ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
PARECER N. 104/2022/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
PROCESSO N. 19739.119311/2022-69
ORIGEM: SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO CEARÁ - SPU/CE
EMENTA:
I - Direito Administrativo. Patrimônio da União. Incorporação de imóvel ao domínio da União, localizado na na Rua Canário da Terra, S/N Edson Queiroz, Fortaleza/Ce, com área 85.929,51m²;
II - Fundamentação: Constituição da República, Art. 20, IV. Lei 9.636/1998, Art. 1º. Instrução Normativa SPU nº 2, de 2018;
IV – Possibilidade de prosseguimentos, desde que atendida a recomendação deste parecer, sem necessidade de retorno para fins de nova análise jurídica.
I - RELATÓRIO
Os presentes autos eletrônicos foram distribuídos ao advogado signatário, no dia 25 de maio de 2022, para análise e emissão de parecer, nos termos do Art. 131 da Constituição da República, do Art. 11 da Lei Complementar nº 73/1993, do Art. 8º-F da Lei nº 9.028/1995 e do art. 19 do Ato Regimental nº 05/2007, da Advocacia-Geral da União.
O acesso aos autos deu-se por link ao Sistema SEI, em Seq. 02 do Sistema Sapiens: https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=2024278&infra_hash=19179be2ceed5f38dc678d1f12a38df4
Para facilitar a compreensão e o entendimento do Administrador, o qual consiste no público-alvo desta manifestação, utilizar-se-á, sempre que possível, a referência documental do Sistema SEI.
Trata-se de solicitação formulada pelo através de Nota Informativa SEI nº 17797/2022/ME (24932368), acerca de análise jurídica de minuta de Termo de Incorporação de imóvel (24924563) localizado na Rua Canário da Terra, S/N Edson Queiroz, Fortaleza/CE, nos seguintes termos:
"Nota Informativa SEI nº 17797/2022/ME
Processo: 19739.119311/2022-69
Assunto: Abertura de matrícula em nome da União – Rua Canário da Terra, S/N Edson Queiroz, Fortaleza/Ce.
Interessado: GOVERNO DO ESTADO DO CEARÁ - DESTINAÇÃO- RESIDENCIAL YOLANDA VIDAL QUEIROZ.
1. Trata o presente processo da incorporação à União de área de domínio da União localizada na Rua Canário da Terra, S/N Edson Queiroz, Fortaleza/Ce, com área 85.929,51m², e em processo de regularização de destinação para o GOVERNO DE ESTADO DO CEARÁ, por meio do processo SEI 04988.001474/2012-13.
2. Para as tratativas de incorporação ao patrimônio da União, destaca-se o contido na Instrução Normativa SPU/SEDDM/ME nº 28, de 26 de abril de 2022:
Art. 49. Após o esgotamento dos recursos administrativos, a Superintendência providenciará a incorporação dos imóveis da União, conforme legislação vigente e na forma do regulamento interno.
3. Em relação à legislação vigente, dispõe a Lei 9.636, de 15 de maio de 1998, o seguinte:
Art. 2o Concluído, na forma da legislação vigente, o processo de identificação e demarcação das terras de domínio da União, a SPU lavrará, em livro próprio, com força de escritura pública, o termo competente, incorporando a área ao patrimônio da União.
Parágrafo único. O termo a que se refere este artigo, mediante certidão de inteiro teor, acompanhado de plantas e outros documentos técnicos que permitam a correta caracterização do imóvel, será registrado no Cartório de Registro de Imóveis competente.
4. Destaca-se também o contido na Nota Informativa 12752 (SEI nº 15415849), por meio do qual a Coordenação-Geral de Incorporação do Patrimônio - CGIPA apresenta a interpretação dos itens do PARECER nº 655/2020 (10330508) emitido pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional - PGFN, que podem ser utilizados pelas superintendências do patrimônio da União no âmbito dos processos de incorporação:
Nota Informativa 12752 (SEI nº 15415849)
Do registro cartorial após a lavratura do termo de incorporação
Enunciado 10: Os registros de propriedade particular de imóveis situados em terrenos de marinha não são oponíveis à União. (item 54).
Enunciado 11: Não se caracteriza como condomínio entre a União e terceiros a situação em que este tem o registro sobreposto à área que posteriormente veio a ser declarada como sendo originalmente da União. (item 52).
Enunciado 12: Devem ser cancelados os registros indevidamente emitidos em favor de particulares sobre áreas de Domínio da União sob gestão da SPU, devendo ser aplicado a todos os casos, por analogia, o procedimento do Art. 18-E do Decreto-Lei n° 9760/1946. (item 55).
Orientações sobre ao itens 52 a 55: A PGFN entende que não cabe simples averbação em matrícula de titularidade de terceiros para indicar a existência de linha demarcatória ou que determinada área é de domínio da União, sendo exigido o pedido de cancelamento à luz do Art. 18-E do DL 9760/1946. No entanto, recomendamos aplicação do item 55 em caso de recusa do pedido de cancelamento pelo oficial da serventia, onde poderá ser solicitada a averbação em conjunto com a suscitação de dúvida registral.
Sobre o item 52, nos casos em que a área declarada como de domínio da União se sobrepõe à área registrada em nome de particular, a PGFN entende não existir condomínio, devendo o título do particular ser cancelado. Sobre esse ponto, recomendamos que, ao pedir o cancelamento ao oficial de registro de imóveis, seja dada a possibilidade de o particular retificar sua área para retirar a parcela da União. Não sendo possível, proceda-se o cancelamento na forma do Art. 18-E do DL 9760/1946.
5. Considerando o exposto no art. 49 da IN nº 28/2022 e no art. 2º da Lei nº 9.636/1998, bem como na Nota Informativa 12752 (SEI nº 15415849), informa-se que os procedimentos de demarcação na região onde localiza-se o imóvel foram realizados no processo nº 30-79-049610-05, tendo sido a Linha de Preamar média homologada.
6. Assim sendo, foram confeccionados os documentos técnicos que caracterizam o imóvel como terreno de marinha e acrescido, quais sejam, Memorial Descritivo SPU-CE-NUCIP (SEI 24891913) e Planta Dendê assinado (SEI nº 24979521).
7. Outrossim, elaborou-se minuta do Minuta de Termo de Incorporação Dendê (SEI 24924563) a ser submetida, para análise e parecer, à Consultoria Jurídica da União no Estado do Ceará - CJU/CE.
8. Dessa forma, encaminhamos os autos para apreciação e assinatura do Ofício 150283 (SEI 24924579) pelo Sr. Superintendente, e à SPU-CE-COORD para disponibilização do acesso externo à CJU/CE.
À consideração superior."
Constam dos autos os seguintes documentos:
Processo / Documento | Tipo | Data | Unidade | |
---|---|---|---|---|
24883284 | Planta Dendê Incorporar - sem assinatura | 17/05/2022 | SPU-CE-NUCIP | |
24891913 | Memorial Descritivo | 18/05/2022 | SPU-CE-NUCIP | |
24924563 | Minuta de Termo de Incorporação Dendê | 18/05/2022 | SPU-CE-NUCIP | |
24924579 | Ofício 150283 | 18/05/2022 | SPU-CE-NUCIP | |
24924715 | Formulário | 18/05/2022 | SPU-CE-NUCIP | |
24932368 | Nota Informativa 17797 | 19/05/2022 | SPU-CE-NUCIP | |
24979521 | Planta Dendê assinado | 20/05/2022 | SPU-CE-NUCIP | |
25012813 | Despacho | 23/05/2022 | SPU-CE-NUCIP | |
25062711 | Despacho | 24/05/2022 | SPU-CE |
É o breve Relatório.
II – FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER
A presente manifestação jurídica tem o escopo de assessorar a autoridade competente para a prática do ato, para que dele não decorra nenhuma responsabilidade pessoal a ela, e também para que seja observado o princípio da legalidade e os demais que norteiam a atuação da Administração.
Desta forma, cercando-se a autoridade de todas as cautelas para a prática do ato, e documentando-as nos autos, a princípio cessa a sua responsabilidade pessoal por eventuais decorrências não satisfatórias.
Nossa atribuição é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar alguma providência para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem, em seu juízo discricionário, compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a cautela recomendada.
Disso se conclui que parte das observações aqui expendidas não passam de recomendações, com vistas a salvaguardar a autoridade administrativa assessorada, e não vinculá-la. Caso opte por não acatá-las, não haverá ilegalidade no proceder, mas simples assunção do risco. O acatamento ou não das recomendações decorre do exercício da competência discricionário da autoridade assessorada.
Já as questões que envolvam a legalidade, de observância obrigatória pela Administração, serão apontadas, ao final deste parecer, como óbices a serem corrigidos ou superados. O prosseguimento do feito, sem a correção de tais apontamentos, será de responsabilidade exclusiva do órgão, por sua conta e risco.
Por outro lado, é certo que a análise dos aspectos técnicos (não jurídicos) não está inserida no conjunto de atribuições/competências afetas a esta e-CJU/Patrimônio, a qual não possui conhecimento específico nem competência legal para manifestar-se acerca de questões outras que aquelas de cunho estritamente jurídico, cabendo ao órgão patrimonial a responsabilidade pela aferição do imóvel ocupado e sua avaliação, pelo exame dos documentos cartoriais referentes a ocupação primitiva, a cadeia sucessória e a detenção física nas hipóteses demandadas, atestando a satisfatoriedade da documentação exibida, anexando aos autos as comprovações pertinentes, de acordo com o preceituado no Enunciado nº 07 do MANUAL DE BOAS PRÁTICAS CONSULTIVAS DA CGU/AGU, no sentido de que o Órgão Consultivo deve evitar "(...) posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade".
III - MÉRITO
Constituem bens da União, nos termos do Art. 20 da Constituição da República:
"Art. 20. São bens da União:
[...]
VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;"
O Decreto-Lei 9.760/1946 estatui que:
Art. 1º Incluem-se entre os bens imóveis da União:
[...]
a) os terrenos de marinha e seus acrescidos ;"
A Lei 9.636/1998 dispõe que:
"Art. 1º É o Poder Executivo autorizado, por intermédio da Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, a executar ações de identificação, de demarcação, de cadastramento, de registro e de fiscalização dos bens imóveis da União e a regularizar as ocupações desses imóveis, inclusive de assentamentos informais de baixa renda, e poderá, para tanto, firmar convênios com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios em cujos territórios se localizem e, observados os procedimentos licitatórios previstos em lei, celebrar contratos com a iniciativa privada."
As prescrições da Instrução Normativa nº 22, de 2017 não são aplicáveis à incorporação sob análise, por força da norma contida no Parágrafo único do Art. 1º do aludido regulamento:
"Art. 1º A aquisição, a incorporação e a regularização patrimonial de bens imóveis em nome da União obedecerão aos procedimentos técnicos e administrativos estabelecidos nesta Instrução Normativa - IN, em consonância com a legislação vigente e os princípios aplicáveis à Administração Pública.
Parágrafo único. Não são alcançadas por esta IN as atividadesde incorporação de imóveis atribuídos à União pelos incisosII a XI do art. 20 da Constituição Federal."
A Instrução Normativa SPU nº 2, de 2018 disciplina a identificação de bens da União, mencionados nos incisos III, IV, VI e VII do Art. 20 da Constituição Federal:
Art. 1º A caracterização e/ou identificação pela Secretaria do Patrimônio da União - SPU das áreas de domínio da União sob sua gestão, relacionadas nos incisos III, IV, VI e VII do art. 20 da Constituição Federal de 1988 - CF/88, obedecerão ao disposto nesta Instrução Normativa - IN, em consonância com a legislação vigente e os princípios aplicáveis à Administração Pública.
§1º São bens da União abrangidos por esta IN:
[...]
IV - os terrenos de marinha e seus acrescidos.
[...]
Art. 2º Para os efeitos desta IN entende-se por:
[...]
III - áreas de domínio indubitável da União: são aquelas cujas características físico-ambientais e identidade espacial, por si, são suficientes para vincula-las ao domínio patrimonial da União - estabelecido no Art. 20 da Constituição Federal de 1988. Por tais características inerentes, decorre a prescindibilidade do processo de demarcação.
[...]
VI - caracterização do Patrimônio: conjunto de instrumentos técnicos administrativos de competência da SPU objetivando o levantamento das características espaciais, fisiográficas e ecológicas, considerando-se a dinâmica ambiental de forma integrada, de determinada área identificada como sendo da União, a partir dos aspectos definidos em lei;
[...]
IX - demarcação: procedimento de delimitação das áreas de domínio da União caracterizadas como Terrenos de Marinha ou Terrenos Marginais, cujo rito legal é posto pelos artigos 9º a 14 do Decreto-Lei 9.760, de 5 de setembro de 1946;
[...]
XII - identificação do Patrimônio: conjunto de procedimentos técnicos, legais e administrativos que visam subsidiar a atuação da SPU em determinada área vinculada ao domínio constitucional da União a partir de sua caracterização territorial e dos aspectos definidos em lei;
[...]
Art. 25 Constituem bens da União relacionados nesta IN e que necessitam de processo de demarcação tradicional para a sua adequada individuação, os terrenos de marinha, os terrenos marginais e as terras interiores.
Subseção I
Dos terrenos de marinha
Art. 26 A identificação e caracterização dos terrenos de marinha e acrescidos obedecerão ao disposto no inciso VII do art. 20 da CF/88, nos arts. 1º, alínea "a" e nos arts. 2º, 3º e 9º a 14 do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946.
§1º São terrenos de marinha, os que em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da Linha do Preamar Médio de 1831, nos termos do art. 2º do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946:
§2º Incluem-se no domínio da União:
a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés; e,
b) os que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés.
§2º São terrenos acrescidos de marinha os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha.
§3º A demarcação dos terrenos de marinha seguirá o disposto nos arts. 9º a 14 do Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, e em instrução normativa vigente, da Secretaria do Patrimônio da União (art. 19 do Decreto nº 3.725, de 10 de janeiro de 2001)
§4º Ficam confirmadas as demarcações de terrenos de marinha com fundamento em lei vigente na época em que tenham sido realizadas, nos termos do art. 202 do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946."
Conforme disposto nas normas supracitadas, em confrontação com as informações de natureza técnica (24891913), segundo as quais, o imóvel consiste em terreno de marinha e acrescido de marinha.
Os terrenos de marinha e acrescidos, nos termos da legislação já citada e da jurisprudência, exigem o competente procedimento de demarcação, com vistas à individuação dos imóveis, conforme Supremo Tribunal Federal em Recurso Extraordinário nº 636199, Pleno, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe: 03/08/2017.
Tendo em vista as características do imóvel, segundo os documentos técnicos, o procedimento de demarcação foi realizado no processo nº 30-79-049610-05, o qual não veio a ser objeto da presente análise. Presume-se como verdadeira tal informação carreada pela Nota Informativa SEI nº 17797/2022/ME (24932368).
A minuta de Termo de Incorporação encontra-se adequada à finalidade a que se pretende e à legislação de regência.
IV - CONCLUSÃO
Em face do exposto, excluídos os aspectos técnicos, administrativos, de cálculos, e o juízo de conveniência e oportunidade, os quais fogem da competência desta análise jurídica, opina-se pela possibilidade de prosseguimento do feito, com a celebração do Termo de Incorporação, devidamente analisado e considerado apto, sob os aspectos jurídicos.
Rio de Janeiro, 07 de junho de 2022.
PAULO KUSANO BUCALEN FERRARI
ADVOGADO DA UNIÃO
SIAPE 1332679 OAB/RJ 110.939
A consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante a utilização do Número Único de Protocolo (NUP) 19739.119311/2022-69 e da chave de acesso 83c13184.