ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00304/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 63042.000505/2022-11
INTERESSADOS: BASE NAVAL DE VAL DE CÃES – BNVC-PA/MB/MD
ASSUNTOS: CESSÃO DE USO GRATUITA. INFRAERO. ANO ELEITORAL.
EMENTA:
I – Direito Administrativo. Patrimônio imobiliário da União jurisdicionado às Forças Armadas.
II – Cessão de uso gratuita de parcela de área da União Jurisdicionada ao Comando da Marinha, com 1,5 Km², localizada na BNVC/MB, por dispensa de licitação, a ser celebrada com a INFRAERO, para regularização da utilização da referida área no Sistema de Luzes de Aproximação de Pista onde estão instaladas lâmpadas do Aeroporto Internacional de Belém.
III – Descaracterização da INFRAERO, empresa pública federal (personalidade jurídica de direito privado) vinculada ao Ministério da Aeronáutica, como “particular”, para fins do Parecer-Plenário nº 002/2016/CNU-DECOR/CGU/AGU e Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 002/2016, em função de sua específica destinação institucional, por executar, como atividade-fim, em regime de monopólio, serviços de infraestrutura aeroportuária constitucionalmente outorgados à União, qualificando-se, em razão de sua específica destinação institucional, como entidade delegatária dos serviços públicos a que se refere o art. 21, inciso XII, alínea "c", CF.
IV – Legislação: art. 21, inciso XII, alínea "c" da Constituição, inciso II do art. 18 da Lei nº 9.636/1998, §3º do art. 79 do Decreto-lei nº 9.760/1946, Lei nº 5.862, de 12 de dezembro de 1972, regulamentada pelo Decreto nº 8.756/2016, art. 73, inciso VI, alínea "a", e seu §10, ambos da Lei nº 9.507/1997; inciso I, do § 2º, do art. 17 da Lei nº 8.666/93.
V – Precedentes: Parecer nº 010/2011/DECOR/CGU/AGU (NUP 00400.014449/2008-16), Parecer nº 83/2012/DECOR/CGU/AGU (NUP 00402.2063/2012-10), Parecer nº 0001/2019/CNPAT/CGU/AGU (NUP 04962.003052/2018-58), Parecer-Plenário nº 002/2016/CNUDECOR/CGU/AGU e Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 002/2016 (NUP 59000.000294/201426), Acórdão RE 363412 AgR / BA – BAHIA – STF – Segunda Turma - Relator: Min. CELSO DE MELLO; Parecer n° 0837 – 5.4.1/2012/DPC/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP 05550.000031/2010-38).
VI – Possibilidade, desde que atendidas as recomendações aduzidas neste parecer.
VII – Recomendação de submissão ao DECOR.
Em cumprimento ao disposto no art. 131 da CRFB/88, no art. 11 da Lei Complementar nº 73/1993, no art. 8º-F da Lei nº 9.028/1995, no art. 19 do Ato Regimental AGU nº 05/2007 e no art. 1º da Portaria AGU nº 14/2020, conforme a delegação de competência atribuída pela Portaria Conjunta CGU/PGFN nº 99/2020, a BASE NAVAL DE VAL DE CÃES – BNVC-PA/MB/MD encaminha a esta e-CJU/Patrimônio, via SAPIENS, cópia digitalizada do processo de referência, cujo objeto é a cessão de uso gratuita de parcela de área da União Jurisdicionada ao Comando da Marinha, com 1,5 Km², localizada na BNVC/MB, por dispensa de licitação, a ser celebrada com a INFRAERO, para regularização da utilização da referida área no Sistema de Luzes de Aproximação de Pista onde estão instaladas lâmpadas do Aeroporto Internacional de Belém.
Encontram-se nos autos, digitalizados na Seq. 1, dentre outros, os seguintes documentos (numeração do processo físico):
Fl. 04/09 – Projeto básico nº 01/BNVC-14/22;
Fl. 10 – Aprovação do projeto básico;
Fl. 14 – Declaração de Atividade de Custeio;
Fl. 15/18 – Declaração de Racionalização de Gasto Público e de Limite de Gastos;
Fl. 19 – Autorização;
Fl. 20/36 – Atribuição e delegação de competência;
Fl. 37/40 – Termo de Justificativa de Dispensa de Licitação nº 1/2022 aprovado;
Fl. 41/47 – Minuta do contrato de cessão de uso gratuito;
Fl. 48/49 – Nota Técnica nº 09/2022.
Processo distribuído em 06/05/2022.
É o relatório.
Inicialmente, cumpre observar que as páginas do processo físico foram digitalizadas e carregadas no Sistema SAPIENS pelo órgão consulente, encontrando-se numeradas, rubricadas e organizadas em ordem cronológica, conforme determina o § 4º do art. 22, da Lei n.º 9.784/1999. Ressalta-se que o ofício de encaminhamento não disponibilizou o link de acesso ao processo no sistema SEI, assim, a presente manifestação jurídica foi elaborada exclusivamente com dos documentos carregados no SAPIENS.
Registre-se, por oportuno, que a análise por ora alinhavada está adstrita à documentação constante nos arquivos digitalizados carregados no SAPIENS. A omissão de documentos determinantes para o não prosseguimento da cessão e a ausência de efetiva fidedignidade do conteúdo das cópias juntadas com os respectivos originais implicam na desconsideração do presente parecer.
A presente manifestação jurídica tem o escopo de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem praticados ou já efetivados. Ela envolve, também, o exame prévio dos textos de editais, de minutas de contratos e de seus anexos, quando for o caso.
A função da Consultoria Jurídica da União é apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.
Importante salientar, que o exame dos autos processuais se restringe aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica. Em relação a estes, parte-se da premissa de que a autoridade competente se municiou dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.
Nesse sentido vale lembrar que o Enunciado n° 07, do Manual de Boas Práticas Consultivas da CGU/AGU recomenda que “o Órgão Consultivo não deve emitir manifestações conclusivas sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, sem prejuízo da possibilidade de emitir opinião ou fazer recomendações sobre tais questões, apontando tratar-se de juízo discricionário, se aplicável. Ademais, caso adentre em questão jurídica que possa ter reflexo significativo em aspecto técnico deve apontar e esclarecer qual a situação jurídica existente que autoriza sua manifestação naquele ponto”.
De fato, presume-se que os estudos técnicos contidos no presente processo, inclusive quanto ao detalhamento de seu objeto, suas características e requisitos, tenham sido regularmente determinadas pelo setor competente do órgão, com base em parâmetros técnicos objetivos, para a melhor consecução do interesse público.
Além disso, vale esclarecer que, em regra, não é atribuição do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Cabe-lhes, isto sim, observar se os seus atos estão dentro do seu espectro de competências. Assim sendo, o ideal, para a melhor e completa instrução processual, é que sejam juntadas ou citadas as publicações dos atos de nomeação ou designação da autoridade e demais agentes administrativos bem como os atos normativos que estabelecem as respectivas competências, com o fim de que, em caso de futura auditoria, possa ser facilmente comprovado que quem praticou determinado ato tinha competência para tanto. Todavia, a ausência de tais documentos, por si, não representa, a priori, óbice ao desenvolvimento do processo.
Por fim, com relação à atuação desta Consultoria Jurídica, é importante informar que, embora as observações e recomendações expostas não possuam caráter vinculativo, constituem importante instrumento em prol da segurança da autoridade assessorada, a quem incumbe, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações, ressaltando-se, todavia, que o seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva da Administração.
Compulsando os autos, não se localizou a documentação referente à propriedade do imóvel da União ou o termo de entrega à Marinha do Brasil/MD de cuja parcela será objeto da pretendida cessão de uso o gratuita, o que deverá ser providenciado pelo órgão consulente. Essa documentação, que comprova a titularidade do imóvel, se faz necessária para fim de aferição da regularidade formal da relação jurídica a ser estabelecida, conforme o ordenamento jurídico vigente.
Trata-se de cessão de uso gratuita de parcela de área da União Jurisdicionada ao Comando da Marinha, com 1,5 Km², localizada na BNVC/MB, por dispensa de licitação, a ser celebrada com a INFRAERO, para regularização da utilização da referida área no Sistema de Luzes de Aproximação de Pista onde estão instaladas lâmpadas do Aeroporto Internacional de Belém.
A cessão de uso gratuita de bem imóvel da União tem sua regência pelo Decreto-Lei nº 9.760/1946 e pela Lei nº 9.636/1998, a teor do disposto no parágrafo único do art. 121 da Lei nº 8.666/1993 e no art. 192 da Lei nº 14.133/2021 – Nova Lei de Licitações:
Art. 121. [...]
Parágrafo único. Os contratos relativos a imóveis do patrimônio da União continuam a reger-se pelas disposições do Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, com suas alterações, e os relativos a operações de crédito interno ou externo celebrados pela União ou a concessão de garantia do Tesouro Nacional continuam regidos pela legislação pertinente, aplicando-se esta Lei, no que couber.
Art. 192. O contrato relativo a imóvel do patrimônio da União ou de suas autarquias e fundações continuará regido pela legislação pertinente, aplicada esta Lei subsidiariamente
O fundamento jurídico da cessão de uso gratuito tem sua previsão legal no art. 18 da Lei nº 9.636/1998:
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
Note-se que já foi controversa a competência das Forças Armadas para promoverem, sem a participação da SPU, a disponibilização de imóveis da União, a elas jurisdicionados, para terceiros, diante da competência exclusiva atribuída à SPU pelo art. 40 da Lei nº 9.636/1998:
Art. 40. Será de competência exclusiva da SPU, observado o disposto no art. 38 e sem prejuízo das competências da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, previstas no Decreto-Lei no 147, de 3 de fevereiro de 1967, a realização de aforamentos, concessões de direito real de uso, locações, arrendamentos, entregas e cessões a qualquer título, de imóveis de propriedade da União, exceto nos seguintes casos:
I - cessões, locações e arrendamentos especialmente autorizados nos termos de entrega, observadas as condições fixadas em regulamento;
II - locações de imóveis residenciais de caráter obrigatório, de que tratam os arts. 80 a 85 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946;
III- locações de imóveis residenciais sob o regime da Lei no 8.025, de 1990;
IV - cessões de que trata o art. 20; e
V - as locações e arrendamentos autorizados nos termos do inciso III do art. 19. (grifos nossos)
Para dirimir essa controvérsia, o Parecer nº 010/2011/DECOR/CGU/AGU (NUP 00400.014449/2008-16) reconheceu para o Exército, inicialmente, a especialidade de suas normas em face da regra geral contida na Lei nº 9.636/1998. A aprovação pelo Despacho do Consultor-Geral da União nº 192/2011, em 23/03/2011, estendeu os efeitos do Parecer nº 010/2011/DECOR/CGU/AGU às demais Forças Armadas. O Despacho foi aprovado pelo Excelentíssimo Sr. Advogado-Geral da União em 28/03/2011. O Parecer nº 0007-5.3.1/2012/MAA/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP 00400.018706/2011-86), em seguida, dirimiu dúvidas sobre a participação da SPU nesse processo ao esclarecer que embora caiba exclusivamente às Forças Armadas decidir pela alienação ou arrendamento de imóveis sob sua administração, a instrução do processo respectivo deve contar com a participação da SPU para lavrar os contratos, conforme o art. 74, do Decreto-Lei nº 9.760/46 e art. 3º do Decreto nº 77.095/76. A Portaria SPU nº 40, de 18 de março de 2009, posteriormente, delegou essa competência aos respectivos Comandantes das Forças Armadas. A citada portaria, por sua vez, foi revogada pela Portaria SPU/ME nº 14.094/2021, ora vigente, que manteve a previsão.
O item 44 do Parecer nº 010/2011/DECOR/CGU/AGU afirma que os requisitos insculpidos no art. 18 da Lei nº 9.636/1998 deverão ser observados, desde que não haja conflito com o Decreto-lei nº 1.310/1974 e o Decreto nº 77.095/1976 e com as normas correlatas das demais Forças Armadas, estando a autorização presidencial exigida pelo §3º do art. 18 suprida pelo Decreto nº 77.095/1976, ficando o Chefe do Poder Executivo dispensado de manifestar-se caso a caso.
Desta feita, ratificou-se a competência das Forças Armadas para promoverem a cessão de uso sob o regime de arrendamento, desde que observados os requisitos contidos no art. 18 da Lei nº 9.636/1998, em especial a possibilidade de ceder a: Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; e a pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional:
Art. 18. [...]
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
Persistiu, contudo, a controvérsia quanto à possibilidade das Forças Armadas promoverem a cessão de uso gratuita, em favor de órgãos e entidades da Administração Pública para atendimento de finalidades públicas ou sociais. Tal controvérsia foi dirimida pelo Parecer nº 83/2012/DECOR/CGU/AGU (NUP 00402.2063/2012-10), aprovado pelo Despacho do Consultor-Geral da União nº 1702, de 17/12/2012, que apresenta, como requisito à cessão, a previsão de utilização futura em finalidade militar objetiva ou complementar, o que deverá ser certificado nos autos:
COMPETÊNCIA DOS ÓRGÃOS MILITARES PARA DISPOR DE BENS IMÓVEIS, DE FORMA GRATUÍTA E PROVISÓRIA, EM FAVOR DE ÓRGÃOS E ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, PARA A ATENDIMENTO DE FINALIDADES PÚBLICAS OU SOCIAIS. POSSIBILIDADE. PARECER Nº 010/2011/DECOR/CGU/AGU.
I – Tendo o Parecer nº 010/2011/DECOR/CGU/AGU firmado o entendimento de que as Forças Armadas detém competência para alienar e arrendar os bens imóveis sob sua gestão, com fundamento nas Leis nº 5.651/70 e nº 5.568/71, no Decreto-lei nº 1.310/74 e no Decreto nº 77.095/76, é de se reconhecer a competência dos órgãos militares para promover a “entrega provisória” e a “cessão de uso gratuita”, em favor de outros órgãos ou entes da Administração Pública, para o atendimento de finalidades públicas ou sociais, de bens imóveis em relação aos quais exista previsão de utilização futura em finalidade militar objetiva ou complementar.
O Parecer nº 0001/2019/CNPAT/CGU/AGU (NUP 04962.003052/2018-58) aprovado pelo Despacho do Consultor-Geral da União nº 1044/2019/GAB/CGU/AGU, de 20/11/2019, por sua vez, aprimorou parte do parecer acima citado, quando esclareceu que:
EMENTA
I – Patrimônio Imobiliário da União. Cessão de uso provisória.
II – Cessão de uso provisória de bens imóveis da União não pode ser concedida aos Municípios e a entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde, com fundamento no art. 11 do Decreto nº 3.725/2001.
III – Considerações sobre a cessão de uso, cessão provisória, entrega e entrega provisória. Uso em serviço público.
IV – Considerações sobre guarda provisória. Instrumento de origem doutrinária, com fundamento no poder geral de cautela, previsto no art. 45 da Lei nº 9.784/1999, de auxílio à Administração Federal na manutenção e conservação do imóvel, diante de risco iminente, onde não se outorga o direito de uso.
V – Considerações sobre a vedação contida na Lei nº 9.504/1997 – Lei Eleitoral.
VI – Proposta de superação dos efeitos do Parecer nº 0155/2012/DECOR/CGU/AGU e de revisão das manifestações jurídicas correlacionadas.
VII – Referência normativa: Decreto-Lei nº 9.760, de 1946, Lei nº 9.636/1998, Decreto nº 3.725/2001, Lei nº 9.784/1999, Lei nº 9.504, de 1997, Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 002/2016.
VIII – Proposta de Enunciados Consultivos.
[...]
31. Parecer nº 083/2012/DECOR/CGU/AGU:
a. Apesar desse parecer não ter correlação direta com o cerne da questão controvertida, o entendimento ora firmado repercute parcialmente no tema de que trata;
b. Reconhece a competência dos órgãos militares para promover a “entrega provisória” e a “cessão de uso gratuita” de bens imóveis sem finalidade militar imediata, porém com previsão de utilização futura, em favor de outros órgãos ou entes da Administração Pública, para o atendimento de finalidades públicas ou sociais;
c. Importante definir que a expressão “entrega provisória” deve ser entendida como “guarda provisória”, uma vez que já existe instrumento legal homônimo, previsto no §3º, art. 11, do Decreto nº 3.725/2001, que só é cabível para destinação de bens imóveis pela SPU a órgãos dos três Poderes;
d. Essa nova compreensão do Parecer nº 083/2012/DECOR/CGU/AGU deverá ser esclarecida aos órgãos militares para aplicação nos casos concretos. (grifos nossos)
Visto isso, a cessão de uso gratuita pelas Forças Armadas em favor de pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional, tem como fundamento jurídico o inciso II do art. 18 da Lei nº 9.636/1998 combinado com o Parecer nº 83/2012/DECOR/CGU/AGU, aprovado pelo Despacho do Consultor-Geral da União nº 1702, de 17/12/2012, devendo, contudo, estar inequivocamente comprovado nos autos os requisitos contidos no referido inciso (tratar-se de "...interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional"), o que se verifica no projeto básico e no termo de justificativa de licitação.
No caso em exame, por se tratar de empresa pública federal, a utilização da cessão de uso se ratifica pelo teor do §3º do art. 79 do Decreto-lei nº 9.760/1946:
§3º Havendo necessidade de destinar imóvel ao uso de entidade da Administração Pública Federal indireta, a aplicação se fará sob o regime da cessão de uso. (Incluído pela Lei nº 9.636, de 1998)
À Secretaria do Patrimônio da União compete privativamente a entrega de imóvel da União para uso da Administração Pública Federal direta, competência que lhe foi atribuída pelo art. 79, e seus parágrafos, do Decreto-Lei nº 9.760/1946. Mediante Termo de Entrega transfere-se a administração ou a jurisdição de imóvel próprio nacional a um determinado Órgão vinculado à Administração Pública Federal direta, para destinação específica, dentro das condições nele estabelecidas. O chefe de repartição, estabelecimento ou serviço federal que tenha a seu cargo próprio nacional, não poderá permitir, sob pena de responsabilidade, sua invasão, cessão, locação ou utilização em fim diferente do que lhe tenha sido prescrito.
Dito isso e para fins de aferição do cumprimento da regra de competência, necessária se faz a instrução dos autos com cópia do respectivo Termo de Entrega, visto que a Autoridade que nele consta é que terá, em princípio, a atribuição para formalizar os atos relativos à cessão de uso. Compete, portanto, à Autoridade assessorada indicar os atos de delegação de competência em vigor para os atos administrativos a serem praticados no processo. Verifica-se que tais documentos encontram-se às fls. 20/36 dos autos.
Superada a análise da possibilidade jurídica da BNVC/MB destinar cessão de uso gratuito parcela de área da União sob sua gestão, cabe agora analisar a possibilidade jurídica da INFRAERO de ser destinatária dessa cessão no ano vigente, em virtude do lapso temporal pertinente à legislação eleitoral.
A Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária - INFRAERO, é uma empresa pública federal (personalidade jurídica de direito privado) vinculada ao Ministério da Aeronáutica, criada pela Lei nº 5.862, de 12 de dezembro de 1972 e regulamentada pelo Decreto nº 8.756/2016. Trata-se, portanto, de entidade integrante da administração pública federal indireta.
A questão que se apresenta diz respeito à aplicação da Lei nº 9.504/1997, que estabelece normas para as eleições, à INFRAERO, tendo em vista sua personalidade jurídica de direito privado.
Dispõem o art. 73, inciso VI, alínea "a", e seu §10, ambos da Lei nº 9.507, de 30 de setembro de 1997:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
[...]
VI - nos três meses que antecedem o pleito:
a) realizar transferência voluntária de recursos da União aos Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública;
[...]
§10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)
O Parecer-Plenário nº 002/2016/CNU-DECOR/CGU/AGU (NUP 59000.000294/201426) foi elaborado para esclarecer a aplicabilidade os dispositivos acima reproduzidos:
Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 002/2016
A vedação prevista no art. 73, §10, da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, dirige-se à distribuição gratuita e discricionária diretamente a particulares, incluídas as doações com encargo e cessões, não alcançando os atos vinculados em razão de direito subjetivo do beneficiário e as transferências realizadas entre órgãos públicos do mesmo ente federativo ou as que envolvam entes federativos distintos, observando-se neste último caso o disposto no inciso VI, alínea "a", do mesmo artigo, que veda transferências nos três meses anteriores ao pleito eleitoral. Em qualquer caso, recomenda-se a não realização de solenidades, cerimônias, atos, eventos ou reuniões públicas de divulgação, ou qualquer outra forma de exaltação do ato administrativo de transferência capaz de afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais.
Referências: Art. 73, inciso VI, alínea "a", e § 10, da Lei nº 9.507, de 30 de setembro de 1997. (Grifos nossos)
EMENTA:
DIREITO ELEITORAL. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE BENS PÚBLICOS FEDERAIS EM ANO ELEITORAL. INTERPRETAÇÃO DO ART. 73, § 10, DA LEI 9.504/97.
1. A disposição do art. 73, §10, da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, dirige-se à distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios pela Administração Pública diretamente a particulares, não afetando as transferências realizadas entre entes públicos. A estes casos aplica-se o disposto no art. 73, VI, "a", da mesma lei, vedando-se a destinação de bens a outros entes públicos nos três meses que antecedem o pleito eleitoral. Tal vedação, porém, não impede as doações realizadas entre entidades que integram a mesma esfera de governo, como por exemplo a doação de bem da União a uma autarquia ou fundação pública federal.
2. Não se admite, porém, que a única função do ente público recebedor do bem seja transferi-lo à população diretamente beneficiada, configurando mera intermediação. Por outro lado, isso não obsta a transferência do bem ao ente público para a prática de atos preparatórios que antecederão a efetiva destinação aos beneficiários finais, que só poderá ocorrer fora do período vedado.
3. Não são afetadas pelas vedações da legislação eleitoral as transferências que constituem direito subjetivo do beneficiário, nas quais o agente público não dispõe de margem de discricionariedade.
4. O entendimento aqui exposto alcança doações e cessões, sendo que o encargo ou finalidade da outorga não desnatura, por si só, seu caráter gratuito.
5. Deve-se orientar o gestor a observar o princípio básico de vedação de condutas dos agentes públicos, de forma a não afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais, sugerindo-se que a divulgação do ato seja a mínima necessária ao atendimento do princípio da publicidade formal – divulgação na Imprensa Oficial , não sendo recomendada a realização de qualquer solenidade, tais como celebração de cerimônias simbólicas, atos públicos, eventos, reunião de pessoas para fins de divulgação, enfim, qualquer forma de exaltação do ato administrativo, sob pena de responsabilização do agente público que assim proceder. (Grifos nossos)
Na mesma linha, o ANEXO II – QUADRO COMPARATIVO DOS INSTRUMENTOS ao PARECER n. 00001/2019/CNPAT/CGU/AGU (NUP: 04962.003052/2018-58) registra:
Sujeição à vedação do ano eleitoral: Cessão de uso gratuita: para Estados, DF e Municípios, nos 3 meses antes do pleito (art. 73, inciso VI, alínea “a”, da Lei nº 9.504, de 1997); para entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde, no ano que se realizar eleição (art. 73, §10, da Lei nº 9.504, de 1997).
Não sujeição: Entrega, entrega provisória, cessão de uso, cessão de uso provisória, conforme Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 002/2016 (entidades integrantes da mesma esfera de governo); a guarda provisória, porque não há outorga do direito de uso, mas, apenas assunção do ônus da guarda, conservação e vigilância; cessão onerosa ou em condições especiais, por envolver contraprestação, o que não configura distribuição gratuita.
Das referidas manifestações jurídicas, em apertado resumo, abstrai-se que:
a) a vedação prevista no art. 73, §10, da Lei nº 9.504/1997, que diz respeito à celebração do contrato no ano em que se realizar eleição, dirige-se à distribuição gratuita e discricionária diretamente a particulares, incluídas as doações com encargo e cessões;
b) há exceção na hipótese casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa;
c) não alcança atos vinculados em razão de direito subjetivo do beneficiário, onde o agente público não dispõe de margem de discricionariedade, bem como a guarda provisória, porque não há outorga do direito de uso, mas, apenas, a assunção do ônus da guarda, conservação e vigilância;
d) a vedação do art. 73, inciso VI, alínea “a”, da Lei nº 9.504, de 1997, alcança Estados, DF e Municípios, nos 3 meses antes do pleito, mas não alcança entidades integrantes da mesma esfera de governo.
É necessário, portanto, compreender a participação da INFRAERO no caso concreto, para, então, concluir se está atuando como particular, desenvolvendo atividade econômica própria das empresas privadas, ou como entidade delegatária dos serviços públicos, executando, como atividade-fim, serviços de infraestrutura aeroportuária constitucionalmente outorgados à União pelo art. 21, inciso XII, alínea "c".
Além disso, há de se verificar se a cessão é, concretamente, discricionária e se, efetivamente, fere o pressuposto maior da legislação eleitoral, qual seja, pratica de condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais.
A cessão pretendida tem por objetivo regularizar o uso da área pela INFRAERO, uma vez que o Sistema de Luzes de Aproximação de Pista onde estão instaladas lâmpadas do Aeroporto Internacional de Belém já se encontram na área. Está evidente que a cessão destina-se a beneficiar uma atividade institucional do ente público donatário com o objetivo imediato ou mediato de fazer frente a uma necessidade coletiva.
Salvo melhor juízo, muito em embora, em tese, a cessão de uso, como regra, seja discricionária, na prática, a não regularização da área implicaria na necessidade de remoção imediata do Sistema de Luzes de Aproximação de Pista, proporcionando risco à vida de 9.930 pessoas por dia (movimento médio diário ano 2019), inviabilizando, assim, a operação do aeroporto, atentando contra o interesse público. A discricionariedade, nesse caso, não parece plena e desprovida de responsabilização.
Essas mesmas considerações são relevantes para observar que a cessão não diz respeito a programas de natureza assistencialista, logo transferência patrimonial pretendida não tem o condão de, por si só, afetar a igualdade dos candidatos no pleito eleitoral, pois, como dito, não há inovação com a cessão, mas a regularização de uma situação pré-existente, de relevante interesse público que se destina a beneficiar uma atividade institucional do ente público cessionário que atua como delegatário de serviço público.
No que diz respeito à atuação da cessionária INFRAERO, o Acórdão RE 363412 AgR / BA – BAHIA – STF – Segunda Turma - Relator: Min. CELSO DE MELLO – Julgamento em 07/08/2007 e Publicação em 19/09/2008, esclarece:
E M E N T A: INFRAERO - EMPRESA PÚBLICA FEDERAL VOCACIONADA A EXECUTAR, COMO ATIVIDADE-FIM, EM FUNÇÃO DE SUA ESPECÍFICA DESTINAÇÃO INSTITUCIONAL, SERVIÇOS DE INFRA-ESTRUTURA AEROPORTUÁRIA - MATÉRIA SOB RESERVA CONSTITUCIONAL DE MONOPÓLIO ESTATAL (CF, ART. 21, XII, "C") - POSSIBILIDADE DE A UNIÃO FEDERAL OUTORGAR, POR LEI, A UMA EMPRESA GOVERNAMENTAL, O EXERCÍCIO DESSE ENCARGO, SEM QUE ESTE PERCA O ATRIBUTO DE ESTATALIDADE QUE LHE É PRÓPRIO - OPÇÃO CONSTITUCIONALMENTE LEGÍTIMA - CRIAÇÃO DA INFRAERO COMO INSTRUMENTALIDADE ADMINISTRATIVA DA UNIÃO FEDERAL, INCUMBIDA, NESSA CONDIÇÃO INSTITUCIONAL, DE EXECUTAR TÍPICO SERVIÇO PÚBLICO (LEI Nº 5.862/1972) - CONSEQÜENTE EXTENSÃO, A ESSA EMPRESA PÚBLICA, EM MATÉRIA DE IMPOSTOS, DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL FUNDADA NA GARANTIA DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA (CF, ART. 150, VI, "A") - O ALTO SIGNIFICADO POLÍTICO-JURÍDICO DESSA GARANTIA CONSTITUCIONAL, QUE TRADUZ UMA DAS PROJEÇÕES CONCRETIZADORAS DO POSTULADO DA FEDERAÇÃO - IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DA INFRAERO, EM FACE DO ISS, QUANTO ÀS ATIVIDADES EXECUTADAS NO DESEMPENHO DO ENCARGO, QUE, A ELA OUTORGADO, FOI DEFERIDO, CONSTITUCIONALMENTE, À UNIÃO FEDERAL - DOUTRINA - JURISPRUDÊNCIA - PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - AGRAVO IMPROVIDO. - A INFRAERO, que é empresa pública, executa, como atividade-fim, em regime de monopólio, serviços de infra-estrutura aeroportuária constitucionalmente outorgados à União Federal, qualificando-se, em razão de sua específica destinação institucional, como entidade delegatária dos serviços públicos a que se refere o art. 21, inciso XII, alínea "c", da Lei Fundamental, o que exclui essa empresa governamental, em matéria de impostos, por efeito da imunidade tributária recíproca (CF, art. 150, VI, "a"), do poder de tributar dos entes políticos em geral. Conseqüente inexigibilidade, por parte do Município tributante, do ISS referente às atividades executadas pela INFRAERO na prestação dos serviços públicos de infra-estrutura aeroportuária e daquelas necessárias à realização dessa atividade-fim. O ALTO SIGNIFICADO POLÍTICO-JURÍDICO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA, QUE REPRESENTA VERDADEIRA GARANTIA INSTITUCIONAL DE PRESERVAÇÃO DO SISTEMA FEDERATIVO. DOUTRINA. PRECEDENTES DO STF. INAPLICABILIDADE, À INFRAERO, DA REGRA INSCRITA NO ART. 150, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO. - A submissão ao regime jurídico das empresas do setor privado, inclusive quanto aos direitos e obrigações tributárias, somente se justifica, como consectário natural do postulado da livre concorrência (CF, art. 170, IV), se e quando as empresas governamentais explorarem atividade econômica em sentido estrito, não se aplicando, por isso mesmo, a disciplina prevista no art. 173, § 1º, da Constituição, às empresas públicas (caso da INFRAERO), às sociedades de economia mista e às suas subsidiárias que se qualifiquem como delegatárias de serviços públicos. (grifos nossos).
Esse entendimento é recorrente nas decisões proferidas nos tribunais, como se verifica no AI nº 0009109-84.2016.4.02.0000 – 4ª Turma Especializada – TRF da 2ª Região – Relator Des. Luiz Antônio Soares – julgamento em 17/11/2016 e publicação em 22/11/2016:
[....]
4. A INFRAERO foi criada pela Lei nº 5.862/72, sob a forma de empresa pública, tendo por objeto implantar e administrar a infraestrutura aeroportuária, serviço público que, nos termos do 1 artigo 21, XII, alínea "c", da Constituição Federal, é de competência exclusiva da União Federal. Logo, a INFRAERO não desenvolve atividade econômica própria das empresas privadas, mas presta serviço público monopolizado de competência da União Federal, submetendo-se, portanto, ao regime jurídico de direito público, inclusive no que toca à questão da imunidade recíproca - CF, artigo 150, VI, "a" - (RE-AgR 363412, CELSO DE MELLO, STF).
Nota-se, portanto, que o STF e os Tribunais reconhecem que a INFRAERO, ainda que criada por lei com personalidade jurídica de direito privado, não desenvolve atividade econômica própria das empresas privadas, mas executa, como atividade-fim, em regime de monopólio, serviços de infraestrutura aeroportuária constitucionalmente outorgados à União Federal, qualificando-se, em razão de sua específica destinação institucional, como entidade delegatária dos serviços públicos a que se refere o art. 21, inciso XII, alínea "c", da Lei Fundamental. Ressalta-se que esse reconhecimento tem o condão de conferir à INFRAERO imunidade recíproca prevista no art. 150, inciso VI, "a", da Constituição.
No caso concreto, a finalidade da cessão enquadra-se no teor dessas decisões, logo, salvo melhor juízo, parece que a INFRAERO não pode ser considerada “particular”, condição definida na Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 002/2016 para esclarecer a vedação prevista no art. 73, §10, da Lei nº 9.504/1997.
Nessa linha de raciocínio, não sendo a INFRAERO “particular”, também não sendo ente dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a vedação do ano eleitoral não alcança a cessão de uso a ser celebrada com a BNVC/MB, pois ambas são integrantes da mesma esfera de governo.
Ocorre que a redação da Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 002/2016 estabelece que a vedação não alcança “... as transferências realizadas entre órgãos públicos do mesmo ente federativo...”. O item 1 da Ementa do Parecer-Plenário nº 002/2016/CNU-DECOR/CGU/AGU, por sua vez, cita que a vedação “...não impede as doações realizadas entre entidades que integram a mesma esfera de governo, como por exemplo a doação de bem da União a uma autarquia ou fundação pública federal.”
Nesse aspecto, parece que o texto da ON restringiu as transferências realizados apenas entre órgãos públicos do mesmo ente federativo, excluindo a administração federal indireta, contradizendo o item 1 da ementa acima transcrito.
Outro ponto relevante que se destaca é que o Parecer-Plenário nº 002/2016/CNU-DECOR/CGU/AGU, das entidades da administração pública federal indireta, cita, de forma expressa, apenas as autarquias e fundações públicas, preterindo as empresas públicas. Há de se esclarecer trata-se de silêncio eloquente.
Com relação à citada Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 002/2016, e em razão das conclusões obtidas no exame do presente no caso concreto, sugere-se à Coordenação da e-CJU/Patrimônio que submeta o presente parecer ao DECOR solicitando, caso entenda pertinente, que esclareça as questões aventadas nos parágrafos 43 a 47.
Assim, parece relevante uma apreciação do Parecer-Plenário nº 002/2016/CNU-DECOR/CGU/AGU, e a consequente repercussão na Orientação Normativa CNU/CGU/AGU nº 002/2016, em face do teor do presente parecer, para concatenação com a hipótese ora surgida, decorrente da análise do caso concreto submetido à análise nestes autos, se o entendimento ora exposto for ratificado.
Inicialmente, diante do teor do item 4 do Termo de Justificativa de Dispensa de Licitação (fl. 38), importa esclarecer que, nos termos da Orientação Normativa CNU/CGU nº 01, de 22 de junho de 2016 (NUP 00402.000662/2015-41) a modalidade pregão é obrigatória para a cessão de uso para o exercício de atividades de apoio, prevista no art. 20 da Lei nº 9.636/1998, não sendo o caso dos autos, que trata de cessão de uso gratuito previsto no art. 18 do mesmo diploma legal. Caso o objeto do presente processo necessitasse de realização de certame, o mesmo se daria pela modalidade concorrência, pelo maior preço oferecido, na base mínima do valor fixado, nos termos do art. 95, parágrafo único, do Decreto-lei nº 9.760/1946.
O termo de justificativa de dispensa de licitação (fls. 37/40) não apresenta o fundamento legal que o administrador entende adequado para a cessão pretendida, ou seja, não cita o artigo que ampara a dispensa de licitação que entende cabível, o que deverá ser providenciado pelo órgão consulente.
De qualquer forma, a dispensa de licitação para a cessão de uso do imóvel encontra fundamento no inciso I, do § 2º, do art. 17 da Lei nº 8.666/93, segundo o Parecer n° 0837 – 5.4.1/2012/DPC/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP 05550.000031/2010-38).
O ato de dispensa deverá ser publicado na imprensa oficial no prazo de 5 dias, nos termos do art. 26, caput, da Lei nº 8.666/1993, o que deverá ser providenciado pela autoridade competente. Recomenda-se, por cautela, que seja registrada nos autos, mediante despacho pormenorizado, manifestação acerca da oportunidade e conveniência da cessão e a razão da escolha do cessionário, para demonstrar, inequivocamente, tratar-se de dispensa de licitação.
Muito embora esteja reconhecida a possibilidade das Forças administrarem os imóveis da União a elas jurisdicionados, sem a participação da SPU na avaliação no mérito da destinação, em sendo a SPU órgão técnico especializado da União com a atribuição legal específica de administrar os referidos bens, recomenda-se que seja utilizado como norte para a elaboração do contrato de cessão de uso gratuita o Anexo IV da ON– GEAPN– 002, de 24/01/01, com as devidas adaptações ao caso concreto.
A minuta deverá ser aprimorada no seguinte aspecto:
a) Como já visto no parágrafo 16 dessa peça, contrato relativo a imóvel da União é regido pela legislação patrimonial, aplicando-se a Lei nº 8.666/1993 subsidiariamente. Ocorre que a minuta está adstrita a Lei Licitatória, deixando de abordar fundamentos importantes da legislação patrimonial, presentes na minuta constante do Anexo IV da ON– GEAPN– 002, de 24/01/01. Nesse sentido propõe-se a inserção das seguintes cláusulas, já parcialmente adaptadas ao caso concreto
CLÁUSULA [...] – neste ato, a OUTORGANTE formaliza a cessão do imóvel ao OUTORGADO, que se incumbirá da administração, uso, conservação e demais responsabilidades sobre as despesas oriundas da unidade destinada a ...............................................................; CLAUSULA [...] – que, com fundamento no o inciso II do art. 18 da Lei nº 9.636/1998 combinado com o Parecer nº 83/2012/DECOR/CGU/AGU, aprovado pelo Despacho do Consultor-Geral da União nº 1702, de 17/12/2012, é feita a Cessão de Uso Gratuito, do imóvel antes descrito e caracterizado, que se destina a ..............................................................................................; que terá sua vigência iniciada a partir da data da assinatura deste instrumento e término previsto ..................................., a critério e conveniência do Comando da Marinha, mediante celebração de Termo Aditivo, não tendo a contratada direito subjetivo à prorrogação .
CLÁUSULA [...] – considerar-se-á rescindido o presente Contrato de Cessão, independente de ato especial, retornando o imóvel à posse da OUTORGANTE Cedente, sem direito o OUTORGADO Cessionário, a qualquer indenização, inclusive por benfeitorias realizadas, nos seguintes casos: a) se ao imóvel, no todo ou em parte, vier a ser dada utilização diversa da que lhe foi destinada; b) se houver inobservância do prazo previsto no ato autorizativo da Cessão; c) se ocorrer inadimplemento de cláusula contratual; d) se o OUTORGADO Cessionário renunciar à Cessão, deixar de exercer as suas atividades específicas, ou ser extinto; e) se, em qualquer época, a OUTORGANTE Cedente necessitar do imóvel para seu uso próprio, ressalvada, em tal caso, a indenização por benfeitorias necessárias, de cuja realização tenha sido dado o prévio e indispensável conhecimento da União.
CLÁUSULA [...] – a presente cessão é feita nas seguintes condições: a) cessado o prazo estabelecido na Cláusula [...], reverterá o próprio nacional à administração da OUTORGANTE, independentemente de ato especial; b) a cessão fica sujeita à fiscalização periódica por parte da cedente; c) não será permitida a invasão, cessão, locação ou utilização do imóvel para fim diverso do previsto na Cláusula .........; d) qualquer ampliação ou alteração do imóvel cedido deve, obrigatoriamente, ser comunicada prévia e formalmente à Base ......, incumbindo ao OUTORGADO, após a autorização, encaminhar à cedente a documentação necessária à averbação no Cartório de Registro de Imóveis competente, bem como a certidão comprobatória de sua ocorrência. CLÁUSULA [...] – que verificado o descumprimento de quaisquer das condições mencionadas nas letras “a”, “b”, “c” e “d” da Cláusula [...], serão fixadas as responsabilidades decorrentes dos fatos apurados, resguardados os imperativos legais e os preceitos da hierarquia funcional
CLÁUSULA [...] - Os direitos e as obrigações aqui mencionados não excluem outros, explícita ou implicitamente, decorrente deste contrato e da legislação pertinente, especialmente quanto à rigorosa observância das leis de preservação ambiental.
b) Rateio de despesas: sugere-se acrescentar a previsão de rateio (proporcionalmente à área com uso cedido) da Taxa de Coleta Domiciliar de Lixo (TCDL), cobrada anualmente do órgão e devida ao Município, estabelecendo-se adequada disciplina quanto ao manejo de resíduos sólidos (lixo extraordinário);
c) No que toca ao prazo de vigência, deve ser desde logo esclarecida a questão das possíveis prorrogações, a critério e conveniência do órgão consulente, explicitando-se, se for o caso, que o encerramento se dará, impreterivelmente, findo o prazo máximo estipulado, sem prejuízo da precariedade da cessão, que poderá ser extinta pela Administração a qualquer tempo, de modo justificado.
d) Recomenda-se que sejam inseridas no contrato as seguintes cláusulas de responsabilidade:
I - responsabilizar-se por quaisquer usos ou intervenções feitas nas áreas cedidas, devendo zelar pela integridade física dos bens recebidos em cessão, obrigando-se a utilizar das normas de direito para a proteção desses bens contra a ameaça de turbação ou esbulho;
II - solicitar à Superintendência do Patrimônio da União a averbação em cadastro próprio e na matrícula do imóvel quando houver incorporação de benfeitorias nas áreas cedidas;
III - reverter o bem da União em idênticas ou melhores condições do que as recebidas, ficando as benfeitorias realizadas pelo outorgado cessionário na área cedida incorporadas aos bens da União, ao final do contrato;
IV - obter autorizações, licenças ou alvarás para a implantação, funcionamento e manutenção do empreendimento, bem como suas renovações, se necessárias, devendo mantê-las em situação regular durante o período da cessão;
V - zelar pelo imóvel cedido, realizar sua fiscalização, conservação e guarda, bem como obedecer às normas e legislações pertinentes sob pena de indenizar, objetivamente, quaisquer danos causados provenientes das atividades desenvolvidas no imóvel objeto desta cessão, a usuários ou terceiros, inclusive eventuais danos ambientais na forma disciplinada na legislação ambiental vigente;
VI - permitir o livre acesso às instalações do empreendimento, de servidores do órgão consulente e de outros órgãos com jurisdição sobre a área do imóvel cedido quando devidamente identificados e em missão de fiscalização;
e) Recomenda-se inserir no contrato, como regra de regência, o inciso II do art. 18 da Lei nº 9.636/1998 combinado com o Parecer nº 83/2012/DECOR/CGU/AGU, aprovado pelo Despacho do Consultor-Geral da União nº 1702, de 17/12/2012, aplicando-se a Lei nº 8.666/1993 subsidiariamente.
f) Na cláusula que trata da rescisão recomenda-se inserir a previsão de vistoria a ser reduzida a termo assinado pelo representante legal da cessionária, que traduza fielmente o estado da parcela do imóvel quando da celebração do contrato.
g) Deverá ser inserida na cláusula acima, parágrafo tratando da retomada/desmobilização do imóvel, definindo prazo para desocupação, multa pelo atraso, remoção para depósito às expensas do cessionário.
h) Recomenda-se a seguinte redação para a Cláusula Décima Quarta - Foro:
Para dirimir quaisquer dúvidas ou litígios na execução deste contrato de cessão de uso, e com fundamento na Portaria AGU nº 1.281, de 27 de setembro de 2007, na Portaria AGU nº 1.099, de 28 de julho de 2008 e no Decreto nº 10.608, de 25 de janeiro de 2021, as partes se comprometem, previamente, a buscar uma solução administrativa na Câmara de Mediação e Conciliação da Administração Federal - CCAF. Caso reste inviabilizada a conciliação, fica eleito o Foro da Justiça Federal da Seção Judiciária [...], para dirimir os conflitos, renunciando-se a qualquer outro por mais privilegiado que seja.
i) Recomenda-se que se promova a conferência final em todos os atos e termos bem como dos documentos de identificação dos signatários, a fim de sanar eventuais omissões, erros materiais, gramaticais, de dados ou técnica de redação, assim como citação de normativos eventualmente revogados, posto que a instrução processual, a conferência de dados e a indicação dos normativos específicos em vigor, que respaldam a prática do ato, são atribuições próprias do órgão assessorado.
As normas citadas encontram-se, na sua maior parte, com o recurso de hiperlink disponível, para acesso imediato pela internet.
Ressalta-se que não compete à e-CJU avaliar questões de ordem fática, técnica ou de cálculo, responsabilizando-se os signatários dos documentos juntadas pelo teor de suas informações perante aos Órgãos de controle, especialmente no que diz respeito às justificativas para o afastamento do certame, inteligência da Boa Prática Consultiva BPC/CGU/AGU nº 7.
Cumpre realçar que, caso o Administrador discorde das orientações emanadas neste pronunciamento, deverá carrear aos autos todas as justificativas que entender necessárias para embasar o ajuste pretendido e dar prosseguimento, sob sua exclusiva responsabilidade perante eventuais questionamentos dos Órgãos de Controle, consoante o inciso VII do art. 50 da Lei nº 9.784/1999. Nesse caso, não haverá a necessidade de retorno do feito a esta Consultoria Jurídica da União.
Alerta-se, por fim, quanto ao teor da Boa Prática Consultiva BPC/CGU/AGU nº 5 (sem grifos no original):
Ao Órgão Consultivo que em caso concreto haja exteriorizado juízo conclusivo de aprovação de minuta de edital ou contrato e tenha sugerido as alterações necessárias, não incumbe pronunciamento subsequente de verificação do cumprimento das recomendações consignadas.
Diante do exposto, uma vez atendidas as recomendações apontadas nos itens 14, 51, 53, 54 e 55, e resguardados o juízo de conveniência e oportunidade do Administrador, nos limites da lei, e as valorações de cunho econômico–financeiro, ressalvadas, ainda, as questões de ordem fática, técnica e de cálculo, ínsitos à esfera administrativa, essenciais até mesmo para a devida atuação dos órgãos de controle, feito está apto para a produção dos seus regulares efeitos, tendo em vista não ter sido verificado defeito insanável, com relação à forma legal, que pudesse macular o procedimento.
Solicita-se ao Protocolo que devolva ao órgão consulente para ciência e providências cabíveis.
É o parecer, de caráter opinativo, que se submete à consideração superior, especialmente no tocante aos itens 48 e 49.
Rio de Janeiro, 13 de maio de 2022
(assinado eletronicamente)
RICARDO COUTINHO DE ALCÂNTARA COSTA
ADVOGADO DA UNIÃO
SIAPE 1332674 - OAB-RJ 110.264
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 63042000505202211 e da chave de acesso 5d0ee68a