temporal que configura utilização irregular por parte do servidor.
Ainda, caso não sejam acatadas pelo servidor as recomendações exaradas ao longo deste Parecer, e o mesmo se recuse a entregar o imóvel para a União, a SPU/MG deverá adotar de modo célere as medidas judiciais de reintegração de posse, com a intervenção da Procuradoria da União daquele Estado.
CONCLUSÃO
Por todo o exposto, e tendo em vista que não mais subsume aos autos a permanência dos motivos que fundamentaram a Portaria de declaração de obrigatoriedade da residência por servidor público, porquanto não mais ocupar o cargo de Coordenador do Laboratório e, principalmente, por encontrar-se afastado do serviço público por licença para trato de interesse particular, opina-se:
a) que os imóveis de natureza residencial só poderão ser alugados por servidores públicos sem prévia licitação, quando houver interesse público. Em caso de residência voluntária ou por outros interessados, imprescindível se torna a concorrência pública, por força dos dispositivos expressos do Decreto-Lei n. 9.760/46 e da Constituição Federal;
b) que a SPU/MG notifique o servidor para que promova a sua imediata desocupação, sob pena de aplicação de multa prevista no parágrafo único, do artigo 10, da Lei nº 9.636/98, e, caso necessário, viabilize as medidas judiciais de reintegração de posse, com a intervenção da Procuradoria da União no Estado.
É o parecer, de caráter opinativo, que prescinde de aprovação por força do art. 21 da Portaria E-CJU/Patrimônio/CGU/AGU n° 1/2020 – Regimento Interno da e-CJU/Patrimônio, publicada no Suplemento B do BSE nº 30, de 30 de julho de 2020.
Ao protocolo da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Patrimônio (E-CJU/PATRIMÔNIO) para restituir o processo ao órgão consulente, para ciência deste, bem como para adoção da(s) providência(s) pertinente(s).
Brasília, 17 de agosto de 2021.
PATRÍCIA KARLLA BARBOSA DE MELLO
ADVOGADO DA UNIÃO
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 21181000164201014 e da chave de acesso 7f6d98d0