ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00894/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 04902.000647/2009-75
INTERESSADOS: SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - SPU/RS
ASSUNTO: REVERSÃO DOAÇÃO
I Consulta. Reversão de Doação. Contrato de Doação para fins de Regularização Fundiária Urbana de Interesse Social. Lei nº 9.636/98. Lei nº 13.465/2017.
II Possibilidade de aplicação dos arts. 51 e 52 da Instrução Normativa nº 22/2017, quanto a parcela do imóvel doado. Município de Ivotí. Superintendência do Patrimônio da União no Estado do Rio Grande do Sul. SPU/RS.
III Possibilidade condicionada.
A Superintendência do Patrimônio da União no Estado do Rio Grande do Sul, por força do disposto no parágrafo único do art. 38 da Lei n. 8.666, de 21 de junho de 1993 e com fundamento no art. 1º da Portaria Conjunta nº 1, de 29 de janeiro de 2019 (DOU de 30.01.2019, Seção 1, p. 16) submete a esta E-CJU Patrimônio à análise de possibilidade de aplicação dos arts. 51 e 52 da Instrução Normativa SPU nº 22, de 22 de fevereiro de 2017, no caso de reversão parcial de doação.
O expediente é composto dos procedimentos em cujos autos é instrumentalizada a contratação, dos quais destacamos os seguintes documentos eletrônicos, conforme lista de acesso externo do sistema SEI: Portaria de declaração de interesse público (511316); matrículas (511318); consultas SPIUnet (511319 e 5111321); ofício SEI nº 78637/2019/ME (5217369); ofício SEI nº 75195/2020/ME ( 7149673); parecer técnico elaborado pelo Depto. Planejamento Urbano do Município (8926602); certidão de regularização fundiária (8926638); despacho do Núcleo de Regularização Fundiária e Habitação (8999532); matrículas (911988 e 9112007); parecer técnico (9689725); despacho do Núcleo de Regularização Fundiária e Habitação (9941025); ofício SEI nº 210654/2020/ME (10131433); matrículas (10434177); ofício SEI nº 313897/2020/ME (12402059); ofício do Gabinete do Prefeito de Ivotí 363/2021 (19910381); memorial descritivo - drenagem pluvial (19910494); relatório técnico (19910534); ART (19910953); laudo de cobertura vegetal (19911026); despacho do Núcleo de Regularização Fundiária e Habitação (19944025); matrículas (20350891, 20350951 e 20351017); ofício SEI nº 303225/2021/ME (20758348); contrato de doação (20307698); despacho do Núcleo de Regularização Fundiária e Habitação (20308044); e por fim, matrículas atualizadas em 17/11/21, atestando a regularização fundiária (20759064).
Este, em síntese, o relatório.
Trata-se de consulta a cerca da possibilidade de aplicação dos arts. 51 e 52 da Instrução Normativa SPU nº 22, de 22 de fevereiro de 2017, em caso de reversão de doação relativa a apenas uma parcela do imóvel doado ao Município de Ivoti. O motivo seria o descumprimento de encargo constante no Contrato de Doação, firmado entre a União e o Município de Ivoti, em 31 de outubro de 2011.
O imóvel doado é constituído por três áreas de terra contíguas, classificadas como nacional interior, com 44.669,52m², 14.600,49m² e 21.469,00m², localizadas na BR-116, lote 30 do setor 298 do Plano Diretor, no Município de Ivoti. Atualmente se encontram descritos nas matrículas nº 2.386, 2387 e 2388, do Registro de Imóveis de Ivotí, atestando a regularização fundiária (20759064).
O Despacho do Núcleo de Regularização Fundiária e Habitação (20308044) bem resume a questão e traz o questionamento a esta E-CJU:
1. Em continuidade ao despacho 19944025.
2. Trata acerca do Contrato de Doação, com encargo, assinado entre a União e o Município de Ivoti, em 31/10/2011, referente ao imóvel constituído por três áreas de terra contíguas, classificadas como nacional interior, com 44.669,52m², 14.600,49m² e 21.469,00m², localizadas na BR-116, lote 30 do setor 298 do Plano Diretor, no Município de Ivoti.
I - Área de 14.600,49m², RIP nº 8717 00007.500-3, Matrícula nº 36.912 do RI de Estância Velha;
II - Área de 21.469,00m², RIP nº 8717 00005.500-2, Matrícula nº 36.913 do RI de Estância Velha.; e
III - Área de 44.669,52m², RIP nº 8717 00002.500-6, Matrícula nº 34.160 do RI de Estância Velha.
3. Para conferência do cumprimento dos encargos, segue o histórico das matrículas.
a) matrícula 2.386 do RI de Ivoti (9111988): originada da Matrícula nº 34.160 do RI de Estância Velha e encerrada em virtude da fusão com a matrícula 2.387 e do projeto de Regularização fundiária originou a matrícula 8.838.
b) matrícula 2.388 do RI de Ivoti (9112007): originada da Matrícula nº 36.913 do RI de Estância Velha, contém averbado o contrato de doação.
c) matrícula 2.387 do RI de Ivoti (10434177): originada da Matrícula nº 36.912 do RI de Estância Velha, contém averbado o contrato de doação. Parte da matrícula (área de 13.221,09 m2) foi objeto de regularização fundiária dando origem à matrícula 8.811. A área remanescente de 1.379,40 m2 foi objeto de fusão com o imóvel matriculado na matrícula 2.386 do RI de Ivoti, resultando na matrícula 8.838. e ficando encerrada
4. Tendo em vista que a matrícula 2.387 do RI de Ivoti (10434177) se originou da Matrícula nº 36.912 do RI de Estância Velha (um dos objetos do contrato de doação), é devida a averbação do contrato de doação. Em prosseguimento, parte desta matrícula (área de 13.221,09 m2) foi objeto de regularização fundiária dando origem à matrícula 8.811 (20195148), que, de forma correta, também contém a averbação do contrato de doação.
5. A área remanescente de 1.379,40 m2 foi objeto de fusão com o imóvel matriculado na matrícula 2.386 do RI de Ivoti, resultando na matrícula 8.838 e ficando encerrada. A matrícula 2.386 do RI de Ivoti (9111988), originada da Matrícula nº 34.160 do RI de Estância Velha (um dos objetos do contrato de doação) foi encerrada em virtude da fusão com a matrícula 2.387 e do projeto de Regularização fundiária originou a matrícula 8.838 (20195213).
6. Contudo, observa-se que nada consta de averbação na matrícula 8.838 do RI de Ivoti referente ao contrato de doação e seus encargos. No sentido de regularizar essa situação, o OFÍCIO SEI Nº 303225/2021/ME (20306359) foi encaminhado ao RI de Ivoti solicitando a averbação do Contrato de Doação e seus encargos, em conformidade com o princípio de continuidade conforme a Consolidação Normativa Notarial e Registral da Corregedoria-Geral Da Justiça, instituída pelo Provimento nº 32/06-CGI, Art. 315, VI. No referido ofício também foram solicitadas as cópias das seguintes certidões das matrículas nºs 8.812 à 8.834 e 8.835 à 8.837, citadas no R1 da Matrícula 8,811 do RI de Ivoti, referentes à Regularização fundiária, no sentido de conferir a transferência gratuita do domínio pleno, um dos encargos contratuais em questão.
7. O contrato em tela foi autorizado pela Portaria nº 333 de 01/09/2011, publicada no DOU nº 170 de 02/09/2011 (seção 1, página 115) destinando o imóvel para regularização fundiária em benefício de 22 famílias de baixa renda, implantação de incumbadoras industriais destinadas a indústrias de pequeno e médio porte e não poluentes e criação de área de lazer e preservação ambiental.
8. O Parecer técnico (8926602), emitido pela Prefeitura, informa a conclusão da Regularização fundiária, gerando através da Certidão de Regularização fundiária (8926638), e que aquela municipalidade não apresenta mais interesse na implantação de incubadoras destinados a indústrias de médio na área em questão, as matrículas 2.386 e 2.388 permanecem em nome do Município e estão sendo utilizadas como área pública de lazer e recreação com equipamentos como churrasqueiras e playground para uso da comunidade.
9. Em prosseguimento, a prefeitura emitiu o Ofício nº 217/2020 (9689680) informando que, após laudo da cobertura vegetal, verificou-se que a mesma não impede a utilização da área para fins previstos no Contrato de Doação, solicitando, como tempo hábil, para a elaboração de projeto de incubadora industrial destinado a indústrias de médio porte e não poluentes, o prazo de 180 dias.
10. O referido parecer enviado pela prefeitura, em 9689725, informa, entre outros aspectos, que "sob ponto de vista ambiental, a área é na sua totalidade bastante propícia para implantação de empreendimentos imobiliários", "embora não haja mata nativa no estágio avançado de regeneração natural, praticamente toda ela encontra-se no estágio médio. Isso implica em custos altos com reposição florestal e preservação de área para completa regeneração, de acordo com a Lei Federal 11.428 de 2006". Salientando que "não foram localizadas áreas de preservação permanente", cursos d’água ou nascentes, embora seja "necessário maior tempo de estudo percorrendo minuciosamente toda área" e sobre a existência de "exemplares de espécies protegidas", que não podem "ser suprimidas, devendo ser transplantadas". O documento conclui que "a vocação da área é a urbanização visto existirem loteamentos tanto na sua vizinhança ao sul como ao norte, e ao leste estar limitada pela Rodovia BR116, favorecendo a logística no caso de parcelamento de solo para fins industriais."
11. O prazo de 5 anos, contados a partir da assinatura do referido contrato, prorrogável por iguais e sucessivos períodos, estipulado para que o donatário conclua a implantação de incubadoras destinados a indústrias de médio porte e não poluentes e criação de área de lazer e preservação ambiental expirou em 31/10/2016. Sendo o encargo permanente e resolutivo, reverte-se automaticamente o imóvel à propriedade da União, independentemente de qualquer indenização por benfeitorias realizadas, se não for cumprida, dentro do prazo, a finalidade da doação, se cessarem as razões que a justificaram, se ao imóvel, no todo ou em parte, vier a ser dada aplicação diversa da prevista, ou se ocorrer inadimplemento de quaisquer das cláusulas contratuais.
12. Para prosseguimento de um novo processo de destinação, foi solicitado ao poder público municipal esclarecimentos sobre o não cumprimento dos encargos contratuais (referente à implantação de incubadoras destinados a indústrias de médio porte e não poluentes), anteprojeto de uso, contendo justificativa, objetivo, número de pessoas que serão beneficiadas e origem dos recursos para manutenção do uso, cronograma para execução e conclusão do projeto de uso da área doada remanescente e laudo de vistoria com fotos.
13. Em atendimento à demanda, o Of. Gab 363/2021 (19910381) informou que realizou a regularização fundiária do chamado “Loteamento DNIT”, onde residem famílias de funcionários e ex-funcionários do órgão, onde todo os ocupantes do local receberam os devidos títulos de propriedade e o Município está realizando obras de infraestrutura, conforme projetos anexos, a fim de garantir condições de vida dignas aos moradores, tanto no aspecto urbanístico quanto no saneamento básico. Em relação à não instalação de incubadoras industriais, encargo assumido pela Municipalidade quando da doação do imóvel, foi verificado, conforme laudo técnico anexo, que a área abriga densa vegetação nativa, bem como constitui importante refúgio da fauna. A proposta do Município é a área de recreação, composta de um playground, um campo de futebol e uma sede social com churrasqueiras, será preservada e mantida operacional, para uso da comunidade local, beneficiando um quantitativo estimado em cerca de 500 pessoas. Consta neste Of. Gab 363/2021 (19910381) os seguintes anexos:
Memorial Descritivo (19910494)
Relatório Técnico (19910534)
Anotação de Responsabilidade Técnica - ART 2021/20462 (19910914) e Comprovante ART (19910953)
Laudo de Cobertura Vegetal (19911026)
Projetos Drenagem (19911147), Pavimentação (19911191), Sinalização (19911289) e Tabela Dimensionamento Pluvial (19911384).
14. Percebe-se, portanto, que o contrato de doação deve ser rescindido nos termos da IN 22 de 2017, ao menos em parte, haja vista que não houve conclusão integral dos encargos acordados. Fazendo-se necessária a reversão parcial do contrato de doação, abrangendo somente a área remanescente, que não fora utilizada para implantação de incubadoras destinados a indústrias de médio porte e não poluentes e criação de área de lazer e preservação ambiental e que não fora incluída no Regularização fundiária.
15. Para fins de instrução processual, questiona-se à Consultoria Jurídica da União sobre a possibilidade de aplicação dos Arts. 51 e 52 da INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 22, DE 22 DE FEVEREIRO DE 2017, ainda que este caso trate apenas de uma parcela do imóvel doado. A portaria de reversão de imóvel à União, proposta por esta Superintendência, seguiria o modelo constante no ANEXO XXXIV da referida IN nº 22/2017, de modo que a identificação do imóvel (endereço, RIP e área) seriam ajustados somente à área remanescente não utilizada conforme os encargos contratuais. Todas as demais etapas do processo de reversão de imóvel, em conformidade com o art. 31, §2º, da Lei nº 9.636, de 1998, se dará nos termos da IN nº 22/2017.
16. Questiona-se esta situação à CJU dada a desnecessidade de aprovação da AGU para reversão de imóvel doado pela união por inadimplemento do encargo, conforme Orientações Normativas eCJU/Patrimônio nº 03/2020 e nº 04/2020, encaminhadas pelo MEMORANDO-CIRCULAR n. 00003/2020/COORD/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU.
17. Publicando a portaria de reversão de imóvel, conforme ANEXO XXXIV da IN nº 22/2017, esta Superintendência manterá as matrículas que foram encerradas por fusão ou abertura de novas matrículas, retornando em propriedade da União somente as matrículas nº 2.388 e 8.811.
18. Posterior ao processo de reversão da área não utilizada conforme os encargos permanentes e resolutivos, esta Superintendência irá instruir um novo processo de destinação, nos termos da Portaria SEDDM/ME nº 7.397/2021, para análise da destinação da área solicitada pelo Município para recreação, composta de um playground, um campo de futebol e uma sede social com churrasqueiras, sendo preservada e mantida operacional, para uso da comunidade local, beneficiando um quantitativo estimado em cerca de 500 pessoas.
Questiona-se à Consultoria Jurídica da União sobre a possibilidade de aplicação dos arts. 51 e 52 da Instrução Normativa nº 22, de 22 de fevereiro de 2017, ainda que este caso trate apenas de uma parcela do imóvel doado. Ou seja, se pergunta a cerca da possibilidade de proceder a elaboração de documentos visando a reversão parcial do doação efetuada.
Não há mais interesse em construir incubadoras industriais, que seriam locais destinados a oferecer suporte técnico, gerencial e formação complementar ao empreendedor e facilitar o processo de inovação e acesso a novas tecnologias nos pequenos negócios. Geralmente ofertam ainda espaço físico especialmente construído ou adaptado para alojar temporariamente os empreendedores.
O Município pretende utilizar o local para recreação, composta de um playground, um da campo de futebol e uma sede social com churrasqueiras, sendo preservada e mantida operacional, para uso da comunidade local, beneficiando um quantitativo estimado em cerca de 500 pessoas.
Em resposta, podemos afirmar a inexistência de impedimento legal para revogar a doação parcialmente. Contudo, deve ser providenciada a adequação dos registros imobiliários de forma a constar a área a ser devolvida individualizada em uma matrícula a parte. Ou seja, caso não esteja, deve ser providenciado novo desdobramento de áreas, nova individuação, de modo que a área a ser revertida a União se encontre descrita, em sua integralidade, nesta nova matrícula.
Da questão ambiental
Não obstante, importa lembrar que a Instrução Normativa nº 22, de 22 de fevereiro de 2017 não se aplica a incorporação de imóveis atribuídos à União pelos incisos II a XI do art. 20 da Constituição Federal, conforme § ún. do art. 1º da Instrução.
Art. 1º A aquisição, a incorporação e a regularização patrimonial de bens imóveis em nome da União obedecerão aos procedimentos técnicos e administrativos estabelecidos nesta Instrução Normativa - IN, em consonância com a legislação vigente e os princípios aplicáveis à Administração Pública.
Parágrafo único. Não são alcançadas por esta IN as atividades de incorporação de imóveis atribuídos à União pelos incisos II a XI do art. 20 da Constituição Federal.
(...)
O artigo 20, inc. II, da Constituição Federal arrola como bens da União as terras devolutas indispensáveis a preservação ambiental, definidas em lei. No caso, existe informação de que a área não utilizada para a instalação de incubadoras industriais abriga densa vegetação nativa, bem como constitui importante refúgio da fauna.
Art. 20. São bens da União:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;
II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei;
(...)
As demais terras devolutas pertencem aos Estados de acordo com a Constituição Federal:
Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados:
(...)
IV - as terras devolutas não compreendidas entre as da União.
A Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, conhecida como Código Florestal, trata da preservação das florestas e demais formas de vegetação nativa, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.
No artigo segundo estabelece que as florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação nativa, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.
Logo, deve se verificar se a área em comento não restou reconhecida legalmente de utilidade pública. Caso isso tenha ocorrido estamos diante de um bem da União considerado terra devoluta indispensável à preservação ambiental. E nesse caso não se aplicaria a Instrução Normativa nº 22, de 22 de fevereiro de 2017 quanto a incorporação de imóveis atribuídos à União. Além disso, o imóvel não poderia ser utilizado para fins de construção de incubadoras destinados a indústrias de médio porte e não poluentes, pois implicaria em destruição da cobertura vegetal.
Art. 2º As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação nativa, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.
§ 1º Na utilização e exploração da vegetação, as ações ou omissões contrárias às disposições desta Lei são consideradas uso irregular da propriedade, aplicando-se o procedimento sumário previsto no inciso II do art. 275 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, sem prejuízo da responsabilidade civil, nos termos do § 1º do art. 14 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, e das sanções administrativas, civis e penais.
§ 2º As obrigações previstas nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural.
Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por:
(...)
IX - interesse social: (Vide ADIN Nº 4.903)
a) as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, tais como prevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies nativas;
b) a exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena propriedade ou posse rural familiar ou por povos e comunidades tradicionais, desde que não descaracterize a cobertura vegetal existente e não prejudique a função ambiental da área;
c) a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais consolidadas, observadas as condições estabelecidas nesta Lei;
d) a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados predominantemente por população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas, observadas as condições estabelecidas na Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009;
A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.903, julgada parcialmente procedente em 28 de fevereiro de 2018, conferiu interpretação conforme a Constituição ao Art. 3, caput, incs. VIII e IX, de modo a se condicionar a intervenção excepcional em APP, por interesse social ou utilidade pública, à inexistência de alternativa técnica e/ou locacional à atividade proposta.
Vejamos trecho do inteiro teor do Acórdão:
22. Apreciação pormenorizada das impugnações aos dispositivos do novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012):
(a) Art. 3º, inciso VIII, alínea ‘b’, e inciso IX (Alargamento das hipóteses que configuram interesse social e utilidade pública): As hipóteses de intervenção em áreas de preservação permanente por utilidade pública e interesse social devem ser legítimas e razoáveis para compatibilizar a proteção ambiental com o atendimento a outros valores constitucionais, a saber: prestação de serviços públicos (art. 6º e 175 da CRFB); políticas agrícola (art. 187 da CRFB) e de desenvolvimento urbano (art. 182 da CRFB); proteção de pequenos produtores rurais, famílias de baixa renda e comunidades tradicionais; o incentivo ao esporte (art. 217 da CRFB), à cultura (art. 215 da CRFB) e à pesquisa científica (art. 218 da CRFB); e o saneamento básico (artigos 21, XX, e 23, IX, da CRFB). O regime de proteção das áreas de preservação permanente (APPs) apenas se justifica se as intervenções forem excepcionais, na hipótese de inexistência de alternativa técnica e/ou locacional. No entanto, o art. 3º, inciso IX, alínea g, limitou-se a mencionar a necessidade de comprovação de alternativa técnica e/ou locacional em caráter residual, sem exigir essa circunstância como regra geral para todas as hipóteses. Essa omissão acaba por autorizar interpretações equivocadas segundo as quais a intervenção em áreas de preservação permanente é regra, e não exceção. Ademais, não há justificativa razoável para se permitir intervenção em APPs para fins de gestão de resíduos e de realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais, sob pena de subversão da prioridade constitucional concedida ao meio ambiente em relação aos demais bens jurídicos envolvidos nos dispositivos respectivos;
CONCLUSÃO : (i) interpretação conforme à Constituição aos incisos VIII e IX do artigo 3º da Lei n. 12.651/2012, de modo a se condicionar a intervenção excepcional em APP, por interesse social ou utilidade pública, à inexistência de alternativa técnica e/ou locacional à atividade proposta,e (ii) declaração de inconstitucionalidade das expressões “gestão de resíduos” e “instalações necessárias à realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais”, do artigo 3º, VIII, b, da Lei n.12.651/2012;
O Código Florestal, também prevê no seu artigo 6º o alargamento da classificação como área de preservação permanente no caso de declaração de interesse social e arrola as hipóteses.
Art. 6º Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando declaradas de interesse social por ato do Chefe do Poder Executivo, as áreas cobertas com florestas ou outras formas de vegetação destinadas a uma ou mais das seguintes finalidades:
I - conter a erosão do solo e mitigar riscos de enchentes e deslizamentos de terra e de rocha;
II - proteger as restingas ou veredas;
III - proteger várzeas;
IV - abrigar exemplares da fauna ou da flora ameaçados de extinção;
V - proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico, cultural ou histórico;
VI - formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;
VII - assegurar condições de bem-estar público;
VIII - auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades militares
.IX - proteger áreas úmidas, especialmente as de importância internacional. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
O art. 7º da Lei nº 12.651/2012 trata das consequências legais resultantes da supressão não autorizada da vegetação em área de preservação permanente. No caso, se afirma existir supressão da vegetação, o que somente poderia ocorrer nas nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas na Lei, se a área for considerada de preservação permanente.
Art. 7º A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado.
§ 1º Tendo ocorrido supressão de vegetação situada em Área de Preservação Permanente, o proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a recomposição da vegetação, ressalvados os usos autorizados previstos nesta Lei.
§ 2º A obrigação prevista no § 1º tem natureza real e é transmitida ao sucessor no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural.
§ 3º No caso de supressão não autorizada de vegetação realizada após 22 de julho de 2008, é vedada a concessão de novas autorizações de supressão de vegetação enquanto não cumpridas as obrigações previstas no § 1º . (Vide ADIN Nº 4.937) (Vide ADC Nº 42) (Vide ADIN Nº 4.902)
Art. 8º A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta Lei.
§ 1º A supressão de vegetação nativa protetora de nascentes, dunas e restingas somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública.
§ 2º A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente de que tratam os incisos VI e VII do caput do art. 4º poderá ser autorizada, excepcionalmente, em locais onde a função ecológica do manguezal esteja comprometida, para execução de obras habitacionais e de urbanização, inseridas em projetos de regularização fundiária de interesse social, em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda. (Vide ADC Nº 42) (Vide ADIN Nº 4.903)
§ 3º É dispensada a autorização do órgão ambiental competente para a execução, em caráter de urgência, de atividades de segurança nacional e obras de interesse da defesa civil destinadas à prevenção e mitigação de acidentes em áreas urbanas.
§ 4º Não haverá, em qualquer hipótese, direito à regularização de futuras intervenções ou supressões de vegetação nativa, além das previstas nesta Lei.
Art. 9º É permitido o acesso de pessoas e animais às Áreas de Preservação Permanente para obtenção de água e para realização de atividades de baixo impacto ambiental.
Lembre-se que todas essas considerações apenas se aplicam à hipótese de se tratar de bem declarado de interesse social. Não sendo o caso, deve se desconsiderar.
Porém, a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981) estabelece que a necessidade de licenciamento ambiental para a construção instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental. A construção de incubadoras destinados a indústrias de médio porte e não poluentes possivelmente careceria de licença ambiental.
Art. 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental. (Redação dada pela Lei Complementar nº 140, de 2011)
§ 1o Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão serão publicados no jornal oficial, bem como em periódico regional ou local de grande circulação, ou em meio eletrônico de comunicação mantido pelo órgão ambiental competente. (Redação dada pela Lei Complementar nº 140, de 2011)
Já a Lei de Fauna (Lei nº 5.197, de 03 de janeiro de 1967) estabelece a proibição de destruição de animais silvestres, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais. Relata-se a existência de animais silvestres no local, o que pode restringir a possibilidade de utilização do bem.
Art. 1º. Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais são propriedades do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha.
(...)
A partir de todo o exposto acima, se faz necessário verificar se se trata de terra indispensável a preservação ambiental ou se a utilização poderia violar o disposto no art. 1º, da Lei da Fauna. Nesses casos, a finalidade prevista no encargo poderia não ser possível cumprir.
Da possibilidade de aditar o contrato
De qualquer forma, a intenção é reverter a doação por desvio de finalidade e após conceder novamente o direito de propriedade ao Município, mediante doação prevendo como encargo o cumprimento da finalidade de para recreação, composta de um playground, um campo de futebol e uma sede social com churrasqueiras, sendo preservada e mantida operacional, para uso da comunidade local, beneficiando um quantitativo estimado em cerca de 500 pessoas.
Na verdade se pretende substituir um interesse público por outro. Inexiste imoralidade ou má-fé na alteração da finalidade. Poderia se defender a tese de ser permitido apenas alterar o contrato de doação mediante a alteração da finalidade. Os argumentos seriam a busca da eficiência, celeridade e inexistência de prejuízo a terceiros.
Contudo, pode se interpretar que o entendimento desta e-CJU/Patrimônio, já consolidado na Orientação Normativa e-CJU/Patrimônio nº 03/2020 é no sentido de ser vedada a alteração contratual visando modificar a o interesse público a ser buscado pelo cumprimento do encargo.
"Orientação Normativa e-CJU/Patrimônio nº 03/2020- Em se tratando de reversão de imóvel doado pela União, em decorrência de não cumprimento de encargo previsto ao ente donatário, aplica-se o disposto no § 2º, do art. 31, da Lei 9636/98; operando-se de pleno direito, sem interferência do Poder Judiciário e independentemente de qualquer indenização por benfeitorias realizadas;
- A forma adotada será de portaria autorizativa da reversão, do Superintendente de Patrimônio local, a ser encaminhada ao Oficial de Registro de Imóveis competente, nos termos dos arts. 51 e 52, IN nº 22/2017, da Secretaria de Patrimônio da União. É possível, entretanto, a prorrogação do prazo de adimplemento caso seja de interesse do donatário;
- Somente há necessidade de submissão do processo ao órgão de consultoria da AGU se houver dúvida jurídica, trata-se de caso de submissão não obrigatória.
Porém o entendimento fixado na Orientação Normativa e-CJU/Patrimônio nº 03/2020 não engloba a conclusão de que o contrato não pode ser aditado visando a alteração do interesse público. Contudo, é necessário providenciar nova Portaria de autorização.
Importa trazer a colação o Parecer n. 385/2021/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, relativo ao processo nº 04902.000844/2013-71, criado pela Superintendência do Patrimônio da União no Estado do Rio Grande do Sul - SPU/RS:
EMENTA:
I) Direito Administrativo e outras Matérias de Direito Público. Patrimônio da União;
II) Direito Civil. Direito das obrigações. Teoria Geral dos Contratos.Contrato de doação com encargo entreUnião e Município de Caxias do Sul. Encargo de implantação pelo donatário de serviços de atendimento desaúde;
III) Inadimplemento do encargo. Cláusula resolutiva expressa Consequências jurídicas;IV) Resposta aos questionamentos trazidos pela SPU/RS. Possibilidade de manutenção da doação, de cessão deuso a terceiros, de devolução de prazo para cumprimento de encargo e de alteração da destinação do imóvel;V) Divergência de entendimento da presente manifestação em relação ao PARECER n.00259/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU. Submissão à Coordenação da E-CJU/Patrimônio.
(...)
Sobre o tema prescreve Orientação Normativa da E-CJU/Patrimônio e o Enunciado Nº 1/2017/CRU 2ªREGIÃO/CGU/AGU:
(...)
"Orientação Normativa e-CJU/Patrimônio nº 03/2020- Em se tratando de reversão de imóvel doado pela União, em decorrência de não cumprimento de encargo previsto ao ente donatário, aplica-se o disposto no § 2º, do art. 31, da Lei 9636/98; operando-se de pleno direito, sem interferência do Poder Judiciário e independentemente de qualquer indenização por benfeitorias realizadas;
- A forma adotada será de portaria autorizativa da reversão, do Superintendente de Patrimônio local, a ser encaminhada ao Oficial de Registro de Imóveis competente, nos termos dos arts. 51 e 52, IN nº 22/2017, da Secretaria de Patrimônio da União. É possível, entretanto, a prorrogação do prazo de adimplemento caso seja de interesse do donatário;
- Somente há necessidade de submissão do processo ao órgão de consultoria da AGU se houver dúvida jurídica, trata-se de caso de submissão não obrigatória.
"ENUNCIADO Nº 1/2017/CRU 2ª REGIÃO/CGU/AGU
I - A previsão de cláusula resolutiva expressa em contratos de cessão de uso se dá em favor da Administração Cedente.
II - Nessa condição, a resolução automática em caso de descumprimento por parte do Cessionário poderá ser afastada através de ato devidamente motivado da Cedente, considerando questões de interesse público e/ou conveniência e oportunidade administrativas, numa interpretação sistemático-teleológica e em cotejo com os princípios que norteiam a Administração Pública, bem como, por aplicação supletiva, do princípio da conservação dos negócios jurídicos.
III - O ato de manutenção do contrato poderá ser praticado posteriormente ao término do prazo previsto para o cumprimento da condição/encargo pelo Cessionário, desde que não expirado o prazo de vigência contratual ,porquanto inaplicável àquele a Orientação Normativa AGU nº 3/2009. Referências: PARECER n. 00001/2017/PLENARIO/CRU2/CGU/AGU. Processo: 04936.004435/2013-56"
26. Nestes termos, há que se entender o contrato de doação como uma liberalidade, entre vivos, com transferência patrimonial do doador ao donatário. Há controvérsias quanto à unilateralidade ou não da doação gravada com encargo (doação modal),bem como se tal negócio jurídico consubstancia caráter gratuito ou oneroso. A doação é contrato solene, escrito, por instrumento particular ou escritura pública. O encargo é uma obrigação patrimonial em favor de terceiros. A inexecução do encargo pode ensejar a revogação da doação, caso transcorrido o prazo estipulado.
27. Vale frisar que a extinção normal dos contratos dá-se pelo cumprimento das obrigações. A observância dos contratos, seu adimplemento e sua manutenção, como regra geral, perfazem a função social do contrato, enquanto uma das mais importantes formas jurídicas pelas quais se estabelecem relações sociais entre pessoas físicas e jurídicas.
28. Assim, a extinção por causas anormais, em tese, deveria se constituir como exceção, salvo se o desfazimento da relação jurídica contratual também obedecer a um interesse jurídico tutelado, previsto em lei, ou em contrato. Dentre as formas de extinção anormais, interessa ao caso a resolução, que consiste no rompimento da relação por descumprimento das obrigações contratuais (inexecução ou inadimplemento). A cláusula resolutiva expressa em instrumento contratual confere à parte a possibilidade de suscitar a resolução de pleno direito, sem necessidade de interpelação judicial. Saliente-se que a cláusula resolutiva não extingue imediatamente o contrato, ela tão somente abre a possibilidade de dissolução da avença, de forma unilateral e sem necessidade de recurso a instâncias jurisdicionais.
29. Frisa-se que o encargo é uma imposição ao donatário. O encargo difere da condição resolutiva, a qual se caracteriza como evento futuro e incerto alheio à vontade das partes. O descumprimento do encargo importa em mora e nas possibilidades de purgação, novação ou resolução, além de indenização por prejuízos. A condição resolutiva, por sua vez, extingue direitos.
30. A Lei 8.666/1993 trata os casos de resolução de contratos, por não cumprimento de cláusulas contratuais, como Art. 31 da Lei nº 9.636/1998 e a Cláusula Décima Primeira do Contrato.
32. Foi constatado o inadimplemento do encargo contratual da doação, que era a implantação de serviço de atendimento à saúde no prazo fixado de dois anos. Não foi efetuada a prorrogação de prazo para cumprimento do encargo. O inadimplemento abriu margem à aplicação de cláusula resolutiva expressa (Cláusula Décima Primeira), a qual retirou seu fundamento de validade da normado inciso I e § 2º do Art. 31 da Lei 9.636/1998 e do Art. 3º da Portaria MPOG nº 384, de 17 de setembro de 2015.
33. O inadimplemento do encargo não gerou o efeito de imediata de resolução do contrato e consequente reversão automática da doação. A sua previsão expressa no contrato teve o condão de possibilitar a resolução unilateral, sem a necessidade de interpelação judicial, nos termos da norma do Art. 474 do Código Civil. Mesmo assim, tratou-se de um a preferência que poderia ser substituída pela exigência do cumprimento da obrigação (norma dos artigos 401, inciso I, 475 do Código Civil). No caso específico de encargo de doação ambos os artigos 555 e 562 da Lei Civil fizeram utilização da expressão"pode ser revogada" a reforçar um direito subjetivo passível de exercício e não uma condição resolutiva alheia à vontade das partes.
34. A Orientação Normativa e-CJU/Patrimônio nº 03/2020 compreendeu que a reversão de "pleno direito" consiste naquela sem necessidade de interferência do Judiciário, mas, dependente de decisão administrativa por meio de Portaria autorizativa de reversão. Já o item II do ENUNCIADO Nº 1/2017/CRU 2ª REGIÃO/CGU/AGU considerou afastável a resolução automática.
35. Vale constar também que a possibilidade de resolução não se caracteriza como ato vinculado ao Administrador. A Lei 8.666/1993 considera que a rescisão deva ser precedida de uma decisão discricionária. A revogação da doação também se insere nesta senda. Assim, incumbe ao Administrador sopesar acerca da conveniência e oportunidade, ante riscos e benefícios da manutenção do contrato, ou sua resolução, conforme cada caso concreto.
36. Todavia, em vista da indisponibilidade de disposição do interesse público, incumbe ao Administrador apurar a eventual ocorrência de prejuízos em face da mora do Município de Caxias do Sul na implantação do encargo. A indenização por eventuais perdas e danos é consequência legal da mora e da aplicação de cláusula resolutiva. Compreende-se que a ocorrência de prejuízos à União consiste numa possibilidade remota, em vista da própria intenção presente desde pelo menos 2018 em se alterar a destinação do imóvel doado, de atendimento à saúde para assistência social.
3.2 - Divergências em relação ao PARECER n. 00259/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
(...)
Assim, respeitosamente, esta manifestação diverge do PARECER n. 00259/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, no que concerne ao descumprimento da finalidade da Portaria autorizativa, tendo em vistanão ter sido celebrado qualquer ato concreto que fosse de encontro à destinação previamente definida.44. Em relação à possibilidade de alteração da destinação, este Parecer entende não haver óbices nas normas do Art. 23 daLei 9.636/1998, por ser esta uma decisão atinente ao mérito administrativo que se amolda ao instituto da novação, previsto no inciso Ido Art. 360 do Código Civil. Todavia, entende-se a necessidade da edição de novo ato autorizativo de doação que permita, se foro caso, conforme o juízo de conveniência e oportunidade, da destinação do imóvel para fins de assistência do social. Assim, aalteração da finalidade por meio de aditamento deve ser precedida de ato autorizativo, consoante normas do caput e § 2º doArt. 23 da Lei 9.636/1998.45. No que tange ao inadimplemento contratual do encargo da doação diverge-se do entendimento adotado noParecer anterior pelas razões já expostas no item 33 a 35 deste Parecer.
IV – CONCLUSÃO
53. Isso posto, resguardados o juízo de conveniência e oportunidade do Administrador, nos limites da lei e as valoraçõesde cunho econômico–financeiro, ainda, a manutenção da conformidade documental com as questões de ordem fática, técnica, fiscal ede cálculo, ínsitas à esfera administrativa, essenciais até mesmo para a devida atuação dos órgãos de controle, transcreve-se novamenteos questionamentos jurídicos apresentado pela SPU/RS, para em sequência respondê-los:
(...)
54. Em relação ao item 7, conforme já expresso no item 44 mostra-se viável a alteração da destinação do imóvel.Todavia, entende-se necessária a edição de novo ato autorizativo de doação que permita, se for o caso, conforme o juízo deconveniência e oportunidade, a destinação do imóvel para fins de assistência do social. Assim, a alteração da finalidade pormeio de aditamento deve ser precedida de ato autorizativo, consoante normas do caput e § 2º do Art. 23 da Lei 9.636/1998.
(...)
A divergência posta no Parecer nº 385/2021/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU quanto ao entendimento exposto no Parecer n.00259/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU foi submetida a apreciação do Coordenador da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Patrimônio, que aprovou integralmente o Parecer nº 385/2021/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU. Tal decisão consta do
DESPACHO n. 00070/2021/COORD/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, anexado ao NUP: 04902.000844/2013-71.
Significa dizer que no âmbito desta E-CJU Patrimônio restou firmado o entendimento pela possibilidade de firmar termo aditivo ao contrato de doação visando à alteração do interesse público tutelado, desde que seja providenciada nova autorização firmada pela autoridade competente e desde que atendidos os demais requisitos legais. A Orientação Normativa e-CJU/Patrimônio nº 03/2020 não possui o alcance de impedir tal alteração contratual.
No mesmo sentido a decisão proferida em agravo em recurso especial nº 1621449 GO 2019/0342830-2:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.621.449 - GO (2019/0342830-2) RELATORA : MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS AGRAVADO : FRICO INDUSTRIA E COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA ADVOGADO : OTANIEL MOREIRA GALVÃO - GO021536 AGRAVADO : MUNICÍPIO DE TRINDADE ADVOGADO : FELICÍSSIMO JOSÉ DE SENA - GO002652 DECISÃO Trata-se de Agravo em Recurso Especial, interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, que inadmitiu o Recurso Especial, manejado em face de acórdão assim ementado:
"EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DOAÇÃO. BEM PÚBLICO DE USO COMUM DO POVO. DESAFETAÇÃO. ALTERAÇÃO DE DESTINAÇÃO. INTERESSE PÚBLICO JUSTIFICADO. ARRECADAÇÃO TRIBUTÁRIA E MERCADO DE TRABALHO. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI. LEIS MUNICIPAIS N. 1471/2011 E 1452/2012. PRESENÇA DOS ELEMENTOS CONFIGURADORES DA LICEIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
1 - É cediço que os bens públicos de uso comum do povo e de uso especial para que sejam alienados, há a necessidade de que saiam, por disposição especial de lei, da área especial de utilização pública que estejam inseridos, para que depois de desafetados da sua finalidade, tornem- se passíveis de alienação, que pode ocorrer através de compra e venda, doação, permuta ou dação em pagamento.
2 - Nos termos do julgado da Corte Especial em sede de Arguição Incidental de Inconstitucionalidade levantado pelo Parquet nos presentes autos 'na doação de bem público, restando demonstrado o interesse público, deve a aludida doação ser convalidada'.
3 - Ante o inequívoco interesse coletivo existente na viabilidade de maior disponibilização de empregos no mercado de trabalho e aumento na arrecadação de tributos, justifica-se a alteração da destinação do bem de uso comum do povo para a edificação de uma indústria e, por conseguinte, reveste-se de liceidade o negócio jurídico de comércio privado realizado entre a Municipalidade e a empresa privada. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA" (fls. 2.476/2.477e). O acórdão em questão foi objeto de Embargos de Declaração, os quais restaram rejeitados, nos seguintes termos: "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO DE REEXAME DA CAUSA. IMPOSSIBILIDADE. 1. De acordo com o Código de Processo Civil de 2015 a decisão é considerada omissa quando deixa de manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento ou quando incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º. 2. Os embargos de declaração, mesmo para efeito de prequestionamento, deve observar as determinações do art. 535 do Código de Processo Civil, já que esse recurso não é o meio hábil para ver reexaminada a causa.
4. Não demonstrada a existência da alegada omissão no acórdão recorrido, devem ser rejeitados os Embargos de Declaração. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS E REJEITADOS" (fls. 2.543/2.544e). Nas razões do Recurso Especial, interposto com base no art. 105, III, a, da Constituição Federal, a parte ora agravante aponta violação aos artigos 1.022, II, do CPC/2015, 17, § 4º, da Lei 8.666/93, 5º, I, do Decreto-Lei 3.365/41 e 4º, I e § 2º, 17, 22 e 28 da Lei 6.766/79. Para tanto, sustenta que (a) "houve, portanto, clara omissão quanto à tese ministerial de impossibilidade do procedimento de desafetação de área pública proveniente de loteamento, uma vez que, após a aprovação do loteamento e consequente passagem de áreas institucionais para o poder público municipal, é vedada a modificação da referida destinação, em observância aos comandos da Lei de Parcelamento do Solo Urbano"(fl. 2.577e); (b)"a Corte goiana deixou de pronunciar respeito da vedação legal de modificação da destinação conferida a áreas institucionais de loteamento, ainda que para fins de desafetação"(fl. 2.559e); (c)"não merece prosperar a argumentação do Tribunal de Goiás, no sentido de sobrepor as regras da desapropriação/doação por utilidade pública (artigo 5º, inciso I, do Decreto-Lei nº 3.365/41 e artigo 17, § 4º, da Lei nº 8.666/93)à vedação legal da desafetação de áreas institucionais provenientes de loteamento urbano (artigos 4º, inciso I e § 2º, 17, 22 e 28 da Lei n. 6.766/79), as quais estão sendo alvo de degradação ambiental" (fl. 2.565e). Por fim, requer o provimento do Recurso Especial, para "cassar o julgamento dos embargos de declaração por violação do artigo 1.022, inciso II, do Código de Processo Civil. Subsidiariamente, requer o Parquet a reforma do acórdão para que seja reconhecida a impossibilidade de desafetação de área institucional proveniente de loteamento urbano (ainda que em razão de interesse coletivo de geração de empregos e aumento na arrecadação de tributos) e, por conseguinte, a nulidade da doação em exame" (fl. 2.566e). Após as contrarrazões, foi inadmitido o Recurso Especial, ensejando a interposição do presente Agravo. A irresignação não merece prosperar. Segundo consta dos autos, "trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível e Fazendas Públicas da comarca de Trindade, DR. ÉDER JORGE, no bojo dos autos de AÇÃO CIVIL PÚBLICA proposta em desfavor de FRICÓ INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA e do MUNICÍPIO DE TRINDADE, na qual os pedidos elencados na exordial foram julgados parcialmente procedente no sentido de, tão somente, determinar à primeira requerida que promova a regularização das suas obrigações ambientais, expressas no ordenamento jurídico, sem que resulte em interrupção da atividade empresarial" (fl. 2.446e). Em relação ao art. 1.022 do CPC/2015, deve-se ressaltar que o acórdão recorrido não incorreu em qualquer vício, uma vez que o voto condutor do julgado apreciou, fundamentadamente, todas as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida pela parte recorrente. Vale ressaltar, ainda, que não se pode confundir decisão contrária ao interesse da parte com ausência de fundamentação ou negativa de prestação jurisdicional. Nesse sentido: STJ, REsp 1.666.265/MG, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 21/03/2018; STJ, REsp 1.667.456/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 18/12/2017; REsp 1.696.273/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/12/2017. No mérito, a Corte de origem asseverou estar caracterizado o interesse público na doação de imóvel, com base nos seguintes fundamentos: "In casu, deve-se analisar a pretensão do Parquet em ver declarada a nulidade da concessão de outorga da escritura pública da área sob litígio que foi objeto de doação pela Municipalidade para a empresa Fricó Indústria e Comércio de Alimentos Ltda, por meio da Lei n. 1.371/2011 e Lei n. 1.425/20124. (...) Não se trata de doação modal (com encargos) considerando que a Lei Municipal n. 1.452/2012 revogou os dispositivos referentes ao estabelecimento de condicionantes para fins de convalidação da propriedade em nome do donatário e aqueles destinados a possibilidade de reversão do imóvel para o patrimônio da municipalidade. Deve-se considerar, ainda, que, nos termos do § 4º do art. 17 da Lei de Licitações, a licitação pode ser dispensada quando a doação for justificada pelo interesse público co substanciado no exercício pela empresa privada de atividade econômica de interesse da coletividade. Neste sentido, foi o entendimento da Corte Especial no julgamento da Arguição Incidental de Inconstitucionalidade das questionadas Leis Municipais n. 1.471/2011 e 1.452/2012, de relatoria do Desembargador Nicomedes Borges, no qual ficou decidido que 'no presente caso, tem-se que o ente municipal fez a doação de uma extensa área para a empresa apelada, com a finalidade específica de priorizar a mão de obra local e aumentar a arrecadação, sendo que foi edificada no local empresa que se prestou a tal fim, ficando pois demonstrado o requisito indispensável à justificação do interesse público, razão por que deve a aludida doação ser convalidada'. Da análise dos dispositivos legais de regência, incidentes no presente caso concreto, quais sejam, a Lei de Licitações e a Lei n. 6.766/79 (Lei Federal que dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano), impõe-se observar que, num primeiro momento, pode-se arguir que a controvertida doação, sem o prévio estabelecimento licitatório, ou ainda, realizada após a aprovação do parcelamento com a desafetação de área destinada a bem de uso comum do povo, implicaria em afronta aos princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa, nem como em transgressão a norma expressa em legislação federal. Porém, como decidido pela Corte Especial, os atos excepcionais vislumbrados nos autos consistentes na desafetação de bem comum do povo para fins de doação para empresa privada e a dispensa do certame, foram devidamente justificados pelo interesse da coletividade no que pertine ao aumento de arrecadação de tributos e da geração de empregos no mercado de trabalho na Municipalidade, fatos estes que presumem a intenção do administrador público em incentivar a atividade econômica na região. Portanto, nos termos do julgado da Corte Especial, a doação efetivada preencheu os requisitos de licitude, na forma prescrita em lei, sem a constatação de fraude à lei de regência, visto que, o imóvel objeto do negócio de bem de uso comum do povo foi devidamente desafetado, fato este que resulta na validade do negócio jurídico e da consequente escritura pública de doação. Por conseguinte, com o reconhecimento da constitucionalidade das leis municipais sub examine, bem como, da escritura pública de doação da área para a empresa privada, ora apelada, mostra-se imperativo o reconhecimento da prejudicialidade das teses recursais relativas à reversão para o patrimônio público municipal e a consequente recuperação e preservação daquelas com o desiderato de restabelecer sua destinação originária" (fls. 2.467/2.470e) Nesse contexto, conclui-se que é incabível a análise do acerto da fundamentação do Tribunal de origem, o qual se baseou na interpretação da Leis Municipais 1.371/2011 e 1.425/2012, de vez que incide o teor da Súmula 280/STF ("Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário"). Ademais, a alteração do entendimento do Tribunal de origem, no sentido da legalidade da desafetação do imóvel, ensejaria, inevitavelmente, o reexame das provas carreadas nos autos, procedimento vedado, pela Súmula 7 desta Corte. Ante o exposto, com fulcro no art. 253, parágrafo único, II, b, do RISTJ, conheço do Agravo, para negar provimento ao Recurso Especial. I. Brasília (DF), 19 de março de 2020. MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES Relatora
(STJ - AREsp: 1621449 GO 2019/0342830-2, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Publicação: DJ 24/03/2020)
Assim, em resumo, é permitido apenas firmar termo aditivo ao contrato de doação. Contudo, não é vedado proceder a reversão da doação e providenciar nova contratação de doação do bem visando o atendimento no interesse público buscado, mediante o estabelecimento de encargo.
Da possibilidade de reversão
Nesse sentido, a reversão se daria com base no art. 31 da Lei Federal nº 9.636, de 15 de maio de 1998 e nos arts. 51 e 52 da Instrução Normativa SPU nº 22/2017.
Lei Federal nº 9.636, de 15 de maio de 1998
Art. 31. Mediante ato do Poder Executivo e a seu critério, poderá ser autorizada a doação de bens imóveis de domínio da União, observado o disposto no art. 23 desta Lei, a: (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
I - Estados, Distrito Federal, Municípios, fundações públicas e autarquias públicas federais, estaduais e municipais; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
(...)
§ 1o No ato autorizativo e no respectivo termo constarão a finalidade da doação e o prazo para seu cumprimento.
§ 2o O encargo de que trata o parágrafo anterior será permanente e resolutivo, revertendo automaticamente o imóvel à propriedade da União, independentemente de qualquer indenização por benfeitorias realizadas, se:
I - não for cumprida, dentro do prazo, a finalidade da doação;
II - cessarem as razões que justificaram a doação; ou
III - ao imóvel, no todo ou em parte, vier a ser dada aplicação diversa da prevista.
§ 3o Nas hipóteses de que tratam os incisos I a IV do caput deste artigo, é vedada ao beneficiário a possibilidade de alienar o imóvel recebido em doação, exceto quando a finalidade for a execução, por parte do donatário, de projeto de assentamento de famílias carentes ou de baixa renda, na forma do art. 26 desta Lei, e desde que, no caso de alienação onerosa, o produto da venda seja destinado à instalação de infra-estrutura, equipamentos básicos ou de outras melhorias necessárias ao desenvolvimento do projeto. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
(...)
Instrução Normativa SPU nº 22/2017
Da Reversão
Art. 51 São passíveis de reversão ao patrimônio da União:
I - a propriedade sobre bens imóveis objeto de contratos de doação; e
II - os direitos reais limitados concedidos a terceiros, nas hipóteses previstas em lei;
§1º A reversão prevista no inciso I do caput dar-se-á independentemente de qualquer indenização por benfeitorias realizadas, em conformidade com o disposto no art. 31, §2º, da Lei nº 9.636, de 1998.
§2º Extinguem-se os títulos que concederam os direitos reais limitados previstos no inciso II do caput:
I - do aforamento, e consequentemente do domínio útil, nos termos do art. 103, incisos I, II, IV e V do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946;
II - do direito de superfície e da concessão do direito real de uso:
a) pelo advento do respectivo item; e
b) pelo descumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo concessionário que ensejem sua resolução.
§3º A cláusula de reversão compreende elemento obrigatório do instrumento de doação, sob pena de nulidade do ato, conforme previsto no art. 17, §4º, da Lei n° 8.666, de 1993.
§4º Configurada uma das hipóteses previstas no art. 31, §2º, da Lei nº 9.636, de 1998, o imóvel doado reverterá automaticamente à propriedade da União.
§5º Caso o donatário manifeste o interesse, tempestivamente,na prorrogação do prazo para cumprimento da finalidade, a decisão caberá à SPU/UF, a depender do que dispõe o ato autorizativo e o contrato, sendo formalizada através de termo aditivo.
§6º Na hipótese da SPU/UF julgar que o prazo para cumprimento da finalidade não deve ser prorrogado, o donatário ou o concessionário do direito real deverá ser notificado dessa decisão.
§7° Na hipótese de reversão de que trata o inciso II do caput, e tratando-se de direito de superfície, recuperará a União, além da propriedade do terreno, as acessões e benfeitorias introduzidas no imóvel, independentemente de indenização, desde que as partes não tenham estipulado o contrário no respectivo contrato, nos termos do disposto no art. 24 da Lei n° 10.257, de 2001 e no art. 1.375 do Código Civil.
§8º Com objetivo de dar publicidade à reversão do direito de propriedade, o Superintendente do Patrimônio da União deverá formalizar ato específico que oficialize esta situação, conforme modelo de portaria constante do Anexo XXXIV desta IN.
§9º Para formalização da reversão de direitos reais limitados sobre o imóvel, é aplicável o modelo de portaria citado no § 8º, feitas as devidas adaptações em seu texto, salvo se já houver forma específica prevista em lei ou outro ato normativo.
Art. 52 A formalização e a efetivação da reversão dar-se-ão pelo cancelamento do registro anterior, a ser requerido ao Oficial de Registro de Imóveis competente.
§1º O requerimento a que se refere o caput, firmado pelo Superintendente do Patrimônio da União, deverá ser instruído com os seguintes elementos, sem prejuízo de outros documentos:
I - contrato original;
II - portaria do Superintendente do Patrimônio da União autorizando a reversão, se decorrente de doação;
III - ato pelo qual a União retomar o direito real limitado;
IV - comprovação da notificação do donatário ou concessionário de direito real limitado quanto às condições de resolução.
§2º Para elaboração da portaria a que se refere o inciso II do parágrafo precedente, deverá ser utilizado o modelo constante do Anexo XXXII desta IN.
§3º A instrução processual da reversão de imóvel ao patrimônio da União dar-se-á no âmbito do processo administrativo correspondente ao respectivo contrato resolvido.
Os arts 51 e 52, acima transcritos, tratam dos procedimentos administrativos visando perfectibilizar a reversão. Indicam modelos, condições, documentos necessários e estabelecem que a formalização e a efetivação da reversão dar-se-ão pelo cancelamento do registro anterior, a ser requerido ao Oficial de Registro de Imóveis competente.
Já a delegação de competência para o ato se encontra na Portaria GM/MPOG nº 54/2016.
Art. 1º - Fica subdelegada competência ao Secretário do Patrimônio da União, permitida a subdelegação, para autorizar:
I - a alienação de imóveis da União;
(...)
§ 1º - Nos atos autorizados nos incisos I a VI, deverá constar sua finalidade, bem como encargos e prazo para seu cumprimento e vigência, devendo os respectivos termos e contratos conter cláusula de reversão do bem na hipótese de inobservância dos requisitos estabelecidos.
§ 2º - O ato que autorizar a cessão provisória prevista no inciso IV deverá ser fundamentado, podendo ser revogado a qualquer momento se o interesse público o exigir, e terá validade até decisão final no procedimento administrativo que tratar da cessão de uso definitiva.
§ 3º - A cessão provisória de que trata o inciso V será formalizada quando houver urgência em razão da necessidade de proteção ou manutenção do imóvel, regularização dominial ou interesse público, devendo o respectivo instrumento conter cláusula resolutiva para o caso de necessidade ou interesse público superveniente.
Art. 2º - As autorizações aqui subdelegadas poderão, a qualquer tempo, ser realizadas pelo Ministro desta Pasta, dispensada justificativa.
Disposições gerais
Afora esses requisitos trazidos pelas leis de regência, a Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997, que estabelece normas para as eleições, traz mais um regramento. Veda a transferência voluntária de recursos da União aos estados e municípios, e dos estados aos municípios, sob pena de nulidade de pleno direito. Senão vejamos:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
(...)
VI Nos três meses que antecedem o pleito:
a) realizar transferência voluntária de recursos da União aos estados e municípios, e dos estados aos municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública;
(...)
§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)
Poderia se interpretar aplicável ao caso o § 10, do art 73, contudo se aplica o inciso VI, alínea a, acima em negrito. Nesse sentido a Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 02, de 2016:
A vedação prevista no art. 73, §10, da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, dirige-se à distribuição gratuita e discricionária diretamente a particulares, incluídas as doações com encargo e cessões, não alcançando os atos vinculados em razão de direito subjetivo do beneficiário e as transferências realizadas entre órgãos públicos do mesmo ente federativo ou as que envolvam entes federativos distintos, observando-se neste último caso o disposto no inciso VI, alínea "a", do mesmo artigo, que veda transferências nos três meses anteriores ao pleito eleitoral. Em qualquer caso, recomenda-se a não realização de solenidades, cerimônias, atos, eventos ou reuniões públicas de divulgação, ou qualquer outra forma de exaltação do ato administrativo de transferência capaz de afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais.
Dessa forma, recomenda-se que a reversão ocorra somente após o término das eleições municipais, visando a atender ao regramento da Lei 9.504/97, art. 73, inc. VI, alínea a.
ANTE AO EXPOSTO, sem prejuízo das recomendações acima, se entende pela possibilidade de aplicação dos arts. 51 e 52 da Instrução Normativa SPU nº 22, de 22 de fevereiro de 2017, no caso de reversão parcial de doação. Contudo, visando maior celeridade se recomenda apenas aditar o contrato de doação visando modificar o encargo, sendo providenciada posteriormente a averbação no Registro de Imóveis.
É o parecer que encaminhamos à origem.
Porto Alegre, 05 de dezembro de 2021.
Luciana Bugallo de Araujo
Advogada da União
Mat. SIAPE n. 1512203
OAB/RS n. 56.884
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 04902000647200975 e da chave de acesso 792e15ba