ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO

 

PARECER n. 00729/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 10154.165473/2021-94

INTERESSADO: SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM SANTA CATARINA

ASSUNTO: CONSULTA E ORIENTAÇÃO DE ATUAÇÃO

 

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO. BENS PÚBLICOS. GESTÃO E GOVERNANÇA DO PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO.  PRAIAS MARÍTIMAS. UTILIZAÇÃO PRIVATIVA DE FAIXAS DE AREIA DE PRAIA CONFERIDA ILEGALMENTE POR MUNICÍPIO, SEM AUTORIZAÇÃO DA UNIÃO.
I - Consulta e orientação de atuação acerca dos termos de permissão de uso conferidos pelo município de Florianópolis/SC.
II - Praias marítimas e faixas de praia. Bem comum de uso do povo. Domínio da União conferido pelo inciso IV do art. 20 da Constituição Federal de 1988.
III - Usurpação da competência do Ministério da Economia, a quem se vincula a  Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União, pelo município de Florianópolis/SC,  à luz do parágrafo único do artigo 10 da Lei 9.636 de 1998  c/c artigo 102 do Decreto nº 9.745, de 8 de abril de 2019.
III - Desrespeito municipal com a titularidade do bem e a legislação que impõe a prévia autorização da União na qualidade de proprietária.
IV – Destinação de área pública à utilização privada sem licitação. Caracterização em tese do delito de contratação direta fora das hipóteses legais. Art. 337-E do Código Penal.
IV – Contrato de permissão de uso sem validade perante a União. Caracterização de ato inexistente por ausência da vontade da proprietária, passível apenas de gerar responsabilização dos agentes públicos municipais e representantes das empresas beneficiadas ilegalmente.
V – Dever da SPU/SC de deflagrar os procedimentos fiscalizatórios e arbitrar o valor da indenização pela ocupação ilícita, com notificação do representante legal do município, o senhor prefeito, e das empresas que ocuparam ilegalmente a área pública.
VI - Encaminhamento de cópia do processo administrativo ao Ministério Público Federal, para ciência e providências que julgar adequadas no âmbito de suas atribuições legais.

 

 

 

 

I – RELATÓRIO

 

1. A SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM SANTA CATARINA - SPU/SC, encaminha o presente processo, para análise e manifestação, nos termos do artigo 11, inciso VI, alínea “b”, da Lei Complementar nº73, de 10 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União e do artigo 19, incisos I e VI, do Ato Regimental nº 5, de 27 de setembro de 2007, do Advogado-Geral da União, combinados com o art. 38 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.

 

2. Os autos foram instruídos com os documentos que seguem:

 

               19679779            Ordem de Fiscalização 106         

               19794779            Despacho           

               19864503            Anexo Relatório fotográfico      

               19869786            Anexo Termo Permissão de Uso da Pref. de Fpolis          

               19901580            Relatório de Fiscalização Individual - RFI 2990   

               19942713            Anexo - Polígono área do evento            

               19943551            Despacho           

               21022947            Ofício 331741   

               21107385            E-mail  

               21115586            E-mail Confirmação de recebimento      

               24766736            Despacho           

               24913382            E-mail

               26360249            Recibo 

               26360251            Ofício 056/2022              

               26360256            Ofício 331741 2021       

               26464080            Despacho           

               27202233            Ofício 223297   

               27365258            Despacho

 

3. Trata-se de consulta e orientação de atuação acerca dos termos de permissão de uso conferidos pelo município de Florianópolis/SC em faixas de praia, bem comum de uso do povo de domínio da União.

 

4. A consulta do órgão assessorado tem por fundamento as considerações consignadas no OFÍCIO SEI Nº 223297/2022/ME  (SEI nº SEI nº 27202233):

 

“Prezados Senhores,
1. Cumprimentando-os cordialmente, encaminhamos o presente processo para apreciação quanto à análise de mérito em relação à prerrogativa para Permissão de Uso em Área da União.
2. Tal dúvida nos foi apresentada após assinatura de Termo de Permissão de Uso, no caso em tela, de área da união, entre o Município de Florianópolis e entidade privada, conforme Ofício da Procuradoria Geral de Florianópolis (26360251).”

 

É o relatório.

 

II - FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER

 

5. Esta manifestação jurídica tem a finalidade de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa. A função do órgão de consultoria é apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências para salvaguardar o Gestor Público, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.

 

6. Importante salientar que o exame dos autos restringe-se aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica e/ou financeira. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade assessorada municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.

 

7. De outro lado, cabe esclarecer que não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes, observar se os seus atos estão dentro do seu limite de competências.

 

8. Destaque-se que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada, a quem compete, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações. Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva do(s) agente(s) público(s) envolvido(s).

 

9. Assim, caberá tão somente a esta Consultoria, à luz do art. 131 da Constituição Federal de 1988 e do art. 11 da Lei Complementar nº 73, de 1993, prestar assessoramento sob o enfoque estritamente jurídico, não sendo competência deste órgão consultivo o exame da matéria em razão das motivações técnicas, nem da oportunidade e conveniência, tampouco fazer juízo crítico sobre cálculos e avaliações, ou mesmo invadir o campo relacionado à necessidade material no âmbito do órgão assessorado.

 

10. Portanto, esta manifestação tem por objeto proferir análise acerca da prática do município de Florianópolis-SC de conferir utilização privada de área de domínio da União,  salvaguardando, sobretudo, no que refere à esfera discricionária do Administrador e à matéria eminentemente técnica (não jurídica), o que orienta o Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, no sentido de que:

 

"O Órgão Consultivo não deve emitir manifestações conclusivas sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, sem prejuízo da possibilidade de emitir opinião ou fazer recomendações sobre tais questões, apontando tratar-se de juízo discricionário, se aplicável. Ademais, caso adentre em questão jurídica que possa ter reflexo significativo em aspecto técnico deve apontar e esclarecer qual a situação jurídica existente que autoriza sua manifestação naquele ponto".

 

III – FUNDAMENTAÇÃO

 

11. As praias constituem bens públicos de uso comum do povo, como as define a LEI Nº 7.661, DE 16 DE MAIO DE 1988, que institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e dá outras providências:

 

"Art. 10. As praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica."
 

12. O domínio público da União em relação as praias está assegurado constitucionalmente no art. 20 da CF/88:

 

“Art. 20. São bens da União:
I – III – omissis;
IV as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II;  (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 46, de 2005) (...)” (grifos e destaques)

 

13. A  LEI Nº 13.240, DE 30 DE DEZEMBRO DE 2015, que dispõe sobre a administração, a alienação, a transferência de gestão de imóveis da União e seu uso para a constituição de fundosautoriza a transferência ao município  da gestão das orlas e praias marítimas, desde que, com sujeição às orientações e fiscalizações da SPU. É o que reza seu art. 14:

 

“Art. 14. É a União autorizada a transferir aos Municípios a gestão das orlas e praias marítimas, estuarinas, lacustres e fluviais federais, inclusive as áreas de bens de uso comum com exploração econômica, tais como calçadões, praças e parques públicos, excetuados:  (Redação dada pela Lei nº 13.813, de 2019)
I - os corpos d’água;
II - as áreas consideradas essenciais para a estratégia de defesa nacional;
III - as áreas reservadas à utilização de órgãos e entidades federais;
IV - as áreas destinadas à exploração de serviço público de competência da União;
V - as áreas situadas em unidades de conservação federais.
§ 1º A transferência prevista neste artigo ocorrerá mediante assinatura de termo de adesão com a União.
§ 2º O termo de adesão será disponibilizado no sítio eletrônico do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão para preenchimento eletrônico e preverá, entre outras cláusulas:
I - a sujeição do Município às orientações normativas e à fiscalização pela Secretaria do Patrimônio da União;
II - o direito dos Municípios sobre a totalidade das receitas auferidas com as utilizações autorizadas;
III - a possibilidade de a União retomar a gestão, a qualquer tempo, devido a descumprimento de normas da Secretaria do Patrimônio da União ou por razões de interesse público superveniente;
IV - a reversão automática da área à Secretaria do Patrimônio da União no caso de cancelamento do termo de adesão;
V - a responsabilidade integral do Município, no período de gestão municipal, pelas ações ocorridas, pelas omissões praticadas e pelas multas e indenizações decorrentes.
§ 3º (VETADO).” (grifos e destaques)

 

14. Ocorre que o Relatório de Fiscalização Individual pontua que não foi firmado Termo de Adesão à Gestão de Praias (TAGP) entre o município de Florianópolis - SC e a União para que o município pudesse ter recebido alguma atribuição delegada para gerir o bem de domínio da União (SEI nº 19679779​).

 

15. Portanto, não tem validade qualquer ato do município em usurpação da competência da União, ao fazer as vezes de proprietário de bem federal sem que detenha a condição legal do domínio.

 

16. Embora um ato inexistente não produza nenhum efeito, bastando que a SPU/SC declare a sua inexistência, ante ao que impõe o art. 20 da Constituição Federal, para que se desconstitua qualquer eventual efeito produzido pela "permissão" municipal de propriedade alheia, é certo que eventuais perdas e danos dos particulares deverão ser direcionadas ao município infrator, por passar-se por proprietário do bem federal, embora já DEVIDAMENTE NOTIFICADO pela SPU/SC, através do OFÍCIO SEI Nº 331741/2021/ME (SEI nº 21022947).

 

17. Outrossim, a alegação do secretário municipal de cultura, esporte e lazer do município, no sentido de que pelo código municipal de posturas "é possível colocação de aparelhos ou qualquer dispositivo de desportos nas praias" (Ofício nº 056/2022 - SEI nº 26360251), não confere a atribuição legal necessária para que o município decida sobre o bem de propriedade constitucional da União mediante instrumento de utilização. Reste esclarecido que normas de posturas municipais visando a organização do meio urbano na se refere à gestão e governança do patrimônio atribuído ao ente político federal constitucionalmente.

 

18. Sendo assim, qualquer instrumento de utilização privada (sem licitação) conferida pelo município não está apto à produção de efeitos jurídicos, pelo evidente vício de competência do ato inexistente por ausência da titular do domínio, razão pela qual a SPU/SC DEVERÁ deflagrar os procedimentos fiscalizatórios que a defesa do patrimônio público exige, devendo o particular ilegalmente beneficiado com o uso privativo do bem público de uso comum da União, caso queira, reportar-se ao município infrator em caso de eventual prejuízo ocasionado com a permissão de uso do bem alheio sem a condição de detentor do domínio, em agressão ao princípio da legalidade e da obrigatoriedade de licitação. Veja-se:

 

0033874-42.2016.4.02.5102 (TRF2 2016.51.02.033874-5)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. OCUPAÇÃO IRREGULAR DE BEM IMÓVEL. PRAIAS MARÍTIMAS. QUIOSQUE. DEMOLIÇÃO. POSSE IMEDIATA PELA UNIÃO. INDENIZAÇÃO. MUNICÍPIO DE NITERÓI. AUTORIZOU IRREGULARMENTE. RESPONSABILIDADE PELA MULTA. REMESSA E RECURSO PROVIDOS. 
1. Discute-se o direito da União em obter a imediata posse de terreno situado em praia marítima sobre o qual o réu David Barbosa edificou com promoção e autorização do Município de Niterói o quiosque n. 09 "quiosque de areia", localizado na Praia de Itaipu, Niterói/RJ. O tema dos autos também versa sobre a condenação da parte ré em indenização no valor de 10% sobre o valor atualizado do domínio pleno do terreno, até a sua efetiva desocupação e multa pecuniária em caso de nova ocupação ilícita.
2. Os elementos reunidos no processo administrativo de fls. 18/56, notadamente a imagem do referido quiosque em área irregular e a notificação do ocupante, evidenciam as alegações da autora, ora apelante, eis que há verdadeiramente a apropriação indevida daquele espaço, área de praia, terreno da União, artigo 20, inciso VII da CRFB/88, inclusive com mesas e cadeiras para o desenvolvimento de suas atividades comerciais particulares.
3. As faixas de areia das praias são bem de uso comum do povo e sujeitam-se a regime especial de proteção e conservação, sendo insuscetíveis de apropriação por particulares, artigos 3º e 10º da Lei n° 7.661/88. Novamente, para eventual ocupação ou utilização faz-se imprescindível a autorização da Secretaria de Patrimônio da União, artigo 9º da Lei n° 9.636/98.
4. De mais a mais, os quiosques irregularmente instalados por particulares em trechos da praia ocasionam degradação pela retirada de vegetação natural com comercialização de comidas e bebidas com riscos à danificação do meio ambiente, mormente se inexistente prévia autorização da SPU.
5. É de se pontuar que o réu particular explica que a construção foi realizada pelo Município de Niterói com apoio de empresa patrocinadora "Skin" com indevida usurpação da competência federal pelo ente local em benefício de atividades privadas e, em prejuízo ao interesse público, fls. 112/144.
6. O raciocínio do magistrado sentenciante de que a instalação irregular de quiosque ocasiona comodidades à coletividade com atendimento ao interesse social de lazer está em descompasso com o reconhecimento de que a utilização privada de bem público vinculado, ainda, à proteção ao meio ambiente, depende de assentimento estatal na esteira da Política Nacional do Meio Ambiente.
7. Nesse cenário, o Município de Niterói, equipado com seus órgãos e entidades não desconhecia a natureza federal do bem, tampouco poderia autorizar a atividade, muito menos em vista a disciplinar o uso privado de terreno federal.
8. Obviamente o fato de o Município não ser o proprietário não o exime de reconhecer a titularidade federal com encaminhamento do particular à autoridade competente no viés cooperativo da Federação. Por isso, não há nenhum descompasso na atuação federal, muito menos ilegitimidade passiva do Município, pois autorizou atividade privada irregular em bem que não é de sua propriedade.
9. Vale destacar que o fato de que o quiosque instalado na Praia de Itaipu estar situado em área comum do povo sob o domínio da União é incontestável. Diante disso, novamente, compete à Secretaria do Patrimônio da União, integrante do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, na forma disposta na Lei no 9.636/98 autorizar qualquer ocupação.
10. Por isso, há direito da União de obter a posse do bem novamente por expressa disposição legal em cotejo ao regramento da Constituição da República de 1988. Também impera o reconhecimento da indenização reparatória a cargo do Município, e não do particular que, com autorização do ente local atuou de boa-fé, pela usurpação de competência à luz do parágrafo único do artigo 10 da Lei 9.636 de 1998.
11. A lei 13.240 de 2015, por sua vez, não socorre ao interesse do Município apelado. Isso porque o caso versa sobre construção edificada em descompasso com a titularidade do bem e a legislação que impõe a prévia autorização da União. Ao tempo da irregular exploração pelo particular, mediante autorização indevida do Município, não havia a aduzida transferência, muito menos é suficiente para afastar o direito da União o termo de adesão que o réu alega ter realizado.
12. Remessa e recurso providos para reformar a sentença e julgar os pedidos procedentes com determinação para que a União seja imitida na posse do imóvel objeto destes autos; condenação do réu Município de Niterói a demolir e a retirar da área todos os restos de demolição da construção Quiosque nº 09, irregularmente erguido sobre a Praia de Itaipu, em Niterói; condenação do réu, Município de Niterói, a pagar a indenização pelo uso do terreno da União onde estava instalado o Quiosque nº 09, irregularmente erguido sobre a Praia de Itaipu, valor esse que deverá ser calculado e informado nos autos pela União de acordo com os usuais parâmetros utilizados pelo ente federal, ou seja, 10% sobre o valor atualizado do domínio pleno do terreno, até sua efetiva desocupação. [Classe: Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e do Trabalho - Órgão julgador: 6ª TURMA ESPECIALIZADA - Data de decisão06/09/2019 - Data de disponibilização 10/09/2019 – Relator ALFREDO JARA MOURA] (grifado e destacado)

 

19. Sendo assim, a União exerce todos os poderes sobre o bem de natureza constitucional, desprovidas de qualquer validade em face da proprietária as avenças ilegais entre o município e as empresas favorecidas. Em consequência, devendo os procedimentos fiscalizatórios ser concluídos.

 

20. Atente-se que a ilegalidade entre o município e o particular, no que refere à utilização do bem de uso comum do povo sem autorização da titular do domínio (a União), também pode configurar os crimes de licitação previstos na Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 (nova lei de licitações), ante a contratação direta a favorecer um particular em detrimento de outros possíveis interessados.  Nesse caso podem responder pelo delito tanto os representantes das empresas beneficiadas quanto  os agentes públicos que firmaram os termos de permissão ilegais, incluindo os que autorizaram a contratação.

 

21. Nesse aspecto,  no que refere à utilização de área pública, SEM LICITAÇÃO, assim prescreve o art. 178 da nova lei de licitações, que majora a penalidade antes estabelecida no revogado art. 89 da Lei nº 8666/1993, dando nova redação ao artigo 337-E do Código Penal:

 

"Art. 178. O Título XI da Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte Capítulo II-B:
“CAPÍTULO II-B
DOS CRIMES EM LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS
Contratação direta ilegal
Art. 337-E. Admitir, possibilitar ou dar causa à contratação direta fora das hipóteses previstas em lei:
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa."
 

22. A ausência de certame licitatório para conferir permissão de uso de bem público a particulares fora das hipóteses previstas nos arts. 17, 24 e 25 da Lei nº 8.666/1993, configura, em tese, o perfazimento do delito. A propósito:

 

"EMENTA: PROCESSO-CRIME DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA - PREFETO MUNICIPAL - PERMISSÃO DE USO DE BEM PÚBLICO SEM LICITAÇÃO - ARTIGO 89, DA LEI Nº 8.666/93 - PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ARTIGO 41 DO CPP - PRESENÇA DE JUSTA CAUSA - DENÚNCIA RECEBIDA. - Satisfazendo a peça acusatória os requisitos do artigo 41, do Código de Processo Penal e, inexistindo quaisquer das hipóteses do artigo 395, do referido Codex Processual, impõe-se o recebimento da denúncia - Nessa fase processual, não se exige comprovação plena dos fatos imputados, prevalecendo o princípio "in dubio pro societate". 

 

23. Além do regular prosseguimento dos procedimentos fiscalizatórios, deverá o senhor prefeito ser notificado das permissões ilegais assinadas pelo secretário de cultura e esportes do município, com remessa da cópia integral da documentação que compõe o presente processo ao douto Ministério Público Federal, para ciência e providências que julgar adequadas no âmbito de suas atribuições legais.

 

IV - CONCLUSÃO

 

24. Ante o exposto, nos limites da consulta formulada, considerando que a orientação promovida por este consultivo especializado é quanto ao controle de legalidade da Administração, não implicando conferência de documentos, matérias de cálculo, técnicas ou financeiras, ou mesmo deliberação, que é prerrogativa do gestor público, opina-se pela invalidade dos termos de permissão de uso conferidos pelo município, ante a constitucionalidade do domínio da União e inexistência de Termo de Adesão à Gestão de Praias (TAGP) firmado, recomendando-se o encaminhamento da presente manifestação jurídica ao órgão consulente, para prosseguimento do feito, uma vez respondidas as indagações contidas no OFÍCIO SEI Nº 223297/2022/ME  (SEI nº 27202233).

 

Brasília, 11 de setembro de 2022.

 

LEANDRA MARIA ROCHA MOULAZ

ADVOGADA DA UNIÃO - OAB/ES 7.792

Matrícula 13326678

 

 

 

 

 

 


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