ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00882/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 10154.166966/2021-41
INTERESSADOS: SPU/SC - SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM SANTA CATARINA
ASSUNTOS: BENS PÚBLICOS. AFORAMENTO. EXTINÇÃO.
EMENTA: Contrato de Cessão de Uso sob o regime de Aforamento. Extinção do Aforamento por descumprimento de cláusula contratual -não-pagamento do foro durante três anos consecutivos, ou quatro anos intercalados e por desvio na condição gravada na destinação do imóvel. Gravames incidentes sobre o domínio útil. Penhora ou hipoteca.
Enunciado nº 4: É juridicamente possível a hipoteca e a penhora de domínio útil titularizado por particular relativo a imóvel da União, mas tais gravames devem ser imediatamente cancelados se o bem for declarado de interesse do serviço público ou se o AFORAMENTO caducar.
Precedente:
- PARECER Nº 0056 - 5.1.3/2012/DPC/CONJUR-MP/CGU/AGU
Por força do disposto no art. 131 da CRFB/88 e no art. 11 da Lei Complementar nº 73/1993, a Superintendência do Patrimônio da União em Santa Catarina encaminha a esta Consultoria Jurídica da União especializada, consulta jurídica sobre como proceder diante de leilão determinado pela Justiça Estadual, a ser realizado no 07/12/2021, de imóvel da União Federal referente à área da União sob a posse do Porto de Itajaí (por meio do “termo de Cessão de uso em condições especiais”), objeto da matrícula nº 10.199 do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Itajaí/SC.
A consulta está entabulada no OFÍCIO SEI Nº 295411/2021/ME (SEI nº 20063634), nos seguinte termos:
"2. Conforme consta na Nota Informativa 36345 (SEI nº 20004280), a área em comento refere-se ao imóvel cadastrado sob o RIP SIAPA 81610000427-75, com área de 21.231,88 m². Este imóvel havia sido aforado para Sul Atlântico de Pesca/SC, porém, o aforamento foi cancelado por interesse público no imóvel para cessão ao Porto de Itajaí. Contudo, tanto o Decreto Municipal nº 7.723 de 26/09/2006, que declarou o interesse público no imóvel, quanto a propriedade do bem em nome da União, não foram registrados na matrícula do imóvel. Em consequência, foram gravadas diversas penhoras na matrícula do imóvel, culminando no agendamento do referido leilão.
3. Deste modo, solicitamos o apoio deste douto órgão no sentido de orientar esta SPU/SC sobre qual procedimento deve ser adotado frente ao cancelamento do aforamento, considerando a ação judicial em curso que determinou o leilão do imóvel.
4. Por oportuno, informa-se que foi concedido acesso externo à integra deste processo, bem como aos processos 04972.000871/2006-91 (Cessão Uso Condições Especiais), 0983.001120/81-00 (aforamento) e 10-80-131546-87 (Cessão de Uso Gratuita), conforme links de acesso abaixo:
10154.166966/2021-41: https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=1534075&infra_hash=2a1ce00fe133a1cec91d45ba1bbfd162
04972.000871/2006-91: https://seimp.planejamento.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=153287&infra_hash=9759a379a50af7256c2bfd24b5887020
0983.001120/81-00: https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=1534166&infra_hash=88cd894ce84b9a6158959d36d9ba315f
10-80-131546-87: https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=1539589&infra_hash=82325cbdcc56388065538e0383c9272a
Anexos:
I - Matrícula 10.199 atualizada (SEI nº 20003074);
II - Decreto 7399 e 7716 (SEI nº 20039180);
III - Nota Informativa 36345 (SEI nº 20004280).
3. Os autos foram disponibilizados por meio de acesso externo ao sistema SEI (links acima), trazendo a aludida Nota Informativa SEI nº 36345/2021/ME (SEI nº 20004280), as seguintes informações:
"QUESTÃO RELEVANTE:
Os autos foram remetidos a esta coordenação para verificação de fato comunicado pelo Porto de Itajaí, qual seja, a divulgação de leilão determinado pela Justiça Estadual (processo n. 5000239-25.2010.8.24.0033), a ser realizado no dia 07/12/2021, de área da União sob a posse do Porto de Itajaí por meio do “termo de Cessão de uso em condições especiais” – RIP 8161.00120.500-7¸ denominada pelo cessionário de CCP – Centro comercial Portuário, objeto da matrícula nº 10.199 do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Itajaí/SC.
No e-mail encaminhado pelo cessionário (SEI nº 19898267), consta o seguinte relato cronológico referente histórico do imóvel:
- 15/02/2005 – decreto municipal 7.399 – decreta área de utilidade publica
- 17/05/2005 – ingresso da ação de desapropriação Nº 2006.72.08.001034-6. 07/11/2005 –
decreto municipal n. 7.716. altera 7.399
- 14/11/2005 - – decreto municipal n. 7.723 26/09/2006 – PFN/SPU notifica o 1º Ofício de imóveis, para CANCELAR O AFORAMENTO em nome da Sul Atlântico de pesca, RETORNANDO O BEM A UNIÃO.
ANTECEDENTES:
Conforme consta no processo 04972.000871/2006-91 (Cessão Uso Condições Especiais), despacho CODES-SPU- SC (1675666 – MP), a área de 32.652,58 m² foi cedida à Superintendência do Porto de Itajaí e foi cadastrada no SPIUnet sob RIP 8161 00120.500-7. A referida área contempla a soma de 4 áreas cadastradas no SIAPA sob RIP’s 81610000147-20, 81610000427-75, 81610000428-56 e 8161 0000740-30. O processo mencionado foi encaminhado ao NUREP para cancelamento dos RIPs SIAPA em 18/04/2016. Contudo, o processo foi restituído à CODES, para obtenção prévia do Superintendente, para posterior cancelamento dos RIP’s. Em 06/04/2020, após o barramento, o processo retornou para o NUPRIV, sem despacho do NUDEPU ou do Superintendente.
Ainda no processo 04972.000871/2006-91, consta a Nota Técnica SEI nº 27571/2020/ME (9175055), de 13/07/2020, na qual se conclui que já houve concordância quanto ao cancelamentos dos RIP’s 81610000147-20, 81610000427-75, 81610000428-56 e 8161 0000740-30, não necessitando de nova anuência, pelo qual sugere-se o encaminhamento ao NUREP para os procedimentos afetos a sua área, com posterior retorno ao NUPRIV para cancelamento dos RIP’s por duplicidade com o RIP 8161 00120.500-7. Os autos permanecem até esta data no NUREP, não tendo sido retornados ao NUPRIV para cancelamento dos RIPs SIAPA.
No processo 0983.001120/81-00 (aforamento), consta que o aforamento do imóvel referente RIP SIAPA 81610000427-75, com área de 21.231,88 m², objeto da matrícula 10.199 (antigo registro nº 1674), foi cancelado por interesse público no imóvel para cessão ao Porto de Itajaí (pág. 137 do PDF). Os autos foram encaminhados à Procuradoria da Fazenda Nacional para cancelamento do aforamento no Cartório de Registro de Imóveis competente. O cancelamento do aforamento foi registrado na matrícula do imóvel, conforme consta na AV-19-10.199. Posteriormente, a matrícula foi gravada com diversas penhoras do executado Sul Atlântico de Pesca/SC, culminando no agendamento do leilão determinado pela Justiça Estadual, conforme processo n. 5000239-25.2010.8.24.0033
CONCLUSÃO: Tendo em vista o exposto, verifica-se, especificamente em relação ao imóvel que está indo a leilão, objeto do RIP SIAPA 81610000427-75 (área de 21.231,88 m², matrícula 10.199), que o cancelamento do aforamento foi efetivado somente na matrícula do imóvel, restando pendente o cancelamento do RIP no SIAPA. Ainda, verifica-se que o decreto que declarou o imóvel como de utilidade pública (decreto municipal n. 7.723 26/09/2006) não foi averbado na matrícula do imóvel, que permanece em aberto, sem registro de transferência da titularidade do imóvel para o patrimônio da União. Deste modo, recomenda-se oficiar a AGU para que 1) intervenha no processo, bloqueando o leilão e 2) notifique o cartório para que registre na matrícula do imóvel o Decreto 7.723 de 26/09/2006 e a propriedade do bem em nome da União.
É o que importa relatar. Passemos à análise.
DO MÉRITO
DO AFORAMENTO E DOS IMÓVEIS CARACTERIZADOS COMO ACRESCIDOS DE MARINHA
Conforme se depreende dos autos do processo n. 0983.001120/81-00 (fl. 87 - PDF ou 62, se considerados os autos físicos), trata-se de imóvel classificado como acrescido de marinha, "de acordo com a linha de preamar médio de 1831, homologada em 13/11/78", sendo portanto, de propriedade da União, por determinação expressa da Constituição da República Federativa do Brasil, ex vi, art. 20, VII:
Art. 20. São bens da União:
(...)
VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;
Nesse patamar, tem-se que o imóvel foi dado em contrato de cessão sob o regime de aforamento em 06.12.1967 (fls.36 dos autos físicos ou 52 -PDF processo n. 0983.001120/81-00), sendo importante transcrever o disposto na cláusula segunda, ao transcrever o texto da autorização do Presidente da República:
"A cessionária indenizará à União Federal da importância equivalente ao valor do domínio útil da área do terreno a que se refere o artigo anterior e se obrigará a pagar o foro anual correspondente na conformidade dos cálculos a serem procedidos pelo Departamento de Serviços Gerais, na forma do Decreto-Lei n. 9.760, de 5 de setembro de 1946.
Art. 3º. Destina-se o terreno a instalações para industrialização do pescado, tornando-se nula a cessão sem direito a qualquer indenização, independente de ato especial, se for dada ao terreno no todo ou em parte, aplicação diversa, ou se houver inadimplemento de cláusula do contrato que deverá ser lavrado em livro próprio do Departamento de Serviços Gerais.
Já na cláusula quarta consta:
"Que a presente cessão tornar-se-á nula, independente de ato especial, revertendo o terreno ao patrimônio da União, sem direito a qualquer indenização, inclusive por benfeitorias realizadas, nos seguintes casos:
a) se ao terreno no todo ou em parte, for dada aplicação diversa, da que lhe tenha sido destinada;
b) se ocorrer inadimplemento de qualquer cláusula deste contrato;"
Às fls. 53, certidão do Oficial de Registro de Imóveis - 1º Ofício, referente ao terreno acrescido de marinha, em que já declarava o registro do aforamento concedido em 1967.
Às fls. 89, consta a Declaração de caducidade de 07/06/2004 sequenciada de notificação por Carta registrada e DOU, o que ultrapassado os 90 (noventa) dias sem que houvesse o pedido de revigoração, provocou o cancelamento nos termos do art. 121 do Decreto-Lei n. 9.760/46 em 26 de setembro de 2006 - fl. 107 - (averbada no registro conforme fls. 116v).
Pois bem, é ressabido que o aforamento ou enfiteuse consiste no “ato pelo qual a União atribui a terceiros o domínio útil de imóvel de sua propriedade, obrigando-se este último (foreiro ou enfiteuta) ao pagamento de pensão anual, denominada foro, na porcentagem de 0,6% do valor do domínio pleno do terreno". É uma autorização de uso do imóvel pela União, em que não se transfere a propriedade do bem, muito embora consista num direito real resolúvel, já que pode ser extinto ou cancelado nas hipóteses elencadas pela Lei 9.760/46:
Art. 103. O aforamento extinguir-se-á: (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
I - por inadimplemento de cláusula contratual; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - por acordo entre as partes; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
III - pela remissão do foro, nas zonas onde não mais subsistam os motivos determinantes da aplicação do regime enfitêutico; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
IV - pelo abandono do imóvel, caracterizado pela ocupação, por mais de 5 (cinco) anos, sem contestação, de assentamentos informais de baixa renda, retornando o domínio útil à União; ou (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
V - por interesse público, mediante prévia indenização. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 1o Consistindo o inadimplemento de cláusula contratual no não-pagamento do foro durante três anos consecutivos, ou quatro anos intercalados, é facultado ao foreiro, sem prejuízo do disposto no art. 120, revigorar o aforamento mediante as condições que lhe forem impostas. (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
§ 2o Na consolidação pela União do domínio pleno de terreno que haja concedido em aforamento, deduzir-se-á do valor do mesmo domínio a importância equivalente a 17% (dezessete por cento), correspondente ao valor do domínio direto. (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
(...)
Art. 110. Expirado o prazo de que trata o art. 104 e não havendo interesse do serviço público na manutenção do imóvel no domínio pleno da União, a SPU promoverá a venda do domínio útil dos terrenos sem posse, ou daqueles que se encontrem na posse de quem não tenha atendido à notificação a que se refere o mesmo artigo ou de quem, tendo requerido, não tenha preenchido as condições necessárias para obter a concessão do aforamento. (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
(...)
Art. 118. Caduco o aforamento na forma do parágrafo único do art. 101, o órgão local da SPU notificará o foreiro, por edital, ou quando possível por carta registrada, marcando-lhe o prazo de noventa dias para apresentar qualquer reclamação ou solicitar a revigoração do aforamento.(Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
Parágrafo único. Em caso de apresentação de reclamação, o prazo para o pedido de revigoração será contado da data da notificação ao foreiro da decisão final proferida.
Art. 119. Reconhecido o direito do requerente e pagos os foros em atraso, o chefe do órgão local da Secretaria do Patrimônio da União concederá a revigoração do aforamento. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
Parágrafo único. A Secretaria do Patrimônio da União disciplinará os procedimentos operacionais destinados à revigoração de que trata o caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
Art. 120. A revigoração do aforamento poderá ser negada se a União necessitar do terreno para serviço público, ou, quanto às terras de que trata o art. 65, quando não estiverem as mesmas sendo utilizadas apropriadamente, obrigando-se, nesses casos, à indenização das benfeitorias porventura existentes.
Art. 121. Decorrido o prazo de que trata o art. 118, sem que haja sido solicitada a revigoração do aforamento, o Chefe do órgão local do S.P.U. providenciará no sentido de ser cancelado o aforamento no Registro de Imóveis e procederá na forma do disposto no art. 110.
Parágrafo único. Nos casos de cancelamento do registro de aforamento, considera-se a certidão da Secretaria do Patrimônio da União de cancelamento de aforamento documento hábil para o cancelamento de registro nos termos do inciso III do caput do art. 250 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) (grifos nosso).
10. Diante da leitura dos dispositivos legais e das cláusulas contratuais supra, possível é perceber que a simples averbação do cancelamento ou da extinção do regime enfitêutico pelo Registro de Imóvel já é suficiente para consolidar o domínio pleno do imóvel pela União. No caso dos autos, não seria necessário (como fez entender a consulta formulada) consignar que a propriedade do Imóvel voltaria para a União, por questão de redundância, já que em todos os registros cartorários já estavam transcritos tratar-se de imóvel acrescido de marinha - propriedade determinada pela Constituição Federal. Ademais, a própria certidão daquele Ofício já afirmara que o direito real exercido se dava por meio de cessão de uso sob o regime de aforamento, relação contratual essa amplamente disciplinada por Lei, a afastar a alegação de desconhecimento por qualquer terceiro.
Assevere-se que a União não está obrigada a manter o regime do aforamento para um bem seu, podendo inclusive retomá-lo nos casos de declaração do interesse público, declaração essa que parece não prescindir de registro na matrícula do imóvel.
Quanto à existência de gravames registrados nas matrículas do imóvel, sabe-se que a jurisprudência dos Tribunais e pareceres da AGU os aceitam quando em relação ao domínio útil, não sendo eles oponíveis à União Federal, desde que observados os recolhimentos do laudêmio e foros. Isto é, enquanto houver a intenção da União Federal em manter o regime de aforamento e esse se mantiver com seus requisitos hígidos, o domínio útil disputado na esfera da relação privada poderá sofrer hipoteca e penhora.
Nesse sentido, oportuna a citação do enunciado Consultoria Jurídica do então MPOG:
Enunciado nº 4: É juridicamente possível a hipoteca e a penhora de domínio útil titularizado por particular relativo a imóvel da União, mas tais gravames devem ser imediatamente cancelados se o bem for declarado de interesse do serviço público ou se o AFORAMENTO caducar.
Precedente:
- PARECER Nº 0056 - 5.1.3/2012/DPC/CONJUR-MP/CGU/AGU
Isso porque, como explica o Parecer n. 0334 - 5.12/2014/DPC/CONJUR-MP/CGU/AGU:
"29. Ora, como os terrenos de marinha e acrescidos são bens inalienáveis por força de interpretação conferida ao art. 49, parágrafo 3º, do Ato das Disposições Constitucionais transitórias (ADCT), concluímos que as penhoras só poderiam recair sobre o domínio útil. Quando diligenciado o cancelamento do aforamento pela SPU, deixa de existir a propriedade do domínio útil pelos particulares, jogando as penhoras de forma imediata num vazio jurídico. Independentemente, apenas para resguardar os direitos da União, sugerimos que, no momento em que a SPU providenciar o cancelamento da cessão sob regime de aforamento junto ao cartório competente, requeira em paralelo a baixa das penhoras".
No caso dos autos, além de o foreiro ter deixado o aforamento caducar, há notícias nos autos de que o mesmo dera destinação diversa ao bem imóvel, já que a condição gravada no respectivo instrumento estava vinculada a instalações para industrialização do pescado, motivos esses que por si só e, independentemente de declaração no serviço público, extinguem o contrato de aforamento concedido e por consequência, óbvio, extinguirá qualquer gravame registrado em favor de terceiro. É que não mais existindo o domínio útil, não mais existirá qualquer relação ou direito decorrente dele.
Nesse particular, ainda deve ser considerado que o pacto firmado se dera por Contrato de Cessão de Uso sob o regime de aforamento (e não o aforamento puro e simples), com finalidade específica. Ora, sabe-se que, em princípio, a cessão de uso é um ato intuito personae, além de sua finalidade vinculada a que sempre lhe é imposta, fatores que impõem a obrigatoriedade na análise do respectivo instrumento acerca da plausibilidade de livre transferência ou se, havendo descumprimento da finalidade a qual o imóvel está afetado, ocorrerá sua reversão à União.
Nesse caminho, as respostas já se encontram tanto no Decreto autorizador da cessão, quanto nas cláusulas supra já transcritas: elas foram categóricas em expressar a condição sine qua non para a manutenção do contrato, de modo que, no momento em que a área fosse empregada para outra finalidade, a cessão tornar-se-ia nula, sem direito da cessionária a qualquer indenização, inclusive por benfeitorias realizadas. Por outro lado, não encontramos no referido instrumento, cláusula em que fosse permitido a transferência do domínio útil, de forma que, com o cancelamento do aforamento ou com a nulidade do contrato de cessão em voga, não há mais substrato jurídico que sustentava a cessão sob o regime de aforamento.
CONCLUSÃO
Por tudo exposto, conclui-se que com a extinção do aforamento, há o desaparecimento do domínio útil, atingindo, por consequência, na origem, quaisquer direitos de terceiro dele decorrentes. Os gravames incidentes sobre o domínio útil não são oponíveis à União Federal, motivo pelo qual devem ser imediatamente cancelados se o bem for declarado de interesse do serviço público ou se o AFORAMENTO caducar.
Em decorrência, deve a SPU consulente, solicitar ao Oficial do registro de imóveis respectivo, para que proceda à averbação dos cancelamentos de tais gravames, face à consolidação do domínio pleno pela União Federal.
É o parecer, de caráter opinativo, que prescinde de aprovação por força do art. 21 da Portaria E-CJU/Patrimônio/CGU/AGU n° 1/2020 – Regimento Interno da e-CJU/Patrimônio, publicada no Suplemento B do BSE nº 30, de 30 de julho de 2020.
Devolvam-se ao órgão consulente, com as considerações de estilo.
Brasília, 22 de novembro de 2021.
PATRÍCIA KARLLA BARBOSA DE MELLO
ADVOGADO DA UNIÃO
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154166966202141 e da chave de acesso 1d6e3bb6