ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00656/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 10154.131537/2021-53.
INTERESSADOS: UNIÃO (MINISTÉRIO DA ECONOMIA/SECRETARIA ESPECIAL DE DESESTATIZAÇÃO, DESINVESTIMENTO E MERCADOS/SECRETARIA DE COORDENAÇÃO E GOVERNANÇA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO/SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO ESTADO DE SÃO PAULO - ME/SEDDM/SCGPU/SPU-SP) E MARINEIDE MINICHILLO NASCIMENTO.
ASSUNTOS: BENS PÚBLICOS. NEGOCIAÇÃO DE DÍVIDAS DE BEM IMÓVEL DE DOMÍNIO DA UNIÃO ORIUNDO DA EXTINTA REDE FERROVIÁRIA FEDERAL S.A. (RFFSA). ASSESSORAMENTO JURÍDICO. CONSULTA FORMULADA. ESCLARECIMENTO DE DÚVIDAS.
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE
DIREITO PÚBLICO. BENS PÚBLICOS. GESTÃO E GOVERNANÇA DO PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. ASSESSORAMENTO JURÍDICO. INDAGAÇÕES FORMULADAS. ORIENTAÇÃO JURÍDICA. ESCLARECIMENTO DE DÚVIDAS.I. Negociação de dívidas de bem imóvel de domínio da União oriundo da carteira imobiliária da extinta Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA).II. Possibilidade de a União renegociar dívidas e saldos devedores decorrentes de contratos de transferência de domínio e de débitos de contratos firmados pela extinta RFFSA que tenham por objeto bens imóveis operacionais e não operacionais. Artigo 28, caput, da Lei Federal 11.483, de 31 de maio de 2007, que dispõe sobre a revitalização do setor ferroviário.III. Memorando Circular nº 147 CGREG/DEINC-SPU, de 11 de novembro de 2011.IV. Consulta a ser formulada a Procuradoria da União no respectivo Estado. Ato preliminar à realização de acordo administrativo. Existência de ação judicial em tramitação em face do objeto do acordo administrativo e não em relação à pessoa/contratante que figura no acordo.V. Ação de Usucapião (processo nº 1003271-74-2017.8.26.0108) em tramitação na 1ª Vara Judicial da Comarca de Cajamar/SP. Pretensão de aquisição da propriedade de bem imóvel, na via do usucapião, mediante sentença judicial. Artigo 1.241 do Código Civil (CC). Objeto do processo judicial não abrange, aparentemente, acordo administrativo relacionado à renegociação de dívidas decorrentes de contratos celebrados pela extinta RFFSA..VI. Ausência de óbice, quanto a tal aspecto, para celebração de acordo administrativo objetivando negociação de dívidas.VII. Observação da(s) recomendação(ões) sugerida (s) nesta manifestação jurídica.
I - RELATÓRIO
O Superintendente do Patrimônio da União no Estado de São Paulo, por intermédio do OFÍCIO SEI Nº 215445/2021/ME, datado de 13 de agosto de 2021, assinado eletronicamente na mesma data (SEI nº 17955075), disponibilizado a e-CJU/PATRIMÔNIO o link de acesso ao Sistema Eletrônico de informações (SEI) com abertura de tarefa no SAPIENS em 18 de agosto de 2021, encaminha o processo para análise e manifestação, nos termos do artigo 11, inciso VI, alínea “b”, da Lei Complementar Federal nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União e do artigo 19, incisos I e II, do Ato Regimental AGU nº 5, de 27 de setembro de 2007.
Trata-se de solicitação de assessoramento jurídico (orientação jurídica) referente a consulta sobre negociação de dívidas de imóvel oriundo da carteira imobiliária da extinta Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA) incorporado ao patrimônio imobiliário da União, localizado à Rua Antônio Furegatti Guin, nº 21, Vila Arens, Município de Jundiaí, Estado de São Paulo, ocupado pela Senhora Marineide Minichillo Nascimento, inscrita no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) sob nº 086.448.238-84.
O processo está instruído com os seguintes documentos:
PROCESSO/DOCUMENTO TIPO
15637792 | Anexo Certidão negativa de imóveis retirad | |||
15637793 | Anexo Certidão negativa de imóveis retirad | |||
15637794 | Anexo IRPF 2019 | |||
15637795 | Anexo Documento de Identificação com foto | |||
15637797 | Anexo Comprovante de residência em nome do | |||
15637798 | Anexo TPU - 1 | |||
15637799 | Anexo TPU - 2 | |||
15637800 | Anexo Documento de identificação com foto | |||
15637801 | Requerimento SP04213_2021 | |||
15730930 | Despacho | |||
15779296 | Ofício 126986 | |||
16048044 | Memorando-Circular nº 147 CGREG/DEINC-SPU | |||
16073284 | ||||
16111443 | Aviso de Recebimento - AR Ofício 126986 | |||
16640014 | Ofício n. 04222/2021/CGJ/PRU3R/PGU/AGU | |||
16640112 | Ofício 162280 | |||
16674308 | ||||
16684382 | Aviso de Recebimento - AR | |||
17654345 | E-mail PRU3R/PGU/AGU | |||
17654430 | Ofício 04787-2021-CGJ-PRU3R-PGU-AGU | |||
17955075 | Ofício 215445 |
II– PRELIMINARMENTE – FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER
A presente manifestação jurídica tem o escopo de assessorar a autoridade competente para a prática do ato, para que dele não decorra nenhuma responsabilidade pessoal a ela, e também para que seja observado o princípio da legalidade e os demais que norteiam a atuação da Administração.
Desta forma, cercando-se a autoridade de todas as cautelas para a prática do ato, e documentando-as nos autos, a princípio cessa a sua responsabilidade pessoal por eventuais decorrências não satisfatórias.
A atribuição da e-CJU/PATRIMÔNIO é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar alguma providência para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem, em seu juízo discricionário, compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a cautela recomendada.
Disso se conclui que a parte das observações aqui expendidas não passa de recomendações, com vistas a salvaguardar a autoridade administrativa assessorada, e não vinculá-la. Caso opte por não acatá-las, não haverá ilegalidade no proceder, mas simples assunção do risco. O acatamento ou não das recomendações decorre do exercício da competência discricionário da autoridade assessorada.
Já as questões que envolvam a legalidade,[1] de observância obrigatória pela Administração, serão apontadas, ao final deste parecer, como óbices a serem corrigidos ou superados. O prosseguimento do feito, sem a correção de tais apontamentos, será de responsabilidade exclusiva do órgão, por sua conta e risco.
Por outro lado, é certo que a análise dos aspectos técnicos da demanda sob análise não está inserido no conjunto de atribuições/competências afetas a e-CJU/PATRIMÔNIO, a qual não possui conhecimento específico nem competência legal para manifestar-se sobre questões que extrapolam o aspecto estritamente jurídico.
III - FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Para melhor contextualização e compreensão da consulta submetida a apreciação da e-CJU/PATRIMÔNIO, unidade de execução da Consultoria-Geral da União (CGU), Órgão de Direção Superior da Advocacia-Geral da União (AGU), reputo relevante transcrever a íntegra do OFÍCIO SEI Nº 215445/2021/ME (SEI nº 17955075) elaborado pelo Núcleo de Destinação Patrimonial da Superintendência do Patrimônio da União no Estado de São Paulo (SPU/SP), no qual há relato da situação fática e do(s) questionamento(s) formulado(s), verbis:
(...)
"1. Trata-se de processo para regularizar dívidas de imóvel pertencente à Carteira Imobiliária da extinta RFFSA e transferido à União, localizado na Rua Antônio Furegatti Guin,21 Vila Arens - Jundiaí/SP ocupado pela Senhora Marineide Minichillo Nascimento, CPF 086.448.238- 84.
2. Em cumprimento ao Decreto Nº 6.018, de 22 de janeiro de 2007, que dispõe sobre o processo de liquidação e extinção da Rede Ferroviária Federa S. A, cumpre ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (Art. 5º, III):
d) “a gestão da carteira imobiliária, com as respectivas informações relativas a saldos devedores, prestações e débitos oriundos de contratos de compra e venda e de locação de imóveis” (Incluída pelo Decreto nº 6.769, de 2009).
3. Em atenção ao Memorando Circular nº 147 CGREG/DEINC-SPU (anexo I), é necessário que, preliminarmente à realização de renegociação de dívidas decorrentes de contratos firmados pela extinta RFFSA, consulte a Procuradoria da União no Estado quanto à existência de ação judicial em curso em face do acordado.
4. Por sua vez, a Procuradoria-Regional da União da 3ª Região nos informou, através do Ofício n. 04787/2021/CGJ/PRU3R/PGU/AGU (anexo II), que foi identificada a Ação de Usucapião n. 1003271-74.2017.8.26.0108 em trâmite perante a 1ª Vara Judicial da Comarca de Cajamar (TJSP), em que a Senhora Marineide Minichillo Nascimento consta no polo ativo.
5. Coube à SPU verificar se a existência da referida ação judicial constitui óbice para a renegociação pretendida, nesse sentido, encaminhamos o presente à Consultoria Jurídica da União no Estado de São Paulo para prestar assessoramento jurídico ao órgão quanto à regularidade da opção de dar prosseguimento à realização da renegociação das dívidas desse imóvel, apesar de ter sido identificada ação que o envolva.
Anexos:
I - Memorando Circular nº 147 CGREG/DEINC-SPU (SEI nº 16048044);
II - Ofício n. 04787/2021/CGJ/PRU3R/PGU/AGU (SEI nº 17654430)."
O artigo 28, caput, da Lei Federal 11.483, de 31 de maio de 2007, que dispõe sobre a revitalização do setor ferroviário, autoriza a União a renegociar dívidas e saldos devedores decorrentes de contratos de transferência de domínio e de débitos de contratos firmados pela extinta RFFSA que tenham por objeto bens imóveis operacionais e não operacionais.
O Memorando Circular nº 147 CGREG/DEINC-SPU, de 11 de novembro de 2011, oriundo da Coordenação-Geral de Regularização Patrimonial do Departamento de Incorporação de Imóveis da extinta Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, cujo assunto versa sobre "Orientação acerca de procedimentos para renegociação, quitação e renúncia de dívidas decorrentes de contratos firmados pela exinta RFFSA" contém no item 1. a seguinte redação:
"1. Em observância à recomendação contida no item 10.c da NOTA Nº 770/2011-KNN/DPP/PGU/AGU, solicitamos a todas as Superintendências do Patrimônio da União no Estados que, preliminarmente à realização de acordo administrativo referentes à renegociação de dívidas decorrentes de contratos firmados pela extinta RFFSA, prevista no art. 28 da Lei nº 11.483/2007, bem como à renúncia prevista no art. 7º da Lei nº 12.348/2010, consulte a Procuradoria da União no Estado quanto à existência de ação judicial em curso em face do acordado, bem como dê ciência a este do eventual pagamento de custas processuais e honorários advocatícios."
Ao se observar a redação do Memorando Circular, constata-se que a consulta a ser formulada a Procuradoria da União no respectivo Estado, como ato preliminar à realização de acordo administrativo, corresponde, salvo melhor juízo de entendimento divergente, ao objeto do acordo administrativo relacionado à renegociação de dívidas decorrentes de contratos celebrados pela extinta RFFSA, e não à pessoa/contratante que figura no acordo.
No OFÍCIO n. 04787/2021/CGJ/PRU3R/PGU/AGU, de 05 de julho de 2021 (SEI nº 17654430), a Coordenação-Geral Jurídica da Procuradoria Regional da União da 3ª Região informou sobre a existência de Ação de Usucapião (processo nº 1003271-74-2017.8.26.0108) em tramitação na 1ª Vara Judicial da Comarca de Cajamar, Estado de São Paulo, figurando no pólo ativo do processo judicial, na qualidade de autora/requerente, a Srª Marineide Minichillo Nascimento.
No Ofício em referência não foi informado a pessoa física ou jurídica que figura no pólo passivo da relação processual e qual o bem imóvel objeto da Ação de Usucapião.[2]
Entretanto, após consulta de processos do 1º Grau realizada no site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJES), foi identificado no pólo passivo o Instituto de Ferrovias e Preservação Patrimônio Cultural e Estrada de Ferro Perus Pirapora S/A e na qualidade de terceiros interessados a União Federal, Fazenda Pública do Estado de São Paulo e Município de Cajamar/SP, não sendo possível, lamentavelmente, a identificação do bem imóvel objeto da Ação de Usucapião Extraordinária.
Aparentemente a Ação de Usucapião em tramitação na 1ª Vara Judicial da Comarca de Cajamar/SP não tem por objeto acordo administrativo relacionado à renegociação de dívidas decorrentes de contratos celebrados pela extinta RFFSA, mas pretensão de aquisição da propriedade de bem imóvel, na via do usucapião, mediante sentença judicial nos termos do artigo 1.241 do Código Civil (CC), verbis:
"TÍTULO III
Da Propriedade
CAPÍTULO II
Da Aquisição da Propriedade Imóvel
Seção I
Da Usucapião
Art. 1.241. Poderá o possuidor requerer ao juiz seja declarada adquirida, mediante usucapião, a propriedade imóvel."
Por tais razões, a existência da referida Ação Judicial e o fato de figurar no seu pólo ativo, na qualidade de autora/requerente, a Srª Marineide Minichillo Nascimento, por si só, não constitui óbice para eventual celebração de acordo administrativo objetivando a negociação de dívidas decorrentes de contratos firmados pela extinta Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA).
Por cautela e preliminarmente a negociação de dívidas do imóvel oriundo da carteira imobiliária da extinta Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA), recomendo a SPU/SP, no exercício da competência discricionária, a qual envolve juízo de conveniência e oportunidade intrínseco à pratica do ato administrativo (decisão administrativa a ser tomada), sopesar/apreciar/examinar de forma criteriosa, em observância aos princípios da legalidade e da razoabilidade que norteiam a atividade administrativa, se a negociação entabulada está em consonância com os requisitos legais e normativos, assim como as orientações administrativas provenientes do órgão responsável pela gestão e governança do patrimônio imobiliário da União, de modo a ser aplicada ao caso concreto a solução mais adequada preservando a boa fé das partes envolvidas e conferindo segurança jurídica ao processo administrativo em curso.
Aspecto importante relacionado ao regime jurídico dos atos administrativos, é a incidência direta do princípio da boa-fé objetiva. O princípio da boa-fé prestigia a estabilidade das relações jurídicas constituídas e almeja a pacificação dos vínculos estabelecidos a fim de preservar a ordem, um dos primados do Direito, sem qualquer prejuízo para terceiros, operando de modo a preservar a legítima expectativa, a confiança gerada e o dever de lealdade, o qual atua como um padrão de comportamento a ser seguido, como um modelo de conduta fundado na honestidade, lealdade e cooperação, tendo como uma de suas funções, a integrativa, prevista no artigo 422 do Código Civil. De acordo com tal dispositivo legal, a boa-fé se integra a qualquer relação obrigacional e objetiva proteger a relação jurídica entre os participantes, de forma a impor-lhes mutuamente alguns deveres como a lealdade e a cooperação, os quais, por sua vez, visam em última análise o adimplemento obrigacional.
A boa-fé constitui-se em princípio constitucional implícito, deduzido e entendido do sistema de valores adotado pela Carta Magna, particularmente dos postulados constitucionais da dignidade humana (art. 1º, inc. III), da solidariedade social (art. 3º, inc. I), da segurança jurídica (art. 5º, inc. XXXVI) e, no que concerne particularmente ao Direito Administrativo, da moralidade (art. 37, caput). A própria Lei Geral do Processo Administrativo (Lei Federal nº 9.784/1999) estabelece, em seu art. 2º, inciso IV, que na condução dos processos, serão observados, dentre outros, critérios de atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé.
Conforme José dos Santos Carvalho Filho[3] são 2 (dois) os aspectos relacionados com o princípio da segurança jurídica, erigido pela Lei Federal nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, como postulado que deve nortear o processo administrativo federal, verbis:
(...)
"SEGURANÇA JURÍDICA – A lei catalogou o princípio da segurança jurídica entre os postulados que devem reger o processo administrativo federal.
Dois são os aspectos relacionados com o princípio da boa-fé constitui-se em princípio constitucional implícito, deduzido e entendido do sistema de valores adotado pela Carta Magna, particularmente dos postulados constitucionais da dignidade humana (art. 1º, inc. III), da solidariedade social (art. 3º, inc. I), da segurança jurídica (art. 5º, inc. XXXVI) e, no que concerne particularmente ao Direito Administrativo, da moralidade (art. 37, caput). A própria Lei Geral do Processo Administrativo (Lei Federal nº 9.784/1999) estabelece, em seu art. 2º, inciso IV, que na condução dos processos, serão observados, dentre outros, critérios de atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé.o em foco.
O primeiro decorre da moderna necessidade de permanência dos atos produzidos pelos agentes do estado. Configurase nela o princípio da estabilidade das relações jurídicas, por meio do qual as normas regentes, uma vez editadas, ganham corpo para serem objeto de conhecimento e de obediência por parte dos indivíduos.
Além disso, a segurança jurídica importa a criação da crença coletiva de que os atos do Poder Público ostentam um delineamento de legitimidade, e esse fato há de merecer amparo pelas autoridades públicas. Por tal motivo, estudiosos referem-se hoje ao princípio da proteção à confiança, exatamente para garantir que a confiança não se dissipe pela constante alteração dos atos públicos e, consequentemente, da disciplina que contemplam.[4]
Com efeito, os cidadãos tem o direito a uma relativa continuidade das resoluções provenientes dos órgãos estatais, nas quais depositaram toda a sua confiança. assim, é mais do que justo que suas expectativas estejam voltadas para a permanência de tais resoluções, tendo a perspectiva do respeito e do reconhecimento que a administração lhes devem dispensar. o sobressalto, nesse caso, é ofensivo ao próprio sentimento de confiança que tem que ser protegido a todo custo.[5]
Oportuno citar o ensinamento de Gilmar Ferreira Mendes,[6] litteris:
(...)
"No âmbito do Direito Administrativo tem-se acentuado que, não raras vezes, fica a Administração impedida de rever o ato ilegítimo por força do princípio da segurança jurídica. Nesse sentido convém mencionar o magistério de Hnas-Uwe Erichsen: "O princípio da legalidade da Administração é apenas um dentre os vários elementos do princípio do Estado de Direito. Esse princípio contém, igualmente, o postulado da segurança jurídica (Rechtssicherheit und Rechtsfriedens) do qual se extrai a idéia da proteção à confiança. Legalidade e segurança jurídica enquanto derivações do princípio do Estado de Direito têm o mesmo valor e a mesma hierarquia. Disso resulta que um asolução adequada para o caso concreto depende de um juízo de ponderação que leve em conta todas as circunstâncias que caracterizam a situação singlar (ERICHSEN, Hans-Uwe; MARTENS, Wolfgang. Allgemeines Verwaltungsrecht. 6 Ed. Berlim, p. 240)".
Segundo magistério de Cláudia Lima Marques[7] boa-fé objetiva seguindo a nova concepção social do contrato é dotada do seguinte significado:
(...)
"Uma atuação refletida, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes. (destacou-se)
Destaco que a análise aqui empreendida circunscreve-se aos aspectos legais envolvidos, não incumbido a esta unidade jurídica imiscuir-se no exame dos aspectos de economicidade, oportunidade, conveniência, assim como os aspectos técnicos envolvidos, especialmente a negociação de dívidas de imóvel oriundo da carteira imobiliária da extinta Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA), conforme diretriz inserta na Boa Prática Consultiva (BPC) nº 7.[8]
Tal entendimento está lastreado no fato de que a prevalência do aspecto técnico ou a presença de juízo discricionário determinam a competência e a responsabilidade da autoridade administrativa pela prática do ato.
Neste sentido, a Boa Prática Consultiva (BPC) nº 7, cujo enunciado é o que se segue:
"Enunciado
A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento." (grifou-se)
IV - CONCLUSÃO
Em face do anteriormente exposto, observado a(s) recomendação(ões) sugerida(s) no(s) item(ns) "13.", "17.", "18.", "19." e "20." desta manifestação jurídica, abstraídos os aspectos de conveniência e oportunidade do Administrador, nos limites da lei, e as valorações de cunho econômico–financeiro, ressalvadas, ainda, a manutenção da conformidade documental com as questões de ordem fática, técnica e de cálculo, ínsitas à esfera administrativa, essenciais até mesmo para a devida atuação dos órgãos de controle, o feito está apto para a produção dos seus regulares efeitos, tendo em vista não conter vício insanável com relação à forma legal que pudesse macular o procedimento.
Com o advento da Portaria nº 14, de 23 de janeiro de 2020, do Advogado-Geral da União, publicada no Diário Oficial da União (DOU) nº 17, Seção 1, de 24 de janeiro de 2020 (Sexta-feira), páginas 1/3, que cria as Consultorias Jurídicas da União Especializadas Virtuais (e-CJUs) para atuar no âmbito da competência das Consultorias Jurídicas da União nos Estados, as manifestações jurídicas (pareceres, notas, informações e cotas) não serão objeto de obrigatória aprovação pelo Coordenador da e-CJU, conforme estabelece o parágrafo 1º do artigo 10 do aludido ato normativo.
Feito tais registros, ao protocolo da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Patrimônio (e-CJU/PATRIMÔNIO) para restituir o processo a Superintendência do Patrimônio da União no Estado de São Paulo (SPU/SP) para ciência desta manifestação jurídica, mediante disponibilização de chave (link) de acesso externo como usuário externo ao Sistema AGU SAPIENS, bem como para adoção da(s) providência(s) pertinente(s) para o prosseguimento da negociação de dívidas de imóvel oriundo da carteira imobiliária da extinta Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA) incorporado ao patrimônio imobiliário da União.
Vitória-ES., 30 de agosto de 2021.
(Documento assinado digitalmente)
Alessandro Lira de Almeida
Advogado da União
Matrícula SIAPE nº 1332670
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154131537202153 e da chave de acesso a1679f33
Notas