ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00569/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 19739.139610/2021-39
INTERESSADOS: UNIÃO - SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM SERGIPE - SPU/SE
ASSUNTOS: PATRIMONIO DA UNIAO. TRANSFERENCIA DE TITULARIDADE DE IMOVEL DA UNIAO
EMENTA: PATRIMÔNIO DA UNIÃO. REGIME DE OCUPAÇÃO DO IMOVEL
1. TRANSMISSÃO POR SUCESSÃO.
2. TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE DE IMÓVEL DA UNIÃO. NECESSIDADE DE COMUNICAÇÃO NO PRAZO LEGAL E NORMATIVO.
3. MULTA POR DESCUMPRIMENTO.
4. CLASSIFICAÇÃO: RECEITA PATRIMONIAL.
5. MODIFICAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. IMPOSSIBILIDADE ANTE A AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL O QUE PODE CONFIGURAR RENÚNCIA DE RECEITA.
6. LEI Nº 101, DE 2000 - LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL.
7. PARECER JURIDICO PELO INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE CANCELAMENTO DA MULTA OU DE REVISÃO DO SEU VALOR.
Trata de processo eletrônico oriundo da Superintendência do Patrimônio da União em Sergipe/SE cujo objeto consiste em obter manifestação desta Consultoria Jurídica especializada quanto a cobrança de multa de transferência e o seu vaLor, em virtude dos fatos narrados no OFÍCIO SEI Nº 207231/2022/ME, 25 de julho de 2022 (SEI 26646910), ou seja:
"Assunto/Objeto: Manifestação quanto a devida cobrança da Multa de Transferência.
Tratam os autos de pedido de revisão da multa de transferência, feita por JOÃO FREIRE PRADO, referente ao Imóvel situado na Avenida Beira Mar, nº 700, Bairro 13 de julho, Aracaju/SE, cadastrado sob o RIP 3105.0005262-60, em regime de ocupação, adquirido através de formal de partilha, datado de 24/08/2020.
Alega o interessado, em apertada síntese, que a imposição da multa de transferência é indevida, uma vez que o art. 3º, §4º, do Decreto Lei nº 2398/87 aplica-se apenas à transação onerosa e aos imóveis em regime de aforamento, sendo que seu imóvel está cadastrado em regime de ocupação e se trata de transação não onerosa (formal de partilha).
Importante ressaltar, que o art. 3º do Decreto-Lei 2398/87 dispõe que a transferência onerosa, entre vivos do domínio útil e da inscrição de ocupação dependerá do prévio recolhimento do laudêmio pelo vendedor. No caso em tela, realmente se trata de transação não onerosa (formal de partilha), por essa razão não cabe a cobrança do laudêmio.
Quanto a aplicação da multa de transferência, os §4º e § 5º, do art. 3º, do supracitado diploma legal, dispõem, respectivamente, que concluída a transmissão (sem especificar se onerosa ou não), o adquirente deverá requerer ao órgão local da SPU, no prazo de 60 (sessenta) dias, que providencie a transferência dos registros cadastrais para o seu nome, observando-se no caso de imóvel aforado , o disposto no art.116, do Decreto -Lei 9760/46. A não observância do prazo acima estipulado sujeitará o adquirente à multa de 0,50%, por mês ou fração, sobre o valor do terreno, excluída as benfeitorias.
No caso em tela, o adquirente requereu a transferência 9 (nove) meses após ter realizado a transmissão do imóvel, junto ao cartório (Data do Formal de Partilha : 24/08/2020 - Data do Requerimento de Transferência: 14/10/2021).
Ante o exposto, encaminhamos os presentes autos para análise e manifestação quanto a devida cobrança da Multa de Transferência."
Os autos foram encaminhados para este NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO, Órgão consultivo integrante da estrutura da Advocacia Geral da União competente para assessorar a Superintendência do Patrimônio da União em Sergipe/SE, com fulcro na Lei Complementar nº 73, de 1993, artigo 8-F da Lei nº 9.028, de 12 de abril de 1995, e Portaria AGU nº 14, de 23 de janeiro de 2020, encontrando-se instruído com os seguintes principais documentos lançados no sistema SEI, cujo acesso foi autorizado pelo Órgão assessorado para possibilitar a presente análise:
- certidão de inteiro teor da matrícula 20898 da 4ª. Circunscrição Imobiliária de Aracaju/SE, de 10 de maio de 2021 (SEI 19689109 )
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Anexo versao_1_Certidão de casamento ou de união es |
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Anexo versao_1_Certidão de casamento ou de união es |
19689172 |
Requerimento versao_1_SE02807_2021.pdf |
22648608 |
Despacho |
22649989 |
Anexo - Ficha Cadastral e Financeira - SIAPA |
22650034 |
Termo de Encerramento de Processo Eletrônico |
26212725 |
Anexo Pedido de Reconsideração SPU |
26212733 |
Procuração |
26212973 |
Despacho de Providências |
26290207 |
Despacho |
26528812 |
Despacho |
26618588 |
Anexo - Ficha Cadastral e Financeira - SIAPA |
26646910 |
Ofício 207231 |
26661147 |
despacho |
Como se denota, o Requerente, João Freire Prado, se insurge, por intermédio do seu procurador (procuração SEI 26212733), contra a imposição de multa de transferência, com amparo nos argumentos expendidos no pedido de revisão, juntado no processo SEI 26212725.
A citada multa de transferência refere-se ao imóvel acrescido de marinha, sob regime de ocupação, localizado na Avenida beira Mar, n° 700, bairro Treze de Julho, CEP: 49.020-010, Aracaju/SE, inscrito no Registro Imobiliário Patrimonial (RIP) n° 3105 0005262-60 e com número de matrícula n° 20898, da 4ª. Circunscrição Imobiliária de Aracaju/SE.
Com efeito, o Requerente recorre às premissas elencadas na sequência para sustentar o seu pedido:
- O caso se refere a imposição de multa por transferência pela Secretaria do Patrimônio da União aos adquirentes do imóvel acrescido de marinha inscrito no Registro Imobiliário Patrimonial sob o n° 31050005262-60, sob o regime de ocupação.
- Júlio Sobral Prado e Leonila Freire Silveira Prado exerciam a ocupação conjunta do referido imóvel;
- Júlio Sobral Prado faleceu em 26 de janeiro de 2002, havendo a transmissão dos direitos patrimoniais do imóvel para a sua cônjuge, Leonila Freire Silveira Prado, e herdeiros;
- Leonila Freire Silveira Prado adquiriu 50% (cinquenta por cento) a título de meação, e cada um dos 8 (oito) herdeiros adquiriram o quinhão correspondente a 5, 55% (cinco inteiros e cinquenta e cinco centésimos por cento) da parte disponível do imóvel;
- os herdeiros de Júlio Sobral Prado já exerciam a detenção de parte do imóvel desde a lavratura e registro do formal de partilha ocorrido em 2004;
- em 04 de abril de 2017 Leonila Freire Silveira Prado falece;
- restou consignado que cada herdeiro adquiriria um quinhão equivalente a 1/9 avos dos 50% (cinquenta por cento) do imóvel, nos termos do formal de partilha lavrado em 24/08/2020, extraído dos autos do processo n° 201812501140;
- SPU após tomar ciência do requerimento fixou a multa de transferência, levando em consideração a integralidade do terreno como base de cálculo. A multa imposta pela SPU perfez, assim, o valor principal de R$ 5.853,04 (cinco mil, oitocentos e cinquenta e três reais e quatro centavos);
- o Decreto-Lei n° 2.398/1987 dispôs sobre a instituição de foros, laudêmios e taxas de ocupação relativas a imóveis de propriedade da União. Para o caso sob exame, importa destacar o art. 3°, §4°, do Decreto-Lei n° 2.398/1987, origem da aplicação da penalidade a qual se pretende a reconsideração deste órgão;
- extrai-se do referido dispositivo, conforme caput do art. 3º supracitado, que a regulamentação refere-se à transferência onerosa e, nesse caso, dispõe acerca da incidência do laudêmio, que não se aplica ao presente caso;
- esse mesmo dispositivo, em sua parte final, faz menção ao art. 116 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, que regula, unicamente os imóveis aforados, que não é o caso destes autos;
- a multa aplicada, com o devido respeito, não pode ser cominada no caso dos autos, tendo em vista que não se trata de transferência onerosa, conforme exigência do caput art. 3º, do Decreto-Lei n° 2.398/1987 e, principalmente, o imóvel que se discute encontra-se sob o regime de ocupação e não de aforamento, razão pela qual inaplicável a multa disposta no art. 116, §2º Decreto-Lei no 9.760, de 1946 a que faz menção expressa o §§4º, do art.3º, do Decreto-Lei n° 2.398/1987;
- os adquirentes já exerciam a ocupação de parte do imóvel, de modo que os dados necessários já se encontravam cadastrados na base da Secretaria de Patrimônio da União, especificamente é preciso deixar claro que não houve transmissão onerosa do bem;
- nesse sentido, parte do bem em questão havia sido transmitido aos herdeiros em 2004 por ocasião da lavratura do Formal de Partilha do inventário do Sr. Júlio Sobral Prado, cabendo a cada um dos herdeiros o quinhão de 5, 55% (cinco inteiros e cinquenta e cinco centésimos por cento) da parte disponível do imóvel, conforme certidão de inteiro teor do imóvel.
- a base de cálculo utilizada pela multa de transferência aplicada está em descompasso com o objeto supostamente transmitido.
- a transmissão do imóvel disse respeito apenas a parte da Sra. Leonila Freire Silveira Prado correspondente a 50% (cinquenta) por cento do imóvel, sendo necessário que a base de cálculo incida apenas sobre essa porcentagem e não, por consectário lógico, sobre a integralidade do bem.
- o Decreto-Lei n° 2.398/1987 em seu art. 3°, §5°, que trata sobre a base de cálculo da multa de transferência, possui dicção expressa nesse sentido: § 5o A não observância do prazo estipulado no § 4o deste artigo sujeitará o adquirente à multa de 0,50% (cinquenta centésimos por cento), por mês ou fração.
Sobre a fundamentada objeção apresentada pelo Requerente, o Superintendente Substituto da SPU/SE autorizou o cancelamento da averbação da transferência no SIAPA calcado nos motivos que apresenta, “visando a anulação da cobrança do percentual da multa de transferência, cobrada indevidamente no percentual de 100%”:
Em atenção ao Despacho de Providências (26212973) quanto à contestação apresentada pela procuradora relativa à cobrança da multa de transferência, (26212725) o Núcleo de Receitas Patrimoniais - NUREP/SPU/SE informa:
Em 14 de outubro de 2021, os requerentes solicitaram no site da SPU, a transferência de titularidade do imóvel acima identificado, apresentando a documentação acostada nos autos do processo administrativo nº processo 19739.139610/2021-39.
Em 22 de fevereiro de 2022, após análise, foi concluída a averbação da transferência no Sistema Integrado de Administração Patrimonial - SIAPA, para o nome do requerente BENÍCIO JOSÉ FREIRE PRADO E OUTROS gerando a multa de transferência no valor R$ 5.853,04 (cinco mil oitocentos e cinquenta e três reais e quatro centavos), correspondente a 12 (DOZE) meses de atraso, considerando a data do título aquisitivo em 24/08/2020 , visto que foi informado equivocadamente o percentual de 100%, tendo em vista que os mesmos já eram possuidores de 50%.
Do exposto, este NUREP para corrigir o equívoco sugere que seja cancelado a transferência e Averbado novamente com a devida correção.
De acordo com o art. 53 da Lei 9.789/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, no qual a Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos. Sendo assim, este NUREP, propõe que seja autorizado no SIAPA o cancelamento da averbação da transferência com base no contido no Despacho (22648608) no qual foi informado equivocadamente o percentual a ser transferido de 100% para 50%."
grifo nosso
Feito o relatório passo a opinar.
COMPETÊNCIA PARA O ASSESSORAMENTO JURÍDICO À SPU/SP
A Medida Provisória nº 870, de 1º de janeiro de 2019, convertida na Lei nº 13.844 de 2019, promoveu significativa modificação na organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios, repercutindo diretamente na competência das Consultoria Jurídicas da União nos Estados da Advocacia-Geral da União, no que se refere ao assessoramento jurídico em matéria da patrimônio imobiliário.
Por tal motivo, o CONSULTOR-GERAL DA UNIÃO e o PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL expediram a Portaria Conjunta nº 1, de 29 de janeiro de 2019, por força da qual foram delegadas às Consultorias Jurídicas da União localizadas fora do Distrito Federal as atribuições consultivas relacionadas a órgãos assessorados integrantes da estrutura do Ministério da Economia localizados nos Estados, pelo prazo, prorrogável, de doze meses, consoante transcrição abaixo:
PORTARIA CONJUNTA Nº 1, DE 29 DE JANEIRO DE 2019
Dispõe sobre a delegação temporária de atribuições consultivas aos órgãos de execução da Consultoria-Geral da União e dá outras providências.
O CONSULTOR-GERAL DA UNIÃO e o PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, no uso de suas atribuições e tendo em vista o disposto no art. 55, § 3º, da Medida Provisória nº 870, de 1º de janeiro de 2019, no art. 39, I, do Decreto nº 7.392, de 13 de dezembro de 2010 e no art. 168 do Decreto nº 9.769, de 2 de janeiro de 2019, e considerando o que consta do processo administrativo nº 00688.000192/2019-91, resolvem:
Art. 1º Ficam delegadas às consultorias jurídicas da União localizadas fora do Distrito Federal as atribuições consultivas relacionadas a órgãos assessorados integrantes da estrutura do Ministério da Economia localizados nos Estados, pelo prazo, prorrogável, de doze meses.
Parágrafo único. A delegação ora promovida compreende apenas as atribuições relacionadas aos órgãos assessorados que integraram a estrutura dos extintos Ministérios do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, da Indústria, Comércio Exterior e Serviços e do Trabalho, até o advento da Medida Provisória nº 870, de 1º de janeiro de 2019.
A delegação temporária de atribuições consultivas prevista na Portaria Conjunta nº 1, de 29 de janeiro de 2019 vem sendo prorrogada sucessivamente, sendo que a última, a PORTARIA CONJUNTA CGU/PGFN Nº 131, DE 1º DE DEZEMBRO DE 2021, estabelece:
PORTARIA CONJUNTA CGU/PGFN Nº 131, DE 1º DE DEZEMBRO DE 2021
Dispõe sobre a prorrogação da delegação temporária de atribuições consultivas aos órgãos de execução da Consultoria-Geral da União.
O CONSULTOR-GERAL DA UNIÃO e o PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, no uso de suas atribuições e tendo em vista o disposto no art. 55, § 3º, da Lei n° 13.844, de 18 de junho de 2019, no art. 43, I, do Anexo I do Decreto n° 10.608, de 25 de janeiro de 2021 e no art. 179 do Anexo I do Decreto n°9.745, de 8 de abril de 2019, resolvem:
Art. 1º Fica prorrogada, a contar de 30 de janeiro de 2022 e pelo prazo de 12 (doze) meses, a delegação às consultorias jurídicas da União localizadas fora do Distrito Federal concernente às atribuições consultivas relacionadas a órgãos assessorados integrantes da estrutura do Ministério da Economia localizados nos Estados, de que trata o artigo 1° da Portaria Conjunta n° 1, de 29 de janeiro de 2019.
Art. 2° Fica revogada a Portaria Conjunta CGU/PGFN nº 99, de 30 de dezembro de 2020.
Art. 3º Esta Portaria entra em vigor em 30 de janeiro de 2022.
ARTHUR CERQUEIRA VALÉRIO
Consultor-Geral da União
RICARDO SORIANO DE ALENCAR
Procurador-Geral da Fazenda Nacional
Deste modo, a competência para o presente assessoramento jurídico tem fundamento na autorização prevista nos referidos atos normativos.
FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER JURÍDICO
A presente manifestação jurídica tem o escopo de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem praticados ou já efetivados. Ela envolve, também, o exame prévio e conclusivo dos textos das minutas.
Nossa função é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências, para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.
Importante salientar, que o exame dos autos processuais restringe-se aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade competente municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.
De fato, presume-se que as especificações técnicas contidas no presente processo, inclusive quanto ao detalhamento do objeto da contratação, suas características, requisitos e avaliação do preço estimado, tenham sido regularmente determinadas pelo setor competente do órgão, com base em parâmetros técnicos objetivos, para a melhor consecução do interesse público.
De outro lado, cabe esclarecer que, via de regra, não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes observar se os seus atos estão dentro do seu espectro de competências. Assim sendo, o ideal, para a melhor e completa instrução processual, é que sejam juntadas ou citadas as publicações dos atos de nomeação ou designação da autoridade e demais agentes administrativos, bem como, os atos normativos que estabelecem as respectivas competências, com o fim de que, em caso de futura auditoria, possa ser facilmente comprovado que quem praticou determinado ato tinha competência para tanto. Todavia, a ausência de tais documentos, por si, não representa, a nosso ver, óbice ao prosseguimento do feito.
É nosso dever salientar que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada a quem incumbe, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações. Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva da Administração
Conforme BPC n° 07, do Manual de Boas Práticas Consultivas da CGU/AGU edição de 2016:
"A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento."
Impende consignar que a presente manifestação jurídica limitar-se-á aos documentos franqueados pela SPU/SE por meio do acesso ao processo em referência, via sistema SEI.
TRANSFERÊNCIA DE IMÓVEL DA UNIÃO UTILIZADO EM REGIME DE OCUPAÇÃO. NORMAS APLICÁVEIS
Antes de enfrentarmos o caso e suas particularidades, imperativo conhecer as disposições legais e normativas que regulamentam o regime de ocupação dos imóveis da União, naquilo que se relaciona ao assunto em pauta.
O Decreto-lei nº 9.760, de 1946 ao dispor sobre os bens imóveis da União permitiu a sua utilização sob o regime de aforamento e sua transferência.
Permitiu, também, a utilização sob o regime de ocupação, mediante o pagamento anual de uma taxa, passível, como no aforamento, de transferência.
Ocorrendo a transferência, o diploma legal estabeleceu a obrigatoriedade de observar o prazo de 60 dias para o cumprimento da obrigação do adquirente do imóvel de requerer a transferência da titularidade do bem perante o Órgão de gestão imobiliária da União. Na eventualidade de desconsideração do limite temporal, o adquirente estaria sujeito à penalidade correspondente ao ato infracional praticado.
Observe-se que o prazo e a sanção referiam-se à transferência do imóvel sob o regime do aforamento, não havendo disposição equivalente a respeito dos imóveis da União utilizados sob o regime da ocupação, consoante se infere dos dispositivos vigentes na época destacados na sequência:
CAPÍTULO IV
Do Aforamento
SEÇÃO I - DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 99. A utilização do terreno da União sob regime de aforamento dependerá de prévia autorização do Presidente da República, salvo se já permitida em expressa disposição legal.
(...)
SEÇÃO III
DA TRANSFERÊNCIA
Art. 116. Efetuada a transação e transcrito o título no Registro de Imóveis, o adquirente, exibindo os documentos comprobatórios, deverá requerer, no prazo de 60 (sessenta) dias, que para o seu nome se transfiram as obrigações enfitêuticas.
§ 1º A transferência das obrigações será feita mediante averbação, no órgão local do S.P.U., do título de aquisição devidamente transcrito no Registro de Imóveis, ou, em caso de transmissão parcial do terreno, mediante termo.
§ 2º O adquirente ficará sujeito à multa 0,05% (cinco centésimos por cento), por mês ou fração, sobre o valor do terreno e benfeitorias nele existentes, se não requerer a transferência dentro do prazo estipulado no presente artigo.
(...)
CAPÍTULO VI
Da Ocupação
Art. 127. Os atuais ocupantes de terrenos da União, sem título outorgado por esta, ficam obrigados ao pagamento anual da taxa de ocupação.
Art. 128. O pagamento da taxa será devido a partir da inscrição de ocupação, efetivada de ofício ou a pedido do interessado, não se vinculando ao cadastramento do imóvel.
Com o passar dos anos foram sendo promovidas várias modificações na legislação de regência, de tal modo, que atualmente regulamentam os institutos jurídicos: Decreto-Lei nº 2.398 de 21 de dezembro de 1987; Decreto nº 95.760, de 1º de marco de 1988; Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998; Lei nº 13.139, de 26 de junho de 2015; Lei nº 13.240, de 30 de dezembro 2015 (conversão da MP Nº 691 DE 2015); Medida Provisória nº 759, de 22 de dezembro de 2016, Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017 e , finalmente, a Instrução Normativa nº 1, de 9 de março de 2018.
Constata-se que no ano de 2018, certamente no intuito de aglutinar as normas acima discriminadas, foi concebida a INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 1, DE 9 DE MARÇO DE 2018, do Secretário do Patrimônio da União contendo as orientações a serem observadas nos processos de cessão de direitos e de transferência de titularidade de imóveis da União, sob os regimes de aforamento ou de ocupação.
Importante a transcrição dos artigos que interessam ao nosso estudo:
TÍTULO I
DA TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE
Art. 1º Esta Instrução Normativa - IN disponibiliza orientações que devem ser observadas nos processos de cessão de direitos e de transferência de titularidade de imóveis da União, sob os regimes de aforamento ou de ocupação, e aplica-se à Secretaria do Patrimônio da União e as suas Superintendências.
CAPÍTULO I
DOS ASPECTOS GERAIS
Art. 2º Para efeito desta IN, considera-se:
I - Transferência de titularidade a alteração do responsável pelo imóvel da União no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União - SPU, com a inclusão dos dados do adquirente, que passa a ser o novo responsável pela utilização e pelas obrigações do imóvel;
(...)
IV - Transações não onerosas as que decorrem de extinção de empresa, cisão ou incorporação de empresas, doação, sucessão ou meação.
(...)
IX - Data de Conhecimento a data em que o requerimento eletrônico foi enviado à Secretaria do Patrimônio da União para instrução do processo, ou, quando de iniciativa da Secretaria do Patrimônio da União, a data em que o documento de transferência tenha sido anexado ao processo.
Art. 3º A transferência de titularidade do imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União deve ser efetuada quando da realização de transações imobiliárias envolvendo transmissão de terrenos da União, estando condicionada à emissão prévia de Certidão de Autorização para Transferência, conforme disposto no Capítulo IV.
Art. 4º O adquirente deve requerer a transferência de titularidade do imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União, no prazo de 60 (sessenta) dias, contados:
I - da data em que foi lavrada o título aquisitivo, no caso de ocupação; ou
II - da data em que foi efetivado o registro da transferência na matrícula do imóvel, no caso de foro.
Parágrafo único. Na inobservância dos prazos estabelecidos neste artigo, o adquirente fica sujeito à multa de transferência, quando a data de conhecimento da transação pela Secretaria do Patrimônio da União for superior ao prazo tratado neste artigo, da seguinte forma:
I - Nos casos de imóveis inscritos na Secretaria do Patrimônio da União sob regime de ocupação:
a. 0,05% (cinco centésimos por cento) ao mês ou fração, sobre o valor do terreno e benfeitorias, quando a escritura ou título aquisitivo lavrada ou escriturada até 30 de dezembro de 2015 ;
b. 0,05% (cinco centésimos por cento) ao mês ou fração, sobre o valor do terreno, quando a escritura ou título aquisitivo lavrada ou escriturada de 31 de dezembro de 2015 a 22 de dezembro de 2016; e
c. 0,50% (cinquenta centésimos por cento) ao mês ou fração, sobre o valor do terreno, a partir de 23 de dezembro de 2016.
(...)
Art. 6º A comunicação de transferência, pelo transmitente, ou a solicitação de transferência, pelo adquirente, deve ser efetuada por intermédio do requerimento específico no Portal da Secretaria do Patrimônio da União (patrimoniodetodos.gov.br).
Art. 7º O processo para transferência de titularidade de imóveis da União compreende as seguintes etapas no âmbito da Secretaria do Patrimônio da União:
I - Cálculo de laudêmio e emissão do respectivo DARF;
II - Emissão da CAT; e
III - Requerimento para alterar responsável pelo imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União.
Art. 8º São instrumentos válidos para a efetivação da transferência:
I - Escritura Pública:
a) se transação realizada até 21 de dezembro de 1987, deve constar menção ao Alvará de Licença expedido pela autoridade local da Superintendência do Patrimônio da União; e
b) se transmissão realizada entre 22 de dezembro de 1987 e 15 de fevereiro de 1997, no chamado regime auto lançado, devem estar mencionados os dados constantes do DARF de laudêmio pago, se for o caso, de qualquer valor;
II - Formal de Partilha, constando a homologação por sentença judicial;
III - Instrumento/Contrato Particular de Compra e Venda com força de Escritura Pública, se celebrados por instituições financeiras autorizadas, devem ser aceitos quando registrados no Cartório de Registro de Imóveis, devendo a Superintendência do Patrimônio da União verificar se houve a emissão da Certidão de Autorização para Transferência a que se refere.
IV - Carta de adjudicação, Carta de Arrematação ou instrumento decorrente de sentença judicial, se a transação incidir laudêmio, deve ser aceito o documento, ainda que não se mencione a CAT. Neste caso, a CAT, na modalidade Especial, é emitida pela Superintendência, mediante autorização da Unidade Central.
§1º Os documentos para transmissão emitidos após 15 de fevereiro de 1997 devem mencionar a Certidão de Autorização para Transferência e o pagamento do laudêmio ou sua isenção.
§2º Para os títulos aquisitivos de imóveis sob o regime de aforamento, deve ser exigido o registro no Cartório de Registro de Imóveis - CRI competente, por meio de certidão do CRI ou da anotação em carimbo ou selo próprio do cartório no título, constando o número do registro e matrícula do imóvel em questão.
§3º Para a transferência de titularidade de imóveis inscritos sob regime de ocupação são aceitos, independentemente do registro nos cartórios de registro de imóveis, os títulos públicos, desde que com recolhimento prévio do laudêmio em transferência onerosa.
§4º No caso de imóveis sob o regime de ocupação, os títulos públicos lavrados ou quaisquer contratos celebrados entre particulares até 27 de abril de 2006 são aceitos como documentos que comprovem a cadeia de posse, independentemente do recolhimento do laudêmio e da emissão de CAT, nos termos do § 7º, do art. 7º, da Lei nº 9.636 de 1998.
§5º Consideram-se contratos celebrados entre particulares os documentos de venda, recibos que identificam a transação de venda, promessas de compra e venda etc.
§6º Os títulos apresentados que não estiverem em conformidade com a norma deverão ser retificados ou aditados, de forma que passem a se enquadrar nas exigências legais.
§7º As promessas de transferência devem ser consideradas apenas para comprovação das circunstâncias que se referem ao recolhimento do laudêmio necessário à emissão da CAT, nos termos do art. 13, e para verificação de eventuais cessões intermediárias, conforme Capítulo VIII - Do Registro da Cessão de Direito.
§8º O documento comprobatório da averbação, no Cartório de Registro de Imóveis, do título aquisitivo de imóvel sob o regime de ocupação é suficiente para transferência da titularidade, desde que mencione a CAT, devendo a Superintendência do Patrimônio da União, verificar em seus sistemas a existência de crédito de laudêmio, no caso de transferência onerosa."
TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE NO CASO CONCRETO
No caso em tela, na esteira do que afirma a SPU/SE, o adquirente requereu a transferência 9 (nove) meses após ter realizado a transmissão do imóvel, junto ao Cartório (data do formal de partilha : 24/08/2020 - data do requerimento de transferência: 14/10/2021), portanto fora do prazo normativo.
Com efeito, a transferência do imóvel, sob regime de ocupação, se deu em razão da sucessão aberta com o falecimento de Leonila Freire Silveira Prado, em 4 e abril de 2017, procedendo-se à transmissão dos direitos patrimoniais do imóvel aos seus herdeiros, portanto, não onerosa na forma da INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 1, DE 9 DE MARÇO DE 2018 .
É importante sublinhar que a Sra. Leonila Freire Silveira Prado já havia adquirido o direito de ocupação de 50% (cinquenta por cento) do mesmo imóvel a título de meação, em virtude da morte do seu marido Júlio Sobral Prado em 26 de janeiro de 2002, e os herdeiros a outra parte disponível, porque tal particularidade teve o condão de justificar a revisão do cálculo da multa devida pelo atraso na comunicação da transferência ocorrida em 2017 por parte do Superintendente do Patrimônio da União em Sergipe, como se infere:
"Em 22 de fevereiro de 2022, após análise, foi concluída a averbação da transferência no Sistema Integrado de Administração Patrimonial - SIAPA, para o nome do requerente BENÍCIO JOSÉ FREIRE PRADO E OUTROS gerando a multa de transferência no valor R$ 5.853,04 (cinco mil oitocentos e cinquenta e três reais e quatro centavos), correspondente a 12 (DOZE) meses de atraso, considerando a data do título aquisitivo em 24/08/2020 , visto que foi informado equivocadamente o percentual de 100%, tendo em vista que os mesmos já eram possuidores de 50%.
Do exposto, este NUREP para corrigir o equívoco sugere que seja cancelado a transferência e Averbado novamente com a devida correção. "
De acordo com art. 2º da Instrução Normativa nº 1 de 9 de março de 2018 considera-se transação não onerosa as que decorre da sucessão ou meação:
I - Transferência de titularidade a alteração do responsável pelo imóvel da União no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União - SPU, com a inclusão dos dados do adquirente, que passa a ser o novo responsável pela utilização e pelas obrigações do imóvel;
(...)
IV - Transações não onerosas as que decorrem de extinção de empresa, cisão ou incorporação de empresas, doação, sucessão ou meação.
No caso dos autos, o instrumento válido para a efetivação da transferência, a teor do artigo 8º é o formal de partilha constando a homologação por sentença judicial:
Art. 8º São instrumentos válidos para a efetivação da transferência:
(...)
II - Formal de Partilha, constando a homologação por sentença judicial;
Deste modo, os adquirentes do direito de ocupação do imóvel por sucessão ou meação, determina a IN nº1/2018, devem requerer a transferência de titularidade no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União para seus respectivos nomes, no prazo de 60 (sessenta) dias, contados da data do formal de partilha constando a homologação por sentença judicial, consoante artigo 8º combinado com o artigo 4º:
Art. 4º O adquirente deve requerer a transferência de titularidade do imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União, no prazo de 60 (sessenta) dias, contados:
I - da data em que foi lavrada o título aquisitivo, no caso de ocupação; ou
A desobediência ao interregno legal e normativo submete o adquirente à penalidade previamente fixada no artigo 4º, § único e seus incisos:
Art. 4º O adquirente deve requerer a transferência de titularidade do imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União, no prazo de 60 (sessenta) dias, contados:
I - da data em que foi lavrada o título aquisitivo, no caso de ocupação; ou
II - da data em que foi efetivado o registro da transferência na matrícula do imóvel, no caso de foro.
Parágrafo único. Na inobservância dos prazos estabelecidos neste artigo, o adquirente fica sujeito à multa de transferência, quando a data de conhecimento da transação pela Secretaria do Patrimônio da União for superior ao prazo tratado neste artigo, da seguinte forma:
I - Nos casos de imóveis inscritos na Secretaria do Patrimônio da União sob regime de ocupação:
a. 0,05% (cinco centésimos por cento) ao mês ou fração, sobre o valor do terreno e benfeitorias, quando a escritura ou título aquisitivo lavrada ou escriturada até 30 de dezembro de 2015 ;
b. 0,05% (cinco centésimos por cento) ao mês ou fração, sobre o valor do terreno, quando a escritura ou título aquisitivo lavrada ou escriturada de 31 de dezembro de 2015 a 22 de dezembro de 2016; e
c. 0,50% (cinquenta centésimos por cento) ao mês ou fração, sobre o valor do terreno, a partir de 23 de dezembro de 2016.
A base de cálculo eleita consiste, atualmente, no valor do terreno, sem eventuais benfeitorias, sobre o qual incidirá o percentual de 0,50% (cinquenta centésimos por cento) ao mês ou fração. Note-se que não há previsão de dosimetria, ou gradação, que dê sustentação à redução, na hipótese, por exemplo, de o imóvel já ter sido objeto de transmissão por sucessão anterior.
No caso sub examine, como se depreende, o Poder sancionador conferido ao agente público competente limita-se ao comando da norma contida no artigo 4º, § único da IN n. 1, de 9 de março de 2018, e demais legislação relacionada nas linhas anteriores.
Calha dizer em acréscimo que o regime jurídico punitivo do Estado submete-se aos princípios da legalidade, tipicidade, irretroatividade, non bis in idem e o devido processo legal, entre outros.
Nesse diapasão, a atividade punitiva vinculada aos preceitos normativos e aos princípios de Direito Administrativo, exige que a conduta tida como reprovável seja previamente tipificada, o que se dá, no caso, desde 1946 com o Decreto-lei nº 9.760, de 1946 até culminar na IN nº 1, de 9 de março de 2018, que consolidou as orientações a serem observadas nos processos de cessão de direitos e de transferência de titularidade de imóveis da União, sob os regimes de aforamento ou de ocupação pela Secretaria do Patrimônio da União e as suas Superintendências.
A conduta censurável encontra-se, assim, definida:
“inobservância do prazo de 60 dias para requerer a transferência de titularidade do imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União:
O ilícito administrativo consiste, portanto, no comportamento consciente, violador da norma de conduta que o contempla, ou seja: deixar de observar o prazo de 60 dias para requerer a transferência de titularidade do imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União, o que enseja a aplicação de uma sanção da mesma natureza administrativa.
A aplicação da sanção administrativa em comento busca desestimular, dissuadir, constranger o adquirente a não deixar de comunicar ou atrasar a comunicação da transferência do imóvel da União, porquanto a sua desídia tem potencial para comprometer a atualização do cadastro da SPU, e como efeito disso impedir ou dificultar a cobrança das receitas patrimoniais devidas.
Não cabe, portanto, falar em redução da base de cálculo de 100% para 50% do valor do terreno para efeito de cálculo do montante da multa, sob o fundamento de que "foi informado equivocadamente o percentual de 100%, tendo em vista que os herdeiros já eram possuidores de 50%" em razão do falecimento de Júlio Sobral Prado em 26 de janeiro de 2002, eis que a fórmula de apuração do valor da multa não comporta tal tipo de ilação.
De outro lado, lembramos que as multas de transferência são consideradas receitas, conforme artigo 55 e 56 da mencionada Instrução Normativa:
DAS RECEITAS DECORRENTES DE TRANSFERÊNCIA
Art. 55. São receitas decorrentes da transferência de titularidade de imóvel da União e da cessão de direito os laudêmios, as multas de transferência, e os foros ou taxas de ocupação referentes aos exercícios ocorridos entre a data do título e a da transferência de titularidade do imóvel.
Art. 56. O lançamento de receitas decorrentes da transferência e da cessão ocorre no processo administrativo e realizado por meio do sistema da Secretaria do Patrimônio da União, no momento da transferência de titularidade do imóvel ou da anotação da cessão de direito.
Desta maneira, a receita patrimonial constitui rendimento auferido pelo Estado, decorrente da gestão do seu patrimônio imobiliário, obtido mediante utilização do sistema de administração patrimonial da Secretaria do Patrimônio da União, que centraliza os lançamentos de receitas de laudêmio e de eventuais multas de transferência.
DO PROCESSAMENTO DA TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE
Art. 39. A transferência de titularidade do imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União é realizada mediante utilização do sistema de administração patrimonial da Secretaria do Patrimônio da União, que centraliza os lançamentos de receitas de laudêmio e de eventuais multas de transferência.
Ademais, a teor da Lei n 4.320, de 1964:
Art. 57. Ressalvado o disposto no parágrafo único do artigo 3º desta lei serão classificadas como receita orçamentária, sob as rubricas próprias, todas as receitas arrecadadas, inclusive as provenientes de operações de crédito, ainda que não previstas no Orçamento.
Tratando-se, pois, de receita que integra o Orçamento da União, a gestão desses recursos submetem-se aos comandos da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a denominada “Lei de Responsabilidade Fiscal, que preceitua:
Art. 2o Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como:
IV - receita corrente líquida: somatório das receitas tributárias, de contribuições, patrimoniais, industriais, agropecuárias, de serviços, transferências correntes e outras receitas também correntes, deduzidos:
A Lei dispõe no CAPÍTULO III - DA RECEITA PÚBLICA - Seção II sobre a Renúncia de Receita, estabelecendo que neste instituto encontra-se compreendida a modificação da base de cálculo, desde que atendidos determinadas condicionantes.
Nessa trilha, para ser possível a modificação da base de cálculo, além de ser necessária previsão legal, o proponente deve atender os incisos I e II, do artigo 14 abaixo transcrito:
Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:
I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;
II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
§ 1o A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.
§ 2o Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de que trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.
§ 3o O disposto neste artigo não se aplica:
I - às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do art. 153 da Constituição, na forma do seu § 1º;
II - ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança.
É nosso entendimento, com alicerce nos fundamentos apresentados no decorrer desta manifestação jurídica, que a modificação da base de cálculo da multa de transferência efetivada no caso concreto não se subsume à hipótese legal, razão pela qual não deve ser acolhido o pedido de cancelamento da multa imposta ou, alternativamente, o pedido de revisão da sua base de cálculo, cabendo à SPU/SP promover os atos necessários à conclusão da transferência de titularidade do imóvel da União, nos termos do documento apresentado pelo adquirentes, com a imposição da penalidade prevista na Instrução Normativa nº 1, de 9 de março de 2018:
Art. 4º O adquirente deve requerer a transferência de titularidade do imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União, no prazo de 60 (sessenta) dias, contados:
I - da data em que foi lavrada o título aquisitivo, no caso de ocupação; ou
II - da data em que foi efetivado o registro da transferência na matrícula do imóvel, no caso de foro.
Parágrafo único. Na inobservância dos prazos estabelecidos neste artigo, o adquirente fica sujeito à multa de transferência, quando a data de conhecimento da transação pela Secretaria do Patrimônio da União for superior ao prazo tratado neste artigo, da seguinte forma:
I - Nos casos de imóveis inscritos na Secretaria do Patrimônio da União sob regime de ocupação:
a. 0,05% (cinco centésimos por cento) ao mês ou fração, sobre o valor do terreno e benfeitorias, quando a escritura ou título aquisitivo lavrada ou escriturada até 30 de dezembro de 2015 ;
b. 0,05% (cinco centésimos por cento) ao mês ou fração, sobre o valor do terreno, quando a escritura ou título aquisitivo lavrada ou escriturada de 31 de dezembro de 2015 a 22 de dezembro de 2016; e
c. 0,50% (cinquenta centésimos por cento) ao mês ou fração, sobre o valor do terreno, a partir de 23 de dezembro de 2016.
CONCLUSAO
Em face do exposto, opinamos, nos limites da análise jurídica e excluídos os aspectos técnicos e o juízo de oportunidade e conveniência, pelo indeferimento do pedido de cancelamento da multa imposta ou, alternativamente, do pedido de revisão da sua base de cálculo, cabendo à SPU/SP promover os atos necessários à conclusão da transferência de titularidade do imóvel da União, bem como à aplicação da penalidade por descumprimento do prazo de 60 dias contados do formal de partilha constando a homologação por sentença judicial, conforme determina a Instrução Normativa nº 1, de 9 de março de 2018.
Não obstante o nosso entendimento, consideramos prudente que a SPU/SE consulte o seu Órgão central, a fim de verificar se existe algum posicionamento anterior sobre a matéria que tenha o condão de afetar a presente manifestação.
É o parecer, de caráter opinativo, que prescinde de aprovação por força do art. 21 da Portaria E-CJU/Patrimônio/CGU/AGU n° 1/2020 – Regimento Interno da e-CJU/Patrimônio, publicada no Suplemento B do BSE nº30, de 30 de julho de 2020.
Brasília, 1º de agosto de 2022.
LUCIANA MARIA JUNQUEIRA TERRA
ADVOGADA DA UNIÃO
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 19739139610202139 e da chave de acesso edcd5bac