ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO


 

PARECER n. 00084/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

 

NUP: 10154.129340/2021-54

INTERESSADO: SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM ESPÍRITO SANTO - SPU/ES

ASSUNTO:  TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE DE IMÓVEL NO CADASTRO DA SPU 

 

 

EMENTA:  DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO. GESTÃO DO PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. PROCEDIMENTO DE TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE DE IMÓVEL NO CADASTRO DA SPU TENDO POR FUNDAMENTO APRESENTAÇÃO DE CARTA DE ARREMATAÇÃO.
I) Consulta acerca de processos de transferência de titularidade de imóvel da União com área de 420 m2, situado na Avenida Saturnino de Brito nº 174, bairro Enseada do Suá, em Vitória-ES, sob o RIP 5705000678913, registrado no Livro de Registro Geral nº 02, sob a matrícula nº 32.932, do Cartório de Registro Geral de Imóveis da 2ª Zona de Vitória -ES. 
II) Dúvida jurídica quanto aos efeitos da Carta de Arrematação expedida pelo Juízo da 10ª Vara Cível de Vitória -ES nos autos judiciais sob o nº 0001344-82.1999.8.08.0024.
III) Considera-se um dos instrumentos válidos para a efetivação da transferência a Carta de Arrematação, segundo o disposto no inciso IV do art. 8º da Instrução Normativa nº 1, de 9 de março de 2018, que disponibiliza orientações para os processos de cessão de direitos e de transferência de titularidade de imóveis da União, sob os regimes de aforamento ou de ocupação.
IV) Pendências, gravames ou irregularidades das transferências anteriores não se transferem porque a aquisição do domínio útil não decorreu do estabelecimento de uma relação jurídica de transmissão com os titulares antecedentes na cadeia possessória, mas sim de arrematação em hasta pública.
V) Constituindo uma forma originária de aquisição de propriedade, não decorrente da antiga e não guardando com ela relação de continuidade, segundo entendimento do STJ, na arrematação a aquisição feita pelo arrematante não guarda qualquer relação com o titular anterior do direito que se adquiriu em hasta pública.
VI) Para registro da arrematação o arrematante necessita da Certidão de Autorização de Transferência (CAT) emitida pela SPU, que poderá emitir a CAT Especial, mediante autorização da Unidade Central, caso o sistema não permita a transferência, automaticamente, pela mera apresentação da Carta de Arrematação, registrando-se o motivo e a informação sobre o documento que motivou a certidão (carta de arrematação), nos termos do disposto nos arts. 26 e 27 da Instrução Normativa nº 1, de 9 de março de 2018​.
VII) Recomendação de encaminhamento prévio à Procuradoria da União no estado do Espírito Santo, solicitando que expeça a manifestação de força executória da decisão judicial que determinou a expedição da Carta de Arrematação, em atenção à Portaria AGU nº 1.547, de 2008, que estabelece a competência dos órgãos de representação judicial da União para determinar a força executória de determinações judiciais que impõem seu cumprimento por parte dos órgãos da Administração. 

 
 
 

I - RELATÓRIO

 

1. A  Superintendência do Patrimônio da União no Espírito Santo SPU/ES  encaminha o presente processo, para análise e manifestação, nos termos do artigo 11, inciso VI, alínea “b”, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União e do artigo 19, incisos I e VI, do Ato Regimental n.º 5, de 27 de setembro de 2007, do Advogado-Geral da União, combinados com o arte. 38 da Lei nº 8.666, de 1993.

 

2. Os autos foram instruídos com os seguintes documentos:    

         

              15376444 Anexo versao_1_Título Aquisitivo/Documento de Trans

              15376448 Anexo versao_1_Ato Constitutivo, estatuto ou contra   

              15376455 Anexo versao_1_Documento de designação do represent          

              15376457 Anexo versao_1_Documento de identificação com foto

              15376460 Anexo versao_1_MATRICULA RGI IMOVEL.pdf  

              15376462 Requerimento versao_1_ES00971_2021.pdf     

              15421918 Despacho         

              15756230 Anexo e-mail - Conhecimento  

              15756243 Anexo Auto de Arrematação     

              15756250 Anexo ITBI        

              15756254 Anexo Espelho Prefeitura          

              15756265 Anexo Comprovante Óbito Jaime Medeiros       

              15756274 Anexo Decisão Judicial 

              15756444 Despacho         

              16044308 Despacho         

              16045198 Ofício 138367   

              16445960 E-mail CONF. GRAVANDO. ACESSO EXTERNO    

              16872043 E-mail ENCAMINHA CHAVE DE ACESSO 

              16872094 Parecer nº 00438/2021 

              16872134 Ofício Nº 00150/2021   

              21239785 Anexo Determinação Registro  

              21239802 Anexo Carta de Arrematação    

              21239881 Anexo E-mail Atelier Localização    

              21241127 Despacho         

              21532986 Despacho         

              21655236 Ofício 9296

 

3. Trata-se de consulta para esclarecer dúvida jurídica acerca do PROCEDIMENTO DE TRANSFERÊNCIA DE RESPONSÁVEL NO CADASTRO DA SPU, tendo por objeto o imóvel de propriedade da União com área de 420 m2, situado na Avenida Saturnino de Brito nº 174, bairro Enseada do Suá, em Vitória-ES, sob o RIP 5705000678913, registrado no Livro de Registro Geral nº 02, sob a matrícula nº 32.932, do Cartório de Registro Geral de Imóveis da 2ª Zona de Vitória -ES. 

 

4. A dúvida do órgão assessorado encontra-se delimitada no Despacho s/n de 14/05/2021 (SEI nº 15756444):

 

"Atelier Locação Patrimonial apresentou requerimento de transferência para o imóvel RIP acima, que foi arrematado em leilão judicial, conforme Auto de Arrematação 15756243 e Decisão Judicial 15756274.
Ocorre que o imóvel está em nome de Jaime Medeiros, que transferiu para Matriz Imóveis Ltda e esta última foi executada, tendo o imóvel ido para leilão sendo arrematado por Atelier Locação Patrimonial Ltda.
Trata-se de imóvel foreiro.
A primeira transferência foi através de promessa de compra e venda, conforme documento 15376460, em 04/03/1993.
Conforme Lei 9636/98 e Instrução Normativa SPU 01/2018. Para imóveis ocupados é permitido à SPU a transferência sem Escritura Definitiva para transações nesta data (1993), mas para imóveis em regime de aforamento apenas com documentos definitivos.
Para registro da arrematação o interessado necessita de Certidão de Autorização de Transferência (CAT), emitida pela SPU, em nome de Matriz Imóveis Ltda.
A situação que temos é a seguinte, imóvel em nome de falecido, que foi transferido em 1993 para uma empresa que teve o imóvel leiloado judicialmente, ou seja, dificilmente esta Escritura definitiva será emitida.
Proponho a remessa deste processo à NUJUC para que seja enviado à Consultoria Jurídica da União (CJU), com o seguinte questionameto:
Mesmo sabendo que a legislação apenas abarca transferência de foreiros com documentos definitivos, a Decisão Judicial da arrematação do imóvel, passando de Matriz Imóveis Ltda para Atelier Locação Patrimonial Ltda não seria um reconhecimento judicial da transferência de 1993 como definitiva?"

 

5. Atendida a recomendação do PARECER Nº 00438/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU (SEI nº 16872094), no sentido de juntada da Carta de Arrematação expedida pelo Juiz de Direito da 10ª Vara Cível da Comarca de Vitória – ES (SEI nº 21239785 e 21239802), o processo retorna a esta E-CJU Especializada Virtual de Patrimônio para resposta quanto ao questionamento suscitado pelo Núcleo de Receitas Patrimoniais da SPU/ES (SEI nº 15756444).

 

É o breve relatório.

 

II - FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER

 

6. Esta manifestação jurídica tem a finalidade de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa. A função do órgão de consultoria é apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências para salvaguardar o Gestor Público, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.

 

7. Importante salientar que o exame dos autos restringe-se aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica e/ou financeira. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade assessorada municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.

 

8. De outro lado, cabe esclarecer que não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes, observar se os seus atos estão dentro do seu limite de competências.

 

9. Destaque-se que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada, a quem compete, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações. Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva do(s) agente(s) público(s) envolvido(s).

 

10. Assim, caberá tão somente a esta Consultoria, à luz do art. 131 da Constituição Federal de 1988 e do art. 11 da Lei Complementar nº 73, de 1993, prestar assessoramento sob o enfoque estritamente jurídico, não sendo competência deste órgão consultivo o exame da matéria em razão das motivações técnica e econômica, nem da oportunidade e conveniência, tampouco fazer juízo crítico sobre cálculos e avaliações, ou mesmo invadir o campo relacionado à necessidade material no âmbito do órgão assessorado.

 

11. Em razão, esta análise limita-se a prestar orientação jurídica quanto ao Procedimento de Transferência de Responsável no Cadastro da SPU do imóvel objeto da Carta de Arrematação expedida pelo Juízo da 10ª Vara Cível de Vitória -ES nos autos judiciais sob o nº 0001344-82.1999.8.08.0024 (SEI nº 21239785 e 21239802), reiterando  que a análise dos aspectos técnicos (não jurídicos) não está inserida no conjunto de atribuições afetas a esta e-CJU, seja por não ser detentora de conhecimentos técnicos específicos ou seja por não ser destinatária da competência legal/normativa para manifestar-se acerca de questões outras que não aquelas de cunho estritamente jurídico, no sentido da orientação do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que assim dispõe:

 

"O Órgão Consultivo não deve emitir manifestações conclusivas sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, sem prejuízo da possibilidade de emitir opinião ou fazer recomendações sobre tais questões, apontando tratar-se de juízo discricionário, se aplicável."

 

III - FUNDAMENTAÇÃO

 

12. Como registrado no Despacho SPU-ES- NUREP (SEI 21241127), o cerne do questionamento refere-se à dúvida quanto à necessidade (ou não) de “regularizar” perante a SPU as transferências de titularidade anteriores à arrematação do imóvel para, somente após este procedimento, fazer constar da cadeia dos responsáveis o arrematante indicado na Carta de Arrematação expedida pelo Juízo da 10ª Vara Cível de Vitória-ES (SEI nº 21239802).

 

13. Inicialmente, necessário considerar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ), corte responsável por uniformizar a interpretação da lei federal no país, no exercício das atribuições elencadas no art. 105 da Constituição Federal de 1988, fixou o entendimento de que a arrematação judicial de imóvel em hasta pública configura forma originária de aquisição da propriedade, como reiterado recentemente pela Segunda Turma no julgamento do REsp 1654979/RJ, relatoria do Ministro HERMAN BENJAMIN (DJe 05/11/2021). Segue-se texto da ementa do referido Acórdão:

 

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL DE TRIBUTO FEDERAL. BEM PENHORADO ARREMATADO EM PROCESSO QUE TRAMITA NA JUSTIÇA ESTADUAL. ARREMATAÇÃO COMO MEIO DE AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DE PROPRIEDADE. PEDIDO DE ANULAÇÃO DO LEILÃO PERANTE A JUSTIÇA ESTADUAL. NÃO COMPROVAÇÃO. OFENSA AO ART. 535 DO CPC/1973 NÃO CONFIGURADA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. CONTEXTO FÁTICO E PROBATÓRIO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 1.025 DO CPC/2015. SÚMULAS 7/STJ, 211/STJ E 282/STF.
1. Na origem, trata-se de Execução Fiscal de tributo federal, cujo imóvel penhorado foi alienado em execução que tramita na Justiça Estadual, ajuizada pelo Banco do Brasil. O acórdão recorrido determinou o cancelamento da penhora existente no executivo fiscal, sob os seguintes fundamentos: a) a arrematação tem natureza de aquisição originária de propriedade, pelo que o arrematante deve receber o bem livre de qualquer ônus ou pendência; b) em relação aos créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, quando arrematados os bens em hasta pública, aplicável a disposição contida no art. 130, parágrafo único, do CTN; c) se o bem arrematado também se encontra penhorado nos autos da Execução Fiscal de tributo federal, a referida penhora deve ser tornada insubsistente, tendo em vista que o valor da venda deverá satisfazer, em primeiro lugar, o crédito da Fazenda Federal, além de o arrematante ter que receber o bem livre de qualquer ônus ou pendência; e d) para que a penhora seja tornada insubsistente necessário não haver nenhuma discussão acerca da legalidade do leilão; e, no caso, embora a União tenha alegado que requereu a anulação do leilão realizado nos autos do processo em trâmite perante a Justiça Estadual, não há nestes autos prova de que o aludido pedido foi apresentado.
2. Nos Recursos Especiais ofertados pela Fazenda Nacional (fls. 473-483, e-STJ) e pelo Ministério Público Federal (fls. 531-547, e-STJ), são apontadas violações dos arts. 535, 613, 694, § 1º, III, e 659, § 4º, do Código de Processo Civil (CPC/1973); dos arts. 185, 186 e 187 do Código Tributário Nacional (CTN); e dos arts. 1º, 167, I, "5", e 240 da Lei 6.015/1973.
VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA
3. No rejulgamento dos aclaratórios interpostos pelo ora recorrido, ocorrido em cumprimento ao decidido no pretérito REsp 1.038.800/RJ, consignou-se expressamente: "Desse modo, todas as pendências incidentes sobre o imóvel, relativas ao período anterior à arrematação, poderão sub-rogar-se no preço pago, após a satisfação do crédito da Fazenda Federal, sendo descabida a exigência de tais valores diretamente ao adquirente, que, como já explicitado, recebe o bem livre de quaisquer ônus ou pendências. Portanto, se o bem arrematado encontra-se penhorado, também, nos autos do processo que originaram este agravo, a referida penhora deve ser tornada insubsistente, tendo em vista que o valor da venda deverá satisfazer, em primeiro lugar, o crédito da Fazenda Federal, além de o arrematante ter que receber o bem livre de quaisquer ônus ou pendências". (fl.438, e-STJ, grifei)
4. Já no julgamento dos aclaratórios da Fazenda Nacional, o Tribunal deixou claro que "a questão foi devidamente apreciada pelo acórdão embargado, até porque a matéria relativa à da fraude execução não foi objeto de questionamento neste agravo". (fl. 462, e-STJ, grifei)
5. Inexiste, portanto, omissão violadora do art. 535 do CPC/1973 à luz dos invocados arts. 185 e 186 do CTN, visto que a Corte de origem expressamente afirmou: a) a preferência do crédito da Fazenda Nacional deveria ser buscada sobre o preço da arrematação perante o juízo estadual; e b) o tema da fraude à execução não deveria ser enfrentado, pois estranho ao recurso julgado (sem prejuízo da possibilidade de submissão do tema ao juízo originário da causa).
VIOLAÇÃO DOS ARTS. 613, 694, § 1º, III, E 659, § 4º, DO CPC/1973; 185, 186 e 187 DO CTN; 1º E 167, I, "5", E 240 DA LEI 6.015/1973. NÃO CONHECIMENTO. SÚMULAS 7/STJ, 211/STJ E 282/STF.
6. O decisum recorrido asseverou: "Com efeito, na hipótese, embora a União Federal tenha alegado que requereu a anulação do leilão realizado nos autos do processo em trâmite perante à Justiça Estadual, não há nestes autos qualquer prova de que o aludido pedido foi apresentado, o que há é apenas é essa alegação, confirmada pelo Ministério Público Federal, em seu parecer às fls. 191/199. Assim, não merecem ser consideradas as alegações das recorrentes quanto à anulação do leilão, por ausência de prova nesse sentido, consoante se depreende do v. acórdão proferido pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que 'a premissa adotada pelo Tribunal de origem, portanto, não se mostra devidamente esclarecida, mesmo após a oposição dos Embargos de Declaração, e é relevante para a solução da demanda, uma vez que as singelas alegações das partes não fazem prova conclusiva do respectivo conteúdo. Dito de outro modo, a utilização do poder geral de cautela deve ser feita a partir da análise clara do fato (pendência de julgamento do suposto incidente processual relacionado à nulidade do leilão) e de suas consequências jurídicas, e não de singelas informações trazidas aos autos'. Ademais, acaso seja anulado o leilão realizado na Justiça Estadual, se for o caso, a penhora na Justiça Federal poderá ser renovada, não havendo, pois, qualquer prejuizo processual em decorrência deste provimento." (fls. 439-440, e-STJ)
7. Ainda no julgamento dos aclaratórios interpostos pelo Ministério Público Federal assentou-se: "O acórdão embargado entendeu que, por ter a arrematação natureza de aquisição originária de propriedade, deve o arrematante receber o bem livre de quaisquer ônus ou pendências, aplicando-se o disposto no art. 130, parágrafo único, do CTN. A posição firmada na decisão recorrida rejeita a aplicação de quaisquer dos dispositivos mencionados pelo embargante, impugnando-se nos presentes embargos de declaração, portanto, as próprias razões de decidir que embasaram a prolação do acórdão embargado". (fl. 519, e-STJ)
8. Os acórdãos recorridos, analisando detidamente as peculiaridades do caso concreto, decidiram: a) a arrematação, do caso dos autos, tem natureza de aquisição originária; b) sendo assim, o arrematante deve receber o bem livre de quaisquer ônus ou pendências; c) quando o bem for arrematado em hasta pública, aplica-se a disposição do art. 130, parágrafo único, do CTN; d) embora a União tenha alegado que requereu a anulação do leilão realizado nos autos do processo em trâmite perante a Justiça Estadual, não há nestes autos nenhuma prova de que o aludido pedido foi apresentado, o que há é apenas essa alegação, confirmada pelo Ministério Público Federal, em seu parecer às fls. 191-199; e) na hipótese de ser anulado o leilão realizado na Justiça Estadual, se for o caso, a penhora na Justiça Federal poderá ser renovada, não havendo, pois, prejuízo processual em decorrência deste provimento; f) deve ser determinado o cancelamento da penhora, nos autos do processo n. 91.0035373-6, incidente sobre imóvel objeto de arrematação nos autos do processo em trâmite na Justiça Estadual; e g) a matéria relativa à fraude à execução não foi objeto de questionamento no recurso julgado, motivo pelo qual nem pode ser diretamente enfrentada pelo Tribunal.
9. Os Recursos Especiais não pretendem aferir a interpretação das normas legais tidas por violadas, mas uma nova análise do conjunto fático-probatório dos autos, sem o que não é possível reconhecer as supostas ofensas aos dispositivos da legislação. Definições no caso concreto sobre a anterioridade da penhora; prevalência dos apontamentos dos registros públicos do bem; possibilidade de anulação da arrematação após consumada, entre outras, dependem diretamente da revisão de aspectos fático-probatórios da demanda que nem sequer constam do acórdão recorrido, inclusive subordinando-se ao levantamento de dados do processo que teve curso na Justiça Estadual.
10. Assim, tal como decidido pela Corte de origem por ocasião da análise da admissibilidade dos Recursos Especiais (fls. 628-630, e-STJ), tem-se que dos apelos não se pode conhecer ante o óbice previsto na Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça.
11. Ainda que não por isso, tampouco se pode conhecer das reclamadas violações dos arts. 613, 694, § 1º, III, e 659, § 4º, do CPC/1973; do art. 187 do Código Tributário Nacional (CTN) e dos arts. 1º, 167, I, "5", e 240 da Lei 6.015/1973, porque não debatidas na decisão recorrida. Apesar da oposição de Embargos de Declaração pelo MPF na origem (fls. 487-498, e-STJ), observa-se que os dispositivos tidos por violados não foram analisados na Corte regional (fls. 515-524, e-STJ). Não se aplica ao caso, ademais, o art. 1.025 do CPC/2015 (prequestionamento ficto), considerando-se que o apelo foi interposto ainda na vigência do CPC/1973. Incidem, assim, os óbices das Súmulas 282/STF e 311/STJ.
CONCLUSÃO
12. Recurso Especial da Fazenda Nacional parcialmente conhecido, somente com relação à violação do art. 535 CPC/1973, e, nessa extensão, não provido. Recurso Especial do Ministério Público Federal não conhecido.
(...)” (grifado e destacado)

 

14. No caso concreto, o objeto da aquisição limita-se ao domínio útil, remanescendo o domínio direto da União. Portanto, compreendido que o domínio útil apresenta-se como desdobramento do domínio pleno, com idêntica natureza de direito real, portanto, a sua aquisição, através da arrematação em hasta pública, de igual modo configura uma “aquisição originária”, pois ocorreu sem nenhuma relação jurídica com o titular ou responsável anterior, ante a inexistência da relação jurídica de transmissão com os titulares antecedentes na cadeia possessória.

 

15. Quanto aos efeitos da aquisição originária de direitos reais, em diferenciação ao modo de aquisição derivada, vale citar fundamentação doutrinária utilizada pela Quarta Turma do STJ para um caso de usucapião, mas que também se aplica ao presente processo administrativo nas passagens em que se destaca a importância da distinção entre modos originário e derivado de aquisição de direitos reais e dos efeitos que se produzem. Leia-se:

 

“USUCAPIÃO. ADMINISTRATIVO. MODO DE AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DA PROPRIEDADE. TERRENO DE MARINHA. BEM PÚBLICO. DEMARCAÇÃO POR MEIO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINADO PELO DEC.-LEI 9.760/1946. IMPOSSIBILIDADE DE DECLARAÇÃO DA USUCAPIÃO, POR ALEGAÇÃO POR PARTE DA UNIÃO DE QUE, EM FUTURO E INCERTO PROCEDIMENTO DE DEMARCAÇÃO PODERÁ SER CONSTATADO QUE A ÁREA USUCAPIENDO ABRANGE A FAIXA DE MARINHA. DESCABIMENTO. CONSIDERAÇÕES DO MIN. LUIS FELIPE SALOMÃO SOBRE O TEMA. PRECEDENTES DO STJ. SÚMULA 340/STF. SÚMULA 496/STJ. LEI 6.015/1973, ARTS. 212, 214 E 237. DEC.-LEI 9.760/1946, ARTS. 1º, 3º E 13.
«... 4. Como é cediço, a declaração de usucapião é forma de aquisição originária da propriedade ou de outros direitos reais, de modo que se opõe à aquisição derivada, à qual se opera mediante sucessão da propriedade, seja de forma singular, seja de forma universal.
A diferença entre aquisição originária e derivada de direitos é bem estabelecida por Venosa:
Aquisição de um direito é adjunção, encontro, união, conjunção com uma pessoa, seu titular.
Essa aquisição pode ser originária ou derivada.
É originária a aquisição feita pelo titular, sem qualquer relacionamento com um titular anterior ao direito a adquirir, tanto porque o direito surge pela primeira vez (como é o caso da aquisição da propriedade pela ocupação de uma coisa sem dono - res nullius), como porque o direito já existia, como na coisa abandonada (res derelicta).
Na aquisição derivada, há relacionamento com o titular antecedente do direito, como é o caso da compra e venda (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil, volume 1. 7 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 321).
Vale dizer que, na usucapião, a propriedade não é adquirida do anterior proprietário, mas, em boa verdade, contra ele.
A propriedade é absolutamente nova e não nasce da antiga.
É adquirida a partir da objetiva situação de fato consubstanciada na posse ad usucapionem pelo interregno temporal exigido por lei. Aliás, é até mesmo desimportante que exista antigo proprietário, mostrando-se bastante comum a situação em que se pleiteia usucapião de bem sem registro imobiliário anterior em nome de particular (REsp 964.223/RN, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/10/2011, DJe 04/11/2011).
964.223/STJ (Usucapião. Imóvel urbano. Ausência de registro acerca da propriedade do imóvel. Inexistência de presunção em favor do Estado de que a terra é pública. Terra devoluta. Conceito. Considerações do Min. Luis Felipe Salomão sobre o tema. Lei 601/1850, art. 3º. CCB/2002, arts. 1.238 e 1.243. Dec.-lei 9.760/1946, art. 5º).
Nesse sentido, é a doutrina de Pontes de Miranda, citada no acórdão proferido no REsp. 13.663/SP, relatado pelo Ministro Athos Carneiro:
13.663/STJ (Usucapião extraordinário. Modo originário de aquisição da propriedade. Irrelevância, por isso, de o imóvel estar gravado com cláusula de inalienabilidade. Alcance do CCB, art. 1.676. (Cita doutrina)).
Na usucapião, o fato principal é a posse, suficiente para originariamente se adquirir; não, para se adquirir de alguém. É bem possível que o novo direito se tenha começado a formar, antes que o velho se extinguisse. Chega momento em que esse não pode mais subsistir, suplantado por aquele. Dá-se, então, impossibilidade de coexistência, e não sucessão, ou nascer um do outro. Nenhum ponto entre os dois marca a continuidade. Nenhuma relação, tão-pouco, entre o perdente do direito de propriedade e o usucapiente (Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, v. XI, § 1.192, nº 1)
Se a propriedade anterior se extingue, tudo o que gravava o imóvel - e lhe era acessório - também se extinguirá.
Nesse passo, lecionam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald:
A importância da distinção entre modos originários e derivado reside nos efeitos que se produzem. Se a propriedade é adquirida por modo originário, não há vínculo entre a propriedade atual e a anterior, incorporando-se o bem ao patrimônio do novo titular em toda a sua plenitude, livre de todos os vícios que a relação jurídica pregressa apresentava. Todavia, se adquirida a propriedade por modo derivado, isto é, pelo registro no ofício imobiliário do título representativo de negócio jurídico ou sucessão, transfere-se a coisa com os mesmos atributos e restrições (ônus reais e gravames) que possuía no patrimônio do transmitente.
Como na usucapião, o possuidor adquire a propriedade por sua posse prolongada, a despeito de qualquer relação jurídica com o proprietário anterior, não incidirá o fato gerador do ITBI (a transmissão da propriedade, a teor do art. 35 do CTN), já que o usucapiente não adquire a coisa do antigo proprietário, mas contra o antigo proprietário. Outrossim, se existir eventual ônus real sobre o imóvel, em razão de negócio jurídico praticado pelo antigo proprietário (v. g., hipoteca, servidão), não subsistirá o gravame perante o usucapiente, que receberá a propriedade límpida, isenta de máculas.
De fato, impraticável será a manutenção de eventual ônus hipotecário que incidia sobre o imóvel usucapido, pois sendo banido o direito principal em que o gravame se fundava, não prevalece o direito real acessório, resultante de garantia concebida em virtude de uma propriedade que não mais subsiste. Ademais, caberia ao credor do proprietário primitivo a prática de atos de conservação de seu direito eventual (art. 130, CC). Por isto, a sentença de usucapião secundariamente implicará o cancelamento de qualquer registro que se relacione com garantias reais primitivamente relacionadas a débitos contraídos pelo antigo proprietário (FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos reais. 5 ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2008, pp. 259-260).
 
Com efeito, como a usucapião é forma originária de aquisição de propriedade, não decorrente da antiga e não guardando com ela relação de continuidade, é descabido cogitar em violação à disposição do artigo 237 da Lei 6.015/1973, pois o dispositivo limita-se a prescrever que não se fará registro que dependa de apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro.
 
Essa é a jurisprudência do STJ:
DIREITO DAS COISAS. RECURSO ESPECIAL. USUCAPIÃO. IMÓVEL OBJETO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. INSTRUMENTO QUE ATENDE AO REQUISITO DE JUSTO TÍTULO E INDUZ A BOA-FÉ DO ADQUIRENTE. EXECUÇÕES HIPOTECÁRIAS AJUIZADAS PELO CREDOR EM FACE DO ANTIGO PROPRIETÁRIO. INEXISTÊNCIA DE RESISTÊNCIA À POSSE DO AUTOR USUCAPIENTE. HIPOTECA CONSTITUÍDA PELO VENDEDOR EM GARANTIA DO FINANCIAMENTO DA OBRA. NÃO PREVALÊNCIA DIANTE DA AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DA PROPRIEDADE. INCIDÊNCIA, ADEMAIS, DA SÚMULA 308.
[...]
4. A declaração de usucapião é forma de aquisição originária da propriedade ou de outros direitos reais, modo que se opõe à aquisição derivada, a qual se opera mediante a sucessão da propriedade, seja de forma singular, seja de forma universal. Vale dizer que, na usucapião, a propriedade não é adquirida do anterior proprietário, mas, em boa verdade, contra ele. A propriedade é absolutamente nova e não nasce da antiga. É adquirida a partir da objetiva situação de fato consubstanciada na posse ad usucapionem pelo interregno temporal exigido por lei. Aliás, é até mesmo desimportante que existisse antigo proprietário.
5. Os direitos reais de garantia não subsistem se desaparecer o "direito principal" que lhe dá suporte, como no caso de perecimento da propriedade por qualquer motivo. Com a usucapião, a propriedade anterior, gravada pela hipoteca, extingue-se e dá lugar a uma outra, ab novo, que não decorre da antiga, porquanto não há transferência de direitos, mas aquisição originária. Se a própria propriedade anterior se extingue, dando lugar a uma nova, originária, tudo o que gravava a antiga propriedade - e lhe era acessório - também se extinguirá.
6. Assim, com a declaração de aquisição de domínio por usucapião, deve desaparecer o gravame real hipotecário constituído pelo antigo proprietário, antes ou depois do início da posse ad usucapionem, seja porque a sentença apenas declara a usucapião com efeitos ex tunc, seja porque a usucapião é forma originária de aquisição de propriedade, não decorrente da antiga e não guardando com ela relação de continuidade.
7. Ademais, «a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel» (Súmula 308).
8. Recurso especial conhecido e provido.” (REsp 941464/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 24/04/2012, DJe 29/06/2012) (grifos e destaques)

 

16. A arrematação é forma originária de aquisição da propriedade, no caso do presente processo, pode ser entendida como a  forma originária de aquisição do domínio útil, como se depreende da leitura do caput art. 130 do Código Tributário, à luz da ressalva do seu parágrafo único:

 

“Art. 130. Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, sub-rogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação.         
Parágrafo único. No caso de arrematação em hasta pública, a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço.” (grifos e destaques)  

 

17. Ou seja, a arrematação transfere o domínio do bem ao arrematante e para o “preço depositado” os vínculos e pendências do proprietário ou possuidor anterior, extinguindo direitos e obrigações que porventura incidam sobre a coisa em relação ao arrematante, valendo transcrever algumas considerações doutrinárias para perfazimento da compreensão em relação aos aspectos processuais da Carta de Arrematação. Leia-se:

 

“A arrematação não é ato contratual, é ato processual de transferência coativa, daí porque se fala em sua irretratabilidade, como ensinou Liebman.
Também não é sentença, de maneira que não pode ser objeto de recurso ou de ação rescisória, como aludiu José Frederico Marques (Instituições de Direito Processual Civil, ed. 1969, volume V, n. 1.219, página 267).
A arrematação é título de domínio, em sentido material, do arrematante sobre os bens adquiridos na hasta pública. Por sua vez, o auto de arrematação funciona como título em sentido formal.
No caso de bem imóvel a transferência forçada aperfeiçoa-se com a expedição da carta de arrematação, que é o instrumento dela, como o translado é o instrumento da escritura lavrada nas notas do tabelião.
A carta de arrematação, contendo os requisitos legais, que se destina à transcrição no Registo de Imóveis, é redigida pelo escrivão e subscrita pelo juiz.
As despesas da arrematação, da extração da carta, bem como os impostos devidos pela transcrição do imóvel são ônus do arrematante.
Já se entendeu que “o arrematante não está obrigado a pagar os tributos incidentes sobre o imóvel arrematado, para obter a expedição da carta de arrematação, uma vez que o preço depositado responde pelos impostos e taxas devidos” (TJSP, ac. De 3 de outubro de 1974, RT 471/58 – 59).
A arrematação transfere o domínio do bem ao arrematante; transfere ao arrematante direito aos frutos pendentes; obriga o depositário judicial ou particular, ou eventualmente o devedor a transferir ao arrematante a posse dos bens arrematados; extingue as hipotecas inscritas no imóvel.
O CPC/73 previa que assinado o auto de arrematação, esta tornar-se-á perfeita e acabada, ainda que julgados procedentes os embargos do devedor.
Por sua vez, o CPC/2015, não obstante prever disposição semelhante (e desde que não provocado o juízo em dez dias após a arrematação ou suscitado vício inerente ao procedimento de leilão), foi além, para também assegurar a irretratabilidade da arrematação não obstante reconhecido, a posteriori, eventuais vícios aptos a invalidar a arrematação já consolidada, como disseram Marques de Medeiros Neto, André Pagani de Souza, Daniel Penteado de Castro e Rogerio Mollica (O artigo 903 do CPC e a arrematação perfeita e acabada, in Migalhas).  
Trago a lição de Tereza Arruda Alvim Wambier (Primeiros comentários ao novo código de processo civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016) quando disse: 
"O Novo Código de Processo Civil extinguiu, pois, a figura dos embargos de segunda fase (embargos à arrematação, alienação e adjudicação), previstos no art. 746 do CPC/73 e, no seu lugar, previu essa ação autônoma que, por expressa disposição do caput, mesmo que bem sucedida, não terá o condão de refletir no desfazimento da arrematação, alienação ou adjudicação. Nesse passo, após a expedição da carta de arrematação ou da ordem de entrega, não será mais admitida a discussão da arrematação, alienação ou adjudicação dentro do processo executivo. Eventual vício terá de ser arguido em ação autônoma. Trata-se de técnica que, a nosso ver, visa a conferir mais segurança e atratividade às formas de expropriação."
Com isso, se ao final dos embargos à execução for verificado que o título não era hábil a iniciar a execução, a arrematação já realizada é preservada, resolvendo-se a questão em perdas e danos. (...)” [VIEGAS, Weverson. Arrematação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 496, 15 nov. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5895. Acesso em: 10 fev. 2022.] (grifado e destacado)

 

18. Após as considerações tecidas, é possível responder à indagação da SPU/ES da seguinte maneira:

 

Consulta:
Mesmo sabendo que a legislação apenas abarca transferência de foreiros com documentos definitivos, a Decisão Judicial da arrematação do imóvel, passando de Matriz Imóveis Ltda para Atelier Locação Patrimonial Ltda não seria um reconhecimento judicial da transferência de 1993 como definitiva?
 
Resposta:
Compreendendo que a Carta de Arrematação constitui, por imposição legal, um “documento definitivo”, considerando que o STJ já fixou entendimento de que, na arrematação, a aquisição feita pelo arrematante não guarda qualquer relação com o titular anterior do direito que se adquiriu em hasta pública, não faz nenhum sentido argumentar que ocorrerá “um reconhecimento judicial da transferência de 1993 como definitiva”, pois, em se configurando a forma originária, como anteriormente demonstrado, esta nova aquisição não decorrerá da antiga, portanto, não guardará com ela relação de continuidade.

 

19. Como para registro da arrematação o arrematante necessita de Certidão de Autorização de Transferência (CAT) emitida pela SPU, devem ser observados por esta os procedimentos estabelecidos na legislação.

 

20. A INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 1, DE 9 DE MARÇO DE 2018, que disponibiliza orientações para os processos de cessão de direitos e de transferência de titularidade de imóveis da União, sob os regimes de aforamento ou de ocupação, considera (art. 2º, incisos I e VIII):

 

- “ Transferência de titularidade a alteração do responsável pelo imóvel da União no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União - SPU, com a inclusão dos dados do adquirente, que passa a ser o novo responsável pela utilização e pelas obrigações do imóvel;”
 
- “Certidão de Autorização para Transferência - CAT o documento em que a Secretaria do Patrimônio da União autoriza a realização da transferência de imóveis da União.” (grifos e destaques)
 

21. A Carta de Arrematação, segundo a definição do inciso IV do art. 8º da mesma IN, constitui instrumento válido para a efetivação da transferência, constando importante observação na redação da segunda parte do mencionado inciso, no sentido de que,

“se a transação incidir laudêmio, deve ser aceito o documento, ainda que não se mencione a CAT. Neste caso, a CAT, na modalidade Especial, é emitida pela Superintendência, mediante autorização da Unidade Central.
 

22. Portanto, se o sistema não permitir a transferência, automaticamente, pela mera apresentação da Carta de Arrematação, ainda é possível a emissão da CAT Especial mediante autorização da Unidade Central, registrando-se o motivo e a informação sobre o documento que motivou a certidão (determinação judicial, carta de adjudicação, carta de arrematação, sentença etc.), nos termos do disposto nos arts. 26 e 27 da IN 01/2018:

 

“Art. 26. A CAT Especial é a certidão autorizativa de transferência para as situações em que se observa requisitos específicos para sua emissão, impossibilitada a emissão automática pelo sistema.
 
Art. 27. A CAT Especial é emitida pela Superintendência, mediante requerimento de autorização à Unidade Central, e tem prazo de validade para emissão.
Parágrafo único. Na emissão da CAT Especial, devem ser registrados o motivo e a informação sobre o documento que motivou a certidão (determinação judicial, carta de adjudicação, carta de arrematação, sentença etc.), conforme inciso IV, art. 9º.” (grifos e destaques)

 

23. Nesse contexto, importante refletir que a atualização referente às transferências de titularidade é de interesse do próprio órgão gestor de patrimônio, razão pela qual o procedimento de transferência de titularidade de imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União poderá ser iniciado inclusive “de ofício, quando a Secretaria do Patrimônio da União tiver conhecimento da transferência”, conforme estabelecido no art. 34 da IN.

 

24. Lembre-se que os casos não previstos na Instrução Normativa devem ser submetidos à área de receitas patrimoniais da Unidade Central, para orientação (art. 65).

 

25. Todos os esclarecimentos e observações deste parecer jurídico, no entanto, condicionam-se à manifestação de força executória acerca das determinações emanadas do juízo estadual, no sentido da constrição sobre o domínio útil do imóvel de propriedade da União, considerando que o requerente utilizou a Carta de Arrematação do referido juízo da 10ª Vara Cível de Vitória-ES como fundamento para o requerimento de transferência perante essa SPU/ES.

 

26. Em razão, cumpre encaminhar os autos à Procuradoria da União no estado do Espírito Santo, solicitando que expeça a manifestação de força executória da decisão judicial que determinou a expedição da Carta de Arrematação, em atenção à Portaria AGU nº 1.547, de 2008, que estabelece a competência dos órgãos de representação judicial da União para determinar a força executória de determinações judiciais que impõem seu cumprimento por parte dos órgãos da Administração. No mesmo sentido, a Portaria nº 4, de 18/5/2017 da PGU, que disciplina no âmbito da Procuradoria-Geral da União e de seus órgãos de execução os procedimentos de análise da exequibilidade de decisões judiciais direcionada à União ou seus agentes, com ou sem determinação de cumprimento.

 

  IV – CONCLUSÃO

 

27. Ante o exposto, resguardados o juízo de conveniência e oportunidade, nos limites da lei, e as valorações de cunho econômico-financeiro, ressalvada, ainda, a manutenção da conformidade documental com as questões de ordem fática, técnica e de cálculo, ínsitas à esfera administrativa, essenciais até mesmo para a devida atuação dos órgãos de controle, uma vez esclarecida a dúvida jurídica suscitada pelo Núcleo de Receitas Patrimoniais da SPU/ES (SEI nº 15756444 e 21241127), opina-se pelo retorno dos autos ao órgão assessorado, para prosseguimento do feito de acordo com as orientações estabelecidas na Instrução Normativa nº 1, de 9 de março de 2018, após atendimento da recomendação do item 26 deste parecer jurídico.

 

Brasília, 10 de fevereiro de 2022.

 

 

LEANDRA MARIA ROCHA MOULAZ

ADVOGADA DA UNIÃO - OAB/ES 7.792

Matrícula 13326678

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Atenção eletrônica está disponível em http://sapiens.agu.gov.br, fornecido o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154129340202154 e chave de acesso 5bc96af95bc96af9

 




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