ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO


 

PARECER n. 00759/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 67613.036125/2020-92

INTERESSADOS: COMANDO DA AERONAUTICA - GRUPAMENTO DE APOIO DE CURITIBA - GAP- CT

ASSUNTOS: DEMAIS HIPÓTESES DE DISPENSA DE LICITAÇÃO

 

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. CESSÃO DE USO GRATUITO DE BEM IMÓVEL AFETADO À AERONÁUTICA. CESSIONÁRIO ASSOCIAÇÃO COM ATIVIDADES NA ÁREA DA EDUCAÇÃO. Possibilidade do modelo pretendido. Problemas na concepção e instrução processual. Retorno do feito pata providências.

 

 

I - RELATÓRIO

 

 

Trata-se de consulta encaminhada por meio do Ofício nº 265/SSCT/43760 (sequência 02, fls 220/221), cujo objeto é cessão de uso gratuito do imóvel cadastrado sob código PR.001-67613-E-042, em parcela do Tombo PR.001-002, -“Lote C”, cadastrado na Secretaria do Patrimônio da União – SPU, sob n.º RIP 7535.00263.500-6, situado na Rua Sargento Alpendre n.º 42, Vila Militar dos Suboficiais e Sargentos do CINDACTA II, com área construída de 768,00 m² e área do terreno de 2.371,11 m2 (0,24 ha); ao CENTRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL CÉU AZUL, pessoa jurídica de direito privado.

Destaque-se que estes autos não serão distribuídos à e-CJU/Patrimônio porque o advogado que subscreve este parecer já participou de algumas reuniões sobre o tema, nas quais foram passadas instruções que se fazem presentes nestes autos. Esta atuação local da CJU/PR é permitida pela Portaria nº 14/2020, do Advogado-Geral da União. 

Destaque-se que os autos administrativos se encontram, em sua totalidade, na sequência 02 da SAPIENS, sendo que dentre os documentos que lhe instruem importa ressaltar:

 

         

É o breve Relatório.

 

II-FUNDAMENTAÇÃO

 

II.1 – Finalidade e abrangência do parecer

 

A presente manifestação jurídica tem o escopo de assessorar a autoridade competente para a prática do ato para que dele não decorra nenhuma responsabilidade pessoal e também para que seja observado o princípio da legalidade e os demais que norteiam a atuação da Administração.

Nossa atribuição é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar alguma providência para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem, em seu juízo discricionário, compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a cautela recomendada.

Disso se conclui que parte das observações aqui expendidas não passam de recomendações, com vistas a salvaguardar a autoridade administrativa assessorada, e não vinculá-la. Caso opte por não acatá-las, não haverá ilegalidade no proceder, mas simples assunção do risco. O acatamento ou não das recomendações decorre do exercício da competência discricionário da autoridade assessorada.

Já as questões que envolvam a legalidade, de observância obrigatória pela Administração, serão apontadas, ao final deste parecer, como óbices a serem corrigidos ou superados. O prosseguimento do feito, sem a correção de tais apontamentos, será de responsabilidade exclusiva do órgão, por sua conta e risco.

Por outro lado, é certo que a análise dos aspectos técnicos (não jurídicos) não está inserida no conjunto de atribuições/competências afetas a esta CJU/PR, a qual não possui conhecimento específico nem competência legal para manifestar-se acerca de questões outras que aquelas de cunho estritamente jurídico, cabendo ao Administrador a responsabilidade pela aferição do imóvel ocupado e sua avaliação, pelo exame dos documentos cartoriais referentes a ocupação primitiva, a cadeia sucessória e a detenção física nas hipóteses demandadas, atestando a satisfatoriedade da documentação exibida, anexando aos autos as comprovações pertinentes, de acordo com o preceituado no Enunciado nº 07 do MANUAL DE BOAS PRÁTICAS CONSULTIVAS DA CGU/AGU, no sentido de que o Órgão Consultivo deve evitar "(...) posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade".

 

III.2 - Da Cessão de Uso Gratuito

 

A cessão de bem imóvel da União, tem sua regência pelo Decreto-Lei nº 9.760, de 1946, a teor do disposto no parágrafo único do artigo 121 da Lei nº 8.666, de 1993, assim enunciado:

 

"Art. 121.
 
[...]

 

Parágrafo único. Os contratos relativos a imóveis do patrimônio da União continuam a reger-se pelas disposições do Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, com suas alterações, e os relativos a operações de crédito interno ou externo celebrados pela União ou a concessão de garantia do Tesouro Nacional continuam regidos pela legislação pertinente, aplicando-se esta Lei, no que couber. "

 

Desta feita, deverão ser observados os requisitos contidos no art. 18 da Lei nº 9.636/1998, em especial a possibilidade de ceder a: Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; e a pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional:

 

"Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde;                 (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional.
§ 1o  A cessão de que trata este artigo poderá ser realizada, ainda, sob o regime de concessão de direito real de uso resolúvel, previsto no art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, aplicando-se, inclusive, em terrenos de marinha e acrescidos, dispensando-se o procedimento licitatório para associações e cooperativas que se enquadrem no inciso II do caput deste artigo.
§ 2º O espaço aéreo sobre bens públicos, o espaço físico em águas públicas, as áreas de álveo de lagos, rios e quaisquer correntes d’água, de vazantes, da plataforma continental e de outros bens de domínio da União, insusceptíveis de transferência de direitos reais a terceiros, poderão ser objeto de cessão de uso, nos termos deste artigo, observadas as prescrições legais vigentes.
§ 3º A cessão será autorizada em ato do Presidente da República e se formalizará mediante termo ou contrato, do qual constarão expressamente as condições estabelecidas, entre as quais a finalidade da sua realização e o prazo para seu cumprimento, e tornar-se-á nula, independentemente de ato especial, se ao imóvel, no todo ou em parte, vier a ser dada aplicação diversa da prevista no ato autorizativo e conseqüente termo ou contrato.
(...)
§ 5º A cessão, quando destinada à execução de empreendimento de fim lucrativo, será onerosa e, sempre que houver condições de competitividade, deverão ser observados os procedimentos licitatórios previstos em lei.
[...]
 

Pelos dispositivos colacionados é possível extrair algumas conclusões preliminares.

De fato, a Lei 9.636/98 autoriza a cessão de uso gratuito de imóveis da União para entidades sem fins lucrativos em dois dispositivos com redações distintas: entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde (I) e pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional (II).

O caso que ora se analisa, portanto, é de cessão de uso gratuito a uma associação na área de educação, cujo Estatuto Social encontra-se nos autos (sequência 02, fls. 160/176), chamada Associação de Pais e Mestres CEI Céu Azul.

As associações estão previstas no Código Civil, destaque-se:

 

Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:
I - as associações;
(...)
Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos.

 

Por esta razão, fica claro que associações regularmente constituídas atendem ao requisito posto na primeira parte do inciso I, do art. 18, da Lei 9.636/98, de que se trate de entidade sem fins lucrativos.

Cabe ao órgão consulente, entretanto, conferir junto ao competente Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas se a Associação de Pais e Mestres CEI Céu Azul está regularmente constituída.

Seguindo, mediante análise do art 2º do referido Estatuto da Associação define sua natureza e finalidade da seguinte forma:

 

Art. 2º A APM Céu Azul, tem como fins, gerir, administrar e colaborar no aprimoramento do processo educacional, na assistência ao escolar e na integração família-escola-comunidade da Associação Educacional.
§1º - O CENTRO EDUCACIONAL INFANTIL CÉU AZUL (CEI Céu Azul) é uma ENTIDADE ASSISTENCIAL, FILANTRÓPICA E SEM FINS LUCRATIVOS, gerida e administrada pela Associação de Pais e Mestres, com objetivo principal de proporcionar a Educação Infantil aos filhos e militares e comunidade local, facilitando a rotina dessas famílias, oferecendo um local seguro e estruturalmente preparado para as interações e brincadeiras no desenvolvimento infantil de crianças de 6 meses à 5 anos, utilizando-se de Projeto Político Pedagógico baseados na BNCC (Base Nacional Curricular Comum) e regimento interno.
(...)

 

Assim, por tratar de associação com finalidade institucional na área de educação, é possível afirmar que existe um encaixe perfeito entre a associação que ora se analisa e o já citado art. 18, in.I, da Lei 9.636/98.

Noutro giro, e apenas visando trazer questão que será relevante adiante, de mesmo modo é possível afirmar que associações que atuem da área de educação, embora se enquadrem no inc. I, art. 18, da da Lei 9.636/98, também se amoldam, em tese, no inc. II, "em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional".

Isso se deve ao fato de que a redação do inc. II é mais ampla e engloba o contido no inc. I. Afinal, sem interesse público nenhum ato administrativo pode ser realizado e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde são espécies de pessoas jurídicas.

Por esta razão, no processo que ora se analisa, resta claro haver enquadramento fático-normativo em ambos incisos do art. 18, da Lei 9.636/98.

Por fim, vale destacar que a aplicação do citado art. 18, da Lei 9.636/98, possui previsão expressa, com a encampação do instituto da cessão de uso gratuito, nos normativos internos do Comando da Aeronáutica. De fato, o consulente juntou aos autos a Portaria DIRINFERA nº 288/DPI, de 08 de agosto de 2019, aprovando a reedição da ICA 87-7  que dispõe sobre o "Controle, Administração, e Gestão do Patrimônio Imobiliário sob Administração do Comando da Aeronáutica". Sendo que em seu item 9.7 o assunto é tratado e assim foi prescrito o item 9.7.2:

 

A cessão de uso gratuita pode se dar, conforme inciso I e II, do art. 18, da Lei 9.636/98 para os Estados, Distrito Federal, Municípios, entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde, além das pessoas físicas ou jurídicas, quando tratar-se de interesse público, social, ou de aproveitamento econômico de interesse nacional.

 

Por todas estas razões, a cessão gratuita pretendida guarda previsão normativa e pode ser executada.

 

III.3 - Da necessidade de licitar nos casos de cessão de uso gratuita

 

Como não se está diante de atividade com fins lucrativos, exclui-se, desde já, a prescrição do §5º, do Art. 18, da Lei 9.636/98, por determinar que a cessão, "quando destinada à execução de empreendimento de fim lucrativo, será onerosa e, sempre que houver condições de competitividade, deverão ser observados os procedimentos licitatórios previstos em lei". 

De todo modo, isso não significa que as leis e princípios que regem as licitações não se apliquem em alguma medida a casos como este, já que se trata de uma modalidade de destinação dos imóveis da União. Sobre o tema, importa destacar a ementa do PARECER n. 00030/2019/DECOR/CGU/AGU

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. CESSÃO DE IMÓVEL A OUTRO ENTE DA FEDERAÇÃO, A TÍTULO GRATUITO, COM FUNDAMENTO NO ART. 18, I, DA LEI Nº 9.636, DE 15 DE MAIO DE 1998.
I - Questionamento do entendimento adotado pela Câmara Regional de Entendimentos Consultivos da 3ª Região - CRU-3, que atribuiu natureza não contratual à cessão de uso gratuito de bem imóvel da União para órgãos e entidades da Administração Pública e, por consequência, entendeu desnecessária a formalização de dispensa de licitação.
II - Apesar da extinção da CRU-3, permanece a necessidade de solução da questão jurídica em razão do art. 12 do Ato Regimental nº 1, de 22 de março de 2019, segundo o qual "devem ser apreciados pela Consultoria-Geral da União eventuais pedidos de revogação, revisão ou esclarecimento acerca de manifestações jurídicas e orientações normativas emitidas com fundamento no Capítulo I do Ato Regimental nº 1, de 2016".
III - Embora a base do questionamento jurídico seja a natureza jurídica da cessão dos bens imóveis da União para outros entes da Federação, a título gratuito, entende-se que o instrumento utilizado para a cessão de uso não se mostra relevante para a solução da questão, que tem o seu cerne na definição sobre a necessidade ou não de realizar a licitação das cessões enquanto instituto jurídico destinado a atribuir a terceiros o uso dos imóveis da União que não estejam sendo utilizados em serviço público (art. 64 do Decreto-Lei nº 9.760, de 1964).
IV - A cessão de uso gratuito de imóvel da União a outros entes da Federação, prevista no art. 18, I, da Lei nº 9.636, de 1998, demanda a observância dos mandamentos constitucionais e legais que regulam o procedimento de licitação, dispensa ou inexigibilidade, independentemente da investigação da natureza jurídica do instrumento utilizado para sua concretização. (destaques não constam no original)

 

Assim, as regras e mandamentos constitucionais atinentes às licitações, dispensas e inexigibilidades aplicam-se às cessões de uso gratuito. Apenas não se definiu como obrigatória a licitação prévia, sendo a realização de um chamamento público, visando selecionar o melhor projeto a ser instalado no imóvel, recomendável mas não obrigatório.

Em não sendo obrigatório o chamamento, passa-se à análise de enquadramento na hipótese de dispensa de licitação prevista no §1º, do art. 18, da Lei 9636/98, que embora já citado anteriormente, destaca-se: 

 
§ 1o  A cessão de que trata este artigo poderá ser realizada, ainda, sob o regime de concessão de direito real de uso resolúvel, previsto no art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, aplicando-se, inclusive, em terrenos de marinha e acrescidos, dispensando-se o procedimento licitatório para associações e cooperativas que se enquadrem no inciso II do caput deste artigo.

 

Para tanto, resgatamos outra manifestação do Departamento de Coordenação e Orientação de Órgãos Jurídicos - DECOR, da Advocacia-Geral da União, desta vez por meio da NOTA n. 00142/2017/DECOR/CGU/AGU (04926.001744/2011-21)

 

3. De fato, a legislação pátria que regulamenta a matéria - art. 18, inciso II e § 1º, da Lei nº 9.636/98, não impõe oa realização do chamamento público como condição prévia à cessão de uso gratuito de imóvel da União à associações sem fins lucrativos. Observe: 
 
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
I. (......)
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. 
§ 1o  A cessão de que trata este artigo poderá ser realizada, ainda, sob o regime de concessão de direito real de uso resolúvel, previsto no art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, aplicando-se, inclusive, em terrenos de marinha e acrescidos, dispensando-se o procedimento licitatório para associações e cooperativas que se enquadrem no inciso II do caput deste artigo. 
 
(...)
4. Contudo, caso a Administração Pública decida lançar mão do chamamento público previamente a cessão de uso gratuito de seus imóveis, ela estará se utilizando de um instrumento de gestão que visa ampliar a publicidade e transparência aos seus atos2. Mas, repete-se, o chamamento público não é um procedimento obrigatório a ser necessariamente levado a cabo em todos os processos de cessão de uso gratuitio de imóveis da União.
 
5. Portanto, diante da revisão do entendimento da CONJUR/MPOG, restou sedimentada a tese da dispensa do chamamento público prévio à cessão de uso gratuita de imóvel da União para associações sem fins lucrativos, com fulcro no art. 18, inciso II e § 1º, da Lei nº 9.636/98. 

 

Embora a previsão de dispensa de licitação contida no dispositivo fale em concessão de direito real de uso, o que se repete no art. 17, §2º, inc. I, da Lei 8.666/9 (especificamente para os casos de cessão entre entes da Administração Pública),  a Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Planejamento, por meio do PARECER n. 01204/2017/ACS/CGJPU/CONJUR-MP/CGU/AGU (04926.001744/2011-21), estendeu esta hipótese de dispensa aos casos de cessão de uso gratuito com os seguintes argumentos:

 

12. Cumpre ponderar, todavia, que esta Consultoria Jurídica tem analisado internamente a viabilidade jurídica de utilizar, na interpretação do art. 18, inciso II e parágrafo 1º, da Lei nº 9.636/98, o mesmo raciocínio empregado à dispensa nas cessões de uso com base no art. 17, parágrafo 2º, inciso I, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, incluído pela Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005, quando o cessionário é “outro órgão ou entidade da Administração Pública”.
13. Para tais situações, este órgão de assessoramento jurídico usualmente argumenta que como a norma dispensa o certame para a concessão de “título de propriedade ou de direito real de uso de imóveis”, entendemos que ela se aplica à cessão de uso, posto que menos gravosa aos interesses da União (não transfere direito real). Verbis:
 
“Art. 17 A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:
[...]
§ 2º A Administração também poderá conceder título de propriedade ou de direito real de uso de imóveis, dispensada licitação, quando o uso destinar-se:
I - a outro órgão ou entidade da Administração Pública, qualquer que seja a localização do imóvel;”
 
14. À título exemplificativo citamos o PARECER n. 00267/2017/ACS/CGJPU/CONJUR-MP/CGU/AGU, proferido na NUP: 11452.001086/97-29, e o PARECER n. 00516/2017/ACS/CGJPU/CONJUR-MP/CGU/AGU emanado na NUP: 04991.000959/2013-11, ambos recentes, destacando, contudo, que tal posicionamento já se encontra pacificado nesta Consultoria Jurídica há muito tempo.
15. Veja-se que o raciocínio empregado considera que a dispensa de licitação expressamente prevista para a concessão de direito real de uso pelo art. 17, parágrafo 2º, inciso I, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, pode ser aplicada à destinação por meio de cessão de uso, pelo fato de se tratar de instrumento patrimonial menos gravoso do que a concessão, já que não envolve a transferência de direito real, mas meramente da posse do imóvel de propriedade da União.
16. Ora, a possibilidade de aplicação da dispensa de licitação prevista no art. 18, inciso II e parágrafo 1º, da Lei nº 9.636/98, para a concessão de direito real de uso à cessão de uso gratuita, ao nosso ver, seguiria basicamente o mesmo raciocínio.

 

 

Este parecer foi, precisamente, base do entendimento do DECOR, posto na NOTA n. 00142/2017/DECOR/CGU/AGU (04926.001744/2011-21).

Assim, é aplicável ao caso a hipótese de dispensa de licitação prevista no art. 18, §1º, da Lei 9636/98. Destaque-se, entretanto, que este processo precisa seguir, no que couber, as regras previstas para a dispensa de licitação no art. 26, da Lei 8.666/93:

 
Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos.                 (Redação dada pela Lei nº 11.107, de 2005)"

 

Assim, como as demais dispensas previstas no dispositivo, estes autos deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos.      

 

III. 4 - Da competência

 

A destinação a terceiros de qualquer bem imóvel de domínio da União  jurisdicionado aos Comandos Militares deverá estar em consonância com o regramento previsto no ordenamento jurídico patrimonial vigente, expedidos no âmbito da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), sucedida pela Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União, órgão subordinado à Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimentos e Mercados, órgão específico singular da estrutura organizacional do Ministério da Economia, a qual incumbe administrar o patrimônio imobiliário da União, zelando por sua conservação, adotando as providências necessárias à regularidade dominial dos bens da União, nos termos do artigo 1º, incisos I e II, do Anexo da Portaria ME nº 335, de 02 de outubro de 2020, que aprovou o seu regimento interno.

As Organizações Militares (OM's) integrantes das Forças Armadas (FFAA) dispõem de um regime jurídico diferenciado na gestão dos bens imóveis de domínio da União sob sua jurisdição, com autonomia limitada na administração de tais bens em comparação com os órgãos civis, em consonância com as atribuições conferidas às Forças Armadas pela Constituição Federal de 1988, notadamente a defesa nacional.

Neste caso, o imóvel encontra-se jurisdicionado à Aeronáutica, cabendo a esta a competência para autorizar a venda ou permuta dos bens, nos termos do art. 1º da Lei 5.651/1970. Nesse sentido, a Portaria 217, de 16.08.2013 da SPU/MPOG, verbis:

 
"Art. 1º Autorizar os Superintendentes do Patrimônio da União a firmar os contratos de aquisição, alienação, locação, arrendamento, aforamento, cessões, concessões, autorizações e permissões relativos a imóveis da União.
Parágrafo Único. Nos contratos referentes às alienações de imóveis da União de que tratam as Leis nº 5651, de 11 de dezembro de 1970, e nº 5.658, de 7 de junho de 1971, fica delegada a competência para a assinatura aos respectivos Comandantes das Forças Armadas.
Art. 2º Compete às Superintendências organizar, sistematizar, documentar e arquivar as informações e documentos arregimentados de que trata o art. 1º." (grifamos)

 

Conferindo concretude a autonomia de que dispõem as Organizações Militares (OM's), foi expedida a  Portaria SPU nº 7.152, de 13 de julho de 2018, publicada no Diário Oficial da União (DOU) 135, Seção 1, de 16 de julho 2018, página 79, alterando a redação do parágrafo único do artigo 1º da Portaria SPU nº 40, de 18 de maço de 2009, e delegando competência aos Comandantes das Organizações Militares (OM's) para assinatura dos contratos referentes às alienações, arrendamento, termo de permissão de uso e concessões de direito real de uso de imóveis da União administrados pelas Forças Armadasverbis:

 
PORTARIA  7.152DE 13 DE JULHO DE 2018
 
O SECRETÁRIO DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO, DO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, DESENVOLVIMENTO E GESTÃO, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo Decreto nº 8.818, de 21 de julho de 2016, e pelo Regimento Interno da Secretaria do Patrimônio da União, aprovado pela Portaria GM/MP nº 152, de 5 de maio de 2016, bem como pelas normas pertinentes da legislação patrimonial, tendo em vista o disposto nos arts. 11 a 14 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, resolve:
 
"Art. 1º O parágrafo único do art. 1º da Portaria SPU nº 40, de 18 de março de 2009, passa a vigorar com a seguinte redação:
 
Parágrafo único: Nos contratos referentes às alienações, arrendamentos, termos de permissão de uso e concessões de direito real de uso de imóveis da União administrados pelas Forças Armadas através de entrega formalizada, fica delegada competência para a assinatura aos respectivos Comandantes, quando for o caso."

 

Ora, se à Aeronáutica é autorizado a alienar os imóveis da União a ele jurisdicionados, é certo que pode promover a cessão de uso gratuita de tais imóveis, independentemente da interveniência da SPU, embora não tenha sido possível encontrar normativo expresso da SPU neste sentido. Este entendimento parece se adequar com o reconhecimento de existência "de interesse público em se manter regime diferenciado para a gestão dos bens entregues às Forças Armadas em virtude das atribuições que lhe foram conferidas pela Constituição Federal de 1988, mormente a de defesa nacional", corroborado pelo PARECER Nº 010/2011/DECOR/CGU/AGU, aprovado pelo Despacho do Consultor-Geral da União nº 0192/2011 (00400.014449/2008-16):

 

PARECER Nº 010/2011/DECOR/CGU/AGU
EMENTA:
ADMINISTRATIVO. PATRIMÔNIO PÚBLICO. BENS IMÓVEIS DA UNIÃO ADMINISTRADOS PELAS FORÇAS ARMADAS. COMPETÊNCIA PARA A PRÁTICA DE ATOS DE ALIENAÇÃO E ARRENDAMENTO. REAFIRMAÇÃO DA NOTA DECOR/CGU/AGU Nº 245/2007 - PCN. VIGÊNCIA DAS LEIS Nº 5.651/1970 E Nº 5.658/1971, DO DECRETO-LEI Nº 1.310/1974 E DO DECRETO Nº 77.095/1976 MESMO APÓS O ADVENTO DA LEI Nº 9.636/1998. ANTINOMIA APARENTE. PREPONDERÂNCIA DAS NORMAS ANTERIORES EM RAZÃO DA ESPECIALIDADE E DO INTERESSE PÚBLICO NA DEFESA NACIONAL.
I - Reiterando e ratificando o que conclui a seu respeito a NOTA DECOR/CGU/AGU Nll 245/2007 - PCN. tendo em vista o caráter especial das normas hospedadas nas Leis nº 5.651/1970 e nº 5.658/1971 frente às disposições da Lei nº 9.636/1998. permanece a competência das Forças Armadas para alienar os bens imóveis da União que estão sob sua administração.
II - Antinomia aparente. resolvida pela utilização do critério da especialidade positivado no art. 211, § 2º do Decreto-lei l nº 4.567/1942.
III - Aplicação. mutatis mutandi, do mesmo raciocínio para o arrendamento de bens imóveis da União pelo Exército, de que cuidam o Decreto-lei nº 1.310/1974 e o Decreto nº 77.095/1976. a permitir que o faça sem a participação da SPU.
IV - Existência de interesse público em se manter regime diferenciado para a gestão dos bens entregues às Forças Armadas em virtude das atribuições que lhe foram conferidas pela Constituição Federal de 1988, mormente a de defesa nacional.
 

Neste contexto próprio de gestão dos imóveis, há previsão expressa na já citada a Portaria DIRINFERA nº 288/DPI, de 08 de agosto de 2019, que aprova a reedição da ICA 87-7, da distribuição de competências internas para fazê-lo:

 

9.7.5 A competência para o início do processo de cessão de uso gratuita é do Comandante, Chefe, Prefeito ou Diretor da OM que tem a responsabilidade administrativa do imóvel, sendo o mesmo responsável por todas as providências necessárias á concretização do contrato, inclusive negociações, com apoio do GAP. Caso haja a necessidade de apoio técnico à OM, para providenciar as peças técnicas necessárias ao processo, o DTINFRA da área prestará o apoio.
9.7.6 São competentes para firmar contratos de cessão de uso gratuita de imóveis, as seguintes autoridades, conforme prazos de vigência abaixo estabelecidos:
 
a) até 5 (cinco) anos, o Comandante, Chefe, Prefeito ou Diretor da OM, ou seja, o responsável administrativo pelo imóvel;
(...)

 

Conforme consta na Minuta de Termo de Cessão de Uso de Bem Imóvel fls. 215/218, a presente avença terá 5 (cinco) anos de vigência, logo está inserida entre as competências do Comandante Interino do CINDACTA II, que a subscreverá.

Por estas razões, é possível verificar que a competência para a cessão pretendida está fixada no plexo de atribuições do Comandante do CINDACTA II.

Analisados os aspectos estruturantes da cessão de uso gratuita objeto destes autos, constata-se que há previsão legal para tanto (art. 18, inc. I ou II, da Lei 9.636/98) que é possível aplicar ao caso hipótese de dispensa de licitação (Art. 18, §1º, da Lei 9636/98 em conjunto com o art. 17, §2º, inc. I, da Lei 8.666/93) e que o Comandante do CINDACTA II possui atribuição para tanto (itens 9.7.5 e 9.7.6, da ICA 87-7, cuja reedição foi aprovada pela Portaria DIRINFERA nº 288/DPI, de 08 de agosto de 2019.

Dito isso, é possível analisar a instrução processual.

 

II.5- Da instrução processual

 

Ao analisar os autos fica claro que o órgão consulente formatou este processo com base na Instrução Normativa nº 05, de 26 de maio de 2017, do SECRETÁRIO DE GESTÃO DO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, DESENVOLVIMENTO E GESTÃO, em que pese seu objeto ser "(...) as regras e diretrizes do procedimento de contratação de serviços sob o regime de execução indireta no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional".

Como o ato que se pretende ultimar é cessão de uso gratuita de bem imóvel é claro que a IN nº 05 não é cogente para o caso. De todo modo, este normativo trouxe para a Administração Pública uma série de instrumentos de gestão que se mostram muito úteis, viabilizando um bom planejamento dos negócios jurídicos. Por esta razão, é possível a aplicação deste diploma.

Entretanto, mesmo que o diploma seja aplicado, é necessário que o órgão consulente o faça apenas e tão somente nos aspectos que se adaptem ao objeto pretendido. E, neste ponto, nos parece que houve uma falha estrutural de instrução do feito que precisa ser corrigida.

De fato, deve ser destacado que os autos tratam de uma dispensa de licitação para a promoção de uma cessão de uso gratuita de imóvel, mas toda a concepção dos autos foi feita para a contratação de serviços, sem sequer uma linha destinada à dispensa. Não temos, assim, um processo de dispensa para uma cessão de uso, mas fólios de contratação de serviços sem uma modalidade de licitação, ou de contratação direta, clara.

É verificável o bom trabalho da equipe na juntada do projeto básico (que não é necessário, mas é uma prática saudável), bem como da minuta de ato que se pretende ultimar, mas existem vários documentos nos autos com conceitos e linguagens próprias de contratação de serviços. Além disso, como já dito linhas acima, o caso é de dispensa de licitação e assim deve ser tratado, inclusive com os cuidados previstos noa art. 26, da Lei 8.666/93.

Por fim, também importa destacar que o principal elemento justificador destes autos é o interesse público na cessão. Ele foi citado nos autos, entretanto, pela sua relevância, faz-se necessário que o consulente desenvolva mais esta fundamentação, trazendo mais elementos que justifiquem a necessidade da cessão pretendida.

 

 

III - CONCLUSÃO

 

 

Isto posto, conclui-se no sentido da viabilidade da cessão de uso de gratuita pretendida do imóvel cadastrado sob código PR.001-67613-E-042, em parcela do Tombo PR.001-002, -“Lote C”, cadastrado na Secretaria do Patrimônio da União – SPU, sob n.º RIP 7535.00263.500-6, situado na Rua Sargento Alpendre n.º 42, Vila Militar dos Suboficiais e Sargentos do CINDACTA II, com área construída de 768,00 m² e área do terreno de 2.371,11 m2 (0,24 ha), ao CENTRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL CÉU AZUL, pessoa jurídica de direito privado.

Foram identificados, entretanto, problemas de instrução processual que devem ser superados antes da análise conclusiva e aprovação da Minuta de Termo de Cessão de Uso de Bem Imóvel fls. 215/218.

Assim, sugere-se o retorno do feito ao consulente para que arquive este feito e, em novo NUP, instrua um processo de dispensa de licitação para cessão de uso gratuito, com os fundamentos trazidos ao longo deste parecer. Que seja mantido o projeto básico juntado aos autos e a minuta de Termo de Cessão de Uso de Bem Imóvel fls. 215/218. Além disso, sugere-se o reforço dos argumentos de justificativa para cessão, que contemple os elementos de interesse público necessários. 

Por fim, sugere-se que todos os demais documentos que façam análises próprias de contratação de serviços sejam revistos ou excluídos dos autos.

Ao CINDACTA II para providências. Após, retornem os autos para exame e manifestação conclusivos.

 

Brasília, 27 de setembro de 2021.

 

 

ROGÉRIO PEREIRA

ADVOGADO DA UNIÃO

CONSULTOR JURÍDICO DA UNIÃO NO ESTADO DO PARANÁ

 

 


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